Quando se caminha por aquela rua estreita, feita de terra batida, em horário crepuscular, esse momento do dia em que não se sabe se é dia ou se é noite, apenas se veem os vultos e se escutam os sons do que talvez seja uma bicicleta apressada ou um menino arrastando os chinelos que, pequeninos, levantam a poeira fina às narinas dos que passam. No meio da luminosidade azul e sufocante, que abraça todas as formas e que se expande a quaisquer olhares e sentidos presentes, o único ponto claro se encontra atrás do cercadinho de madeira, dentro do barraco em que um homem preto assiste à brilhante televisão.
Esse senhor, que parece preto no breu que se faz, embora não seja gordo, é pesado e ocupa três assentos que ficam no canto do velho sofá esqueletiforme. O controle remoto jamais sai debaixo de sua mão direita, que se estende sobre o braço do móvel. Não é certo que ele realmente esteja vendo a programação transmitida, pois seu pensamento, ao que indica sua compenetração, está bem longe ou muito próximo, no profundo de sua alma. Dizem alguns parentes seus que ele é só infelicidade; outros, que é pura indiferença. Há, ainda, os que defendem haver, em seu coração, grande compaixão que lhe cause angústia estagnante. Mas simplesmente não se pode entender aquele, ou o que ocorre na mente daquele, que jamais estabelece contato com quem quer que seja. Não é possível definir coisa alguma sobre quem somente se ouvem cogitações e suspeições.
Em véspera de Natal ou de ano-novo, seus familiares e seus vizinhos se reúnem todos em torno do grande sofá, e do gigante preto não se consegue expressão que seja interpretável. Há expressões? Palavras, também, nenhumas. A cada tentativa de toque e de aproximação dos que festejam, uma queda ao chão sujo. Alguém se levanta e tenta, de novo, tocá-lo e outrem chora; depois volta a querê-lo. No ano-novo ou no Natal daquela estreita e poeirenta rua, o silêncio, o desentendido e o misterioso permanecem.
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