O ventilador de teto rodava vagaroso. Todos os funcionários do escritório de contabilidade permaneciam em seus gabinetes. Uns trabalhando, outros tirando um cochilo. Apenas Suely Aparecida, suada e com a cabeça erguida, observava o movimento do ventilador. Não que o observasse precisamente, seu olhar parecia mais contemplativo que especulativo. A corda ela já havia arranjado: estava na gaveta. Nunca pensou por que faria isso ali, onde seus colegas de trabalho pudessem ver tudo. Não se tratava de um protesto, pois não demonstrava um traço sequer de revolta: nem nas expressões faciais, nem nas conversas atravessadas.
Pelo contrário, Cida se sentia resignada, tanto faz, tanto fez, não fazia diferença. Casa, televisão, escritório, piadinhas sem graça dos amigos, igreja aos domingos, um pedaço de bolo de fubá e dois dedinhos de café na varanda da irmã e, novamente, casa. O itinerário era o mesmo, sempre o mesmo. Para Cida e para quem a conhecesse, é como se ela fizesse parte desses ambientes todos. Caso não estivesse presente, o lugar pareceria, de alguma maneira, estranho, tal como uma mesinha de canto no canto da sala.
Não era, porém, a hora ainda. Sentia-se gorda: o ventilador de teto não aguentaria seu peso e, é claro, transformar tragédia em comédia não seria seu último desejo. Dieta, então, que, toda vida tortura, agora era exercício fácil. Foram-se aqueles quilos. A irmã reparou, os amigos repararam, o rapaz da igreja, que sentava no outro banco, reparou. Dois dias antes do grande dia, a vizinha disse como estava mais bonita, “distinta” foi a palavra usada. Cida sorriu com alguma curiosidade. O velho da banquinha: “Tá bonita, dona Cida”. Ela ergueu a mão em cumprimento.
Na segunda-feira, o grande dia, Suely Aparecida, contabilista, pediu as contas.
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