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A POLÍTICA DA GARÇA
Lasana Lukata

Todo mundo já deve ter visto alguma vez na vida uma garça na enciclopédia, desculpe, não somos muito dados á leitura, mas num documentário de TV, num filme, na praia, à beira mar, num barco, na cabeça de um boi... Dependendo da qualidade. Qualquer dia desse, não se espante, veremos garças pousadas nas cadeiras do Congresso, Assembléias, Câmaras, etc.
Mas no ano 2000 o mundo não acabou, ainda estamos acabando com ele, estamos atrasados, no entanto, apareceu uma garça por aqui e com sua feia voz chamava outras garças para habitarem no rio Meriti, que foi a minha primeira televisão em cores com seus peixinhos vermelhos, amarelos, dourados... Peixes que vinham acompanhando os barcos da Baia de Guanabara. Isso mesmo: o rio Meriti já foi navegável.
Hoje as garças passam de cem num Meriti estreitado, de águas turvas, lama e tome agressividade que já é o natural delas. A garça é branquinha, mas não se engane, é urubu disfarçado. Até rato entra no seu cardápio. Os Ratos que se cuidem. No rio Meriti não existe mais nenhum. Eu disse no rio!
Quando não estão em combate, as garças ficam vadeando lentamente ou paradas, Observando. Ora erguendo a perna esquerda, ora a direita. Se você também não sabe as garças têm a mania de ficar alternando as pernas na água. Dizem os garceólogos que elas sentem frio, por isso alternam as pernas na água, mas sendo friorentas deveriam ficar com os dois pés fora d’água, não é verdade?! Ah, as garças são aves de vôos pesados! Parecem bêbados de canelas finas que dizem vão ter saúde porque deixaram de beber, mas a outra perna continua fincada no cigarro...
As garças são boas observadoras e de repente desferem certeiras bicadas na água e vem o alimento, já o eleitor brasileiro não é tão bom observador como a garça, vejam:
O domingo amanheceu fresco, comprei pães frescos e fui ler notícias frescas como esta do Estado de São Paulo: “Eleitor destaca Bolsa-Família, mas critica corrupção no governo Lula”. A reportagem ainda dizia que “o governo Lula fez três coisas boas - o programa Bolsa-Família, a estabilidade econômica e a ajuda aos pobres; e três coisas ruins - a corrupção, o apagão aéreo e a pouca atenção à saúde”.
Por ser crônica, não vamos questionar a paternidade das coisas, fiquemos apenas com uma coisa boa e outra ruim: o Bolsa-Família e a Saúde, supondo serem as pernas de uma garça chamada Brasil; suponhamos também que as garças sentem frio mesmo. Não esqueçam que as garças têm a mania de ficar alternando as pernas na água.
Todos sabemos que noventa por cento do Bolsa-Família sai da CPMF, criado exclusivamente para a saúde. Sabemos que por esses dias a mídia veiculou ameaças de o governo acabar com o Bolsa-Família caso não seja aprovada CPMF.
Ora, veja! Se o eleitor reconhece coisa boa o Bolsa-Família e coisa ruim a pouca atenção à Saúde é porque a garça está com uma perna erguida, mas a outra está fincada na água turva, na lama, sentindo frio, no caso, a perna da saúde. O Bolsa-Família só é bom porque a saúde está ruim porque se a saúde ficar boa quem fica ruim é o Bolsa-Família. Não adianta descobrir um santo para cobrir outro. Se noventa por cento for de fato aplicado na perna da saúde, ela se erguerá e quem sentirá frio será a perna do Bolsa-Família, repise-se. Aliás, se acabarem com o Bolsa-Família teremos uma Garça perneta e um partido perneta... Eu nunca vi uma garça perneta ou com perna de pau! Já vi sim, partido com cara-de-pau.
Como a garça, o Brasil é uma ave de vôo pesado. E assim vamos sobrevivendo dessa política. É a política da garça: Uma das duas pernas tem que sentir frio. É triste, mas alguém tem que sentir frio nesse país e é sempre a saúde, os aposentados, a educação... Enquanto as belas pernas da corrupção... Não estraguemos o domingo, a segunda, a terça... E a primavera que se aproxima.


Biografia:
Lasana Lukata é poeta, escritor por usucapião, São João do Meriti, RJ.
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