O galo não canta mais. A gente não dorme mais. A gente não sonha mais.
Não há tempo pra se sonhar. Não há tempo para o café. Não há tempo para a oração.
Não há tempo para a emoção.
A condução não espera. O trabalho não espera. Da vida, nada se espera.
Não há tempo para o “bom-dia”. Não há vontade para o “bom-dia”.
Não existe mais um bom dia.
Olho-no-olho não existe mais. Não há a comunicação. Não há tempo para escrever.
Não há a quem visitar. Não há o que se esperar. Não temos tempo a perder.
Não temos tempo pros filhos. Não temos tempo pra nós. Simplesmente, não temos tempo.
A produção não espera. O cifrão não tolera atraso e o prazo está se esgotando.
Comemos alguma coisa no fast-food, mas não há tempo pra mastigar.
Esperamos a ligação. Ao mesmo tempo, não temos tempo pra esperar.
Fechemos o mês antes do mês acabar. Temos pressa. Temos gana. O que não temos é tempo.
Infeliz desse relógio que teima em fazer o tempo passar.
Não terminamos o relatório. Não há como terminar.
A luz do sol já se foi e nós nem notamos.
A lua já brilha no céu e nós nem notamos.
A vida está se esvaindo e nós nem notamos.
No retorno para casa, não olhamos o cenário.
Não há cenário a se contemplar.
Porém, no horário, está fixo o nosso olhar.
Nossos ouvidos, grudados ao celular,
nem sequer uma canção se atrevem a escutar...
Nossas mãos estão trêmulas e nossas pernas não param de balançar.
Estamos cansados. Meu Deus! Mas, não há tempo pra se cansar!...
Em casa chegamos... sem ninguém pra nos esperar
Por certo, estão todos sem tempo.
Tomamos um banho, deitamos.
Fechamos os olhos. Abrimos os olhos.
Já é hora de levantar.
O galo não canta mais. A gente não dorme mais. A gente não sonha mais...
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