Lembro o ditado popular que diz “... de louco, todos temos um pouco”, porque realidade é sonho, na ilusão dos afazeres e desfazeres onde a noite é longa e o dia é curto. O Sol nasce todos os dias, mesmo encoberto; o mar transborda areias e o vento traz os vírus. As cores refletem o azul no uniforme escolar; o vermelho no sangue; o verde na grama e o branco é o invisível como livro sem leitor.
Como fugir desse emaranhado em que a vida se dá no desencontro, quando a mentira é revelada como verdade, a maldade impera na bondade, o doce se torna amargo e o pensamento é segredo e mistério? O desafio é ser tresloucado e se sintonizar num mundo em movimento. Para Inês Vieira, “Querida, és tudo o que eu preciso, / Pra me sentir feliz num Paraíso.../ Ou será que eu perdi o juízo?”.
Por minutos, paro a correria do dia e repenso a vida, para que eu possa alcançar o projeto de SER, e não de TER; como retrata Olavo Bilac, “Tresloucado Amigo”.
Em alguns dias, olho o mar e penso que o melhor ainda está por vir. Nas palavras de Marina Du Bois, “A vida, é mesmo um mar que nos leva. Vai e vem, vem e vai. Num momento estamos seguros de tudo, de que aquela é a direção certa. Mas, de repente, uma corrente não esperada tira-nos daquele rumo, que pensávamos ser nosso, e leva-nos para outro, que adotamos como nosso, até a próxima guinada. //... Ondas que se contradizem buscando o equilíbrio, ou quem sabe um desequilíbrio”.
Por meses, sou surpreendida pensando no meu livro. Uso o meu poder e a atitude de não me preocupar com a opinião dos outros, de não me abalar em questões referentes à minha linguagem e à visão “distorcida” do mundo, como em Oscar Wilde, “Tornar-se espectador da sua própria / vida é, para o homem, escapar aos / sofrimentos da vida”.
Em anos, vivo minha batalha interior: um lado quer se libertar e o outro quer entender ser a poesia comércio de ilusões. Ela é dona das páginas da minha vida, como rascunhos que surgem no meu pensamento. Tenho cuidado para não me deixar levar pelo medo; reúno coragem e rompo padrões literários, que não fazem mais sentido ao tresloucado. Desafio a memória e a imaginação para reescrever a minha história. Ponho em palavras o que de mais doído existe em minha alma e explico o mundo com novas imagens.
Sou capaz de dar conta do tempo como centro das preocupações. Tresloucada, penso que o tempo passa rápido e é impossível encontrar mais tempo para realizar as atividades, que fazem com que eu me sinta bem ao pensar sobre as questões da vida; o pensamento reflete exatamente quem sou. Pedro Du Bois demonstra, “Tresloucados // Ser do ângulo o vértice deslocado / tresloucado olhar / sobre a inverdade. // prisões suaves / com que os anos / transformam a vida / em quase nada // ser do vértice / o vórtice apropriado / tresloucado olhar / dos sentimentos // razões impávidas / com que os compromissos / perseguem a vida / em retirada”.
Chegado o momento do reconhecimento, da novidade com que o olhar harmoniza o pensamento com as ideias e a esperança, procuro entender que a vida segue a nova paisagem se eu deixar a emoção no comando, como em Marina Du Bois, “... E o coração? / Acelerado / Passo a passo / Num novo compasso / Não é paixão / Não é sentimento louco nem tresloucado / É bom...”.
Mesmo assim, fico com a impressão de que o mundo estará contra mim se eu não tentar dar conta dos sentidos e resolver uma questão de cada vez; minha força interior atende ao chamado da alma e meus sonhos são revelados e reveladores, assim, no “Conto Tresloucado”, de Mario Quintana e, em seu poema, “Essas duas tresloucadas, a Saudades e a Esperança, vivem na casa do presente, quando deviam estar – seria lógico – uma casa do Passado e a outra na casa do Futuro. – Mas e o presente seu moço? – Ah! esse nunca está em casa”.
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