Dizem que a fotografia reproduz o real da forma mais exata possível; possível porque entre a lente e a forma há um rabo de palha... E com rabo de palha é preciso ter cuidado, porque já dizia um pastor em Vila Tiradentes: quem tem rabo de palha cuidado comigo porque eu piso, risco um fósforo e toco fogo!
Machado de Assis viu com bons olhos a chegada da gravura aos jornais em 26 de maio de 1895. Reconheceu que as palavras não davam conta de tudo, bem ao contrário da idéia absoluta de hoje que diz: imagem é tudo. Absoluta?
Entanto, em 13 de janeiro de 1901, Olavo Bilac, substituindo Machado cronista, não viu com bons olhos essa chegada, porque chegaram demais, e desenhistas, caricaturistas, ilustradores já estavam tomando os espaços dos jornais. Ninguém estava ligando para a leitura. Eram gravuras e gravuras, fotografias e meia dúzia de palavras. Pobres cronistas! Essa ameaça estava presente no seu tempo, mas hoje há espaço para gregos, troianos, espartanos, tebanos, persas, todos.
O que me chamou a atenção na crônica de Bilac. A perplexidade veio dessa fala: “as palavras são traidoras e a fotografia é fiel. A pena nem sempre é ajudada pela inteligência; ao passo que a máquina fotográfica funciona sempre sob a égide da soberana verdade...”. Não é verdade. Rabo de palha. Querem ver?
Pisemos no rabo de palha. Risquemos um fósforo... O rabo de palha da fotografia chama-se homem. Bilac viu mal. A soberania da fotografia, como a soberania de muitos países, é de palha. As palavras não são traidoras. A fotografia é fiel se o fotógrafo é fiel. As palavras são traidoras se o homem é traidor. O fotoshop não é o melhor, mas pode ser o melhor anti-ruga do planeta, depende do Web Designer. Dependendo do traidor, uma imagem pode dizer mais ou menos. Se o traidor é amigo, tira rugas, se inimigo, mesmo não as tendo, põe.
A fotografia não é fiel, pois das poucas vezes em que advoguei de um caso não me esqueço: Uma mulher teve seu imóvel deformado por um vizinho e o convidamos a ir ao juiz reparar os danos.
No dia da audiência não pude estar presente. Um amigo me substituiu. Ao chegar de viagem encontrei a mulher triste. Disse que quase saiu presa da mesa do juiz. As fotos, Dr. Lukata! Advogado não é doutor. De fato as fotos no processo tinham arte. Obra prima. Verdade. Imagem é tudo. Tanto que convenceram ao juiz. A sentença sairia em breve, mas o barulho da carruagem era favorável ao adversário. As fotos tiradas à noite, de uma espécie de oitava à esquerda, oblíquas, de ladinho, eliminavam os sinais de ataque ao imóvel. Gostei. Agora eram Palavras versus Fotografias.
Achei o oficial de justiça Joel que se compadeceu da mulher, foi até o local, constatando os rabinhos de palha da fotografia, havia danos e lavrou aquela certidão, finalizada com o tradicional: O referido é verdade e dou fé. As palavras ganharam das fotografias nas 1ª e 2ª instâncias.
Outro rabo de palha pode ser visto na página VII do livro Antologia II, 2004, da ALAM (Academia de Letras e Artes de São João de Meriti), onde o professor de história, Gênesis Torres, aparece numa fotomontagem ao lado dos fundadores da academia, Professor Moysés Henrique dos Santos e Maria das Graças G. Neves.
Na foto original Gênesis Torres não aparece. Só depois do adultério é que surge o imponente professor Gênesis ao lado dos fundadores, ferindo a história da Academia de Letras. Penso que um livro de uma Academia de Letras é um documento, mas pelo lado da poesia, agora Gênesis Torres, além de ser professor de história, é poeta da fotografia. Seja bem-vindo: A Arte é o mundo dos adúlteros.
Por ser crônica, não dá para colocar aqui as fotos, original e adulterada, mas creio, bastam palavras para dizer:
Ora, Bilac! Perdeste o senso? Perdão do trocadilho, mas contra fotos há argumentos
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