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Vozes na Escuridão
Fernando Rodrigues dos Santos

Resumo:
Perdida e assustada, Susan ouve vozes. Há alguém? Alguém para ajudar? Não há ninguém. As vozes brincam com a cabeça de Susan, que, desesperada, toma uma atitude inesperada.

Susan ri enquanto tenta, pela enésima vez, ligar o carro. Seu riso demonstra sua incredulidade com o que está acontecendo. O carro rosna, mas não passa disso. Apenas resmungos. Susan apóia a cabeça ao volante.

“Meu Deus, me ajude a sair daqui.”

Tenta mais uma vez dar a partida. Nada.
Grita de raiva. Chora de desespero.

“Preciso de ajuda!”

Susan pega a bolsa e tenta o celular.

“Sem rede”

Deixa cair os ombros e a cabeça.

“Por favor, meu Deus, me ajude!”

Fecha os olhos.
A rua, completamente às escuras, está deserta. Não há casas. Apenas galpões e contêineres de lixo.

“Vamos lá garota, precisamos manter a calma e sair daqui”.

Susan toca na maçaneta da porta. Olha à frente, através do para-brisas. Está com medo. Sua respiração torna-se ofegante à medida que compreende sua situação. Abre a porta do carro. Olha para o céu. Está nublado e uma nuvem carregada cobre a lua.

“Meu Deus, meu Deus... o que faço?”

Olha para trás. Não há sinal algum de luz ou movimento. A rua é longa, tanto à frente quanto na direção contrária. Vários contêineres, de um lado e outro da rua. Susan se pega pensando se haveria alguém escondido, ou dormindo, atrás de algum daqueles contêineres. Aflita. Com medo.

“O que faço... o que faço! Bom, fico aqui e espero amanhecer ou procuro ajuda agora mesmo?”

- Ei!

Susto. Susan se vira. Olha para a frente. Seu coração bate acelerado. Alguém a chamara.

- Olá? – Sua voz soa estridente. Fere seus ouvidos. Ecoa na rua deserta. Susan fecha a porta do carro e caminha para a frente.

- Alguém? – Acelera o passo – por favor, preciso de ajuda! – Susan pára. Observa a rua à sua frente.

“Acho que estou ficando louca. Não há ninguém.”
Vira-se para trás, tencionando voltar ao carro.

“O que?!”

Há alguém sentado ao volante. Susan corre em direção ao carro.

“Mas o quê...”

- Ei, por favor! – Susan ouve alguém a chamando na direção contrária. Pára e se vira. Está ofegante. Coração ecoando suas batidas dentro do peito. Não há ninguém

“Meus Deus, o que é isso?”

Se vira para o carro novamente. Não há ninguém. Não há ninguém em lugar algum. Abre a porta.

“Havia alguém.”

As chaves balançavam na ignição. Susan arregala os olhos. Gira a cabeça para todos os lados. Procura. Tenta encontrar. Alguém. Algum movimento. Não há nada. Entra. Fecha os olhos. Apóia a cabeça ao volante do carro. Respira fundo. Bate a porta e abaixa os pinos de tranca das pontas. Silêncio. Apenas o vento.

“O que é isso... o que está acontecendo? Meu Deus, meu Deus, me ajude!”
Susan levanta a cabeça. Há um contêiner de lixo logo à frente. Está escuro. Algo se movimenta atrás da caixa de aço. Há uma sombra.

“Tem alguém!”

Susan fica paralisada. Olha fixamente para a sombra, atrás do contêiner. Apenas um pedaço de sombra. Está imóvel.

“Vamos, se mova! Eu sei que está aí, estou te vendo seu filho da mãe!”

Os segundos passam. Susan sente uma gota de suor descer-lhe pelas costas. Gelada. Arrepia-lhe os pêlos dos braços. A sombra permanece imóvel. Susan percebe que havia prendido a respiração. Olha para as próprias mãos e as vê avermelhadas. Estava apertando o volante. Respira. Solta o ar lentamente a afrouxa as mãos. Olha para o contêiner. A sombra se move.

“Filho da mãe!”

Susan leva a mão à maçaneta da porta. Olha mais uma vez para o contêiner.

“Desgraçado!”

Abre a porta do carro.

“Espera.”

Fecha a porta. Passa por entre os bancos da frente e alcança o porta malas, na parte detrás do banco traseiro. Sob o tapete, pega uma chave de roda. A chave tem o formato de uma cruz e é pesada. Susan volta ao banco da frente e abre a porta. Devagar. Olhos fixos no pedaço de sombra. Coloca uma perna para fora e inclina o corpo. Agora pode ver a caixa de aço sem a interposição do pára-brisas.

- Ei, estou vendo você! Saia daí! - diz.

A noite fica mais gelada. Susan sai do carro e sente o vento frio cobrir-lhe o rosto. Resolve deixar a porta aberta. Caminha na direção do contêiner. Devagar. Chave de roda em punho.

"Espera”

Volta ao carro e recolhe as chaves da ignição. Retoma a aproximação lenta. Devagar. Sua respiração agora provoca nuvens de vapor. Está com frio. Está tremendo. Chega mais perto. Mais perto.

- Aaaaah! – Susan salta sobre a sombra. Grita e golpeia. Não há nada. Não acerta em nada. Apenas jornais enrolados.

"Meu Deus do céu!”

Ofega. Apoia as mãos nos joelhos.

“Se acalme Susan, se acalme!”

- Ei! – Alguém grita. Susan prende a respiração.
Seu coração acelera novamente. Levanta a cabeça. Olha para o carro. Há alguém sentado no banco do motorista! Está parado. Mãos apoiadas ao volante. Susan sente suas penas fraquejarem.

“Vou desmaiar...”

Apóia-se no contêiner. Seus olhos estão fixos na figura que a encara de dentro do carro. Está sorrindo.

“O desgraçado está sorrindo!”

Susan se recupera. Agarra a chave de roda com força e caminha na direção do carro.

“Desgraçado, desgraçado...”

- Desgraçado! – Susan corre. – Eu te mato! Eu te mato!

Agarra a maçaneta da porta e puxa com força. Se prepara para atacar com a chave de roda. Grita, em fúria. O golpe estaca a meio caminho. Um gato. Há um gato sobre o painel do carro. Apenas um gato.

“Um gato! Meu Deus, um gato?!”

Susan se apóia com a mão esquerda na porta aberta. Respira fundo. Está suada. Sua blusa gruda nas costas. Ela olha para o gato, que a encara, imóvel sobre o painel.

- Saia! Sai daí seu puto! – Susan ameaça o gato com a chave de roda. Ele pula sobre o banco do motorista e alcança o chão, fora do carro. Corre e desaparece na escuridão. Susan entra no carro e bate a porta. Abaixa os pinos da tranca. Apoia a cabeça no volante.

“Meu Deus, estou enlouquecendo.”

Há algo sobre o painel, onde o gato estava. Susan olha o objeto.

“Mas o que...”

Uma adaga. Susan toca, lentamente, a adaga. Não acredita que seja real. É real. Segura o cabo. Manuseia, incrédula.

- Ei! – Alguém grita na escuridão.

Susan sai do transe. Olha através do para-brisa. Há uma figura em pé na frente do carro. Susan pode ver apenas a silhueta do estranho.

- Ei! Ei! – A silhueta repete o chamado. Uma
sombra se mexe atrás do contêiner. Outra silhueta aparece!

- Ei! Ei! Ei! - os chamados se multiplicam.

Estão gritando. Dentro e fora de sua cabeça. Susan fecha os olhos.

“Por favor, parem!!”

Leva as mãos aos ouvidos. Pressiona os lados da cabeça.

- Parem!

Silêncio. Susan abre os olhos. Não há ninguém. As silhuetas sumiram. Ela chora. Segura o cabo da adaga. A aperta. Sente os nós dos dedos doerem. Chora.

“Por favor meu Deus, me ajude...”.

Soluça. Encosta-se no banco, ainda segurando a adaga. Relaxa o pescoço. Sua cabeça cai para trás. Susan fecha os olhos. Sente o coração batendo forte. Pode ouvi-lo. Tum...tum...tum...
Há vozes em sua cabeça:

“ei...ei...ei”

De repente, o vento forte sacode o carro. Susan abre os olhos. Olha de um lado para o outro. Olha para o contêiner. Vê o rolo de jornal sendo carregado pelo vento forte. Aperta a mão fechada sobre a adaga. Um sussurro sopra em seu ouvido:

- Eeeeei...

“Estão aqui dentro!”.

Susan grita. Segurando a adaga, eleva o braço ao lado esquerdo do pescoço e abre a própria garganta, puxando a adaga de um lado a outro.


Biografia:
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