Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
O VÍRUS
21 DE MARÇO 2020
Juarez Fragata

Se o medo da contaminação não estivesse no ar – o sábado assemelhar-se-ia a quietude de um feriado importante. Não é de agora que os dias demonstram um ar diferente, muito além de uma atmosfera de domingo ou então de um feriado quaisquer. Encontram-se, poucas pessoas nas calçadas, e nas ruas o vaivém de veículos segue um rodízio reduzido, deixando um tempo espaçado entre um e outro. O sistema, antes quantitativo está operando no nível diminutivo, por isso uma fila de supermercado chama a atenção. Todo cuidado é pouco. Não se pode ignorar o risco de contaminação. Só é liberada a entrada de duas, três pessoas, depois que a mesma quantia deixa o estabelecimento. A corrida desenfreada as prateleiras fora desencadeada depois que os meios de comunicações notificaram – os primeiros casos de micro-organismo deletério originário da Ásia.
As notícias que chegavam da Itália, por meio dos telejornais, jornais impressos e radiofônicos causavam perplexidade. O agente nocivo já tinha matado uma grande leva de pessoas em idade avançada, principalmente na região da Lombardia, onde segundo dados havia mais pessoas idosas, sendo que para esse grupo – no qual também se incluía aqueles que não eram senis, mas que tinham imunidade baixa, o vírus havia se mostrado mortífero como a picada de uma serpente venenosa.
O foco das atenções era o surto italiano, ficando em segundo plano os casos registrados em outros países, uma vez que não eram em larga escala, e o pouco não dá audiência, nem tão pouco gera comoção.
Estávamos assistindo de camarote à calamidade italiana, ignorando a possibilidade de que o vírus atravessasse as nossas fronteiros, mas o agente maléfico havia chegado com elegância, não em porões de navios cargueiros, mas sim em voos de primeira classe.
Parte da população já estava – a beira de um estado de pânico, esperando a chegada do pior a qualquer momento. Diante de uma situação atípica as autoridades agiram por conta própria, ignorando a autoridade do presidente da República. As medidas foram cabíveis para uns, e não cabíveis a um grupo minoritário, no qual figurava o maioral da nação. Será que a voz da maioria é a voz de Deus?
Isso só o tempo dirá!
Enquanto muitas pessoas idosas ficam resguardadas em seus lares, temendo – o pior, outras, por imprudência ou necessidade ignoram as recomendações das autoridades, e saem às ruas.
Percebe-se um clima um tanto tenso, e a minha sensação é de que a qualquer momento ocorrerá – um bombardeio fulminante.
O sol se põe no seu devido tempo. A escuridão liquefaz-se com o clima prolixo, contudo, minha audição e visão parecem mais aguçadas. Talvez, por isso, a pomba sentada sobre o canto do portão de entrada e saída de veículos não escapara do meu olhar. A distância parecia um casal, mas à medida que fui me aproximando percebi que era apenas uma. A falsa impressão fora causada por uma de suas asas.
Uma pomba longe do bando, sentada num lugar um tanto inusitado? Certamente deve estar doente ou ferida!? A asa machucada, estendida para baixo, causava a impressão de ser um casal, contudo, a proximidade dissipava a ilusão de ótica. Não sei se foi compaixão ou sentimentalismo. Peguei-a, com zelo, e coloquei-a, num lugar que julguei ser seguro, sem risco da pobre pomba ser devorada por um dos bichanos. Senti algo úmido tocar a pele. Ao olhar percebi que minha camisa estava suja de fezes. Essa foi à paga que recebi por ter lhe ajudado. Saí às pressas com o intuito de remover aquela sujeira com água, e dei de cara com a senhora dos gatos do Bloco D1.
“Será que a mesma não está com medo?”, perguntei-me um tanto surpreso, com seu ar despreocupo.
Sua alta estatura, cabelo curto e grisalho, como estandarte daqueles que assumem a velhice de bom grato, para uns e outros deve ser o foco das atenções, no entanto, para mim a cena marcante é vê-la abraçada a um pote cheio de ração de um lado, e a uma garrafa pet com água gelada do outro. Os gatescos rodeiam-na, ansiosos pelo quinhão noturno. Depois de algumas palavras segui apressado. Meu objetivo era limpar a camisa, porém meu esforço fora em vão. Mesmo a contragosto fui obrigado a trocá-la, uma vez que a situação se inseria no nível irremediável. Sim. Aquela pomba tinha me dado um presente de grego.
Antes mesmo de reencontrar a senhora dos gatos do D1, avistei a pomba sentada no telhado do portão de pedestres. Não fiquei preocupado, pois agora, ela tinha feito uso do bom senso, e havia escolhido um lugar seguro.
Como sempre a conversa girou em torno dos felinos que, tinham feito dos recantos do pátio do condomínio morada, e do pátio área de laser. Um deles havia deixado o conforto de um lar, onde tinha o privilégio de dormir numa cama fofa, extremamente confortável, para viver sem senhoril, e sem a segurança de um domicílio fixo.
Logo depois que, a senhora dos gatos retirou-se, ouvi:
– O vizinho!
Olhei ao derredor e não vi ninguém.
– Aqui em cima, vizinho!
Era a nova moradora do segundo andar do Bloco C1.
– Tu tens álcool?
– Não! – respondi secamente.
Na verdade eu tinha um pouquinho num potinho miniatura. Como pensei que a mesma iria me pedir respondi que não tinha.
– Vem aqui embaixo que vou jogar pela janela um potinho que eu trouxe do hospital. Quando terminar me avise que te dou mais!
“Das duas uma: a nova moradora é técnica em enfermagem ou enfermeira!”, pensei.
Num tempo em que é quase uma obsessão lavar as mãos com água e sabão, ou então passar álcool gel, com o intuito de proteger-se do temido vírus chinês, um pouco mais de álcool é sempre bem vindo.
Havia escrito umas poucas frases quando uma de minhas irmãs entrara em contato. Sua queixa era de que o nosso irmão que mora numa cidade do interior não lhe contatava, nem mesmo via redes sociais. Minha resposta fora que isso era em decorrência de seu trabalho. Ser dono de estúdio e operar todo o sistema de gravações tinha essas implicações. Minha sugestão foi: quando o mesmo estiver conectado a uma rede social procura-o.
Voltei à escrita, mas não consegui ir além de poucas palavras, uma vez que fui interrompido pela vovozinha do térreo.
Como já está em idade avançada, e tem a saúde bastante debilitada, me prontifiquei a levar o seu lixo ao local destinado a recebê-lo, sempre que precisasse, e agora a mesma estava uma vez mais me pedindo para fazer-lhe esse favor. Distrações não são compatíveis com a criatividade, por isso estacada por teima, num lapso de tempo ela me abandonou.









Biografia:
Evangelista e músico! Livros publicados mediante demanda:Mecânica Quântica e a Bíblia, As Pedras Grandes e Benai Elohim e Nephilim
Número de vezes que este texto foi lido: 59433


Outros títulos do mesmo autor

Artigos NÃO NOS CONDUZA A TENTAÇÃO Juarez Fragata
Artigos SE O MUNDO VOS ODEIA, SAIBA QUE PRIMEIRO ODIOU A MIM Juarez Fragata
Artigos PALAVRAS DITAS AOS SEU TEMPO Juarez Fragata
Artigos MORTE E VIDA NO PODER DA LÍNGUA Juarez Fragata
Artigos NO INÍCIO ERA O VERBO, E O VERBO ESTAVA COM DEUS Juarez Fragata
Artigos MUITAS SÃO AS AFLIÇÕES DO JUSTO Juarez Fragata
Artigos QUEM FOI A MULHER DE CAIM? Juarez Fragata
Artigos LILITH, A PRIMEIRA ESPOSA DE ADÃO Juarez Fragata
Artigos A ORIGEM DAS SOCIEDADES SECRETAS Juarez Fragata
Artigos SE QUISERDES, E OBEDECERDES, COMEREIS O MELHOR DESTA TERRA Juarez Fragata

Páginas: Próxima Última

Publicações de número 1 até 10 de um total de 73.


escrita@komedi.com.br © 2024
 
  Textos mais lidos
RECORDE ESTAS PALAVRAS... - MARCO AURÉLIO BICALHO DE ABREU CHAGAS 62441 Visitas
Fragmento-me - Condorcet Aranha 61895 Visitas
PRA LÁ DE CAIPIRA - Orlando Batista dos Santos 61666 Visitas
RODOVIA RÉGIS BITTENCOURT - BR 116 - Arnaldo Agria Huss 61574 Visitas
LIBERDADE! - MARIA APARECIDA RUFINO 61538 Visitas
Humanizar o ser humano - jecer de souza brito 61027 Visitas
ARPOS - Abacre Restaurant Point of Sale 5 - Juliano 60396 Visitas
Mulheres - Ana Maria de Souza Mello 60355 Visitas
"Fluxus" em espanhol - CRISTIANE GRANDO 60284 Visitas
É TEMPO DE NATAL! - Saulo Piva Romero 60220 Visitas

Páginas: Próxima Última