Li nesse fim de semana um jornal com a matéria sobre família em crise: “Seu juiz, o que faço com meu filho?”. Tive uma crise de riso, pois pode haver a essa hora juízes fazendo a mesma pergunta às suas diaristas: Dona Diarista, o que faço com meu filho? Há diaristas e domésticas que guardam grandes segredos... Até a Praça XV. Quando chega sexta-feira e vem aquele dilúvio de domésticas e diaristas da Zona Sul, da Barra e inunda a Praça XV... Ah, quantas notícias enquanto os ônibus não chegam... Quantas crônicas domésticas... Também, quem manda o ônibus demorar! Mas vejam: crônica não é fofoca, é literatura. Na Praça XV se faz literatura. Literatura oral. “Oralitura”.
Na capa do jornal dizia a chamada: “Pais apelam a juízes para controlar filhos”. Não sei se sairia na capa do jornal uma chamada de juízes apelando às suas diaristas... Sei que geral é a crise, mas vejo nisso o positivo retorno da solidariedade. O juiz ajuda a cuidar do filho da diarista e a diarista do filho do juiz. Lidar com a crise do outro parece mais fácil. Mas não é só da crise familiar que venho falar hoje. Esse mês de janeiro tivemos inundações de água e de crise. Essa é a crônica das crises.
Nesse início do mês acordei pela manhã ouvindo a notícia do roubo de 5 aves de diferentes espécies no zoológico. E comigo deduzi: é a crise. A crise provoca mudanças. Só três papagaios, presumindo-se que estavam sendo bem tratados no Zoo, deu para fazer uma boa compra ou pagar a mensalidade universitária. Não sei se cada papagaio ainda está por 120 na feira nem se as faculdades não subiram de preço.
Depois ouvi, quebraram dois dentes do compositor Guinga num aeroporto da Espanha. E de novo pensei: pode ser a crise. Mas então repensei que a crise já está instalada nos aeroportos da Espanha há muito tempo. Há quanto tempo brasileiros vêm sofrendo naqueles aeroportos?
Levantei e encontrei a Crise sentada no meu fogão. Nem café tinha para beber. Sou um desempregado. A Crise riu e disse: bebe água! Olhei, olhei... Disseram-me que a Crise seria marolinha, dessas modelos, inclusive com problemas de anorexia, mas quando a vi sobre o meu fogão, pernas grossas, peitões, glúteos volumosos e até as maçãs do rosto muito salientes me assustei e indaguei se não seria a Dona Prosperidade. Não, não! Eu sou a Crise. E mostrou a certidão de nascimento. Na verdade seu nome é Crisis e se pronuncia Kraisis. A boneca é norte-americana. Boneca.
Saí para comprar o jornal e um homem ao microfone fazia o seu pregão: “Leve por apenas 3 reais a miraculosa pomada de peixe elétrico! Cura luxação, entorse, pé destroncado, espinhela caída, espinhela caída pelo marido... Muito mais eficaz do que a Lei Maria da Penha. É passar a pomada de peixe elétrico e amanhã você estará novinha em folha para outra espinhela caída...”. A mulher queria ir à delegacia denunciar o marido, mas a crise... Tinha os R$4,40 da passagem... A pomada era R$3,00. E pensou, pensou... Vou levar a pomada. Sobrava R$1,40, já dava para o pãozinho que ainda não aumentou o preço, não diminuiu de peso, mas sejamos sincero: esfarela-se como biscoito de vento... A crise provoca mudanças.
E um camelô gritava ao meu lado. Na crise ele grita mais. Grita tanto que chama a atenção da polícia, dependendo do pregão que faz:
“Roubado é mais gostoso! 4 chocolates por apenas 1 real. Roubado é mais gostoso, ó!”
Mas em aparecendo a polícia, gera uma crise e o camelô se vê forçado a mudar de discurso:
“Olha aí, ó! 4 chocolates por apenas 1 real! Parece até roubado!”
Como a crise provoca mudanças. Só o que não muda há mais de 120 anos nesse país e muitos outros, quando há crise, é a velha fórmula capitalista gananciosa para os pobres empregados. Quando há crise eles só falam em demitir ou reduzir salários. Há mais de 120 anos somos sempre nós que carregamos a Pirâmide. Até quando esse hilotismo... Se nos juntássemos... Os 100 mil do Maracanã, os 100 mil do Carnaval, os 100 mil do oba-oba, ah se fôssemos como as domésticas e diaristas na sexta-feira na Praça XV! Seríamos um dilúvio.
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