Eu vi um homem deitado numa calçada
Com os olhos fechados.
Parecia dormir.
Sonhava, como todos nós sonhamos,
Talvez com dias melhores,
Talvez com um pouco de sorte.
Provavelmente ali passara a noite
Acompanhado pelas vigilantes luzes dos postes
E por bêbados vadios,
Poderia ser até mais um deles.
Apenas mais um bêbado que o mundo esqueceu.
As marcas no rosto fatigado daquele homem
E os sulcos profundos na pele grossa
Denunciavam histórias ocultas de uma vida:
Derrotas, vitórias, segredos eternos,
Quem sabe, filhos, irmãos, uma mulher amada ou um grande amor Perdido na estrada.
Mas ali, naquela calçada, não havia ninguém, nem ele.
Eu vi um homem deitado numa calçada,
Já não era homem, era um farrapo,
Era de plástico,
Papel rasgado,
Era de lixo, um flagelo dentro da sociedade
E ao mesmo tempo fora dela.
Talvez vencido pela modernidade,
Pelo mundo atual,
Pela vida hodierna ou pela própria agonia intrínseca.
Eu vi um homem deitado numa calçada.
E vi também quando ele se levantou,
Arranjou seus poucos pertences na sacola surrada
E cambaleou sozinho pela rua solitária
À procura de outra chance.
E, por um instante, pude me lembrar de Carlitos.
São tantos os encantos.
Tantos desencantos.
São tantos os Carlitos.
Meu Deus!
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