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Aquele Carro em Chamas: o espetáculo
Manoel Rodrigues de Abreu Matos


Uma cena que presenciei ontem, fez-me pensar sobre nossa capacidade de ajudar ao nosso semelhante nos momentos mais temerosos. Aquela corriqueira frase “conte comigo”, pronunciada com tanta facilidade e constância, desvanece-se pontualmente no momento para o qual ela foi necessariamente criada. Somos todos nós dissimulados então? Não, creio fielmente que os bons feitores existem os milhões distribuídos pela imensidão do mundo, mantendo vivos os bravos atos de caridade outrora realizados por Irmã Dulce e pessoas afins.
O usual “conte comigo”, ontem não se dispões a se fazer presente nos lábios dos transeuntes que se aglomeravam para assistir ao espetáculo que se realizava, ansiando para que acontecesse da pior forma possível. Os Fleches dos vagalumes eletrônicos velozmente guiados pelas mãos dos espectadores cuidavam em dá àquela cena, proporções universais. Em pouco tempo, como a rapidez da luz, os compartilhamentos propagavam a tristeza e a preocupação de um homem solitário que se via em pleno deserto, envolto a várias estátuas preocupadas em assistir à cena através das telinhas.
Era um sábado à noite, 22 horas talvez, rua silênciosa, momento em que um carro trafegava conduzindo uma família para o repouso do lar. Os ocupantes eram três crianças e dois adultos, uma família por certo. Era a última vez que eu veria aquele carro cumprindo a missão relevante a que fora submetido sem nada dizer ou recusar. O carro sumiu nas curvas das ruas e eu continuei, em silêncio, contemplando a beleza encantadora daquela família reunida se encaminhado para casa vindo da igreja ou de uma festinha qualquer, era sábado, final de semana. Dizem alguns pensadores que a felicidade não pode durar para sempre, ao que prefiro me ausentar de qualquer opinião por não ter ainda uma ideia formulada acerca dessa questão demasiadamente profunda.
A família não conseguiu chegar ao destino ou o carro não cumpriu a missão tão honradamente executada outrora. Após uma pane, provavelmente no sistema elétrico, o andante de quatro rodas pegou fogo e foi consumido em minutos por uma língua feroz e indomável que o acariciava ardidamente. Não há motivo para choque caro leitor, os ocupantes saíram ilesos, não esperaram para serem acariciados. Não resistir, fui verificar o que teria acontecido e encontrei já dezenas de curiosos apenas observando e registrando o fim trágico do pobre carro que nada fez de maldoso para merecer tal fim. O motorista circulava desoladamente em torno do veículo que jazia em chamas, em total desespero, não sabia o que fazer e notadamente não havia se lembrado do extintor de incêndio.
A multidão que se aglomerava assistia à cena, faltando-lhes apenas um refrigerante e umas pipocas para melhor desfrutar da infelicidade alheia, coisa típica do ser humano. Aproximei-me do grupo e indaguei sobre a possibilidade de pegar rapidamente um extintor de incêndio em um hospital, próximo uns duzentos metros. As respostas me intrigaram e me levaram a traçar os argumentos lindos acima. Informaram-me que ninguém havia pensando em tal possibilidade por estarem todos em estado de choque. Os carros que se aproximavam, os que paravam, vale dizer, não tinham extintores ou estavam quebrados, era o que afirmavam os proprietários. Finalmente, chamado por mim, um segurança do hospital chegou com um extintor enorme. Foi inútil, a ingratidão e a falta de amor ao próximo selaram o destino daquele que outrora conduzia alegremente uma família e ainda garantia-lhe o sustento do dia a dia. Voltei para casa, já disparava em meu celular, as fotos e vídeos daquela cena triste que acabara de presenciar. De fato, os flashes substituíram o “Conte comigo”, mesmo aqueles ditos apenas para consolo ou para engrandecimento. Seja como for, ainda prefiro ouvir o “Conte comigo” ou “posso ajudar?” é mais sensato.


Biografia:
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