Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
Pecado – Muito Mais do Que Simplesmente Errar
Silvio Dutra


Sumário

O Que É o Pecado Original?

Por Natureza e Não Por Hábito ou Costume

Xô Justiça Própria!

O Pecado

O Pecado e o Evangelho

Pecado, Justiça, Juízo

A Vitória da Fé Sobre o Mundo

Doença e Pecado

Como Deus Julga o Pecado

Levando o Pecado a Sério

Afinal por que não entraram na arca com Noé?
Sobre o Pecado nos Crentes


O Que É o Pecado Original?

Abandonando todas as definições teológicas sofisticadas e detalhadas sobre o assunto, e considerando esta verdade do ponto de vista da simplicidade do fato havido no princípio da criação, daí o nome original – de origem, podemos afirmar com toda segurança que o pecado original consistiu no governo usurpador do espírito do homem, pela sua alma, por causa do abandono do governo do Espírito de Deus.
Esta condição ruim, deste governo despótico da alma, em usurpação ao governo que Deus havia dado ao espírito do homem, passou a existir porque o espírito morreu, ou seja, no ato da desobediência, cessou automaticamente toda a comunhão espiritual que ele mantinha com Deus.
A vida do nosso espírito depende inteiramente que ela seja insuflada pelo Espírito de Deus.
Cessada a comunhão com Ele, o nosso espírito morre, fica separado da vida de Deus, e com isto nos tornamos fracos (Rom 5.6), incapacitados para exercermos governo, por meio do nosso espírito, sobre a nossa alma (sentimentos, emoções, vontade, razão).
Pecado é portanto, basicamente isto.
Tudo o mais (pensamentos, atos, omissões errados) é mera consequência desta grande realidade que a tudo dá causa.
É somente em Cristo que esta situação pode ser revertida.
Porque sem Ele, não podemos ter a habitação e o governo do Espírito Santo, que é vitalmente necessário para a ressurreição do nosso espírito, que se encontra morto (não aniquilado, mas sem comunhão com Deus e incapacitado de todo ato de adoração em espírito e em verdade).
É por meio de Cristo que ocorre o reavivamento da consciência (outra faculdade do espírito).
Da consciência que se achava morta quanto ao conhecimento real da pessoa de Deus, e de quem somos de fato a seus olhos.
A razão desta morte da consciência em relação ao que é espiritual e verdadeiro quanto às realidades espirituais, celestiais e divinas, é consequente do fato de se achar o espírito também morto em delitos e em pecados.
Por isso Jesus diz que é somente nEle que podemos conhecer a verdade (sobretudo a pessoa de Deus e Sua Palavra), quando somos libertados do pecado, ou seja, desta condição terrível de morte espiritual, na qual todos se encontram naturalmente, sem Ele, e sem a habitação do Espírito Santo, que é o agente da nossa ressurreição espiritual.
Col 2:12 tendo sido sepultados, juntamente com ele, no batismo, no qual igualmente fostes ressuscitados mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos.
Col 2:13 E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos;
Para melhor entendermos o significado do que seja o pecado original devemos voltar às páginas do terceiro capítulo do livro de Gênesis.

A Queda do Homem em Razão do Pecado (Gênesis 3.1-7)
“1 Ora, a serpente era o mais astuto de todos os animais do campo, que o Senhor Deus tinha feito. E esta disse à mulher: É assim que Deus disse: Não comereis de toda árvore do jardim?
2 Respondeu a mulher à serpente: Do fruto das árvores do jardim podemos comer,
3 mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis, para que não morrais.
4 Disse a serpente à mulher: Certamente não morrereis.
5 Porque Deus sabe que no dia em que comerdes desse fruto, vossos olhos se abrirão, e sereis como Deus, conhecendo o bem e o mal.
6 Então, vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos e sendo árvore desejável para dar entendimento, tomou do seu fruto, comeu, e deu a seu marido, e ele também comeu.
7 Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; pelo que coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais.”
A queda do homem descrita no terceiro capítulo de Gênesis não é apenas a sua própria queda, mas de todo o universo, porque mediante a sua queda toda a criação foi sujeitada à maldição de Deus.
Tudo envelhece e se corrompe pelo uso, desde então.
Tudo perdeu o seu caráter eterno.
O pecado do homem influenciou tudo o mais na criação.
Gênesis 3 revela como a criação perfeita, boa, de Deus, se tornou corrompida e má.
Satanás, que tinha sido expulso do céu por causa da sua rebelião, tentou Eva valendo-se de uma serpente.
Ele entrou na serpente e falou através dela.
Não é de se admirar que tenha entrado na serpente, pois vimos Jesus permitindo que demônios entrassem em porcos conforme lhe haviam rogado. Sem a permissão de Deus isto não pode suceder, muito menos o ato de falar por meio dos agentes que possuem, mas o fato é que isto foi concedido a Satanás, porque de outra sorte, a obediência da mulher e do homem não poderia ser provada.
Este é um dos motivos porque Deus não nos livra de todas as tentações.
Ele nos concede poder e graça para resistir e não cair nas tentações, mas de modo nenhum nos poupa, porque é exatamente por elas que a nossa fé, fidelidade, obediência, perseverança, são provadas, e o nosso caráter fortalecido e confirmado no bem.
Ainda que Deus mesmo a ninguém tente e nem possa ser tentado.
Mas Satanás em seu ódio a Ele e a tudo o que criou, acaba servindo ao propósito de Deus de colocar a nossa fé à prova para que se firme e cresça, por meio das tentações.    
Satanás queria conduzir Eva e Adão ao pecado. Ele queria fazer com que eles desobedecessem a Deus. Ele queria corromper a criação boa de Deus.
A estratégia usada por Satanás é a mentira, ou o engano.
O que Satanás precisa fazer para efetuar o resultado esperado por ele é criar uma mentira na qual Eva creia.
Ele tem que enganá-la para que ela venha a pecar.
E por isso que Jesus em João 8:44 chama Satanás de “pai da mentira".
Satanás mente sobre o caráter de Deus, e ele mente sobre a Palavra de Deus.
É nisso onde o ataque dele se concentra inevitavelmente.
Satanás que caiu e no momento que caiu levou um terço dos anjos juntamente com ele volta-se agora para atingir a criação mais alta de Deus no mundo natural: o homem.
Ele se volta para Eva disfarçado na serpente, como se fosse um "anjo de luz", de acordo com 2º coríntios 11:14. Ele quer que você acredite que ele está lhe contando a verdade, e que o Deus da Bíblia é mentiroso.
Essa é a sua estratégia. Se ele pode conseguir que você creia que o caráter de Deus não pode ser confiável e, na Palavra de Deus como não sendo a verdade, e, portanto, não digna de ser aceita e confiada, mas que nele você pode confiar, naquilo que está afirmando, então ele alcança a sua meta.
Ele conseguiu que Eva duvidasse do caráter de Deus, duvidasse da palavra de Deus, e acreditasse nele, Satanás.
Satanás chega a Eva argumentando que se ela lhe ouvisse experimentaria alegrias das quais Deus gostaria de privá-la.
Ele se esforça para que Eva rebaixe o conceito de Deus na visão dela, e então viesse a descrer na palavra de Deus, e a dar crédito não àquilo que Deus afirmou, mas àquilo que lhe apontava o seu próprio desejo e sentimentos.
E Satanás disse à mulher: “É assim que Deus disse: Não comereis de toda árvore do jardim?”. Como a dizer sutilmente: “Reflita sobre o significado real desta ordem. Ela é razoável? Você tem liberdade para questionar Deus; você tem liberdade para duvidar de Deus; você tem liberdade para desconfiar de Deus.”
E isso conduziu Eva à desobediência.
Quando fazemos a suposição de que aquilo que Deus disse está sujeito ao nosso julgamento, nós estamos a um passo de pecar, nos tornando desobedientes e incrédulos.
Toda transgressão da vontade de Deus, todo pecado, traz em seu bojo esta ideia da relativização dos mandamentos de Deus, do questionamento ainda que indireto da Sua vontade soberana.
Assim, Eva é deslocada da firme posição de estar seguramente confiada na soberania de Deus para a sua provisão pessoal, para a de fazer valer aquilo que passaria a considerar como seus direitos.
Satanás conseguira o seu intento, fazendo com que pensasse que a sua liberdade estava sendo tolhida, que Deus lhe estava impondo restrições.
Colocou um desejo em seu coração e agora ordena que não o satisfaça. Qual é a lógica que há nisso?
A da cruz que estava oculta aos olhos de Eva.
A nossa vontade deve ser submetida a Deus. Importa que seja feita a vontade dele e não a nossa, ainda que seja muito grande o nosso desejo de ser ou obter algo.
A cruz trata com o eu, e impõe o tom correto aos nossos desejos, fazendo com que deixemos que sejam governados pelo Senhor e não pela nossa própria vontade.
O que o Senhor tem dito que é lícito e conveniente faremos, mas o que nos é vedado, ou mesmo que sendo lícito, seja inconveniente, isto não faremos, assistidos pela Sua graça que opera em nós, enquanto sujeitos à Sua santa vontade.
Mas Eva e lembrou que havia uma penalidade atrelada ao ato da desobediência.
Ela disse para Satanás que não deveria comer ou tocar no fruto da árvore que estava no meio do jardim, para que não morresse.
E observando que já havia conseguido o intento de lançar a dúvida no coração da mulher em relação à verdade da Palavra de Deus, Satanás foi ousado e direto contrariando diretamente a afirmação daquilo que Deus havia dito, dizendo: “é certo que não morrereis”, e para gerar convicção em Eva apresentou um argumento para sua afirmação: “Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do bem e do mal.”. (Gên 3.3,4).
E o resultado imediato está relatado no verso 6: “Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu, e deu também ao marido, e ele comeu.”.
O admirável nisto tudo é que apesar de Eva ter conhecido o caráter de Deus, tendo experiência do Seu amor e bondade, ela deixou que o seu desejo falasse mais alto e não questionou Satanás em nada do que ele disse, e não levantou qualquer suspeita sobre as afirmações que ele estava fazendo; ainda que ela não soubesse que estava falando com um anjo caído, com o arqui-Inimigo de Deus.
Seria de se esperar que ela partisse em defesa de Deus, de Seu caráter, de Sua Palavra, e que permanecesse fiel e obediente à Sua vontade.
Mas, não é exatamente isto que se espera também de nós quando confrontados pela tentação e pelas cobiças que operam na nossa carne?
Assim, o ponto é este: se o que fazemos não é completamente, de todo o coração, sem reservas, confiando na sabedoria e bondade de Deus, nós estamos em dificuldade. Nós pecamos.
Eva pecou, não quando ela comeu. Ela pecou quando ela deixou de acreditar que Deus era bom e somente bom. E que importava ser obedecido em tudo. Mas se achamos que pode haver alguma falha no caráter de Deus, é bem provável que não confiemos inteiramente na Sua Palavra.
Antes do pecado ela poderia ter resistido a tudo pela graça divina que lhe seria concedida caso obedecesse à Palavra, sem a dificuldade que todos nós temos depois que o pecado entrou no mundo, porque, uma vez estando debaixo do seu senhorio, ele é muito mais forte do que a nossa própria vontade.
O que queremos dizer é que Eva não tinha tanta impulsão para desobedecer no ato da desobediência original, quanto a que passou a ter depois que pecou, e juntamente com ela toda a humanidade, em razão do domínio e habitação do pecado em nossa natureza terrena.
O pecado que reina na carne luta contra a nossa mente e diz que não é o que Deus quer que importa, mas o que nós queremos.
Todo pecado em nós dá boa acolhida às mentiras de Satanás: de que há prazer lá fora; que há satisfação lá fora; que há diversão lá fora; que há alegria lá fora; que o mundo tem tudo o quanto possa nos satisfazer; e que Deus está sempre tentando nos restringir.
Nós pecamos quando pensamos que por causa de Deus estamos perdendo a nossa possibilidade de sermos livres e felizes.
Temos dado crédito à mentira de Satanás quando afirma ousadamente que Deus é um mentiroso ao declarar que o salário do pecado é a morte, e afinal temos pecado e não temos morrido. Satanás cria a falsa ideia de que não há e não haverá qualquer julgamento contra o pecado.
Esquecidos que já estamos naturalmente julgados e mortos espiritualmente falando, porque não temos real comunhão com Deus, a menos que Ele nos redima em Jesus Cristo.
Assim, Eva não chegou a conhecer o bem e o mal do modo que ela pensou que conheceria, isto é, tal como Satanás lhe mentira, dizendo que seria na exata forma como Deus os conhece.
Deus conhece o bem e o mal, guardadas as devidas proporções, pois que seu conhecimento é perfeito e onisciente, do modo que um cirurgião de câncer sabe sobre o câncer que é muito diferente do modo que um paciente o conhece.
E como Eva conheceu o mal?
O mal estava no coração de Eva.
Ela não conheceu o mal por algum efeito mágico na fruta, mas conheceu o mal no seu próprio coração.
Ela tinha desconfiado do caráter de Deus. Ela tinha impugnado os motivos de Deus, e ela tinha desobedecido a Palavra de Deus.
Desde então, o homem ainda procura cobrir a vergonha do estado pecaminoso da sua alma, não mais com vestes de figueira, mas com apanágios psicológicos, com sistemas positivistas de pensamento, com sistema de autoajuda que procurem elevar a sua auto- estima.
Mas perguntamos, qual é a eficácia destas coisas para limpar um coração corrompido pelo pecado, e de uma má consciência, que são as fontes onde residem e de onde brotam de fato, todos os nossos sentimentos de fraqueza, insucesso e toda sorte de perturbações da alma e do espírito?
Vestes de figueira não cobrirão a vergonha da sua nudez diante de um Deus santo e temível.
Esconder-se atrás das árvores, não mais do jardim do Éden, mas de uma má consciência, para fugir da presença de um Deus amoroso e fiel que nos busca para nos resgatar da condição má em que nos encontramos em nossa própria natureza, continua sendo um sentimento universal, produzido pelo pecado original.
Por isso o caminho de volta para Deus, para o reino dos céus, desde o Éden e para sempre, deverá ser feito por meio de violência, ou seja, por esforço deliberado para o exercício de fé e obediência e sujeição ao Deus que nos procura para ter comunhão conosco.
Então mais adiante vemos Adão não assumindo a sua culpa de modo responsável, ao contrário ele lançou a culpa no próprio Deus e não em Eva. Ele não disse “Essa mulher que me levou a fazer isto”, mas “a mulher que você me deu”. Em outras palavras: a culpa é sua por ter criado e me dado esta mulher.
Não houve o mínimo arrependimento traduzido em atitude voltada para a mudança e correção do erro, pela aceitação responsável do erro, pelo reconhecimento sincero da culpa e pela confissão da maldade.
Mas, ao contrário disto, vemos vergonha, fuga, desculpa esfarrapada. E então Deus pronuncia uma maldição neles. Deus os amaldiçoou. E o universo inteiro sentiu as consequências desta maldição.
Então ambos foram expulsos do jardim.
Deus deixou uma porta aberta para que o pecador pudesse entrar por ela na Sua presença. Cristo é esta porta e não há nenhuma outra para tal propósito.
Deus pode perdoar os pecadores em Cristo. E não é maravilhoso saber isso, que apesar da realidade de tudo aquilo que somos, que Deus perdoa os pecadores? Essa é a glória do evangelho.
Deus colocou nossa iniquidade em Cristo. Grande realidade. Ele carregou nossos pecados no Seu próprio corpo. Ele foi feito pecado por nós, e assim Deus O castigou no nosso lugar, para que possamos ser levantados da queda a que nos sujeitou Adão em razão do pecado.
O homem foi criado em estado perfeito por Deus e foi colocado no topo da criação. Mas o pecado o derrubou das alturas em que havia sido colocado por Deus, mas pela Sua exclusiva graça e misericórdia, Ele tem levantado os pecadores que creem por intermédio de Cristo, para que estejam para sempre, em Sua santa presença.

Deus Vem ao Encontro do Homem Caído (Gênesis 3.8-13)
“8 E, ouvindo a voz do Senhor Deus, que passeava no jardim à tardinha, esconderam-se o homem e sua mulher da presença do Senhor Deus, entre as árvores do jardim.
9 Mas chamou o Senhor Deus ao homem, e perguntou-lhe: Onde estás?
10 Respondeu-lhe o homem: Ouvi a tua voz no jardim e tive medo, porque estava nu; e escondi-me.
11 Deus perguntou-lhe mais: Quem te mostrou que estavas nu? Comeste da árvore de que te ordenei que não comesses?
12 Ao que respondeu o homem: A mulher que me deste por companheira deu-me a árvore, e eu comi.
13 Perguntou o Senhor Deus à mulher: Que é isto que fizeste? Respondeu a mulher: A serpente enganou-me, e eu comi.”
Devemos aprender do que Deus fez no Éden logo depois que o primeiro casal pecou. Aprender do diálogo que o Senhor teve com o homem e com a mulher logo depois da queda, e que antecedeu o proferimento da maldição da serpente, da mulher, do homem e da terra por causa do pecado.       
Quando Deus confrontou Adão e Eva no Éden depois da queda, e os amaldiçoou, bem como a serpente e toda a terra, não foi por um pequeno motivo.
O pecado conturbaria o propósito de Deus para a criação.
A humanidade sujeitada ao pecado e ao diabo passaria a ser, destrutiva, mentirosa, assassina das coisas boas e eternas, que Deus havia criado e especialmente aquelas que estavam sendo cultivadas no espírito do homem, como o amor, a bondade, a paz, a alegria, o domínio próprio, enfim, todas as virtudes que fazem parte do caráter do próprio Deus.
E quando Adão e Eva ouviram a voz do Senhor Deus, que andava no jardim pela viração do dia, esconderam-se da Sua presença entre as árvores do jardim (Gên 3.8).
Isto representava uma mudança dramática no relacionamento deles com Deus.
O endurecimento produzido pelo pecado se revelou no conteúdo e no modo das respostas que ambos deram a Deus, quando foram confrontados por Ele.
Nenhum dos dois mostrou arrependimento ou lamentou pelo que haviam feito.
Não demonstraram tristeza diante de Deus.
Não assumiram a própria culpa declarando-se culpados, ao contrário, deram respostas evasivas e com troca de acusações.
O pecado faz com que atribuamos os nossos fracassos a outros e não a nós mesmos.
Faz com que tentemos nos justificar condenando a outros.
E foi o que Adão e Eva fizeram quando foram confrontados por Deus. Eles haviam duvidado da bondade de Deus, e agora, no estado de pecado não creram, não confiaram na Sua graça e misericórdia para serem perdoados através do arrependimento e confissão da sua culpa.
Assim, eles ofenderam duplamente a Deus, quando fugiram da Sua presença, quando ouviram a Sua voz no jardim.
Eles o consideraram como alguém mal e disposto a destruí-los, e foi por isso que fugiram.
Eles tiveram medo de Deus porque viram que estavam nus.
Tinham vergonha de estarem nus, porque agora estavam sendo dominados por maus pensamentos.
E eles conheciam a santidade e pureza de Deus.
Na verdade, eles queriam evitar Deus, se fosse possível. Mas o Senhor não os deixou entregues à própria sorte, e veio confrontá-los e prestar contas juntamente com eles dos atos que haviam praticado e das coisas que estavam sentindo.
Eles estavam endurecidos pelo pecado, conforme demonstraram em suas atitudes e respostas, e de nada adiantaria Deus argumentar com eles para convencê-los acerca da Sua graça e misericórdia.
Aquela era a hora das trevas, Satanás havia triunfado em seu intento de induzir o homem e a mulher ao pecado, e não restou a Deus senão a alternativa de punir o pecado, naquele momento, com a morte espiritual, pela quebra da comunhão de Adão e Eva com Ele, e pela punição da falta com o proferimento de maldições, e com a expulsão do homem e da mulher do jardim.
O pecado manifestou a sua face terrível e o seu poder de manter escravizada a alma humana.
Uma vez debaixo da escravidão do pecado, o homem fica dependente de que Deus use os meios de graça necessários para conduzi-lo ao arrependimento, para que possa ser libertado.
Somente o poder da graça de Deus pode libertar o homem da escravidão do pecado.
Somente o Filho Unigênito de Deus pode libertar aqueles que são escravos por natureza deste inimigo terrível que conduz o homem tanto à morte física, quanto espiritual e eterna.
O pecado é como um vício terrível ligado à alma humana, e do qual o homem não pode se livrar por si mesmo.
Ele pode entender que o que tem feito é errado.
Pode sentir vergonha da sua condição em pecado, tal como Adão e Eva sentiram.
Pode reconhecer que Deus é santo e que não pode estar em comunhão com Ele enquanto estiver escravizado ao pecado.
Pode saber que há um julgamento de Deus sobre o pecado.
Pode sentir a sua consciência culpada.
Pode fazer resoluções de mudar sua vida e deixar de fazer as coisas erradas que faz, mas não pode parar de pecar, nem pode se arrepender honestamente, porque o poder do pecado é maior do que todos os poderes que existem na natureza humana.
Somente o poder de Deus pode vencer o pecado.
Para tanto, o homem deve se sujeitar a Deus.
Deve pedir-lhe humildemente que o ajude a se livrar dessa escravidão que é mais forte do que tudo o que há no mundo.
Por isso a Bíblia indica ao homem qual é o caminho que ele deve seguir para obter o favor, a graça de Deus. Ele deve lamentar, chorar as suas misérias humildemente diante do Senhor, esperando que Ele estenda a Sua mão poderosa, e o liberte e o abençoe.
Adão e Eva tentaram cobrir a vergonha da sua nudez com folhas de figueira, mas isto não foi suficiente, porque a nudez do pecado é sentida no coração, e não pode ser acobertada.
Somente pela fé e pelo arrependimento é que pode ser coberta pelo sangue de Jesus.
Não há outro modo para se livrar da culpa do pecado, e alcançar uma boa consciência diante de Deus.
Conseguimos esta boa consciência pela certeza de que fomos de fato perdoados de todos os nossos pecados e que toda a nossa culpa foi removida, pelo sacrifício de Jesus, para o ato de justificação que nos reconciliou para sempre com Deus.    
Aquele foi o pôr de sol mais triste já testemunhado pela história do mundo.
Pois, foi naquele entardecer que a criação foi amaldiçoada por Deus.
Foi quando a amizade foi rompida e toda a humanidade passou a estar debaixo da ira de Deus.
A ira do julgamento do pecado que sujeitou o homem à morte, tal como havia sido alertado anteriormente.
As trevas do pecado receberam a justa sentença divina, e somente por meio do sangue de Jesus, o homem poderia voltar a ter paz com Deus.
“O Filho do homem veio buscar e salvar o perdido.” (Lc 19.10).
O próprio Jesus proferiu estas maravilhosas palavras quando se referiu à conversão de Zaqueu, o publicano.
Esta missão de buscar o pecador perdido começou no jardim do Éden, quando o Senhor Deus veio ao encontro de Adão e Eva depois de terem caído no pecado.
Como Ele lhes havia alertado que no dia em que eles O desobedecessem comendo o fruto, que lhes havia proibido, eles certamente morreriam, é bem provável que ambos tenham pensado que seriam aniquilados pela ira de Deus quando Ele os encontrasse, e por isso fugiram da Sua presença e tentaram se esconder entre as árvores do jardim.
Mas Deus veio buscar o pecador escondido.
E aqui nós achamos a primeira visão da graça, a primeira expressão de misericórdia, a primeira indicação de que poderia haver uma possibilidade para a reconciliação.
No verso 9 nós lemos: “E chamou o Senhor Deus ao homem, e lhe perguntou: Onde estás?”.
Isto não é certamente o que se poderia imaginar, porque se eles desobedecessem a Deus, eles iriam morrer, e pensamos em algum ato imediato de julgamento divino caindo sobre as cabeças deles. Mas ao invés, nós achamos Deus iniciando uma confrontação que começa de uma forma muito branda.
Aqui está revelada pela primeira vez a verdade do evangelho: Deus busca o pecador e lhe pergunta onde ele está.
Há uma sentença de morte sobre o pecador, mas Deus vem buscá-lo para que possa ser salvo desta condenação.
O homem está morto em seus pecados, mas Deus vem buscá-lo para que tenha vida, e a tenha em abundância. E Deus ainda busca os pecadores.
A nossa própria consciência nos acusa e condena acerca do fato de sermos pecadores.
E Satanás é o grande acusador que nos aponta os nossos pecados e tenta nos fazer sentir que Deus não tem qualquer misericórdia para pessoas corrompidas pelo pecado como nós.
Mas, neste ato de busca de Adão e Eva, depois de terem pecado, Deus revelou a grande mentira do diabo, e o quanto a nossa própria consciência sujeita ao pecado nos engana e é uma má consciência nos dizendo que não podemos ter confiança em que Deus possa ser bondoso e perdoador em relação a nós, um a vez tendo nós lhe ofendido de maneira tão terrível com os nossos pecados. Seria de se esperar vingança e ressentimento e não oportunidade e perdão.
Mas, a graça superabundou onde abundou o pecado. A graça se revelou infinitamente rica, pela primeira vez, por Adão e Eva terem sido poupados pela longanimidade de Deus, apesar de não terem manifestado qualquer tipo de arrependimento em relação ao seu pecado.
A graça reteve a destruição deles.
Quando Deus perguntou a Adão onde ele estava, ele não o fez porque não soubesse onde ele havia se escondido, pois Ele sabe tudo, Ele é onisciente. Ele sabia onde Adão estava. O que Ele queria era que Adão reconhecesse a sua condição atual, e que confessasse o seu pecado, porque é Deus misericordioso, compassivo, longânimo, perdoador, e estava manifestando estes seus atributos a Adão de forma que ele pudesse achar lugar para o arrependimento.
A palavra "chamou", “ikrrá”, no mesmo versículo (3.9), “Chamou o Senhor Deus ao homem”, significa no hebraico o ato de chamar alguém para uma prestação de contas. É usada em várias passagens do Velho Testamento como por exemplo em Gên 12.18; 20.9; 26.9.10. Dt 25.8. Deus chama Adão para responder por seus atos perante Ele, mas é uma aproximação bastante compassiva.
Antes do pecado, Adão falava somente a verdade e amava somente a verdade, mas o engano havia entrado agora no seu coração. Ele não consegue ser inteiramente honesto em dizer em plena sinceridade a Deus tudo o que estava sentindo e pensando.
O pecado tem esta característica de levar o homem a ser indulgente para com as suas faltas, e ser parcial na justa avaliação delas.
Adão não sentiu repulsa pelo seu pecado. Não ficou entristecido pelo fato de ter desagradado Aquele que tanto o amava e que lhe manifestava diretamente este amor todas as vezes que ia ter com ele no jardim.
Adão não ficou horrorizado com o próprio pecado, ao contrário ele ficou horrorizado com Deus porque teve medo de Deus.
Ele teve medo das consequências, mas não teve nenhum temor em relação ao mal que havia aprisionado a sua mente e coração.
Depois de ter confrontado Adão, Deus confrontou Eva: “Disse o Senhor Deus à mulher: Que é isto que fizeste? Respondeu a mulher: A serpente me enganou, e eu comi.”. Adão não tentou proteger Eva. E cabia a ele, no casamento, a função de proteger a sua esposa.
Ao contrário, ele direcionou a atenção de Deus para ela, procurando achar alívio na sua própria responsabilidade.
Ele fez, como se costuma dizer popularmente: “tirou o corpo fora” e lançou toda a carga sobre sua esposa.
Aquela relação maravilhosa que havia antes do pecado foi inteiramente torcida.
Do mesmo modo que fez com Adão, Deus deu à mulher uma oportunidade para arrependimento quando lhe perguntou o que ela havia feito.
Mas, tal como o seu marido, a mulher não assumiu a sua culpa, e a jogou inteiramente sobre a serpente.
Pensou que poderia ser justificada perante Deus pelo fato de ter sido enganada pela serpente. “A culpa é toda do diabo.”.
É o que muitos pensam erroneamente. Há mesmo cristãos que pensam que tudo o que fazem de errado não é por causa do seu próprio pecado, mas que é sempre por causa do diabo.
“Foi o diabo que me fez fazer aquilo. Não fui eu o culpado. O culpado foi o diabo!”.
É muito comum se ouvir isto. Ainda que não se possa inocentar o maligno que veio realmente roubar, matar e destruir, sendo ele o pai da mentira, nem por isso, não podemos transferir a responsabilidade
pelos nossos maus pensamentos e atos inteiramente para a conta de Satanás.
Como afirma Tiago: “Cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz.” (Tg 1.15).
O homem é inteiramente responsável por todos os seus atos. A cura está portanto em exatamente reconhecer esta responsabilidade e confessá-la a Deus. Porque isto é a verdade quanto à nossa condição em relação ao pecado. E é portanto somente confessando a própria culpa que se pode achar o favor e graça de Deus.

A Maldição da Serpente (Gênesis 3.14,15)
“14 Então o Senhor Deus disse à serpente: Porquanto fizeste isso, maldita serás tu dentre todos os animais domésticos, e dentre todos os animais do campo; sobre o teu ventre andarás, e pó comerás todos os dias da tua vida.
15 Porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua descendência e a sua descendência; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.”
Satanás conseguiu se prover de filhos espirituais através do êxito do seu propósito em tentar a mulher a pecar, e ao conseguir com que esta também convencesse o seu marido a comer o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal.
O descendente da mulher que ferirá a cabeça do diabo é sem qualquer sombra de dúvida o Senhor Jesus, que sendo Deus, foi concebido no ventre de Maria para vir a este mundo destruir as obras do diabo, esmagando a sua cabeça.
Este ato de esmagar a cabeça da serpente, seria feito através de um ferimento “do calcanhar” do Senhor pelo diabo, a saber a humilhação, perseguição que foi permitido que o diabo lhe fizesse, e que culminou com a Sua morte na cruz; e não somente isto, esta ferida que é produzida no calcanhar pelo diabo, na descendência bendita da mulher, é também feita naqueles que são de Cristo.
Satanás se proveu de uma descendência em toda a humanidade, por meio do pecado, mas Deus prometeu levantar desta descendência muitos que seriam inimigos do diabo, e não seriam mais seus descendentes, porque viria Aquele que lhe esmagaria a cabeça, e lhe despojaria do seu poder sobre todos os homens, de maneira que aqueles que se unissem ao Redentor, seriam livrados do seu senhorio maligno.
Por isso, há uma maldição sobre os animais, e especialmente sobre a serpente, como consequência do pecado do homem, e há também uma maldição específica sobre Satanás, por ter a sua cabeça esmagada pelo descendente da mulher, que é Cristo.
Nós temos a partir destes versículos de Gênesis, o começo da maldição divina. Nós temos a maldição que Ele proferiu sobre a serpente; que é sobretudo a maldição de Satanás.
É importante verificar que Satanás foi lançado juntamente com muitos demônios à terra, depois que eles se rebelaram no céu, e muitos demônios foram colocados em cadeias num lugar que a Bíblia chama de abismo. E eles ainda permanecem lá.
No tempo do fim, no período da Grande Tribulação, um grande número deles será libertado para afligir os homens que estiverem vivendo sobre a terra. É possível que Satanás e os demônios que atuam na terra também estivessem no abismo, antes de o Senhor criar os céus e a terra, e foi permitido a estes saírem do abismo para cumprirem pelo menos dois grandes propósitos de Deus: O primeiro de trazer um julgamento sobre eles, através do agravamento do pecado deles, por ter Satanás tentado o primeiro casal a pecar contra Deus, fazendo com que a criação ficasse sujeita à vaidade, e também por toda a sorte de males que eles praticam sobre a terra, especialmente em relação aos homens, e por terem também atuado para levar Jesus à cruz.
Isto tudo agravou sobremaneira o juízo deles, pois Deus propiciou com que ficasse exposta à vista de todos os seres celestiais e dos homens, a excessiva malignidade de Satanás e de todos os anjos caídos.
Foi, portanto, pela morte de Jesus na cruz, que eles não somente ficaram despojados do domínio completo sobre aqueles pelos quais o Senhor morreu, e que nEle creem, como também ficaram sujeitos ao desprezo pela vitória de Jesus na cruz (Col 2.14,15).
O segundo propósito é o de que Satanás e os demônios que estão na terra, operam como agentes de provação da obediência dos homens, e são também os executores de juízos sobre os desobedientes que lhes são entregues para destruição da carne.
Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém também pode tentar, porque é absolutamente puro e santo, e desta forma, Satanás e os demônios atendem bem ao propósito de provar a fidelidade do coração dos homens, por tentar seduzi-los à prática do mal.
Evidentemente, isto não esgota tudo o que Deus intentou em Sua sabedoria e soberania, quando fez com que os homens sobre a terra tivessem que ter a companhia de Satanás e de demônios, que mesmo sendo indesejável para aqueles que amam e temem ao Senhor, acabam cooperando indiretamente para o aperfeiçoamento do seu caráter, nas lutas que têm que empreender contra os poderes das trevas.
Satanás, certamente, tanto quanto o próprio homem a quem tentou, não sabia, não conhecia tudo o que estaria implicado naquele ato de tentação do primeiro casal. Ele jamais imaginaria tudo o que seria colocado em curso por Deus para cumprir os Seus eternos propósitos tanto no que se refere à redenção do homem, quanto à manifestação da glória da Sua graça, quanto aos juízos que Ele traria sobre o próprio diabo.
Satanás pensou que poderia estragar completamente a criação de Deus, levando o primeiro casal a cair no pecado. Mas Ele não sabia que tudo já estava previsto nos conselhos eternos de Deus, e que Ele tinha um plano maravilhoso para ser colocado em prática.
É interessante observar que na palavra mesma de maldição que Deus proferiu sobre a serpente estava embutida a promessa do Salvador.
A maldição distintiva da serpente teve também o propósito de que ela se tornasse um símbolo, uma lembrança constante para o homem, da queda e da condição amaldiçoada do próprio Satanás, que se identificou com a serpente, e que é por isso chamado na Bíblia por este nome, como em Apo 12.9; 20.2; II Cor 11.3, por exemplo.
Satanás disse em seu coração: “Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono, e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei acima das mais altas nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo.” (Is 14.13,14). Entretanto, Deus que tudo sabe, conhecendo-lhe estes pensamentos íntimos proferiu a seguinte sentença sobre ele: “Contudo serás precipitado para o reino dos mortos, no mais profundo do abismo,” (Is 14.15).
Satanás será de fato lançado no abismo por ocasião da volta de Jesus (Apo 20.1-3), e será lançado no lago do fogo e enxofre, no final do milênio (Apo 20.10).
Satanás jamais considerou, quando pensou que teria estragado para sempre, o plano de Deus de ter muitos filhos como Jesus Cristo, com a sua tentação de Eva, porque sabia que havia uma sentença de morte para o caso de desobediência ao mandamento de Deus, caso comesse do fruto proibido, que daquela sentença de morte, Deus traria ainda vida, e vida em abundância ao homem morto espiritualmente em seus delitos e pecados.
Jamais o diabo cogitaria que o próprio Deus pagaria na pessoa de Seu Filho, o preço exigido para a redenção do pecado e a remoção da morte do mundo.
A morte seria vencida pelo autor da vida, com a Sua própria morte, e como Satanás poderia cogitar um tal plano de redenção em que o próprio Deus se disporia a morrer por amor ao homem, e ainda por cima, de um homem agora corrompido pelo pecado, e transgressor dos mandamentos de Deus?
O diabo não podia pensar que um Deus tão elevado, poderoso, glorioso e majestoso, se humilhasse e se dispusesse a tal ponto de assumir a forma de homem e de servo, para morrer em tal condição, em favor de míseros pecadores.
Satanás estava cheio de ódio contra Deus por ter sido expulso para sempre do céu, e por ter recebido uma sentença de morte espiritual eterna. E jamais poderia imaginar que Deus pudesse perdoar transgressores da Sua vontade tal como ele, a saber, o diabo.
Então, ao atacar a criação perfeita na pessoa de Eva, ele tencionava atacar o próprio Deus.
Ele já havia enganado e arrastado a muitos anjos juntamente com ele, enquanto ainda se encontrava no céu. E agora procuraria produzir estragos na criação de Deus na terra.
Na verdade, ele continua operando incansavelmente neste seu trabalho, procurando produzir tudo o que está ao seu alcance para trazer miséria, destruição e corrupção ao mundo e a tudo o que ele contém.
Com isto ele está agravando e em muito a sentença de condenação contra ele, e ele sabe muito bem disto.
Até o momento do proferimento da maldição não havia nenhuma luta entre o homem e o diabo. Adão e Eva tinham seguido a Satanás. Não havia nenhuma hostilidade entre eles. Não havia nenhuma inimizade lá. E não é dito que eles fugiram da serpente depois da queda procurando se esconder do diabo. Ao contrário é dito que fugiram da presença de Deus tentando se esconder entre as árvores do jardim. E o diabo deve ter se regozijado antecipadamente num triunfo pleno que ele de fato não chegaria a ter, pois não imaginava que Deus se proveria de muitos filhos, incontáveis como as estrelas do céu, dentre os pecadores caídos.
Na maldição proferida por Deus contra Satanás, há uma possível profecia indicando a futura conversão de Eva. O diabo pensou que teria Eva do seu lado para sempre, mas quando Deus lhe disse que Ele colocaria uma profunda inimizade entre a mulher e o diabo, pode estar também incluída aqui a conversão de Eva.
Ela, por um momento, havia se tornado inimiga de Deus por causa do pecado, mas ela poderia, pela misericórdia e graça de Deus vir a se converter e assim voltar a ter comunhão com Deus, e consequentemente ser inimiga do diabo.
Temos nas palavras de Eva proferidas em Gên 4.1, em que tributou glória a Deus no nascimento do seu filho primogênito, Caim, uma indicação desta sua possível conversão: “adquiri um varão com o auxílio do Senhor.”.
Depois de Caim ter assassinado Abel, a mesma Eva viria a declarar em relação a nascimento de sete: “Deus me concedeu outro descendente em lugar de Abel, que Caim matou.” (Gên 4.25).
Há nestas palavras algum indício de inimizade contra Deus?
Ao contrário, parecem ser palavras de quem tinha o temor do Senhor.
Estas foram palavras proferidas por Eva depois da maldição da serpente.
Que duro golpe não seria para Satanás a conversão de Eva, e quão duro golpe é para ele a conversão de todos aqueles que ele consegue enganar por algum tempo mantendo debaixo da sua influência na condição de inimigos de Deus.
É possível que até o próprio Adão tenha se convertido a Deus, porque vemos Abel sendo temente a Deus e agindo de acordo com as ordens de Deus, e provavelmente todos os primeiros descendentes de Adão e Eva aprenderam acerca da bondade e do amor de Deus através do relato de seus pais.

A Maldição da Mulher (Gênesis 3.16)
“E à mulher disse: Multiplicarei sobremodo os sofrimentos da tua gravidez; em meio de dores darás à luz filhos; o teu desejo será para o teu marido, e ele te governará.” (Gên 3.16).
Deus estava projetando originalmente que as mulheres teriam fillhos e que esses filhos trariam às mulheres tristeza e dor física, tristeza na hora do nascimento, e então tristeza assistindo a luta daquele pequeno ser, contra todas as ameaças que vêm contra a sua vida e todas as coisas que podem afligir e quebrar o coração de uma mãe.
O desígnio original de Deus era isso? Não. Tudo isso é parte da maldição. Isso é o que Gên 3.16 está dizendo. Isso faz parte da maldição; isso não faz parte do desígnio original de Deus.
A mulher foi amaldiçoada na esfera do seu trabalho, na esfera da sua vida; na relação com os filhos e o seu marido.
As dificuldades com os filhos e as dores que se sofre nesta área, a dor física e emocional e às vezes uma dor espiritual profunda, e a luta com o marido, não fazia parte do que Deus pretendeu no princípio.
Isso é um resultado do pecado, e da maldição que Deus fez a Eva.
Isto lhe viria como consequência do pecado.
A primeira parte da maldição é em relação aos filhos. A segunda parte está relacionada ao marido. Nesta primeira parte, é dito literalmente: "'Em dor você terá os seus filhos”. E na segunda parte: “o teu desejo será para o teu marido, e ele te governará.”.
Assim, as mulheres foram amaldiçoadas para sofrerem nas duas relações mais significativas da maioria delas, a saber, relacionamento com os filhos e relacionamento com os maridos.
Esses realmente são os dois reinos nos quais as mulheres geralmente acham a sua vida, porque a maioria delas está vocacionada por Deus para ser esposa e mãe.
Deus criou Adão e Eva, originalmente no jardim em perfeição e sem pecado.
Deus falou com a mulher com a maldição que foi destinada a ela para servir como uma lembrança constante do seu pecado.
E é em princípio uma lembrança para todas as mulheres do horror do pecado, não para acusação, mas para reconhecimento da condição de pecado, para que haja confissão, arrependimento e salvação, porque sem o convencimento do pecado, não se pode receber a graça que liberta do pecado.
Podemos dizer então que a maldição no caso da mulher e do homem, não foi para o mal, mas para uma boa finalidade, a saber, a da redenção da humanidade.
A mulher quer ter paz, alegria, amor e harmonia no relacionamento com seu marido e filhos, mas para tê-lo, depois do pecado, deverá buscar tudo isso vivendo para Cristo.
Se ele não edificar o lar, em vão será todo o seu trabalho e esforço em tal sentido, porque somente Cristo pode libertar do poder e escravidão do pecado, que impede um viver abençoado em plenitude.
Isto quer dizer que a vida da mulher que está vencendo os efeitos da maldição que há no mundo é marcada por fé em Deus, por amor sincero a Deus, por santificação, pureza de vida e domínio próprio.
Esta é a marca com que uma mulher piedosa produzirá filhos piedosos. E com isso a sua dor será grandemente reduzida, pela bênção de Deus em sua vida, neste mundo de trevas.
Entretanto, como já dissemos, nem toda dor, sofrimento, decepção, serão retirados, pois não há quem não peque e que não necessite da disciplina e da instrução do Senhor.
Como aprenderemos humildade e paciência se não formos contraditados, injustiçados, perseguidos, desamparados?
Como experimentaríamos a realidade do cuidado de Deus se não tivéssemos em que ser socorridos?
Em quê perceberíamos a necessidade de mudarmos nosso comportamento, e mais do que o comportamento exterior, as atitudes internas do nosso coração, se não percebêssemos, pela graça do Senhor, no que temos errado em relação à edificação da vida de nosso cônjuge e filhos?
Por isso, os problemas em família são também oportunidades para mudança e crescimento espiritual, pelo aprendizado e prática das virtudes que estão na própria pessoa de Cristo.
Assim, Deus faz com que tudo coopere para o bem daqueles que Lhe ama, sejam circunstâncias favoráveis ou adversas, porque estarão sempre produzindo um fruto pacífico de justiça e de refinamento de caráter e de fé.
Agora, vejamos a segunda parte da maldição que se refere à relação da mulher com o seu marido: “o teu desejo será para o teu marido, e ele te governará.”.
"O teu desejo será para o teu marido.". Isto significa que o desejo dela vai ser algo negativo, algo que reflete separação e alienação.
Até este ponto foi posta inimizade entre a serpente e a mulher. Foi posta inimizade entre o homem e a terra. E é posta inimizade entre a esposa e o seu marido.
Ela não pode fazer o que ela deseja. Ela não vai viver a própria vida dela totalmente independente, porque o marido dela rege sobre ela.
Tudo que ela deseja está sujeito à vontade dele.
Ela nem sempre adquirirá o que ela quer.
Ela vai ter que suportar a tristeza da insatisfação.
Lembre, antes de prosseguirmos, que isso será experimentado, sempre que não estiver debaixo do governo de Cristo.
Somente o Senhor pode modificar este quadro, colocando satisfação no coração em toda e qualquer circunstância.
Olhemos agora para as particularidades do idioma que expressa o conflito. "'Seu desejo será para o seu marido.". Agora, falemos sobre a palavra "desejo". Significa “busca de controle”. Literalmente, poderia ser lido: “você buscará ter o controle de tudo”.
O pecado produziria isto naquela submissão voluntária da mulher antes da queda.
Em vez dela, haveria naturalmente na mulher, em sua natureza terrena, esta inclinação para governar o marido, invertendo assim o que fora planejado por Deus desde o princípio.
Você desejará fazer prevalecer sua vontade. Isso é um sinal da maldição do pecado que está no mundo desde a queda.
Somente em Cristo, este desejo pode ser revertido em sincera submissão.
Este comportamento seria uma consequência do próprio pecado na mulher, e não propriamente da maldição proferida por Deus.
Você desejará estar no controle, dominar. E então, a consequência disto é que seu marido reagirá com domínio, governo, em vez de liderança amorosa.

A Maldição do Homem (Gênesis 3.17-19)
“17 E ao homem disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei dizendo: Não comerás dela; maldita é a terra por tua causa; em fadiga comerás dela todos os dias da tua vida.
18 Ela te produzirá espinhos e abrolhos; e comerás das ervas do campo.
19 Do suor do teu rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, porque dela foste tomado; porquanto és pó, e ao pó tornarás.”
Na maldição da mulher relativa a seus filhos e marido, temos a indicação indireta de que o reino da mulher casada é o seu lar. E nos versos 17 a 19 nós vemos qual é o reino do homem, pois foi designado a ele a atribuição de obter o sustento da sua família lavrando a terra.
O homem passaria também a ter dificuldades no trabalho que deveria fazer para obter o sustento de sua família, porque a terra produziria cardos e abrolhos, que é uma referência a ervas daninhas e espinhos.
A causa da maldição do homem é declarada por Deus: “Visto que atendeste à voz de tua mulher, e comeste da árvore que eu te ordenara não comesses: maldita é a terra por tua causa...”. Houve uma razão para o efeito especial que foi projetado para ser um castigo particular colocado no homem como uma lembrança da severidade do pecado. A razão porque ele fez isto foi porque ele escutou a voz da sua esposa, em lugar da voz de Deus.
Ele decidiu fazer o que ela queria que ele fizesse, em lugar do que Deus lhe ordenou que fizesse. É bom conhecer os desejos da esposa; é bom satisfazer os pedidos da esposa. Mas não quando ela está pedindo que o marido desobedeça a Deus.
Ela sabia o que Deus tinha dito. Mas ela queria que ele comesse. Ela tinha feito isto debaixo da ilusão que ela conheceria o bem e o mal agora; que ela seria como Deus. Este era um ato de autoexaltação. Ela queria que ele fizesse isto. E ele escutou a voz dela, em lugar do mandamento de Deus. Ele fez o que a sua esposa queria que ele fizesse. E foi como se Deus dissesse: "'Porque você escutou a voz de sua esposa no lugar da voz de Deus. Porque em lugar de regê-la, você deixou que ela o regesse. Em lugar de mostrar a ela através do exemplo o que era certo, obedecendo a Deus, você seguiu o exemplo dela de desobediência a Deus. Em lugar de honrar a Deus, você honrou sua esposa, que, em vez de honrar a Deus, honrou a serpente.”.
A consequência disso é que a terra permanece sob maldição, e não há outro modo de se obter boas safras agrícolas a não ser mediante muito trabalho e esforço.
Por isso Deus disse a Adão: “maldita é a terra por tua causa: em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida. Ela produzirá também cardos e abrolhos, e tu, comerás a erva do campo. No suor do rosto comerás o teu pão”.
Assim, somente o trabalho honesto num mundo de pecado se torna uma bênção. E as dificuldades para o homem vencer em seu trabalho são um duplo reforço de bênção já que estamos num mundo de pecado e sujeitos ao pecado.
O trabalho mantém a mente e as mãos ocupadas naquilo que é útil e não pecaminoso.
O coração fica fortalecido e Deus derrama a sua bênção sobre aquele que trabalha.
Mas, o ocioso pode facilmente se dispor para a prática do mal, e a ocupar o seu pensamento com o que é vão e pecaminoso.
Assim, essa maldição específica, num mundo pecado, é uma proteção para o homem com seu coração pecaminoso, e não algo para atormentá-lo e levá-lo à ruína.
O ideal seria que não houvesse fadiga, esforço, tristeza em seu trabalho, mas isto somente seria adequado num mundo sem pecado.
Certamente, as mãos que não estiverem ocupadas no que é útil, poderão mais facilmente ocupar-se de cousas com as quais não deveriam se envolver.
Isto se aplica tanto ao pão material, quanto ao espiritual, porque sem diligência, trabalho, especialmente para viver dentro do padrão estabelecido por Deus em Sua Palavra, a graça que está disponível em Jesus, de pouco ou nada nos beneficiará, porque o Senhor tem amarrado à Sua bênção à quebra da maldição, pelo esforço em diligência.

A Promessa da Redenção (Gênesis 3.20-24)
“20 Chamou Adão à sua mulher Eva, porque era a mãe de todos os viventes.
21 E o Senhor Deus fez túnicas de peles para Adão e sua mulher, e os vestiu.
22 Então disse o Senhor Deus: Eis que o homem se tem tornado como um de nós, conhecendo o bem e o mal. Ora, não suceda que estenda a sua mão, e tome também da árvore da vida, e coma e viva eternamente.
23 O Senhor Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden para lavrar a terra, de que fora tomado.
24 E havendo lançado fora o homem, pôs ao oriente do jardim do Éden os querubins, e uma espada flamejante que se volvia por todos os lados, para guardar o caminho da árvore da vida.”
O jardim do Éden simbolizava o céu na terra; e assim, em razão do pecado, o homem não poderia permanecer no Éden, porque ninguém pode permanecer em pecado no céu.
Isto é claramente ensinado aqui, em figura. Então o homem foi expulso do Éden, e querubins, que são guardiões da santidade de Deus foram colocados à entrada do jardim, para que o homem soubesse que ele não pode estar no local da habitação de Deus, enquanto estiver sob o pecado.
Mas a redenção, que é segundo a fé, e com base na misericórdia e graça de Deus, pode dar ao homem caído a oportunidade de ser restaurado, e habilitado a retornar ao paraíso, isto é, ao local da habitação do homem, que é também a morada de Deus. E o modo de se ter isto, está ensinado de forma compactada em Gên 3.20,21.
Jesus prometeu ao ladrão na cruz, que havia se arrependido, que o conduziria ao paraíso.
Aqui nesta passagem de Gênesis é provável e quase certo que nós tenhamos a primeira revelação da promessa do evangelho em ação, salvando pela fé a Adão, que recebeu, depois deste posicionamento de fé, uma cobertura adequada para a sua nudez física, preparada não por ele e nem por Eva, mas pelo próprio Deus, que fez túnicas de peles para ambos, que exigiu o sacrifício de animais, e consequentemente derramamento de sangue.
Um ato de fé em Deus fez com que fossem cobertos com a justiça de Cristo, que seria a única vestimenta apropriada para cobrir de justiça a todos os que nele creem, desde que o pecado entrou no mundo.
Nós temos no versículo 20, anterior ao que fala da cobertura com as túnicas de peles (v.21), uma possível evidência do porque ter Deus preparado uma tal vestimenta que, diga-se de passagem, foi aceita por Adão e por Eva, pois, se estivessem do lado da serpente, lhe dando crédito na mentira que havia proferido, eles se apresentariam em rebelião contra Deus.
Eles estavam debaixo do pecado, sentindo as consequências e influências do pecado, como qualquer pessoa depois deles, mas haviam provavelmente se reconciliado com Deus, pela fé, como se dá com todos os que nEle creem.    
Como dissemos, há uma forte evidência para a conversão de Adão, logo posteriormente à queda, uma vez que ele deve ter presenciado e ouvido a maldição contra a serpente, a qual conforme já estudamos antes, afirma que haveria inimizade entre a mulher e a serpente, e entre a descendência da mulher e a da serpente, e que o descendente da mulher lhe esmagaria a cabeça.
Ora, isto, trouxe provavelmente a Adão a fé que salva.
Ele demonstrou ter crido nesta promessa de Deus, e por conseguinte, no próprio Deus, uma vez, que, ato contínuo, deu, o próprio Adão, o nome de Eva à sua mulher.
Até aquele momento ela não tinha um nome próprio específico.
Adão se sentiu inspirado a lhe dar o nome naquela hora, que é para nós uma forte e provável evidência da sua fé, pois este nome, no hebraico, como está no original, significa “vida”.
Ele creu que haveria vida, porque Deus, apesar de terem sido amaldiçoados, manteve a ordem de que ele e sua esposa fossem fecundos e se multiplicassem; e o melhor de tudo, haveria uma grande oportunidade para eles, de serem inimigos da serpente, e gerar Aquele que viria depois deles, como descendente de Eva, para esmagar a cabeça da serpente.
Isto é maravilhoso, não é verdade?
Adão que tinha amizade com Deus no Éden, antes da queda, não tinha, no entanto, fé em Deus, tanto que não deu crédito a Deus e confiou nas palavras da serpente.
Mas, agora, apesar de pecador, tendo quebrado aquela perfeição de comunhão, por causa do pecado, ele expressa fé em Deus, e naquilo que ainda não era visível e concretizado.
Ele creu na promessa de Deus, e colocou o nome de “Vida” em sua esposa.
Ele não era pai de ninguém, e nem Eva era mãe de ninguém, até aquele momento, e Adão creu em Deus e na Sua palavra.
A fé é por isso, o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que não se veem (Hb 11.1), e quanto à importância da fé, Jesus disse diante da incredulidade de Tomé que felizes são os que não viram e creram.
Por isso, sem fé é impossível agradar a Deus.
É também por isso que se declara que é por meio da fé que vive o justo.
A vida eterna é por fé, porque é somente por ela que podemos expressar a nossa confiança em Deus.
Confiança plena no Seu caráter, naquilo que Ele é.
Plena certeza na Sua fidelidade, especialmente para cumprir Suas promessas.
Neste texto de Gênesis 3.20-24 estão resumidos os componentes necessários para a salvação. Aqui é apresentada a teologia da redenção, tanto pelo lado do homem, quanto pelo lado de Deus.
Do lado do homem, são apresentados fé e arrependimento.
Do lado de Deus é apresentada substituição.
O homem crê com um coração penitente, e Deus provê substituição para o pecador crer na eternidade.
A salvação dos pecadores, a libertação deles do pecado, sempre foi por fé e arrependimento; e por substituição e pelo poder de Deus para nos justificar e nos afiançar a vida eterna.
A substituição aqui referida é a de que Deus provê um substituto para cobrir o nosso pecado.
Os animais que foram sacrificados para cobrir a nudez de Adão e Eva, tipificavam o sacrifício de Jesus que foi sacrificado para cobrir o nosso pecado.
Assim, a salvação do lado do homem requer fé. Mas do lado de Deus, requer substituição para satisfação da Sua justiça e santidade.
O versículo 21 diz que Deus fez túnicas de peles para Adão e Eva e os vestiu com elas. Antes de qualquer outro comentário queremos deixar destacado o fato de que a Bíblia diz que foi Deus mesmo quem os vestiu.
Ele não somente fez as túnicas como também os vestiu.
O que eles fizeram foi somente aceitar aquilo que Deus tinha preparado para eles.
Deus já preparou para nós uma vestimenta de justiça apropriada para cobrir o nosso pecado: a justificação que é por meio da fé em Jesus.
Adão e Eva não tiveram que pagar pela veste que Deus fez para cobri-los.
De igual modo a justiça de Jesus para todo pecador que nEle creia é também pela graça de Deus.
O pecador não tem nada que fazer senão somente aceitar a justiça que lhe está sendo oferecida gratuitamente por Deus.
Será o próprio Deus, pelo Seu poder, que justificará e salvará o pecador. Este, tão somente deve aceitar aquilo que Deus já preparou para ele.
Aqui nós temos então novamente a iniciativa soberana de Deus, dantes buscando o homem perdido no jardim, e agora preparando uma vestimenta de peles para Adão e Eva, e os vestindo.
Eles não haviam pedido isto, e nem sequer sabiam que era possível fazer uma vestimenta mais apropriada com peles de animais do que com folhas de figueira.
Eles não participaram disto.
Deus fez tudo sozinho. Assim são os meios de salvação.
Jesus consumou a Sua obra sozinho, sem qualquer participação do homem, quanto aos meios que são necessários para livrá-lo do pecado e torná-lo um filho de Deus. Ele agiu em graça para com o pecador.



Por Natureza e Não Por Hábito ou Costume

“E éramos por natureza filhos da ira, como também os demais.” (Ef 2.3)
O apóstolo afirma, conforme havia sido instruído por nosso Senhor Jesus Cristo quando recebeu dele o evangelho, que toda a humanidade se encontra perante Deus na condição de filhos desobedientes condenados à ira, e que isto se dá em razão da nossa própria natureza, e não meramente por praticarmos pecados habitualmente, como se tivéssemos, de nós mesmos, a capacidade e escolha de nunca os praticarmos.
Então, a verdade relativa à nossa condição é a de que não somos pecadores por hábito, por costume, mas pelo que somos em nossa natureza.
É a isto que comumente se chama de pecado original, pois aponta para a sua origem.
Ao usar o verbo ser na primeira pessoa do plural, o próprio apóstolo Paulo se inclui na referida condição em que todos se encontram naturalmente, antes de serem libertados por Cristo. Não que sejamos libertados completamente do pecado neste mundo, mas da ira de Deus em condenação, porque estando em Jesus a sua ira é desviada de nós, porque ele a recebeu em si mesmo em nosso lugar quando morreu na cruz do Calvário.
Ora, se o pecado é uma questão de natureza, e por se encontrar ligado ao nosso velho homem até o dia da nossa morte, como poderíamos ser salvos se não fosse por pura graça e misericórdia de Deus em relação a nós, por causa da nossa fé em Cristo? Como poderíamos ser salvos baseados em nossa própria justiça e méritos, quando aquilo que nos mata está ligado à nossa natureza, àquilo que somos em essência?
Por isso, somos salvos na esperança daquela santidade perfeita que haveremos de ter na glória celestial, e não por quaisquer boas obras que possamos fazer enquanto estivermos deste outro lado do céu.
Estas boas obras são a consequência e a evidência, mas não a causa da nossa salvação.
Vemos assim, que independentemente das grandes realizações de qualquer pessoa, que sem Cristo, esta continua sendo filha da ira tanto quanto aqueles que não têm se aplicado a viverem de modo justo.
Há no melhor dos homens a mesma mancha do pecado original que existe em todos os demais, e assim, somente o sangue de Jesus poderá limpá-lo, de modo a poder ser reconciliado com o Deus que é perfeitamente justo e santo.
Não há um justo sequer, de si mesmo, aos olhos de Deus. Todos necessitamos da justiça de Cristo para nos apresentarmos justificados diante dele.
Cabe portanto, e fica bem a qualquer pessoa, que ande em humildade perante o Senhor, independentemente do grau de santificação que tenha alcançado aqui embaixo, porque, ainda continua sujeita à ação do pecado, até que venha a dar o seu último suspiro aqui na Terra.




Xô Justiça Própria!
Quando insistimos em nos considerar pessoas muito boas e justas a nossos próprios olhos, agravamos e muito a nossa situação diante da justiça de Deus.
Porque temos uma natureza que foi derrotada pelo grande Inimigo de nossas almas, e que ficou sujeita ao seu poder.
Isto nos tornou impotentes para nos libertarmos deste jugo de escravidão do Inimigo e do pecado, quer pela nossa própria capacidade, quer da de quaisquer outras pessoas ou até mesmo dos anjos.
Importava que o Inimigo e o pecado fossem derrotados na mesma natureza terrena e humana que temos, e por isso Jesus se fez homem e foi achado na forma de servo, para que pudesse derrotar por sua impecabilidade, morte e ressurreição, tanto o diabo quanto o pecado.
De modo que pode livrar para sempre do jugo de servidão, a todos os que creem nele e que lhe obedecem para o trabalho de transformação de suas vidas à Sua própria imagem e semelhança.
Portanto, submetamo-nos à vontade do Senhor, e, sejamos humildes suplicantes de sua misericórdia e bondade.
Não há razão para permanecermos mortos espiritualmente, e debaixo da ameaça de uma condenação à morte eterna, por causa do nosso orgulho pecaminoso de não reconhecer que não podemos nos libertar a nós mesmos, e que somos dependentes totalmente da vida e do trabalho de Jesus Cristo para tal propósito.
A justiça própria não é uma amiga, senão a nossa pior inimiga, pois não permitirá jamais que recorramos humildemente ao socorro de Deus.
Abraão, que foi chamado de amigo de Deus, foi achado fiel, na medida em que ele se tornou obediente à palavra de Deus. E do mesmo modo que ele foi justificado pela fé e salvo, e o comprovou pela sua obediência, de igual modo também o seremos tanto quanto ele, na medida em que seguirmos o exemplo que ele nos deixou.
“Atos 26:15 Então, eu perguntei: Quem és tu, Senhor? Ao que o Senhor respondeu: Eu sou Jesus, a quem tu persegues.
Atos 26:16 Mas levanta-te e firma-te sobre teus pés, porque por isto te apareci, para te constituir ministro e testemunha, tanto das coisas em que me viste como daquelas pelas quais te aparecerei ainda,
Atos 26:17 livrando-te do povo e dos gentios, para os quais eu te envio,
Atos 26:18 para lhes abrires os olhos e os converteres das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus, a fim de que recebam eles remissão de pecados e herança entre os que são santificados pela fé em mim.”




O Pecado
Por John Bunyan
O pecado é um grande empecilho e obstáculo à nossa felicidade; é a causa de todas as misérias do homem, tanto no presente quanto no porvir. Removamos o pecado de nossa existência e nada nos afligirá, visto que a morte temporal, espiritual e eterna é o salário do pecado.
O pecado, e não o homem, é o objeto da ira de Deus. Quão terrível, portanto, deve ser a situação daquele que permanece no pecado, pois quem pode suportar e lutar contra a ira de Deus?
Nenhum pecado contra Deus pode ser considerado pequeno, visto que todo pecado é cometido contra o grande Deus do céu e da terra. Mas, se o pecador puder encontrar um Deus pequeno, será fácil encontrar pecados pequenos.
O pecado transforma a graça de Deus em libertinagem. O pecado é o desafio à justiça de Deus; é o rapto da sua misericórdia; é oescárnio da sua paciência; é o menosprezo do seu poder; é o desdém do seu amor.
Acautele-se de não se entregar à libertinagem de cometer um pecado, pois este o levará a outro, até que, por costume, o pecado se torne natural.
Começar a pecar é o primeiro passo em direção a continuar pecando; e a continuação é a mãe do costume, que, por fim, resultará em impudência.
A morte de Cristo nos proporcionou a melhor descoberta acerca de nós mesmos. Estávamos em tal condição que nada nos poderia ajudar, exceto a morte de Cristo e a descoberta evidente da terrível natureza de nossos pecados. Se o pecado é algo tão horrível, que traspassou o coração do Filho de Deus, como poderíamos dar apoio ao pecado?





O Pecado e o Evangelho

Quando em Lc 2.10, o anjo anunciou aos pastores: "eis aqui vos trago boa nova de grande alegria, que o será para todo o povo; é que hoje vos nasceu na cidade de Davi, o Salvador, que é Cristo o Senhor.", ficam em destaque pelo menos duas grandes verdades:
1 - A vinda de Jesus, o Senhor, ao mundo como Salvador é uma boa nova de grande alegria. E boa nova, boa notícia, é o significado literal da palavra evangelho no grego. Uma boa notícia é algo que traz alegria, como destacado pelo anjo em sua anunciação; e no caso, não se trata de uma alegria qualquer que está associada ao evangelho (boa nova), mas uma "grande alegria".
O fato de aqueles que não creem no evangelho, serem condenados eternamente no inferno, não é a boa nova do evangelho que é de grande alegria, mas a triste verdade de que qualquer pessoa, sem Cristo, está morta em seus pecados por causa do pecado original de Adão. E a grande alegria do evangelho é exatamente esta boa notícia de que em Cristo há salvação desta condição de morte espiritual por causa do pecado de Adão. Assim, a condenação eterna faz parte da verdade da Palavra de Deus quanto ao homem no seu estado pecaminoso, mas não do evangelho, no seu caráter de boa nova relativa ao livramento da referida condição.
2 - A segunda grande verdade na anunciação do anjo, é que esta boa nova é para todo o povo, isto é, não que todos serão salvos, mas que a salvação em Cristo está sendo oferecida por Deus a todas as pessoas. O evangelho é para ser anunciado a todos e não para alguns. Todo aquele que se arrepender dos seus pecados e crer em Cristo será salvo por dar crédito a esta boa nova e recepcioná-la em seu coração como verdade, pedindo a Cristo simplesmente pela fé nEle, que o perdoe dos seus pecados e o salve da condenação eterna.
A condenação eterna é portanto consequente da rejeição desta boa nova, que é a única forma do pecador se livrar da perdição eterna e se tornar filho de Deus.
O evangelho deve ser pregado portanto com o foco na missão de Cristo, consoante com este evangelho, que é a de salvar e não de condenar o mundo. O pecado, as consequências do pecado devem também ser pregadas não como parte do evangelho, mas como alerta quanto ao que sucederá àqueles que rejeitarem a salvação que está disponível a todos em Cristo Jesus.
É por isso que, quanto a este aspecto do dever de se pregar o evangelho a todos, isto é, de lhes tornar conhecida a verdade que Cristo veio ao mundo para salvar os perdidos, e que ele salvará de fato a todo e qualquer pecador que se arrependa e creia nEle, é que erram os que são conhecidos por hipercalvinistas, na sua tentativa de fazer com que todas as verdades do evangelho se enquadrem, segundo eles, com o desejo de Deus de salvar somente os eleitos, e não a todos os homens, contrariando o ensino claro da Bíblia de se anunciar o evangelho a toda criatura debaixo do céu, e quanto ao desejo de Deus de que todos se salvem (Rom 9.22-24; I Tim 2.4; II Pe 3.9) pois que de fato é esta a Sua vontade que não tem prazer na morte do ímpio, antes que ele se converta e viva (Ez 18.23), pois que antes de tudo, Deus é em Sua própria essência, amor, bondade, benignidade, misericórdia, e prova isto através da morte de Jesus na cruz, e o perdão eterno que é oferecido gratuita e livremente pela simples fé no Seu nome, mesmo ao pior dos pecadores.
Os chamados hipercalvinistas afirmam que é inútil pregar o evangelho aos que estão mortos, contrariando a promessa e o poder de Deus que afirma que dá vida aos que estão mortos.
Os mortos quando ouvem a voz de Cristo tornam a viver.
Há pastores que dizem que se deve somente falar do estado de miséria do pecador, e advertir-lhe, porém não deve ser convidado a vir a Cristo. A estes pastores podemos dizer que terão que passar pelo outro lado, como o sacerdote da parábola do bom samaritano, porque não têm de fato boas novas para o pobre infeliz pecador.
O hipercalvinismo, que retira de nós a obrigação de pregar o evangelho, por crer que Deus fará sozinho a obra de salvação dos eleitos, reduz as igrejas à inatividade ou as leva à paralisia completa. Eles dizem: "Deus tem um propósito que se cumprirá sem dúvida alguma, portanto, não nos moveremos nem um palmo. Todo poder está nas mãos de Cristo, portanto estaremos calados e quietos.". Porém o que Cristo afirma é que "Todo o poder me é dado nos céus e na terra, ide portanto e fazei discípulos de todas as nações.". Em outras palavras: Movam-se, façam algo, preguem o evangelho a todos em todas as nações, para levar a minha salvação aos perdidos.
Afinal, quando Jesus derramou o sangue precioso da Nova Aliança, revelada a Abraão, não foi para comprar umas poucas centenas de almas, ou para redimir um punhado de pessoas, mas derramou o seu sangue por uma multidão que não se pode contar, e que é mais numerosa do que as areias do mar.
Esta mensagem de que Cristo salva tão somente por olharem para Ele (Is 45.22) os pecadores com os olhos da fé, crendo em seus corações que Ele é o Salvador e Senhor, pedindo-lhe para que os aceite, isto é para serem salvos, é a mensagem do evangelho que deve ser pregada. A mensagem do evangelho é a única rede com que podemos ser pescadores de homens. É com esta rede que apanhamos os peixes para Deus. Mas se esta mensagem não for pregada com o poder do Espírito Santo (I Tes 1.5; I Cor 2.4; 4.20) e acompanhada pelo trabalho do Espírito Santo nos corações dos que a ouvem, os peixes não serão atraídos para dentro da rede. Poderemos trabalhar a noite inteira e não capturaremos nada. Nenhum peixe. Porque é o Espírito Santo que dirige e atrai os peixes para dentro da rede que lançamos.
Estas verdades estão colocadas de modo bastante claro na epístola de Paulo aos Romanos.
Quando lemos o texto de Romanos 5.15-21, em conexão com I Cor 15.21,22, a conclusão a que chegamos, pode ser traduzida nas seguintes palavras:
Eu não estava lá quando Adão pecou e recebeu a sentença de morte eterna, mas Deus considerou como que se eu estivesse lá e eu morri em Adão, mas eu também não estava lá no Calvário quando Cristo morreu e ressuscitou, mas Deus também, pela fé nEle, considerou como que se eu estivesse na cruz, e a morte e a ressurreição de Cristo foi também a minha morte e ressurreição, para livramento da condenação e para ter vida eterna.
Graças a Deus pelo seu plano de salvação, pois sem que eu nada fizesse herdei de Adão o dom do pecado e da morte, mas também sem nada fazer, recebi pela graça, mediante a fé, como co-herdeiro com Cristo, o dom da santidade, da vida, da justiça.
Realmente é maravilhosa a graça de Jesus que o levou a experimentar o sofrimento, a injúria, a morte, por amor de mim pecador. Não foi por nenhum pecado nEle mesmo que Ele sofreu e morreu, mas por ter escolhido livremente se identificar com os pecadores, experimentando a morte no lugar deles, a morte que eles mereciam, a morte que era deles, para que pudessem ter a dívida dos seus pecados perdoada, e pudessem participar da Sua própria vida.
Assim, há pecado no desobediente Adão, mas há justiça no obediente Cristo. Em Adão há condenação e morte, mas em Cristo há salvação e vida. Há morte no mundo, por causa de Adão, mas também há opção de vida em Cristo Jesus. Há juízo para condenação no mundo, por causa de Adão, mas também há graça e livramento da condenação, em Cristo. E há muito mais suficiência de graça, por ser eterna e rica porque procede de Deus, do que há pecado, porque procede do homem e está limitado ao tempo, e está destinado a ser inteiramente destruído por Deus. Por isso se diz que onde abundou o pecado, superabundou a graça.
Se recebemos o pecado como um dom de Adão, temos recebido também como um dom de Cristo a Sua justiça, para que não sejamos mais servos do pecado, mas servos da justiça.
Cristo libertou de fato o crente da escravidão do pecado pela sua fé nEle. E crer nEle para a salvação é crer que a temos por causa da Sua morte e ressurreição no nosso lugar. Ele morreu por nós para que pudéssemos morrer para o pecado e para a condenação da lei. E Ele ressuscitou dos mortos para que possamos também ressuscitar dentre os mortos. Pela fé somos unidos a Ele tanto no que se refere à Sua morte, quanto à Sua ressurreição e vida. Fomos livrados do pecado para que pudéssemos ser feitos servos de Deus, da justiça de Deus.
Romanos 6.17,20 ensina claramente que o crente já não é mais escravo do pecado, consoante o ensino de Jesus sobre esta verdade em João 8.34-36.
Em razão da libertação da escravidão do pecado para sempre; o crente foi feito também simultaneamente, servo da justiça para sempre, conforme se afirma em Romanos 6.18. É por isso que agora, tendo sido feito um servo da justiça, que o crente se preocupa permanentemente sobre o modo de vida que agrada a Deus. Eles sentem as dores e as consequências da quebra da comunhão com Deus quando pecam, porque já não são mais escravos do pecado, e sim da justiça. É por isso que são convocados a servirem agora o seu novo senhor chamado justiça (Romanos 6.19).
O pecado não tem realmente mais domínio absoluto sobre a vida do crente porque ele foi libertado da escravidão ao pecado por Cristo. O crente não precisa necessariamente ficar sujeito aos comandos do pecado que opera na sua carne ordenando-lhe que desobedeça aos mandamentos de Deus, que se rebele, que minta, furte, cobice, adultere, odeie, não ore, não ame, que se deprima, que fique ressentido, ansioso etc, porque o pecado já não é mais o seu senhor, como era antes de ter sido libertado dele por Cristo. Pois que morreu também para o pecado quando morreu juntamente com Cristo. E pela Sua graça é impelido agora a praticar a justiça do Reino. A justiça de Cristo que lhe ordena que ore, confie, espere, obedeça, suporte, seja sincero, verdadeiro, honesto, fiel, que ame, seja manso, tenha domínio próprio, descanse em Deus, não fique turbado, ansioso, magoado, ressentido, antes que perdoe, assim como Deus o perdoou em Cristo.
O crente foi livrado portanto de um cativeiro, para outro cativeiro. Do cativeiro do pecado, para o cativeiro da justiça. E ser servo da justiça é ser verdadeiramente livre. Porque é nesta condição que pode agora, e poderá perfeitamente no porvir, fazer toda a vontade de Deus. E fazer esta vontade é ter o poder para fazer somente aquilo que é bom e aprovado. É nisto que consiste a verdadeira liberdade. A de ser e fazer aquilo que foi planejado por Deus para que sejamos e façamos. Isto é, ser homem, ser filho de Deus, na verdadeira acepção da palavra. Cristo conquistou esta liberdade para os filhos de Adão caídos e cativos no pecado, pela identificação deles, pela fé, com a Sua morte, ressurreição e vida. Libertados agora do pecado, são verdadeiramente livres para poderem fazer a vontade de Deus.
Daí se dizer em Romanos 6.14 que: "o pecado não terá domínio sobre vós; pois não estais debaixo da lei, e, sim, da graça.".


Pecado, Justiça, Juízo
Em I Tim 1.20 lemos: “E dentre esses se contam Himeneu e Alexandre, os quais entreguei a Satanás, para serem castigados, a fim de não mais blasfemarem.”.
Satanás como arqui inimigo de Deus pode servir aos propósitos elevados de Deus para produzir danos e sofrimentos tanto a crentes quanto a descrentes, tanto para motivo de juízo contra o pecado, quanto para o aperfeiçoamento dos santos em suas tribulações. No texto destacado, temos um exemplo de pessoas a quem Paulo entregou nas mãos do diabo para serem castigadas.
Isto não significa que havia ou há qualquer sociedade amigável entre luz e trevas, entre Cristo e Belial, mas, como já dissemos, Satanás cumpre os propósitos de Deus em seus juízos e decretos.
No caso de Himeneu e Alexandre, quando foram submetidos à sentença de serem entregues a Satanás, está em vista o fato de pessoas que já vinham satisfazendo aos desejos do inimigo, por blasfemarem, e assim, sendo entregues formalmente ao diabo, isto significava que eles ficavam fora da proteção que Cristo dá àqueles que estão no Seu corpo. É assim, que mesmo incrédulos, quando estão associados a um crente fiel, por casamento ou filiação, eles são santificados pela parte crente, isto significando principalmente que se tornam partícipes de benefícios da parte de Deus, especialmente da Sua proteção, por estarem ligados a um crente, por laços de matrimônio ou filiação.
Mas, não há condição de proteção plena como a de estar unido ao corpo de Cristo que é a igreja. Ali, em comunhão com seus irmãos, o crente está na condição de ser protegido do mal, de receber força e graça para vencer a tentação, conforme a ministração do Espírito Santo. Mas, uma vez cessada esta condição, pela exclusão formal do corpo por um ato de disciplina, ele ficará sujeito ao livre ataque das trevas sem que tenha a graça para resistir a estes ataques, até que se arrependa e retorne à comunhão.
Agora, isto é uma forma de considerar a questão genericamente, e há muitos outros aspectos a serem considerados quanto a isto.     
Toda a humanidade não remida está caída no pecado e a Bíblia nos fala em I Jo 5.19 que o mundo inteiro jaz no maligno. Além disso, Rom 1.18 a 32 diz porque o homem está debaixo do pecado: porque Deus permitiu. Deus os entregou a uma mente réproba para praticarem todas as formas de mal. Não foi Deus que tentou o homem ao pecado, não foi Ele quem lhe ensinou a pecar, ou que o tenha criado para pecar, mas o próprio homem se desvia da luz, da verdade, de Deus, e Ele os deixou entregues a isto, como uma forma de juízo sobre este estado de desobediência latente que há em toda pessoa.
O que João quer dizer então com que todo o mundo jaz no maligno, é que Deus abandonou a raça humana em pecado sob o poder de Satanás. E somente em Cristo o homem pode ser livrado desta condição. Em Ef 2.2 se afirma que todas as pessoas não remidas estão mortos em transgressões e em pecados, e que caminham de acordo com o curso deste mundo, de acordo com o príncipe do poder do ar que é chamado o espírito de desobediência que trabalha neles. A raça humana inteira não remida está sob o poder de Satanás.
Quem são então esses que são entregues a Satanás? Esses são aqueles que uma vez tendo sido livrados do seu poder em Cristo, foram por motivo de desobediência, sujeitados de novo ao poder do inimigo sobre suas vidas para efeito de juízo temporal, de modo a ficarem excluídos dos benefícios da graça de Deus que são derramados abundantemente sobre aqueles que permanecem em comunhão com o Seu Senhor. Vemos que para isto não há necessidade da proclamação formal de um ato de excomunhão, porque não são poucos os crentes que abrigam pecados ocultos gravíssimos que são desconhecidos da Igreja, mas não são desconhecidos de Deus, e ficam, assim, por Ele excluídos da Sua comunhão e sujeitados à destruição da carne pelo inimigo, apesar de participarem da unidade visível da igreja frequentando os seus trabalhos e o culto público.
Assim, estar identificado com uma comunidade resgatada pelo sangue de Jesus, é achar um porto seguro contra a fúria plena dos ataques de Satanás. E vimos que mesmo incrédulos associados por laços de matrimônio e filiação a crentes se tornam alvo desta proteção de Deus, por amor daqueles que são Seus.
Assim, é o crente ou algum destes incrédulos que são membros de um lar onde haja um marido ou esposa crente, que podem ser entregues a Satanás.
Paulo instruiu Timóteo que ele teria que entregar a alguns da igreja de Éfeso a Satanás, assim como ele havia fixado o seu próprio exemplo no verso 20, sobre o que havia feito com Himeneu e Alexandre.
A igreja é um porto maravilhoso, um lugar de proteção para crentes, e até mesmo um lugar onde os incrédulos podem vir e achar um certo livramento da fúria de Satanás. Mas a Bíblia é muito clara também, em mostrar que em razão dos propósitos de Deus há tempos e há pessoas que são entregues ao domínio de Satanás.
Entregue a Satanás para provar a autenticidade e o caráter da fé, para manter em humildade e em dependência do Senhor e para outros Propósitos Soberanos de Deus Relativos ao Aperfeiçoamento dos Santos
Veremos primeiro algumas passagens bíblicas em que o próprio Deus entregou crentes piedosos ao Inimigo para cumprir neles os Seus santos e elevados propósitos.
Ele faz isto conforme a Sua própria soberania, como vemos ilustrado na vida de Jó. E Jó não era somente um bom homem, ele era o melhor dos homens em seus dias, um homem reto que honrava Deus com tudo na sua vida, um homem íntegro, um homem que temia a Deus e que se desviava do mal. E ainda assim ele foi entregue a Satanás e a Satanás foi permitido destruir todas as suas posses, todos os seus dez filhos e até mesmo provocar uma doença terrível no seu corpo.
E Jó realmente não entendeu por que isto aconteceu. Mas nós sabemos porque Jó foi entregue a Satanás, porque através do seu testemunho na aflição Deus pôde provar que o amor por Ele de um crente autêntico e piedoso como Jó, é verdadeiro, e que a fidelidade a Ele não é dependente de circunstâncias. O argumento de Satanás contra Jó era o de que Ele era interesseiro e que amava a Deus por conveniência de todo o bem que dEle havia recebido. E o amor e a fé de Jó foram provados quando foi entregue por Deus a Satanás, e o diabo foi envergonhado.
O Inimigo deve ter estremecido quando Jó disse que ainda que Deus o matasse continuaria confiando nEle. E também quando disse à vista do sepultamento dos seus sete filhos e três filhas, que Deus havia dado e havia tomado, e que louvado fosse o nome do Senhor, tendo-Lhe adorado.
Foi também para testemunho e para cumprimento do propósito eterno de Deus que o próprio Jesus foi entregue a Satanás, tanto na tentação no deserto, quando da sua prisão, humilhação e morte na cruz. Ele foi conduzido ao deserto pelo próprio Espírito Santo para ser tentado pelo diabo.
Em II Cor 12 nós vemos o apóstolo Paulo sendo entregue a Satanás, a um mensageiro do diabo para esbofeteá-lo, ao que ele chamou de espinho na carne. E Paulo disse que se gloriava nisso, porque na Sua fraqueza o poder de Jesus foi aperfeiçoado, sendo-lhe ensinado e comunicado o inteiro poder da graça para nos sustentar contra as investidas do diabo. Mas Deus sempre coloca limites à ação do inimigo. Assim como Ele pôs limites na ação de Satanás contra Jó, Ele também colocou tais limites na experiência de Paulo e na de todos os Seus servos aos quais chama para serem assim provados, por se permitir que o inimigo lhes inflija sofrimentos por um determinado tempo.
Com isto, Deus nos faz conhecer melhor o nosso inimigo, aquele contra o qual lutamos.
Pedro também foi entregue a Satanás em certa ocasião. Jesus disse que ele havia pedido Pedro para peneirá-lo como trigo, e pela afirmação de Jesus vemos que isto não lhe foi negado, porque o Senhor disse apenas que havia intercedido em favor de Pedro para que a sua fé não desfalecesse (Lc 22.31).
Pedro foi entregue a Satanás, não porque ele tivesse cometido algum pecado voluntarioso ou por ter vivido numa atitude de rebeldia desafiante e reticente, porque Jesus lhe disse que quando ele se convertesse, que ele fortalecesse os seus irmãos. Isto não significa que Pedro não fosse um crente convertido, mas que quando ele saísse de sua experiência de prova, voltando de novo à plena comunhão com Deus, que ele fortalecesse outros crentes que estivessem passando por dificuldades severas, assim como ele tinha vivido em sua própria experiência pessoal.
Em Mt 24.21,22 nós vemos Jesus falando sobre aqueles que sofrerão durante a Grande Tribulação, próximo e antes da Segunda Vinda de Cristo. Em Apo 6 nós os vemos clamando porque eles foram mortos naquela Tribulação. Haverá crentes privados de comida, privados de água, privados de trabalho, privados das suas vidas durante a Tribulação, quando serão entregues a Satanás pela mediação do Anticristo, que espalhará a destruição por todas as partes do globo.
Mas você vê a esses mesmos santos resgatados no capítulo 7 de Apocalipse, onde aparecem saídos da Tribulação, depois de terem tido as suas vestes lavadas no sangue do Cordeiro e se diz que eles sempre estarão dia e noite diante do trono do Senhor louvando-o e servindo-O. E eu creio que isto está dizendo que haverá uma geração inteira de crentes que será entregue à fúria de Satanás na Tribulação de forma que quando eles forem livrados disso, eles terão um nível de louvor a Deus que pode exceder todas as outras gerações resgatadas. Assim, Deus receberá louvor no final das contas daqueles que sofrerão muito porque a libertação deles será grande e muito gloriosa.
A igreja de Esmirna foi entregue a Satanás, conforme se lê em Apocalipse 2.10, que estava para lançar alguns deles na prisão, para serem postos à prova e teriam tribulação de dez dias, e o Senhor lhes animou dizendo que não temessem as cousas que teriam que sofrer. Isto não foi evidentemente por motivo de juízo de pecado, mas para que o nome de Deus fosse glorificado.
Nós vemos então por estas poucas ilustrações que verdadeiros crentes, o melhor dos crentes, líderes como Jó, Paulo e Pedro, congregações como a igreja de Esmirna, e aqueles que se converterão na Tribulação, podem ser entregues a Satanás para os propósitos soberanos de Deus, para provar a autenticidade e o caráter da sua fé, para mantê-los humildes e dependentes do Senhor, para permitir que possam fortalecer a outros que passam por tentações, encorajando-os a se fortificarem na graça que está em Jesus, e para a finalidade de louvor ao longo da eternidade porque eles foram livrados do Inimigo para receberem uma recompensa eterna.
Entregue a Satanás para Juízo
Mas, há um outro aspecto de ser entregue a Satanás, como já comentamos no início em relação a Himeneu e Alexandre. Estes dois homens não foram entregues a Satanás para que eles pudessem provar a verdade da sua fé, não para que pudessem se manter humildes e dependentes, não para poderem fortalecer outros, não para que eles pudessem receber uma coroa de vida, não para que louvassem a Cristo por toda a eternidade. Não, eles foram entregues a Satanás para julgamento... isso é diferente... para julgamento. E a Bíblia ilustra neste caso e em outros semelhantes.
Saul foi um exemplo vivo desta verdade no Antigo Testamento. Desde que o Espírito do Senhor retirou dele a unção que lhe havia sido dada para governar Israel, diz-se que um espírito maligno passou a atormentá-lo, e que este espírito procedia da parte do Senhor, isto é, pela vontade de Deus que assim fosse para julgamento dos desatinos e rebeliões de Saul.
Tendo sido entregue a Satanás para juízo, Saul foi atormentado pelo demônio que Satanás despachou sobre ele até a sua morte.
Em Jo 13.27 vemos também Judas sendo entregue a Satanás que entrou nele para trair Jesus. Judas tinha estado com Jesus durante três anos. Judas tinha visto tudo que Ele fez, ouviu tudo o que Ele disse, assistiu os milagres, Judas que não podia negar a veracidade de Cristo, Judas que não podia negar a perfeição de Cristo nem o poder de Cristo rejeitou tudo. Mas o horário divino estava fixado e Deus entregou Judas a Satanás. Ele tinha sido parte da comunidade dos Apóstolos. Ele tinha sido separado da fúria plena de Satanás por causa da proteção daquele grupo que Deus tinha abençoado pela presença do Seu Filho, mas agora ele está fora daquele grupo. Ele é entregue a Satanás.
Ele saiu possuído por Satanás, e vencido pelo remorso e pelo diabo colocou uma corda em seu pescoço e se suicidou. Satanás tinha destruído Saul até a morte, e agora destrói também a Judas da mesma forma.
No quinto capítulo de Atos lemos o que ocorreu com Ananias e Safira, que haviam mentido ao Espírito Santo dizendo que venderam uma propriedade por tanto e que haviam ofertado cem por cento do fruto da venda. Entretanto isto não era verdade, e ambos foram entregues a Satanás para destruição da carne, e expiraram naquele mesmo dia, sobrevindo grande temor à igreja.
A soberania de Deus determinou que ambos fossem destacados como exemplo que não se deve mentir ao Espírito, que se deve andar na verdade, porque a prática do pecado, mesmo no caso de crentes, sujeita à morte, ainda que não à morte eterna.
Não há porque duvidar que eles fossem autênticos crentes, pois que ambos mentiram ao Espírito Santo, e como pode alguém mentir para Ele se não for um crente? Ele não havia falado a Ananias que vendessem a propriedade e que dessem o dinheiro aos apóstolos, como o próprio Pedro afirma. Eles mentiram no entanto, pelo que se infere, debaixo do poder do Espírito. Eles afirmaram ao Espírito que fizeram uma coisa quando no entanto tinham feito outra. E este foi o motivo do juízo que veio sobre eles.
O que se aprende disto é que quando o crente se deixa vencer pelo pecado ele corre o risco de ser entregue por Deus a Satanás para destruição da carne, isto é, para propósitos corretivos e de julgamento do pecado. Este é o tipo de risco que não vale a pena correr. Deus em Sua soberania poderá apanhar alguém nesta condição quando a pessoa pode estar pensando que por estar sob a graça de Jesus está livre desta situação.
No entanto, não é isto que vemos na experiência prática e nos exemplos fixados na Bíblia. Quantos não foram entregues a Satanás para destruição da carne na igreja de Corinto, sendo enfermados e mortos? Paulo chega a destacar o exemplo de um crente que estava tendo relações sexuais com sua madrasta.
A questão não é que isto seja estabelecido pelo grau do pecado cometido, mas pelo exercício da soberania de Deus.
Paulo admoestou a igreja de Corinto dizendo que aquele que havia tido relações com a sua madrasta deveria ter sido excluído da comunhão sendo entregue a Satanás. Mas como eles não o fizeram, ele determinou que o fizessem porque era isto o que deveria ser feito naquele caso, para que não desfrutasse da proteção da igreja.
Ele devia ter sido sujeitado ao processo disciplinar descrito em Mateus 18, e ser considerado um pagão e cobrador de impostos pela igreja, depois de ter sido desligado do rol de membros. E era o que estava sendo feito agora segundo ordem do apóstolo.
Em II Tes 3.6 lemos: “Nós vos ordenamos, irmãos, em nome do Senhor Jesus que vos aparteis de todo irmão que ande desordenadamente, e não segundo a tradição que de nós recebestes.”.
E, no verso 14: “Caso alguém não preste obediência à nossa palavra dada por esta epístola, notai-o, nem vos associeis com ele, para que fique envergonhado.”.
Mas isto deve ser feito não por motivos pessoais e com um coração endurecido, porque o amor e a paz devem acompanhar o juízo. Daí também se dizer no verso seguinte (15): “Todavia, não o considereis por inimigo, mas adverti-o como irmão.”.
Há pessoas que nem chegam a passar pelo processo de disciplina porque o Senhor mesmo as coloca para fora da igreja em razão da vida desordenada que levam no pecado, e assim as entrega a Satanás, e não as vemos mais por um longo período frequentando o culto público, e ficamos sabendo posteriormente da tragédia em que se transformou as suas vidas, quer no casamento, quer na prática de imoralidade, embriaguez e todos os tipos de coisas que Satanás usa para destruir a carne daqueles que estão sujeitados por Deus à disciplina da aliança.
Deus não permite que um pouco de fermento levede toda a massa. E ordena à igreja que lance fora todo fermento velho porque a igreja é uma nova massa sem fermento.    
Mas, quando um verdadeiro crente é entregue a Satanás para destruição da carne, esta destruição é limitada por Deus, assim como foi com Jó, Paulo e Pedro. Satanás pode destruir a carne, mas o espírito será salvo no dia do Senhor.
Pedro alerta a igreja para a necessidade de ser sóbrio e vigilante porque o diabo anda em derredor como leão que ruge procurando alguém para devorar. E quem é que ele devora? Aquele que lhe é entregue por não ser sóbrio e vigilante, por não resistir às suas tentações com firmeza de fé, com paciência em seus sofrimentos (I Pe 5.6,9). O crente está sendo aperfeiçoado por Deus nas tribulações, em meio a sofrimentos (v 10), e há um modo com que o crente deve viver para que não seja devorado pelo inimigo, que fica espreitando quem cairá de sua firmeza de fé, e deixará de viver de modo sóbrio e vigilante, para que estando agora vivendo deliberadamente em pecado, lhe seja entregue para destruição da carne. E ele, ao que parece, tem muito prazer em causar dores e sofrimentos aos crentes, não por motivo de justiça, para corrigi-los, longe dele tal pensamento, mas para se vingar de Deus, para trazer dores ao seu coração de Pai, por trazer seus filhos em mau testemunho de vida, e por inflingir-lhes toda sorte de males, sabendo que não os terá no inferno consigo. Então tudo fará para lhes causar o maior sofrimento que lhe seja possível, e ele sabe muito bem que há um modo de lhes fazer sofrer por motivo de tristeza e má consciência, seduzindo-os à prática do pecado.
Tal já não ocorre com o crente que lhe é entregue por motivo de provação da sua fé, pois quando aprovado, quem sai com dano é o próprio diabo, e o nome de Deus é glorificado, e o crente tem motivo de regozijar-se com muita alegria em sua tribulação.
Uma forma segura para não ser entregue a Satanás por motivo de juízo é viver segundo a sã doutrina. É honrar, amar e praticar a Palavra de Deus. É algo muito perigoso, pior do que brincar com fogo, o ato inconsequente de ter a Palavra de Deus por nada e distorcer o seu reto ensino. O próprio Senhor adverte sobre este perigo e determinou que nada lhe fosse acrescentado ou retirado. Em Apocalipse ele ameaça trazer as pragas descritas naquele livro sobre aquele que adulterasse a Sua Palavra. O Senhor vela sobre a Sua Palavra para a cumprir e não terá por inocente aquele que a adulterar.
Daí o conselho de Paulo a Timóteo em II Tim 2.15-19, concitando Timóteo a sempre contrastar o seu procedimento com o daqueles que estavam sendo entregues a Satanás por motivo de adulterarem a Palavra de Deus como Himeneu e Fileto, que assim fazendo, estavam pervertendo a fé de alguns na igreja. Paulo afirma expressamente que ambos não eram conhecidos como parte do povo do Senhor porque estavam ligados à injustiça. Todo crente autêntico que professa o nome do Senhor deve se apartar da injustiça.
“Recomenda estas cousas. Dá testemunho solene a todos perante Deus, para que evitem contendas de palavras que para nada aproveitam exceto para a subversão dos ouvintes. Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade. Evita igualmente os falatórios inúteis e profanos, pois os que deles usam passarão a impiedade ainda maior. Além disso a linguagem deles corrói como câncer; entre os quais se incluem Himeneu e Fileto. Estes se desviaram da verdade asseverando que a ressurreição já se realizou, e estão pervertendo a fé a alguns. Entretanto o firme fundamento de Deus permanece, tendo este selo: O Senhor conhece os que lhe pertencem. E mais: Aparte-se da injustiça todo aquele que professa o nome do Senhor.” (II Tim 2.14-19).       
Vemos então que o modo de viver saudável física e espiritualmente é obedecendo a Palavra de Deus, temendo o Senhor e o honrando. Será portanto bastante inócuo repreender o diabo com palavras quando se está vivendo deliberadamente no pecado. É possível que ele tenha tomado autoridade sobre nós por termos sido entregues a ele por motivo de juízo. Em I Cor 11.30-32 Paulo diz que havia muitos crentes fracos, doentes e morrendo por estarem sendo julgados pelo Senhor, que estava deixando o diabo matá-los e adoecê-los, e certamente enfraquecendo a muitos mental, espiritual e emocionalmente, sujeitando-os a depressões e a todo tipo de desordem psicológica.
Podemos resumir então que há vários motivos para ser entregue a Satanás. Podem ser por amor ao Senhor, como Jó. Pode ser por nossa própria causa para que possamos manter a humildade e a dependência da graça do Senhor, como Paulo em II Cor 12. Pode ser para fortalecer a outros como no caso de Pedro. Pode ser por causa do desejo de Deus recompensar e dar uma coroa de vida. Pode ser para produzir grande louvor depois da tribulação.
Mas por outro lado, pode ser por causa de castigo como no caso do incestuoso de Corinto, ou de Ananias e Safira. Pode ser para castigar até a morte como no caso da igreja de Tiatira em Apo 2, por cometer fornicação e dar ouvidos a falsa doutrina. Também pode ser por causa de julgamento final, para perdição eterna como no caso de Saul, Judas, Himeneu, Alexandre e Fileto.
Acidentes e Tribulações nem sempre São Resultantes de Juízos Diretos de Deus
Há vários outros aspectos bíblicos a serem considerados sobre pecado, justiça e juízo.
Em Tiago 2.12 lemos: “Falai de tal maneira e de tal maneira procedei, como havendo de ser julgados pela lei da liberdade.”.
E em Tiago 4.11,12: “Irmãos, não faleis mal uns dos outros. Quem fala mal de um irmão, e julga a seu irmão, fala mal da lei, e julga a lei; ora, se julgas a lei, não és observador da lei, mas juiz. Há um só legislador e juiz, aquele que pode salvar e destruir; tu, porém, quem és, que julgas ao próximo?”.
Devemos ser muito cuidadosos e criteriosos em não sair estabelecendo julgamentos apressados e falsos, especialmente sobre os servos de Deus que passaram ou estão passando por situações aflitivas e calamitosas, por considerar que sejam motivados em razão de castigos do Senhor de possíveis pecados daqueles que estão passando por tais experiências.
Quando os discípulos perguntaram a Jesus se certa pessoa era cega de nascença em razão de Deus ter castigado nela o pecado dos seus pais, Jesus respondeu que não.
No caso de Jó que perdeu em um só dia sete filhos e três filhas, isto não se deu porque Deus estivesse visitando a sua iniquidade nos seus filhos. Como poderia ser isto se o próprio Deus testemunhou dele dizendo que não havia homem igual na terra, pois que era íntegro, reto e temente a Deus, e que se desviava do mal (Jó 1.8).
A mão poderosa e soberana do Senhor age como Lhe apraz e Ele permitiu que Jó fosse entregue a Satanás para destruição da carne, não por motivo de castigo, mas porque Ele é o Deus que faz o que quer com o que Lhe pertence, para cumprir seus propósito elevados e santos.
Ora, que diremos à face destas coisas? Continuaremos julgando no lugar de Deus as coisas que sucedem a irmãos piedosos, afirmando que estão sendo castigados por Deus por estarem passando por tribulações? Seríamos tão néscios ao ponto de desconsiderarmos os muitos testemunhos que existem na Palavra de que nem todo sofrimento é motivado por juízos de Deus? Ou continuaremos agido como os amigos de Jó que lhe atribuíram falta por estar passando por tudo o que sofreu?
Somos chamados a ser judiciosos e criteriosos especialmente nestas coisas, porque Deus é soberano e tem muitos outros propósitos nas tribulações e aflições do que o de visitar as nossas iniquidades, como já enfocamos alguns aspectos e continuaremos estudando ao longo destas nossas reflexões, onde falaremos sobre os Seus juízos que são muito amplos e abrangentes, e para propósitos variados.    
Atos 1.7 “Respondeu-lhes: A vós não vos compete saber os tempos ou as épocas, que o Pai reservou à sua própria autoridade.”.
Deus tem reservado à sua exclusiva autoridade, isto é, à Sua soberania, quanto à forma de aplicar os seus decretos, e não compete ao homem legislar estabelecendo normas fixas de aplicação de princípios relativos às áreas em que Deus determinou e reservou à sua própria autoridade, tais como os tempos ou as épocas referentes às dispensações de juízos para propósito variados.

Visitação da Iniquidade dos Pais nos Filhos

Uma outra destas áreas é claramente a de visitação da iniquidade dos pais nos filhos.
Nem ainda na Nova Aliança em que se diz que os dentes dos filhos não ficarão embotados em razão de os pais terem comido uvas verdes foi tal visitação da iniquidade dos pais nos filhos revogada, porque diz respeito ao próprio caráter de Deus, e Ele aplica isto conforme a Sua soberania, conforme o tem reservado à sua própria autoridade.
No Antigo Testamento, vemos Davi sendo castigado com a perda do primeiro filho que tivera com Bate-Seba, em razão do seu pecado. A sua iniquidade foi visitada no seu bebê. Mas um outro filho de Davi com Bate-Seba, Salomão, foi o indicado por Deus para assumir o trono de Israel no lugar do seu pai.
Mas, alguém perguntará: “Por que então tem Deus afirmado mesmo no Velho Testamento que o filho não morreria no lugar do pai, e que a alma que pecasse essa morreria?” E também, fica na mente de alguns uma segunda indagação: “Por que também afirmou que na Nova Aliança não mais se diria que os pais comeram uvas verdes e os dentes dos filhos é que ficaram embotados?”.
Em primeiro lugar, quanto à primeira questão, cabe destacar que a Antiga Aliança continha mandamentos e leis civis, cerimoniais e morais. A lei civil continha prescrições que configuravam a constituição civil da nação de Israel, isto é, enquanto sob aquela aliança, a nação de Israel, como uma teocracia, estava obrigada a cumprir em seus tribunais aquelas ordenanças para regular a vida em sociedade daquele país. Ora, assim, nenhum juiz poderia sentenciar qualquer pessoa à pena de morte, em razão de algum delito praticado pelos seus pais, nem vice-versa.       
No entanto, retira-se daí um princípio ou verdade espiritual, de que ninguém será condenado à morte eterna em razão de pecados cometidos por outrem, porque quanto a isto a responsabilidade é individual. Cada um responderá por si mesmo diante do tribunal de Deus. O que se arrepender e crer será salvo. O que não o fizer será condenado. É o que se ensina claramente no evangelho.
Quanto à segunda questão colocada, deve ser dito que tendo sido a Antiga Aliança feita com todas as gerações de Israel enquanto durasse aquele pacto, até que fosse revogado e substituído pela Nova Aliança, Deus trabalharia com a nação de Israel de uma forma muito distinta, especialmente para preservá-la da contaminação com as nações pagãs. Assim determinou juízos especiais, como subjugação dos israelitas por povos estrangeiros, quer na forma de tributação, cativeiros etc; quer trazendo juízos cataclísmicos, enfermidades e pestes, e sob outras formas, tanto sobre o conjunto da nação quanto sobre grupos de pessoas ou mesmo individualmente. Muitos dos juízos de Deus que sobrevinham aos israelitas de forma ampla e devastadora, conforme relatos que encontramos na quase totalidade do Antigo Testamento tinham a ver com o cumprimento das maldições previstas na Antiga Aliança, onde Deus revela claramente os tipos de juízos que traria sobre Israel no caso de desobediência à aliança.
Mas vemos também o Senhor visitando a iniquidade dos pais nos filhos, conforme havia revelado a Moisés porque isto faz parte do Seu caráter (Êx 34.7: “que usa de beneficência com milhares; que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado; que de maneira alguma terá por inocente o culpado; que visita a iniquidade dos pais sobre os filhos e sobre os filhos dos filhos até a terceira e quarta geração.”).
Por exemplo, no Antigo Testamento Acã foi destruído em razão do seu pecado, mas também junto com ele a sua família e servos. O pecado foi dele, mas, outros pagaram pela sua transgressão. A forma como a situação foi tratada e conduzida por Deus até a execução da sua sentença contra eles, respondia tipicamente à consumação das maldições prescritas contra os rebeldes de Israel sob aquela aliança. Um homem pecou transgredindo uma ordem expressa de Deus, e muitos foram mortos ficando sujeitos á ruína eterna de suas almas por causa da transgressão de um outro.
No Novo Testamento, na igreja de Corinto muitos estavam sendo enfermados e mortos fisicamente pelo Senhor em razão do pecado, e não se relata se entre estes havia alguns que estavam nesta condição por causa do pecado de seus pais. Mas, caso isto estivesse ocorrendo estaria de acordo com o caráter de Deus e o uso da Sua exclusiva autoridade.
Vemos uma ameaça dura dirigida à igreja de Tiatira. Jesus diz que mataria aos que estavam adulterando com uma mulher chamada Jezabel. Mas mataria quem? Aqueles que não se arrependessem.
Mas, em razão do caráter das promessas feitas na Nova Aliança, vemos, mesmo em relação a esta aplicação da visitação da iniquidade dos pais nos filhos um grande abrandamento destes juízos no período da dispensação da graça, e isto, ao longo de toda a história da igreja, e mesmo nos nossos dias. E isto se deve em muito à promessa de que não se diria mais na nova aliança que os filhos ficariam com os dentes embotados em razão de os pais terem comido uvas verdes.
Agora, poderíamos afirmar que de modo nenhum, na Nova Aliança, em razão desta promessa de que os filhos não ficariam com os dentes embotados em razão de seus pais comerem uvas verdes, que Deus nunca mais visitou a iniquidade dos pais nos filhos? De modo nenhum. E qual é a resposta para isto? Ele o tem reservado à sua exclusiva autoridade. Ele é livre para agir segundo a sua sabedoria e soberania.
Então, chegamos à conclusão que Ele de fato é o Juiz a quem cabe todo o julgamento. A nós cabe tapar a boca e buscar orientação do seu Espírito em tudo o que fizermos. E não propriamente para saber os motivos da aparente morte prematura de alguns no meio evangélico, que parece denunciar um possível julgamento de Deus. Porque fazê-lo é andar num território que não nos compete. Jesus tem dito que há áreas que Deus tem reservado à Sua exclusiva autoridade. E a determinação de quem deve sofrer também parte ou todas as consequências do pecado de seus pais, é algo que somente Deus sabe, e dificilmente revelará a alguém mais.
Agora, isto não é coisa que se veja a todo dia e a toda hora. Especialmente na Nova Aliança. Pelo contrário, vê-se muito mais o contrário disto. Vê-se Deus usando de uma completa paciência, longanimidade e misericórdia com a quase totalidade do seu povo. Ele julgará todos os nossos pecados que não confessarmos porque a Sua santidade e justiça o exige. Não para nos condenar eternamente porque fomos comprados para Ele, pelo sangue de Jesus. Mas para disciplinar-nos, para fazer-nos participantes da Sua santidade.
Entretanto, temos visto em toda a história da igreja que não é usual esta Sua prática de visitar a iniquidade dos pais nos filhos. Nós o temos conhecido muito mais como o Deus de toda a graça. O Deus que perdoa a iniquidade e o pecado. Que, a propósito, tem feito isto na Nova Aliança, conforme Sua promessa (Jer 31.34) para toda a eternidade. E isto está plenamente em conformidade com que Deus afirmou de Si mesmo dizendo que usa de misericórdia com milhares; isto é até mil gerações daqueles que O amam, e que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado; enquanto que visita a iniquidade dos pais sobre os filhos e sobre os filhos dos filhos somente até a terceira e quarta geração.
O pecado do crente, para efeito de condenação futura, tem sido perdoado eternamente. Por isso já não há nenhuma condenação para quem está em Cristo Jesus.
Promessa da Nova Aliança:
Jeremias 31.29-34: “Naqueles dias não dirão mais: Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos se embotaram. Pelo contrário, cada um morrerá pela sua própria iniquidade; de todo homem que comer uvas verdes, é que os dentes se embotarão. Eis que os dias vêm, diz o Senhor, em que farei um pacto novo com a casa de Israel e com a casa de Judá, não conforme o pacto que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito, esse meu pacto que eles invalidaram, apesar de eu os haver desposado, diz o Senhor. Mas este é o pacto que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo. E não ensinarão mais cada um a seu próximo, nem cada um a seu irmão, dizendo: Conhecei ao Senhor; porque todos me conhecerão, desde o menor deles até o maior, diz o Senhor; pois lhes perdoarei a sua iniquidade, e não me lembrarei mais dos seus pecados.”.
Vejamos agora a mudança do princípio de vingança da Antiga Aliança, feita por Jesus ao instituir a Nova Aliança:
Na Antiga:
Êx 21.23-25: “21 mas se resultar dano, então darás vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe.”.
Na Nova:
Mt 5.38-41: “Ouvistes que foi dito: Olho por olho, e dente por dente. Eu, porém, vos digo que não resistais ao homem mau; mas a qualquer que te bater na face direita, oferece-lhe também a outra; e ao que quiser pleitear contigo, e tirar-te a túnica, larga-lhe também a capa; e, se qualquer te obrigar a caminhar mil passos, vai com ele dois mil.”.
Vale destacar que na Antiga, já que era a Constituição da nação de Israel, se determinava a sentença de morte de crimes de perversidade, como destacaremos abaixo, mas, Jesus ordenou que o povo de Deus na Nova Aliança não deve resistir ao perverso, ao contrário, deve mostrar-se disposto a sofrer perdas e danos por amor ao Senhor e ao evangelho.
Êx 21.12: “Quem ferir a um homem, de modo que este morra, certamente será morto.”.
Êx 21.15-17: “ Quem ferir a seu pai, ou a sua mãe, certamente será morto. Quem furtar algum homem, e o vender, ou mesmo se este for achado na sua mão, certamente será morto. Quem amaldiçoar a seu pai ou a sua mãe, certamente será morto.”.
Êx 21.29: “Mas se o boi dantes era escorneador, e o seu dono, tendo sido disso advertido, não o guardou, o boi, matando homem ou mulher, será apedrejado, e também o seu dono será morto.”.
Muitos outros mandamentos semelhantes a estes faziam parte da Antiga Aliança. Alguém em sã consciência afirmaria que eles estão em pleno vigor na Nova Aliança, devendo ser aplicados ao povo de Deus na dispensação da graça? E por que já não são mais aplicáveis literalmente à igreja? Resposta: Jesus revogou o cumprimento dos mandamentos civis e cerimoniais da Antiga Aliança, quando instituiu a Nova Aliança no seu sangue.
Hebreus 8.6-13: “Mas agora alcançou ele ministério tanto mais excelente, quanto é mediador de um melhor pacto, o qual está firmado sobre melhores promessas. Pois, se aquele primeiro fora sem defeito, nunca se teria buscado lugar para o segundo. Porque repreendendo-os, diz: Eis que virão dias, diz o Senhor, em que estabelecerei com a casa de Israel e com a casa de Judá um novo pacto. Não segundo o pacto que fiz com seus pais no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; pois não permaneceram naquele meu pacto, e eu para eles não atentei, diz o Senhor. Ora, este é o pacto que farei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor; porei as minhas leis no seu entendimento, e em seu coração as escreverei; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo; e não ensinará cada um ao seu concidadão, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao Senhor; porque todos me conhecerão, desde o menor deles até o maior. Porque serei misericordioso para com suas iniquidades, e de seus pecados não me lembrarei mais. Dizendo: Novo pacto, ele tornou antiquado o primeiro. E o que se torna antiquado e envelhece, perto está de desaparecer.”.
II Coríntios 3.6-11: “o qual também nos capacitou para sermos ministros dum novo pacto, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica. Ora, se o ministério da morte, gravado com letras em pedras, veio em glória, de maneira que os filhos de Israel não podiam fixar os olhos no rosto de Moisés, por causa da glória do seu rosto, a qual se estava desvanecendo, como não será de maior glória o ministério do espírito? Porque, se o ministério da condenação tinha glória, muito mais excede em glória o ministério da justiça. Pois na verdade, o que foi feito glorioso, não o é em comparação com a glória inexcedível. Porque, se aquilo que se desvanecia era glorioso, muito mais glorioso é o que permanece.”.
Muitos outros textos falam da revogação da Antiga Aliança, inclusive no Velho Testamento, mas estes dois são suficientes para demonstrar que as bases com que Deus trata com o seu povo na Nova Aliança não são reguladas pelas prescrições exclusivas à Antiga Aliança, que faremos bem em conhecer, para que ao ler porções que se apliquem àquele pacto não pensemos que elas devem ser aplicadas literalmente à igreja de Cristo, que está não debaixo da lei, neste e em outros sentidos, como por exemplo, estar debaixo da condenação da lei, por estarmos na graça.
Não devemos também, no entanto, como vimos no início deste breve estudo, afirmar que Deus não tem julgado os pecados da igreja pelo fato de estar na Nova Aliança, pois a experiência tem demonstrado que Ele o faz segundo a Sua livre vontade e soberania, e o Novo Testamento está repleto de exemplos de tais juízos.
I Pe 4.17: “Porque já é tempo que comece o julgamento pela casa de Deus; e se começa por nós, qual será o fim daqueles que desobedecem ao evangelho de Deus?”.
Hebreus 10.30,31: “Pois conhecemos aquele que disse: Minha é a vingança, eu retribuirei. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo. Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo.”.
I Coríntios 11,30-32: “Por causa disto há entre vós muitos fracos e enfermos, e muitos que dormem. Mas, se nós nos julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados; quando, porém, somos julgados pelo Senhor, somos corrigidos, para não sermos condenados com o mundo.”.
Não obstante, quando falamos de juízos de Deus contra o pecado, não podemos nunca esquecer que Jesus, realmente, ama demais o pecador e ama que este se converta e viva. Tanto que não há nada que ele mais deteste do que um fariseu que se interponha entre Ele, Sua graça, e um pecador, impedindo que este chegue à salvação, ou mesmo que estabeleça juízos amargurados contra aqueles que apesar de estarem cheios de pecados, podem chegar à conversão. Ele demonstra claramente este Seu sentimento na parábola que proferiu sobre o publicano e o fariseu. Cuidado então crente, para que não seja um fariseu cheio de amargura, condenando os pecadores em vez de atraí-los para o Seu Senhor.
Assim, ao falar de Sua indignação em juízo contra o pecado, Deus sempre o faz na expectativa de que o pecador se arrependa e viva. De que ele não se iluda vivendo prazeirosamente no pecado, alegrando-se com sua prosperidade ou ausência da aplicação imediata dos juízos de Deus, e assim em não se convertendo venha a perecer eternamente. Há então uma repreensão permanente de Deus contra o pecado em Sua Palavra, com vistas a conduzir o pecador a conhecer a sua real condição, para que possa se arrepender e converter de seus maus caminhos.
Prosperidade nem Sempre é Sinal da Aprovação de Deus
É isto que vemos no seguinte texto do profeta Oseias:       
“Não te alegres, ó Israel, não exultes, como os povos; porque com prostituir-te abandonaste o teu Deus, amaste a paga de prostituição em todas as eiras de cereais.” (Os 9.1).
Estas palavras do profeta foram dirigidas contra a maldade obstinada do povo de Israel. Ele declara que Deus estava tão irado, que nenhum sucesso poderia ser esperado. E esta advertência deveria ser notada cuidadosamente; porque nós vemos que os hipócritas contanto que Deus os poupe ou os favoreça, acham ocasião para estarem seguros porque: eles pensam que eles têm paz segura com Deus, quando ele for paciente até mesmo por algum tempo com eles; e se mais adiante, esta é excluída e a espada desembainhada aparece, eles nunca têm medo. Assim, os homens dormem agarrados firmemente aos seus vícios, especialmente quando o Senhor os tratar com paciência e bondade. O profeta declara aqui, que os Israelitas não tinham nenhuma razão para se alegrar com a prosperidade deles, e nem se vangloriarem do fato de que o Senhor não tinha exercido vingança imediatamente sobre eles; porque ele diz, que entretanto todas as pessoas debaixo do céu das demais nações fossem prósperas e se alegrassem nisto, contudo Israel não tinha motivo para se alegrar com a sua prosperidade porque havia cometido prostituição contra o Seu Deus, e o julgamento do Senhor começa pela Sua casa. Especialmente o verdadeiro Israel de Deus, composto pelos remidos pela fé nEle, é julgado pelo Senhor para que não seja condenado com o mundo.
Assim, o que Deus está dizendo a Israel através do profeta é que embora Ele fosse propício não lhes afligindo, mas ao contrário, sendo amável com eles, entretanto em face destas provas de amor e favor paterno, eles não tinham motivo para se congratularem e nem se alegrarem em sua prosperidade, porque um fim infeliz os aguardava. Eles tinham se prostituído, e com isto abandonaram o Seu Deus. Esta advertência era muito necessária. Este vício, nós sabemos, tem prevalecido entre os homens, porque eles ficam cegos aos pecados contanto que o Senhor os poupe. Como estamos sujeitos ainda hoje a isto, deixemos que esta advertência do profeta nos acorde, de forma que nós não nos alegremos mesmo em face de grande prosperidade, se nos examinarmos e vermos que Deus tem motivo de estar irado conosco. Embora Ele possa não pesar a Sua mão abertamente, entretanto ele pode deixar de nos procurar e fazer-nos excluídos da comunhão com Ele, e nós faremos bem então em nos antecipar à Sua ira; porque este é o próprio trabalho da fé, não somente de descobrir o castigo presente do Senhor que está irado, mas também temer, por causa de qualquer vício prevalecente, o castigo que está ainda distante. Aprendamos então a nos examinar, não somente para participarmos da ceia do Senhor, mas em todo o tempo, e fazermos uma exame sincero, mesmo quando o Senhor esconde o Seu desgosto de nós, e não visita a nossa iniquidade. Então, se nós temos sido infiéis a Deus, toda a nossa prosperidade deveria ser suspeitada por nós; porque este desprezo, abusando das bênçãos de Deus, certamente não é algo que Lhe seja agradável e aprovado por Ele.
A comparação feita por Deus através do profeta, com as pessoas de outras nações é também de grande peso. Ele quer dizer, que entretanto Deus pudesse poupar as nações pagãs, contudo ele castigaria Israel, não por serem menos culpados do que Israel, nem porque tivessem real motivo para se regozijarem plenamente com sua prosperidade, mas porque a verdadeira prosperidade de Israel é andar em retidão com o Seu Deus. Hoje temos a igreja e os gentios. A igreja é o verdadeiro Israel. Os gentios são os estrangeiros, isto é, aqueles que não conhecem a Cristo. Aqueles que não são da fé. Como um crente pode se alegrar em sua prosperidade material se Ele não anda em retidão com o Seu Deus? Como pode alegrar-se em face da bondade e misericórdia de Deus demonstrada para com ele, se vive vencido pelo pecado e vive de modo infiel ao Seu Senhor? Que os gentios busquem as coisas do mundo e se alegrem nelas, e mesmo que vivam de modo contrário à vontade de Deus, não há nada para ficar surpreso com isto. Mas aquele que é do Israel de Deus, que o conhece, deixaria de buscar o Seu reino e a Sua justiça, para entregar-se ao mesmo modo de vida e expectativa dos gentios? Fará simplesmente da prosperidade material o motivo da sua alegria? Ele violaria a aliança com o Seu Deus e pensaria que isto ficaria sem ter a devida avaliação do Altíssimo? Compareceria na presença do Senhor com festas, danças de alegria por toda a sua prosperidade, sem estar de fato fazendo a Sua vontade? Isto é monstruoso, e por isso não é para se estranhar que o profeta declare que ainda que isto seja relevado em outros povos, no entanto Deus ainda visitaria e castigaria a infidelidade de Israel.
Ele acrescenta ainda que eles amavam a paga da sua prostituição em todas as eiras de cereais. O que é isto? Eles estavam vivendo somente para obter prosperidade mundana. O único objetivo de vida deles havia se tornado o amor à recompensa imediata, visível. Deus havia sido esquecido e as cousas do alto. Os interesses do Seu reino foram esquecidos e abandonados, e Israel entrou em aliança com os assírios, contratando-os com uma grande soma de dinheiro, para livrá-los da ameaça das nações ao seu redor, especialmente dos sírios. Na sua esperança de ganho eles adoraram falsos deuses. Eles eram como prostitutas que se sujeitam a todos os tipos de imundície quando a recompensa as atrai. Eles violaram a aliança, sacrificaram e negociaram os princípios absolutos da lei do Senhor, voltaram as costas às Suas ordenanças, e não tinham portanto qualquer motivo para exultar, apesar de toda a prosperidade que estavam experimentando.
O profeta repreende os israelitas porque o interesse deles era o de encher os seus celeiros de trigo. E isto por si mesmo não parece ser merecedor de reprovação realmente, porque quem de nós não deseja um aumento frutífero de alimentos? O Senhor não tem prometido cuidar das necessidades do seu povo? Mas a recompensa que Israel buscava era uma paga de prostituição. Eles estavam buscando isto em outros deuses, assim como as meretrizes buscam o seu sustento naqueles que não são seus próprios maridos. Israel estava agindo como uma meretriz ao buscar sua provisão em ídolos, e não no seu marido, o Senhor Seu Deus.   
As Correções em Juízos de Deus sobre os Crentes São Motivadas pelo Seu Amor
E quando os filhos de Deus vivem de modo contrário à Sua vontade, eles são disciplinados por Ele. Hebreus 12.6 afirma que ele corrige seus filhos açoitando-os.
Por que Deus nos açoita (Hb 12.6), especialmente com aflições e tribulações?
Estamos diante de um Deus que é santo e justo. Isto tem o propósito de tirar de nossa imaginação orgulhosa que somos carvalhos poderosos, para que enxerguemos que somos canas quebradas.
Ser cana quebrada é ver o estado de miséria da alma em razão do pecado.
Por isto quando Deus nos açoita com as aflições e tribulações Ele não está sendo mau nem caprichoso. Este trabalho de nos açoitar é necessário e crucial. Porque os homens não têm somente transgredido repetidamente as leis de Deus, insurgindo-se contra a autoridade boa e legítima do Senhor, como são também completamente ignorantes da verdadeira natureza do seu pecado e culpa. Nós poderíamos pensar que Aquele que lançou fora do céu os anjos que não permaneceram em sua condição original, deixaria vermes que vivem em rebelião sem a devida correção e castigo?
Então, para nos trazer a salvação, Deus faz com que primeiro conheçamos a nossa necessidade de salvação. Antes de enviar o Médico ele faz com que conheçamos a causa da nossa enfermidade, o pecado. Assim, pelos açoites que envia à alma, Ele abre os nossos olhos espirituais para que vejamos o pecado, e conheçamos o nosso estado de miséria e necessidade.
O conhecimento da nossa doença é acompanhado pelo conhecimento da nossa incapacidade para tratar com ela. Sem Cristo não poderemos fazer nada por nós mesmos. Somos humilhados e feridos por Deus para que vejamos isto, e assim nos sujeitemos ao Médico e recebamos o único remédio para a cura da nossa alma.
Além disso, tal é a falsidade de nossos corações que até mesmo isto que nos açoita para a compreensão de nossa verdadeira condição pessoal está além de nossa habilidade. Porque no final das contas este propósito de Deus de nos dirigir a Cristo, é um trabalho que somente o próprio Deus pode efetuar.
Vemos assim que muitas das aflições e tribulações que sofremos, assim como se deu no caso de Jó, não têm o propósito de serem julgamentos morais pelos quais Deus nos esteja castigando, isto é, dando-nos a justa retribuição e vingança pelos pecados que tenhamos praticado, mas, sim, operando o quebrantamento do nosso espírito, para que possamos conhecer a nossa total necessidade da graça de Cristo para que possamos ser curados das feridas de nossas almas produzidas pelas nossas transgressões ativas, ou mesmo pela condição de termos uma natureza pecaminosa, que está portanto sujeita ao poder do pecado.
A alma, por natureza, em razão do pecado, está sujeita a se desviar de Deus, e por meio de necessidades, perdas, angústias, aflições, tribulações, Deus convence a alma da sua fraqueza, e a chama para perto de Si.
O Espírito Santo é quem Convence do Pecado porque a nossa Natureza Terrena Jamais Faria a Devida Avalição do Nosso Estado Pecaminoso
Não é somente o trabalho de convencimento do pecado que é exclusivo do Espírito Santo. A mortificação do pecado é também um trabalho exclusivo dEle.
Tal é a condição da alma humana, que mesmo quando a pessoa pensa estar buscando a Deus, ela pode estar sendo vencida por sentimentos de orgulho religioso (veja o fariseu da parábola) e não se voltará de fato para Deus, caso não seja quebrantada, para que possa enxergar a sua real condição de permanente necessitado da graça e misericórdia de Deus. Por isso Jesus diz que sem Ele nada podemos fazer e que é o Espírito Santo quem nos convence do pecado, da justiça e do juízo. Não podemos fazer este trabalho. Ele é feito pelo Espírito Santo, que nos leva a fazer o devido julgamento da nossa verdadeira condição espiritual, convencendo-nos do pecado, que há um juízo de Deus sobre o pecado, mas que também há uma justiça disponível em Cristo para cobrir o pecado e nos purificar de toda injustiça.     
Somente quando o orgulho é morto e com isto o julgamento de Deus relativo ao nosso pecado é aceito, então Cristo começa a fazer sentido para nossas mentes caídas.
Mas tão inquieto e caído é o nosso coração que logo depois de convertidos, nossos olhos acham modos para deixar Cristo para trás e olhar para nós mesmos. Mas enquanto nós tentamos colocar nosso descanso e esperança de segurança em nossa santificação, Deus, na sua longanimidade e misericórdia, dirige-nos novamente a Cristo, enquanto nos leva a lançar nosso descanso na justificação, e não na santificação, mas isto tende a se repetir, pois abandonamos muitas vezes nossa visão de Cristo, colocando nossos olhos em nós mesmos e em nosso próprio progresso espiritual, pois somos inclinados a isto por natureza. Mas Deus intervém novamente e novamente, enquanto exercitando este ministério de quebrantar-nos, de maneira que desejemos nada mais que Cristo. Neste comportamento aqui considerado, o que é condenável não é a nossa busca de retidão e santificação, pois que é o que se espera de nós, mas o fato de confiarmos em nossa justiça própria, e não na justiça de Cristo, para sermos aceitáveis a Deus.
Debaixo deste trabalho de quebrantamento devemos ter o cuidado de não retirar o gesso antes de que a cura esteja completa, porque o osso se partirá de novo. É a isto que Tiago se refere quando diz que a perseverança deve ter a sua ação completa, de forma que seja completada a provação da fé (Tg 1.3,4). E assim Cristo será para você a mais doce de todas as coisas.
O quebrantamento não é o que salva, porque é apenas a revelação da realidade da verdadeira condição da pessoa, mas ninguém pode ser salvo sem isto. É por isso que quando alguém se converte a Cristo, necessita ser convencido do pecado pelo Espírito Santo, porque é somente quando a doença é diagnosticada corretamente, que a cura pode ser aplicada.
A tribulação produz perseverança. O Senhor nos ajudará antes que se acabe a nossa paciência em perseverança. A perseverança produz caráter provado. Para que a nossa experiência nos seja útil, tem que ser dolorosa, porque se não for dolorosa, já não será mais uma experiência que nos beneficie. Deus permitirá que soframos até a um ponto de sofrimento que seja para o nosso bem, porém não mais do que o necessário. A Seu tempo, quando nossa confiança tiver sido direcionada ou redirecionada exclusivamente para Cristo, por meio da tribulação, Ele tirará a experiência dolorosa. E Ele o fará antes que nossa esperança seja frustrada. O caráter provado produz esperança e a esperança não traz vergonha. O Senhor não permitirá que o nosso problema se prolongue tanto que ao fim digamos que fomos enganados, e não devíamos ser cristãos. Deus nunca nos abandonará na hora da necessidade.
Por isso se diz que Paulo fortalecia as almas dos discípulos, exortando-os a permanecer firmes na fé; e mostrando que, através de muitas tribulações nos importa entrar no reino de Deus (Atos 14.22). Isto porque as tribulações não somente apeffeiçoam o nosso caráter, como também ajudam no aperfeiçoamento e aumento da nossa fé, pois que colocam à prova especialmente o que se refere à nossa exclusiva confiança em Cristo.
O Formalismo Religioso Está Ligado à Natureza Terrena

As tribulações ajudam também a combater o formalismo religioso.
"Tendo aparência de piedade, mas negando-lhe o poder. Afasta-te também desses (II Tim 3.5).
Leia também Rom 2.28,29, onde vemos Paulo dizendo que não é o formalismo religioso que identifica um verdadeiro crente. Porque um crente formal não é um crente na visão de Deus.                                   
Quando uma pessoa é somente um crente no nome e não em realidade, quando somente em coisas externas e não em seus sentimentos interiores; somente em profissão e não na prática, quando o seu cristianismo é em resumo uma mera questão de forma, ou costume sem qualquer influência no seu coração ou vida, então esta pessoa é uma religiosa formal, porque ela detém somente a casca ou superfície da religião, mas não possui a sua substância ou o seu poder. Daí Paulo se referir a quem tem somente forma ou aparência de piedade, mas que lhe nega o poder, isto é, que não tem o poder.
Pessoas assim assistem a cerimônias, frequentam regularmente a adoração pública. Eles não estão familiarizados com a Bíblia, e não têm nenhum prazer em lê-la. Eles não se separam dos modos do mundo. Eles não fazem nenhuma distinção entre piedade e impiedade nas amizades deles, ou alianças matrimoniais. Eles se preocupam pouco ou nada sobre as doutrinas distintivas do Evangelho. Eles parecem totalmente indiferentes sobre o que eles ouvem na pregação. Você pode estar na presença deles durante semanas, e do que você ouve ou vê neles, você poderia dizer facilmente que eles eram ateus.
Olhe em outra direção para aquelas centenas de pessoas cuja religião parece consistir em muita conversa e profissão. Eles sabem a teoria do Evangelho em suas cabeças, e professam se alegrar com a doutrina do Evangelho. Eles podem dizer muito sobre a "inteireza" das próprias visões deles, e da "ignorância" de todos que discordam deles. Mas eles nunca adquirem qualquer aprendizagem da verdade. Quando você examina as vidas interiores deles você acha que eles não conhecem nada de piedade prática. Eles não são verdadeiros, nem amam, nem se humilham, nem são honestos, nem amáveis, nem gentis, nem generosos ou honrados. O que diremos nós destas pessoas? Eles reivindicam ser cristãos, e não há substância nem fruto dentro do cristianismo deles. Há apenas uma coisa a ser dita: eles são crentes formais. A religião deles é apenas uma FORMA vazia.   
Tais noções são da terra. Não é bastante que eles sejam terrenos, carnais, eles cheiram a sepultura. Se precavenha deles, e fique em guarda. Se houver qualquer coisa sobre a qual a Bíblia fala expressamente, é o pecado e inutilidade do FORMALISMO.
Escute o que o Paulo conta para os romanos: "Um homem não é um judeu se ele for somente no exterior, nem é circuncisão meramente externa e física (Rom 2.28). Estas realmente são palavras fortes. Um homem poderia ser um filho de Abraão de acordo com a carne - um membro de um das doze tribos - circuncidado ao oitavo dia – observador de todas as festividades - um habitual adorador no templo - e ainda na visão de Deus não ser um israelita. Do mesmo modo, um homem pode ser um crente através de profissão externa - um membro de uma Igreja Cristã - batizado com batismo cristão - fiel em receber a Ceia do Senhor - e ainda na visão de Deus, não ser um crente afinal.
Ouça o que diz o profeta Isaías: "Ouvi a palavra do Senhor, governadores de Sodoma; dai ouvidos à lei do nosso Deus, ó povo de Gomorra. De que me serve a mim a multidão de vossos sacrifícios? diz o Senhor. Estou farto dos holocaustos de carneiros, e da gordura de animais cevados; e não me agrado do sangue de novilhos, nem de cordeiros, nem de bodes. Quando vindes para comparecerdes perante mim, quem requereu de vós isto, que viésseis pisar os meus átrios? Não continueis a trazer ofertas vãs; o incenso é para mim abominação. As luas novas, os sábados, e a convocação de assembleias ... não posso suportar a iniquidade e o ajuntamento solene! As vossas luas novas, e as vossas festas fixas, a minha alma as aborrece; já me são pesadas; estou cansado de as sofrer. Quando estenderdes as vossas mãos, esconderei de vós os meus olhos; e ainda que multipliqueis as vossas orações, não as ouvirei; porque as vossas mãos estão cheias de sangue.” (Is 1.10-15).          
Estas palavras, quando examinadas, são extraordinárias. Os sacrifícios que são declarados aqui como sendo inúteis foram designados pelo próprio Deus! As festividades e ordenações que Deus diz que Ele "odeia", tinham sido prescritas por Ele! O próprio Deus pronuncia as próprias instituições dele como inúteis quando elas são formalmente usadas e sem coração pelo adorador! Na realidade, elas são piores do que inúteis; elas são até mesmo ofensivas e danosas. Não podem ser imaginadas palavras mais distintas e inconfundíveis. Elas mostram que aquela religião formal é inútil na visão de Deus. Isto não pode na verdade ser chamado de religião de modo nenhum, porque religião significa aquilo que liga o homem a Deus.
Ouça, o que nosso Senhor Jesus Cristo diz. Nós O achamos dizendo dos judeus em seus dias: "Estas pessoas me honram com os seus lábios, mas os seus corações estão longe de mim. Eles me adoram em vão; os ensinos deles são regras ensinadas por homens" (Mt 15:8-9). Nós O vemos repetidamente denunciando o formalismo e a hipocrisia dos escribas e fariseus, e advertindo os discípulos dele contra isto. Oito vezes num capítulo (Mt 23:13) Ele diz a eles, "Ai de vós mestres da lei e fariseus, ai de vós hipócritas! ". Mas para o pior dos pecadores Ele sempre teve uma palavra de bondade, e oferecia a eles uma porta aberta. Mas com o formalismo, Ele nos fez saber, que é uma doença desesperada, e deve ser exposta com o idioma mais severo. Ao olho de um homem ignorante pode um formalista parecer ter uma "quantidade" muito decente de religião, entretanto não talvez da melhor "qualidade." Aos olhos de Cristo, porém, o caso é mesmo diferente. No formalismo aos olhos dEle, não há nenhuma verdadeira religião.
Assim como a Bíblia nos ensina que o pecado é terrível e que nós devemos evitar o pecado, de igual modo o formalismo é terrível e nós devemos evitá-lo. O formalismo pode pegar a sua mão com um sorriso, e parecer ser um irmão, enquanto o pecado vem contra nós com a espada desembainhada, como nosso inimigo. Ambos querem arruinar nossas almas; e dos dois, o formalismo é o mais provável de fazer isto. Se nós amamos a vida, deixe-nos nos precavermos do formalismo na religião, pois é na verdade o pior tipo de pecado, e Jesus deixou isto bem claro nos ais que dirigiu aos escribas e fariseus.   
Nada é tão comum. É uma das grandes doenças familiares da raça humana. Nasce conosco, cresce conosco, e nunca é completamente expulso de nós até que nós morramos. Nos conhece na igreja, encontra-se entre os ricos, e nos conhece entre os pobres. Nos conhece entre as pessoas educadas, e nos conhece entre os sem educação. Nos conhece entre os católicos romanos, e nos conhece entre protestantes. Se encontra entre os líderes da igreja, e entre os mais novos membros.
Nada é tão perigoso à própria alma de um homem. Familiaridade com a forma de religião, enquanto nós negligenciamos sua realidade. Nada parece se tornar tão desesperadamente duro como aqueles que estão repetindo palavras santas continuamente, enquanto os corações deles estão correndo atrás do pecado e do mundo. Líderes de nossa sociedade que vão à igreja somente para mostrar a todo mundo que são religiosos. Pais que fazem orações familiares formalmente, para manter uma boa aparência nas suas casas. Ministros não convertidos que todas as semanas estão lendo para pregar e ensinar a Bíblia, na qual eles não sentem nenhum real interesse. Membros de igreja não convertidos que constantemente estão dizendo "Amém", sem sentir o que eles dizem. Cantores não convertidos que cantam os hinos mais espirituais todos os domingos, somente porque eles têm vozes boas, enquanto os afetos deles estão completamente nas coisas terrenas.
Uma pintura de um fogo não pode esquentar, e um banquete pintado não pode satisfazer a fome, e uma religião formal não pode trazer paz à alma. Embora a pessoa possa enganar vizinhos, conhecidos, e ministros com uma forma de piedade, ela pensa que pode enganar a Deus? A ideia em si mesma é absurda. "Aquele que formou o olho não verá?". Ele sabe até mesmo os segredos do coração.
O Pecado Está Ligado ao Coração e é aí que Deve Ser Examinado e Destruído
Um verdadeiro crente é um crente em seu coração. O coração é o real teste do caráter de um homem. Não é pelo que ele diz ou pelo que ele faz que o homem pode ser conhecido. Ele pode dizer e fazer coisas que são certas, com falsos e desmerecedores motivos, enquanto o seu coração está completamente errado. O coração é o homem. "Como ele pensa em seu coração, assim ele é" (Provérbios 23:7).
O coração é o teste certo da religião de um homem. Não é bastante que um homem sustente a doutrina correta, e mantenha uma forma externa de piedade. O que está no coração dele? Essa é a grande pergunta. Isso é para o que Deus olha. O homem olha o exterior, mas Deus olha o coração (1 Samuel 16:7).
É por isso que se crê com o coração para a salvação.   
Quando o coração está errado tudo o mais estará errado na visão de Deus. Muitas coisas certas podem ser feitas. As formas e ordenações que o próprio Deus tem designado podem parecer estar sendo honradas. Mas se o coração estiver distante, Deus não está contente. Ele terá o coração do homem ou nada.
Há vários lugares de adoração em nosso país hoje onde todas as coisas externas da religião são feitas com perfeição. O templo é bonito. O serviço é bonito. O louvor é bonito. As formas de devoção são bonitas. Há tudo para satisfazer os sentidos e emoções. Olhos e ouvidos e sentimentos naturais estão contentes. Mas Deus não está contente. Uma coisa está faltando, e a falta disso estraga tudo o mais. O que é essa coisa? É o coração! Se Deus não vê conversões, renovação, corações quebrantados, penitentes, então Ele não está contente. Cabeças se curvando, joelhos se dobrando, amens altos, olhos e mãos erguidos ao céu, tudo, tudo será nada sem que Deus aviste corações certos.
Se o coração estiver certo Deus perdoará muito o que estiver imperfeito, quando ele vê um verdadeiro coração.
A verdadeira religião nunca tem que esperar ser popular. Ela não deve ter o louvor do homem, mas de Deus. Paulo diz isto em Rom 2.29.
A verdade de Deus e o cristianismo bíblico nunca são realmente populares. Eles nunca foram. A forma como a natureza humana é descrita na Bíblia nunca poderá ser popular porque depõe contra a maldade do coração humano.    
A religião formal satisfaz o farisaísmo secreto do homem. Todos nós, uns mais outros menos, somos fariseus. Todos nós abraçamos a ideia naturalmente de que o modo de ser salvo é fazendo determinadas coisas, e fazendo assim muitas observâncias religiosas, como resultado nós adquiriremos o céu. O formalismo parece nos mostrar um modo pelo qual nós podemos fazer nossa própria paz com Deus.
O formalismo agrada a preguiça natural do homem. Dá uma grande importância ao que é a parte mais fácil do Cristianismo - a superfície e a forma. O homem gosta disto. Ele odeia o esforço interior da religião. Ele quer algo que não se intrometerá com a consciência dele e com sua vida interior. Somente se ocupará com trabalhos ou ações. Nada de esforço para ser transformado interiormente pela graça de Deus.     
A religião do coração é muito santa para ser popular. Ela interfere com o mundanismo e o pecado. Ela cruza o caminho do pecador como um desmancha-prazeres. E por isso não poderia jamais ser popular.
O combate ao formalismo, que é na verdade um combate à acomodação ao pecado, gerará e despertará o ódio daqueles que o abraçam, assim como se deu com Jesus e os escribas e fariseus; com Lutero, e todos os reformadores em relação à igreja romana, e mesmo dentro de qualquer igreja local, contra os membros que são formais. Foram e são odiados todos aqueles que se levantaram e têm se levantado para pregar contra a inutilidade do formalismo, e a impossibilidade de salvação sem arrependimento, fé, regeneração e santidade de coração.

A Vitória da Fé Sobre o Mundo

Um cristianismo verdadeiro é um cristianismo santo, isto é, separado do mundo.   
“Pelo que, saí vós do meio deles e separai-vos, diz o Senhor; e não toqueis coisa imunda, e eu vos receberei;” (2 Cor 6:17)
Este texto fala do grande dever de separação do mundo.    
A separação do mundo sempre foi uma das principais evidências de um trabalho da graça no coração. Aquele que nasceu do Espírito, e foi feito uma nova criatura em Cristo Jesus, sempre se esforçará por sair do mundo, e viver uma vida separada. Aqueles que somente usaram o nome "crente", sem a realidade, sempre recusaram "sair” e ser “separado" do mundo.
O mundo é uma fonte de grande perigo para a alma.
Lembre-se que por "o mundo", eu não quero dizer o mundo material sobre a face do qual nós estamos vivendo e estamos nos movendo. Quando eu falo de "o mundo" eu quero me referir àquelas pessoas que pensam somente, ou principalmente, sobre as coisas terrenas, e negligenciam o mundo por vir, as pessoas que sempre estão pensando mais na terra do que no céu, mais neste tempo do que na eternidade, mais no corpo do que na alma, mais de ser agradável ao homem, do que ser agradável a Deus.    
Dentre os textos que nos advertem contra o mundo temos dentre outros: Rom 12.2; I Cor 2.12; Gál 1.4; Ef 2.1,2; II Tim 4.10; Tg 1.27; 4.4; I Jo 2.15-17; 3.1; 4.5; 5.4,19; Mt 13.22; Jo 8.23; 14.17; 15.18, 19; 16.33; 17.16.
Estes textos falam por si mesmos, e mostram que um crente tem o mundo como seu inimigo, porque é amigo de Cristo.
Os crentes que amam o mundo acabam como Demas ou como a mulher de Ló. Somente o último dia provará quantas almas o mundo matou.   
Quando Paulo disse, "Saiam do meio deles e estejam separados", ele não queria dizer que os crentes deveriam deixar todas as chamadas terrenas, comércios, profissões, e negócios. Ele não proibiu os homens de serem soldados, marinheiros, advogados, doutores, comerciantes, banqueiros, lojistas, ou negociantes. Não há nenhuma palavra no Novo Testamento para justificar tal linha de conduta. A inatividade é em si mesma um pecado. Uma chamada legal é um remédio contra a tentação. "Se um homem não trabalhar ele não deve comer" (2 Tes 3:10).
Paulo também não disse que os cristãos deveriam recusar toda associação com pessoas incrédulas. Não há nenhuma autorização para tal no Novo Testamento. Nosso Senhor e os seus discípulos não recusaram ir a uma festa de matrimônio, ou sentar para jantar na casa de um fariseu.   
Paulo também não quis dizer que os crentes não deveriam se interessar por qualquer coisa na terra. Negligenciar a ciência, arte, literatura, e política; não ler nada que não seja diretamente espiritual, não saber nada sobre o que há entre o gênero humano, e nunca olhar para um jornal, não se preocupar nada sobre o governo do país, e ser totalmente indiferente sobre as pessoas que o governam e fazem suas leis.
Paulo também não disse que os crentes deveriam ser diferentes em seus trajes, modos, comportamento e linguagem.    
Nós devemos estar separados; mas devemos tomar cuidado para que seja a separação do tipo certo.    
Não é fácil mostrar em que consiste a verdadeira separação.
Primeiro isto consiste em se recusar em ser guiado pelo padrão do mundo sobre o que é certo e errado.   
O crente não seguirá a regra do mundo, mas perguntará: “o que diz a Bíblia sobre isto?”.
Podemos e devemos ter conhecimento das pessoas do mundo convivendo com elas (I Cor 5.10), tratando-os com cortesia, bondade e amor, mas conhecimento é uma coisa e amizade íntima é totalmente diferente, sendo esta última perigosa à alma. A natureza humana é constituída de tal forma que nós não podemos nos associar com outras pessoas sem que isto tenha um efeito em nosso próprio caráter (Pv 13.20). Quando um crente se associa de forma íntima com pessoas do mundo, será impossível para ele prosperar em seu cristianismo. Deve haver separação. Claro que tal separação será dolorosa.    
Se nós temos que escolher entre a perda de um amigo e o dano de nossas almas, não deveria haver nenhuma dúvida em nossas mentes.
O princípio aqui colocado deveria ser lembrado cuidadosamente por todos os cristãos solteiros na escolha de um marido ou esposa. Mas isto eu digo com confiança a todo homem ou mulher crente solteiros. Se você ama sua alma, se você não quer cair e apostatar, se você não quer destruir sua própria paz e conforto para sua vida, nunca resolva se casar com qualquer pessoa que não seja um verdadeiro e dedicado crente. Seria melhor você morrer do que se casar com um incrédulo.
Separar-se do mundo não é uma coisa fácil, requer incessante conflito e abnegação. Isto nos coloca frequentemente em oposição aos membros de nossas próprias famílias, parentes e vizinhos, isto às vezes nos obriga a fazer coisas que dão grande ofensa para nós. É precisamente isto que faz com que muitos voltem atrás e desistam de ser cristãos.
O grande segredo da vitória sobre o mundo é um coração correto, que vive pela fé (I Jo 5.4). Um coração regenerado, genuinamente convertido, que confessa a Cristo corajosamente em todas as ocasiões.     
Deus se vale de muitos meios para abrir os nossos olhos para que não coloquemos o nosso coração no mundo. E um destes meios é a enfermidade.

Doença e Pecado

A doença entrou no mundo por causa do pecado.
Se o homem nunca tivesse pecado seria difícil discernir qual seria o propósito e benefício da doença. Mas desde que o pecado entrou no mundo, eu posso ver que a doença ajuda a lembrar os homens da morte. A maioria das pessoas vive como se nunca fosse morrer. Eles vivem com se a terra fosse a casa eterna deles. Eles planejam e planejam para o futuro, como se fossem viver para sempre. Uma doença séria às vezes ajudará a dispersar estas ilusões. Desperta os homens dos seus devaneios.
A doença ajuda a fazer com que os homens pensem seriamente em Deus, e em suas almas, e no mundo por vir. A maioria das pessoas quando está vivendo nos dias de plena saúde não pode achar nenhum tempo para tais pensamentos. Eles os repugnam. Eles os ignoram.
A doença ajuda a amolecer os corações dos homens, e lhes ensina a sabedoria. Um duro coração de pedra não pode ver qualquer bem nas coisas que não são desta vida, mas a doença prolongada às vezes vai corrigir estas ideias.
A doença ajuda a nos nivelar e nos humilhar. Nós somos todos naturalmente orgulhosos e um pouco convencidos. Poucos, até mesmo da classe mais pobre, são livres deste orgulho. Poucos serão achados que não olham para baixo a outras pessoas, e que secretamente se lisonjeiam de que eles não sejam iguais aos outros homens. Mas um leito de dor é um domador poderoso de tais pensamentos como estes.
A doença ajuda também a testar a religião dos homens, enquanto mostra de que tipo é. A doença revelará se a nossa fé tem ou não um firme fundamento. A doença expõe frequentemente a depravação da alma de um homem.
Deus tem dado por misericórdia, conhecimento e sabedoria ao homem para diagnosticar, prevenir, e tratar de muitas moléstias e enfermidades, quer somáticas quer psíquicas.
Mas, a maioria dos homens desconhecem que isto procede de Deus, e glorificam-se a si mesmos, e esforçam-se por criar as condições de recuperação plena da humanidade de todo tipo de enfermidades, sem saber que este impulso vem do próprio Deus para que encontrem meios de socorrer os que sofrem. Entretanto, em razão do endurecimento do pecado o homem se dedica à pesquisa científica sem ser grato a Deus e sem lhe tributar o devido reconhecimento. Considera o sentido da vida apenas para este mundo, e para o aqui e agora, e esforça-se por erradicar todo tipo de enfermidades como o principal e grande alvo do que chama de qualidade de vida. No entanto, por mais paradoxal que possa parecer, enquanto sujeito ao pecado, Deus usa as enfermidades como prova patente da Sua misericórdia, e desejo de restaurar o homem caído no pecado, pelo convencimento de que ele necessita de salvação, pois as doenças são uma prova forte de convencimento para o homem tanto para a brevidade desta vida, quanto ao fato de que algo vai mal na criação por uma grande causa, chamada de pecado original. Tudo seria muito bom como no princípio da criação se o pecado não tivesse entrado no mundo. Caso a terra não tivesse sido sujeitada à maldição em razão do pecado, e caso não houvesse enfermidades e toda sorte de tragédias que acometem a vida humana, seria de se esperar que o homem não se voltasse para Deus, em busca de socorro, e de perdão dos seus pecados, de modo a poder assim, escapar da condenação eterna. Isto é tão previsível, porque mesmo no estado a que ficou sujeito o mundo, muitos permanecem endurecidos e se recusam a aceitar que a criação se degenerou em razão do pecado e necessita da restauração que será feita por meio do arrependimento e da fé em Cristo. Entretanto, Deus pesa isto de modo correto com a Sua providência controlando as enfermidades e usando o próprio homem caído como instrumento para efetuar tal controle. Ele faz isto por motivo de misericórdia, pois que se compadece do sofrimento humano. Ele faz a ferida mas também procura mitigar a dor, enquanto faz o trabalho de convencimento geral de que algo está errado na criação e que o homem necessita ser resgatado disso. Mas, nunca haverá enquanto houver pecado no mundo, mesmo no milênio, a erradicação total da doença e da morte, pois que por isto o homem é chamado principalmente a se convencer de que há pecado porque há doença e morte. Pois tudo o que Deus faz é bom e perfeito. Ele é Deus de vivos e não de mortos. Ele é Deus do que é sadio, e não Deus do que se corrompe. Além do mais, há que se considerar que ainda que fosse possível erradicar toda enfermidade somática ou psíquica da terra, não se encontra na esfera de domínio do homem salvar a alma de sua condenação eterna, pois que isto está exclusivamente na esfera de poder de Jesus Cristo.
Deus pode amenizar e curar diretamente, muitas enfermidades quer somáticas ou psíquicas, mas Ele não o faz em muitos casos, mesmo em caso de crentes, porque a forma comum de conduzir as diversas gerações da humanidade à morte física, é pela doença, e aqui deve ser considerada como tal a própria velhice, que nada mais do que a degeneração física em razão da sentença determinada por Deus sobre o pecado original, amaldiçoando o homem e a terra em que vive, e decretando a morte como uma das consequências do pecado.
A graça de Deus derramada na Nova Aliança não garante por isso, de modo absoluto a cura de enfermidades físicas ou psíquicas. Deus poderá fazê-lo em razão da Sua soberania e compaixão, mas não em razão de uma obrigatoriedade em relação à aliança feita com os crentes por meio de Cristo. Ele tem garantido a sua salvação eterna, pelo livramento da condenação futura, mas jamais prometeu livrá-los de dificuldades, perigos, enfermidades, de modo absoluto. Muitos são os seus livramentos e curas, especialmente para o seu povo, mas não por uma promessa obrigatória que esteja na aliança. Pois, como vimos, a própria enfermidade em si é uma prova patente da misericórdia de Deus, pois que por ela procura convencer-nos do pecado, tornar-nos pessoas melhores, a exercermos também compaixão e amor prático em relação aos que sofrem.
O Ungido, em Isaías 61 vem para curar os quebrantados de coração, e isto não significa necessariamente cura de todas as enfermidades físicas e psíquicas. Um coração quebrantado em reconhecimento da condição do pecado, pode ser curado com a salvação, mesmo que a pessoa esteja doente ou gravemente ferida de morte, como foi o caso do ladrão na cruz.
A citação de Is 53.4 de que Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores, não é também uma promessa de um direito legal para sermos curados de toda sorte de enfermidades, adquirido pela fé em Cristo enquanto estivermos no corpo, porque ainda que Ele cure a muitos por motivo de compaixão e para demonstrar que de fato é o Messias prometido que nos curará de todas as enfermidades que entraram no mundo por causa do pecado, e que removerá também no porvir toda dor ao enxugar todas as lágrimas de nossos olhos, isto não há de ser visto entretanto em plenitude e de modo absoluto enquanto estivermos neste corpo de morte, ainda sujeito à ação do pecado. A morte será vencida no estado de eternidade porque não haverá mais pecado no novo céu e nova terra que o Senhor criará, e isto será feito por causa do cumprimento pleno da profecia de Is 53.4. Mas há também um outro sentido nesta profecia que não deve ser ignorado que é o fato de que Jesus tomou literalmente sobre si as nossas enfermidades e dores, quando carregou sobre si os ossos pecados no madeiro, e Ele, tem a rigor, participado diretamente de todo sofrimento e dor humanos, quando se identificou conosco tomando a forma de homem. Como lemos em Hebreus 4.14,15: “Tendo, pois, a Jesus, o Filho de Deus, como grande sumo sacerdote que penetrou os céus, conservemos firmes a nossa confissão. Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, antes foi ele tentado em todas as cousas, à nossa semelhança, mas sem pecado.”. E também em Hb 2.10: “Porque convinha que aquele, por cuja causa e por quem todas as cousas existem, conduzindo muitos filhos à glória, aperfeiçoasse por meio de sofrimentos o Autor da salvação deles.”. E ainda em Hb 5.7,8: “Ele, Jesus, nos dias da sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia livrar da morte, e tendo sido ouvido por causa da sua piedade, embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelas cousas que sofreu.”. Vemos nisto que Ele tomou de fato sobre si as nossas enfermidades e dores, pois não tinha porque sofrer deste modo, porque não tinha pecado. Mas o fez voluntariamente por amor de nós. As enfermidades eram nossas, e também o sofrimento, mas Jesus participou disto, para ser nosso sumo sacerdote, capaz de se compadecer de nossas misérias.              
A súmula do que temos afirmado é que pode haver salvação da alma de uma pessoa sem que esta seja curada de alguma enfermidade física ou psíquica, assim como uma pessoa pode permanecer com sua alma condenada, sendo curada de enfermidades físicas ou psíquicas, mas todos, apenas com exceção dos que serão arrebatados, haverão de ser arrancados desta vida pela morte, e isto se dará inevitavelmente, de um modo ou de outro, por acidente ou doença, em resumo, pela cessação de uma ou mais de uma das funções vitais.
Uma teologia que prometa cura segura, infalível e permanente de enfermidades somáticas e psíquicas, pela fé em Cristo, não está portanto em conformidade com a sã doutrina bíblica. Consideremos que até mesmo crentes, em razão de juízos de Deus, podem ser entregues a Satanás para destruição da carne. Muitos crentes coríntios foram enfermados e morreram em razão de tais juízos. Assim, devemos ser cautelosos na formulação de uma teologia que se refira ao assunto da relação existente entre doença e pecado. É preciso ser cautelosos quando mergulharmos nas águas profundas da reflexão deste assunto.
Há muitas enfoques que podem ser feitos acerca deste assunto sem que nunca possamos esgotá-los à luz dos propósitos de Deus no uso das enfermidades. Mas um destes muitos enfoques é o de que as enfermidades fazem parte das variadas tribulações a que Tiago se refere, e que colocam à prova a nossa fé e refinam o nosso caráter. Assim, aquilo que não é um bem em si mesmo, e que pode ser chamado de mal, acaba, na sabedoria de Deus, cooperando para o nosso bem, já que fomos corrompidos pelo pecado, e uma das consequências do pecado (a doença) pode ser usada por Deus para a nossa restauração moral.
Stanley Jones, em seu livro, Cristo e o Sofrimento Humano, apresenta várias abordagens sobre o assunto de que estamos tratando, e dentre estas destacamos as constantes das citações a seguir:
“Jesus rejeitou, incidentalmente, no curso de uma explicação positiva sobre o sofrimento humano, três atitudes comuns para com ele. Os discípulos perguntaram-lhe na presença do cego de nascença: “Quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?”, E o Mestre respondeu: “Nem ele pecou nem seus pais, Mas para que se manifestem nele as obras de Deus, devo fazer as obras daquele que me enviou.’. Note-se que pusemos um período depois de “pais”, de modo que em vez de se ler: “Nem ele pecou, nem seus pais, mas para que se manifestem nele as obras de Deus”, lemos daquela maneira. Isto é admissível, dizem algumas autoridades. Nesse caso, pois, vemos que ele definitivamente rejeita a ideia de que atrás de toda calamidade física, como a cegueira congênita, esteja sempre o pecado pessoal ou dos pais. O fardo que pesa sobre muitas pessoas de serem as suas calamidades físicas castigo de Deus é, desse modo, levantado. A doença não é necessariamente um sinal da ira de Deus, ou do seu castigo. De acordo com a pontuação modificada, Jesus também recusa aceitar a ideia de que Deus manda todos os sofrimentos. Segundo a posição mais antiga, a doença é mandada para que “as obras de Deus se manifestem nele”. Isto poria a responsabilidade da doença diretamente em Deus. Jesus rejeita essa ideia. Ele se recusa em lançar a culpa no cego de nascença, em seus pais, ou em Deus. Põe de lado essas presunções e diz que a desgraça é uma oportunidade “para fazer as obras de Deus” nele, “enquanto é dia”. D´´a ênfase ao fato de ser a desgraça uma oportunidade.”. A isto pode acrescentar, oportunidade para Deus operar os Seus santos e elevados propósitos em relação ao resgate do homem da situação de condenação que se encontra em razão do pecado.   
“Novamente, ao falarem com ele sobre alguns galileus cujo sangue Pilatos misturar com os seus sacrifícios, Jesus respondeu: “Cuidai vós que esses galileus foram mais pecadores do que todos os galileus?,,, Não, vos digo...”. “E aqueles dezoito, sobre os quais caiu a torre de Siloé...    foram mais culpados do que todos quantos habitam em Jerusalém? Não, vos digo.”. Aqui, ele definitivamente diz que as calamidades provenientes dos homens (Pilatos), e dos poderes da natureza (queda da torre de Siloé), não provaram ser as pessoas vitimadas por elas particularmente pecadoras. Isto afasta a atitude de se julgarem justo aqueles que estão livres de desgraças quando elas sobrevêm a outros. Pode ser, disse Jesus, que não sejam absolutamente melhores do que aqueles sobre os quais sobreveio essa tribulação.”.
Um outro enfoque que pode ser apresentado em relação ao propósito de Deus nos sofrimentos decorrentes de toda sorte de aflições a que estamos sujeitos, enquanto no corpo, neste mundo, e dentre estes a doença, Stanley Jones destaca o de oportunidade para testemunhar. Ao falar em Lucas 21.7-13 sobre as aflições a que estariam sujeitos os crentes até a Sua segunda vinda, Jesus disse que tudo isto serviria para que dessem testemunho. Isto é, como uma oportunidade para testemunho. Em outras palavras: estas desgraças devem ser mudadas em testemunho. Em vez de fugir do sofrimento, o crente pode suportá-lo pela graça de Jesus e usá-lo para fazer a vontade de Deus, revelando ao mundo o poder de Cristo em sua vida.
Stanley Jones diz: “As boas novas não são apenas boas visões. Representam o fato de serem o pecado e o sofrimento enfrentados, vencidos e de proclamar-se através deles um método de vida – é esta a realidade do evangelho.”. E destaca o exemplo de Paulo para ilustrá-lo:
“Paulo tinha um espinho na carne, um emissário de Satanás para esbofeteá-lo. Pela descrição, pode ser uma enfermidade física que lhe adviera como resultado de uma injustiça – realmente um emissário de Satanás para esbofeteá-lo. Era uma enfermidade proveniente de injustiça; portanto duplamente difícil de suportar.
Certamente num caso dessa natureza Deus poderia curar a enfermidade, anular a injustiça e permitir que o apóstolo continuasse o trabalho. Três vezes Paulo pediu que Deus o tirasse, sem ser atendido. Deus parecia implacável e indiferente. Injustiça proveniente do homem, mais enfermidade em si próprio, mais indiferença de Deus, é igual a um espírito abatido! Pelo menos mediante todos os cálculos matemáticos usuais. Mas não foi! Depois do terceiro pedido, Deus disse a Paulo: “Não te curarei da enfermidade, mas farei algo melhor: Dar-te-ei poder para usá-la. Basta-te a minha graça porque a minha força se aperfeiçoa na fraqueza.”. Compreendendo o significado dessa dádiva, Paulo levantou-se e disse: “Se assim é, eu me gloriarei nas enfermidades porque na fraqueza sou forte”. Não sendo atendido na cura, viu ele a possibilidade de algo mais elevado, isto é, usar as próprias enfermidades para os objetivos de uma eficácia maior. Essa atitude nos põe diretamente diante do problema da cura. Esse fato torna evidente que Deus às vezes cura. Paulo esperava ser curado. Penso que temos direito de esperar a cura. Alguns sabem disso perfeitamente pela experiência tão indubitavelmente real que não podemos deixar de considerá-la como fato. Reconhecemos que Deus cura de muitas maneiras – pelo clima, pelos remédios, pela cirurgia, pela sugestão, pelo exercício. Não podemos considerar essas coisas senão com métodos divinos. Mas acima e além de todas elas há o toque direito do poder de Deus que cura o organismo, o qual não pode ser incluído em nenhuma dessas categorias. Embora seja verdade que Deus cura, devemos também reconhecer que ele nem sempre cura. É nessas exceções que muitos perdem a fé. É no querer provar não haver exceções que surge grande parte de irrealidades e crendices, desacreditando, assim, a cura divina. Se reconhecermos que algumas vezes Deus cura e outra não e que o recusá-la é no interesse de um bem mais alto, então podemos aceitar a recusa como sendo a sua vontade tanto quanto a cura. Na verdade, a recusa pode significar dádiva mais elevada, pois nesse caso Deus pode recusar-nos em virtude de merecermos a confiança de usar até a enfermidade. É a dádiva da sua fé em nossa força espiritual. Aqueles que sofrem nesta questão teriam conservado a fé e a teriam conservado mais gloriosamente, se tivessem compreendido o fato de que Deus oferece, não um propósito de cura inalterável, fixo, mas alternativas. As alternativas são estas: ou ele nos curará da enfermidade ou nos dará poder para usá-la. Em qualquer dos casos, soluciona-se a dificuldade. Quando alguém me pede que ore para ser curado, sempre concordo, com a condição de não perder a fé em Deus se ele recusar a cura. E que penso que o conservarmos a fé é mais importante do que a saúde. Intacta a nossa fé, embora seja negada a cura, estamos prontos para a segunda alternativa, isto é, podemos empregar a enfermidade nos propósitos de um bem mais elevado.”.
Acrescentamos às palavras de Stanley Jones, que enfocou nesta citação o problema da doença dentro do propósito de Deus de modo particular, isto é, no que se refere ao que acontece no plano pessoal, que se deve também considerar o propósito geral de Deus no uso das enfermidades, conforme já comentamos inicialmente, para convencer-nos de que há pecado no mundo, e que em razão disso, o homem necessita de salvação. Consideremos também, que a fraqueza produzida pela enfermidade nos torna dependentes de Deus, conforme é da Sua vontade, levando-nos a aproximar-nos dEle em busca de socorro e/ou conforto através da fé e da oração. O homem afastado em razão do pecado é chamado a aproximar-se de Deus em razão dos desconfortos causados pelas consequências do pecado original, que se encontram no mundo. Não é Deus, nem o cego, nem os pais do cego, os culpados de ter nascido cego, mas o pecado que entrou no mundo, sujeitando a terra à maldição, degenerando genes, produzindo cataclismas e acidentes, tornando o homem vulnerável, trazendo desordens psíquicas, corrompendo a vontade, e por fim a morte, tanto física, quanto espiritual. Não foi Deus o causador disto, mas o pecado.
Um outro propósito de Deus usando as enfermidades no mundo de pecado, é que através delas podemos aprender misericórdia, compaixão, serviço. Podemos nos exercitar no amor ao próximo, ajudando-o em suas necessidades. Doutro modo, dificilmente aprenderíamos isto. As nossas próprias enfermidades nos ensinam a ter compaixão dos que estão passando pelas mesmas dificuldades que já experimentamos.
Aqui cabe a citação de Stanley Jones:
“O amor não pode ser amor e rejeitar os fardos dele decorrentes. Num mundo como este, Deus não pode recusar a cruz e continuar como Deus de amor. Se, portanto, no meio da dor e do sofrimento, clamarmos em protesto, por ter Deus feito um mundo como este, onde são possíveis o pecado e o sofrimento, lembremo-nos de que, se nos custa muitíssimo viver nele, custou mais a Deus criá-lo. Criar um mundo como este significa que ele teria de viver nele como amor. Significa a sua própria cruz. Ele poderia ter criado um mundo em que não houvesse possibilidade de pecado ou de sofrimento. Mas, se o tivesse feito, não nos teria formado como seres morais livres, capazes de escolha. Poderia ter-nos feito títeres, não pessoas. Máquinas, não homens. Ele escolheu, ao contrário, empreender a grande aventura e criar seres morais capazes do bem e do mal.”.
“Verdadeiramente felizes são aqueles que, deliberadamente, tomam sobre si mesmos a dor por causa dos outros. E infelizes são aqueles que se concentram em si próprios e se recusam a fazer qualquer coisa pelos outros, à custa do sacrifício próprio.
Tornam-se melancólicos e enfastiados. Um Deus que se apartasse da tragédia, do sofrimento e da miséria do mundo, seria um Deus egocêntrico; infeliz portanto. Mas o Deus que conhecesse a alegria de uma cruz, seria um Deus que haveria de conhecer a alegria mais profunda do Universo – a alegria de salvar outros à custa do sacrifício próprio. Um Deus que não tivesse na sua natureza a coisa mais sublime, isto é, o amor, seria um Deus imperfeito, e portanto, não seria Deus. Pergunta o Salmista: “Aquele que fez o ouvido, não ouvirá? E o que formou o olho, não verá?”. E acrescenta Browing: “Aquele que criou o amor, não amará?”. E poderíamos acrescentar: “Aquele que pôs no coração dos homens mais nobres o impulso para o sacrifício de si mesmos, não se sacrificará?”.
À luz destas reflexões, poderíamos chamar de amor a atitude de quem procura livrar-se imediatamente dos seus entes queridos enfermos, em razão de se terem tornado em sua enfermidade um peso para eles? Seria uma demonstração de amor acusá-los de falta de fé por não serem curados? Seria toda a necessidade deles simplesmente a de serem enviados a um especialista que se ocupe em tentar curá-los profissionalmente?
Quanto à questão que se levanta quanto à atitude do crente em relação ao sofrimento, Stanley apresenta algumas reflexões, dentre as quais destacamos:
“O evangelho seria uma mensagem bastante limitada se ensinasse o indivíduo a usar o sofrimento para fins superiores, e deixasse intactos os sistemas que o causam.”.
“Devemos não só transformar o ensino sobre a atitude cristã para com o sofrimento, como também insistir na transformação dos sistemas que o produzem.”.
“O evangelho de Cristo deve ir além da justiça, deve insistir em que tomemos, quanto ao sofrimento, a atitude de Deus. A atitude divina não é apenas de justiça; supera-a – é vicária. Deus nos dá a possibilidade de usar a dor, mas não se conserva inativo nesse ponto. Ele está em ação – vicariamente em ação, na remoção das causas do sofrimento humano. E a sociedade deve fazer o mesmo.”. Note-se que não são poucas as Suas ordenações divinas em Sua Palavra, convocando todos os homens à prática da justiça. Ele quer que haja empenho nisto, apesar de serem os homens pecadores, e de viverem num mundo corrompido. Ele ordena que se converta o coração, que se modifiquem as atitudes, que se ame o próximo como a si mesmo, e que não se faça isto com palavras, mas de fato e de verdade. Isto está na Sua lei, e esta é a expressão exata da Sua vontade.
“Assim como os contatos de Deus com a sociedade são vicários, os da sociedade com o indivíduo também o devem ser. O sofrimento do indivíduo deve ser considerado e sentido como o sofrimento do todo. A queda e o pecado de um devem ser considerados e sentidos como o sofrimento do todo. A fome de qualquer pessoa deve ser sentida como a fome de todas as pessoas. O espírito de expiação deve agir em todas as relações humanas. A falta desse espírito está destruindo a sociedade humana.”.
“Jesus proclamou uma nova ordem na sociedade humana. Nessa nova ordem cada um se sentiria parte do outro, o sofrimento de um seria o sofrimento de todos, e o amor seria o móvel e o inspirador. Paulo vislumbrou uma nova fraternidade, um “corpo” no qual, ao sofrer um membro, todos sofressem com ele. Assim como no corpo humano, quando um membro é ferido, corpúsculos de todas as partes são impelidos para curar e auxiliar, assim também a saúde do organismo social devia estar à disposição das partes mais fracas para curar e elevar. Jesus mesmo representa a nova sociedade. A dor e o pecado de todo homem estavam na sua pele. Ele os sentiu tão profundamente que lhe quebrantaram o corpo na cruz. Mas esse corpo destruído tornou-se a vida de uma raça.”.
É desta sociedade onde reinam tais sentimentos vicários, isto é, colocando-se cada um no lugar do outro, que Jesus é o Rei. É este povo que compõe o Seu reino. Aqueles que carregam suas cruzes com boa vontade e amor. Que participam do mesmo cálice de sofrimentos do Seu Senhor. Uma sociedade hedonista, direcionada para o prazer, e que não sabe identificar o elevado sentido de vida que há no ato de sacrificar e sofrer em favor de outros, não é a sociedade sobre a qual o Senhor reina.
“Não devemos, portanto, transformar a possibilidade gloriosa do uso do sofrimento numa indiferença pelo sofrimento do indivíduo. Um rico fazendeiro, numa reunião de família orou para que seu vizinho pobre não morresse de fome. Quando todos se levantaram da mesa, sua filhinha lhe disse: “Papai, você não precisaria ter importunado a Deus com isso, pois facilmente poderia impedi-lo de morrer.”. Ela tem razão. A sociedade não deve permitir religiosidade em lugar de justiça. E para ser verdadeiramente cristã, ela não deve deter-se na justiça. Deve tomar a atitude de expiação e tornar todo sofrimento do homem, seu próprio sofrimento, cada pecado do homem, seu próprio pecado. E deve remover-lhe as causas, qualquer que seja o preço para si mesma. Deve fazer isto ou abdicar de ser cristã.”.
Um crente esclarecido não ficará satisfeito em seu íntimo por não ser pecador como os demais homens, tal como o fariseu da parábola. Ele terá o pecado dos outros como se fosse o seu próprio pecado, e se esforçará em levá-los à conversão e à santificação. Ele evangelizará, orará, ensinará a Palavra, exortará, disciplinará, auxiliará os que estão sendo vencidos por pecados, enquanto se regozija na presença de Deus pela sua própria santidade de vida.
Neste sentido, as frequentes enfermidades de Timóteo, foram oportunidades para Paulo e para a igreja de demonstrarem de forma prática o seu amor por ele. Seria fácil para Deus curá-lo definitivamente, mas o Senhor poderia se valer de suas enfermidades para propósitos mais elevados, como por exemplo, ensinar o amor prático ao corpo de Cristo.
Stanely Jones dá-nos alguns testemunhos sobre isto, dentre os quais destacamos este:
“Dois missionários perderam a única filha, vítima de lepra. “Este é o resultado do nosso serviço para a Índia”, poderiam ter dito no amargor da tristeza. Mas não o disseram. Voltaram à Índia resolvidos a fazer alguma coisa pelos leprosos que sofreram como a filha sofreu. Fundaram o Leprosário Purulia, que se tornou uma das maiores e melhores colônias de leprosos do mundo. A filha não morreu em vão, pois por sua morte abriu um lar para milhares dos seus companheiros de sofrimento. A nuvem que veio sobre aquele lar, com a morte da filhinha, apenas clareou a visão dos pais e fez-lhes ver uma necessidade humana que não teriam visto, se ela não os tivesse tocado diretamente.”.
Quanto à visão de sucesso atribuída à abundância de bens e de saúde, vale a pena considerar a seguinte citação de Stanley Jones:
“O homem que é capaz de usar apenas a abundância é escravo da abundância. Aquele que somente é capaz de usar a pobreza é escravo da pobreza. Ambos são escravos. Mas o homem como Paulo, que “aprendeu a estar contente na abundância e na necessidade” é livre.”.
E quanto ao temor da velhice diz:
“Sério problema é ver o nosso organismo começar a perecer e a decair. Podemos afastá-lo por meio de subterfúgios que a ciência oferece a fim de modificar o rosto, e por meio de cosméticos. Mas a batalha é perdida, e compreendemos afinal, que seremos derrotados. Esse problema é sério se nossa vida for escrava das aparências. Suponha-se, porém, que não o seja. Nesse caso poderemos encarar a velhice, que se aproxima com um sorriso, ou melhor ainda, com verdadeira alegria. Cada período da vida oferece uma oportunidade para fazer alguma coisa que é impossível em qualquer outro. Na juventude oferecemos a Deus o nosso entusiasmo; na velhice oferecemos a ponderação, a experiência, a simpatia – qualidades impossíveis de oferecer em outra época. Envelhecer, não somente em graça, mas também em gratidão, é o privilégio do cristão. Pois o cristão não deve suportar a velhice; deve usá-la.”.


Como Deus Julga o Pecado

Agora, como temos demonstrado fartamente, Deus reserva à Sua exclusiva autoridade, conforme a Sua soberania, o ato de exercer juízos temporais sobre o pecado, do modo, com quem, onde e quando Lhe apraz. Ele sempre o faz para santos propósitos, como não poderia ser diferente disto, mas é um fato inconteste que o faz, inclusive com as pessoas do Seu próprio povo, a igreja, assim como fizera com o povo de Israel nos dias do Antigo Testamento, ainda que não na mesma intensidade, presentemente, por causa da dispensação da graça em que tem vigorado a Nova Aliança feita no sangue de Cristo.
Assim, Deus julga e Ele julga as ações da mesma maneira que Ele julga de acordo com a culpa, como Ele julga de acordo com verdade e Ele julga de acordo com o conhecimento. E as ações de uma pessoa é o indicador inflexível, infalível da vida deles. E ainda que não haja um julgamento temporal de pecados praticados, nenhum pecado de quem não tenha sido justificado deixará de ser considerado no dia do juízo final. E mesmo os crentes que são julgados temporalmente por Deus quando não confessam seus pecados para que não sejam condenados juntamente com o mundo nas mesmas bases em que as pessoas que são do mundo serão julgadas, terão as suas obras julgadas no tribunal de Cristo.
A justificação pela fé somente se aplica ao tempo de entrada na salvação, mas não ao tempo de julgamento. Nós somos salvos por fé somente mas nós seremos julgados, diz Romanos, por nossas obras. Quando o crente é justificado em sua conversão, daquele momento em diante ele entra numa responsabilidade para obediência, e então a marca do crente se torna o padrão de obediência de sua vida, como fruto da graça. Fé não significa que agora que eu recebi a Jesus eu posso fazer tudo aquilo que eu quiser. Ao contrário, a verdadeira fé sempre resulta num viver santo. Agora há épocas em que nós falharmos, mas tem que estar lá alguma evidência de uma busca de Deus, de glória, honra e incorrupção como se diz em Romanos 2, porque esse é o padrão pelo qual nós seremos julgados.
Deus não julga somente segundo as obras, Ele julga também segundo o caráter e os motivos. E Ele julga segundo o Seu próprio caráter e é imparcial não aceitando suborno. Ele julga com o mesmo critério independentemente da posição que a pessoa ocupe na sociedade.
O único modo de demonstrar a verdadeira fé é através de obras.
Deus requer obediência perfeita. Deus requer uma manifestação de justiça, mas ninguém pode fazer isso. Assim a lei tem também a função de nos dirigir a um ponto de desespero onde nós nos voltamos para Deus para poder fazer o que nós não podemos fazer por nós mesmos sem a capacitação do Senhor.
A vida cristã é um combate, e o crente é um soldado que deve estar em luta constante. Agora, contra quem ele deve lutar? Não com outros crentes, irmãos na fé em Cristo. Miserável realmente é a ideia daquele homem religioso que está sempre envolvido em controvérsias. Ele nunca está satisfeito a menos que ele esteja envolvido em alguma discussão. Não, a luta principal de um crente é com o mundo, a carne, e o diabo. Se ele não tem obtido vitória sobre estes três as outras vitórias são inúteis, são vãs.
Salomão, no livro de Eclesiastes adverte o jovem, que na alegria da sua juventude, e ao recrear o seu coração nos dias da sua mocidade, deve se lembrar que Deus lhe pedirá contas de todas estas coisas (Ec 11.9). Haverá uma prestação de contas que todos farão no dia do juízo diante de Deus. Ele julgará cada coisa secreta. Dificilmente um jovem se arrepende com a intensidade devida, dos pecados que comete pelas paixões da mocidade, mas, sendo crente e se caminhar com Deus, haverá de se arrepender amargamente na velhice, e terá profunda tristeza pelas cousas reprováveis que fez em sua mocidade. E como alguém já disse apropriadamente: o arrependimento no crente aumenta, assim como a sua fé, na medida da sua consagração, e pelo aumento do conhecimento da santidade de Deus, com o passar dos anos, e não há hora em que uma pessoa mais se arrependa diante do Altíssimo, do que na hora da sua morte. É por isso também que se diz em Provérbios (13.24) que o que ama seu filho cedo o disciplina porque estará livrando sua alma dos juízos do futuro. A disciplina é a verdadeira expressão do amor porque tem por alvo não somente formar o caráter que é segundo Deus, mas também livrar a pessoa dos julgamentos de sua própria consciência e dos juízos de Deus, relativos a pecados praticados, que serão em maior número e intensidade, em proporção ao fracasso do tipo de ação disciplinadora a que estiveram submetidos por parte daqueles que são responsáveis por aplicá-la: pais, professores etc. Eli, o sacerdote, foi morto por Deus para servir de ilustração desta verdade, e seus filhos do mesmo modo, foram exterminados, pela omissão do seu pai em discipliná-los.
Nos capítulos 24 e 25 de Mateus ouvimos da própria boca de Jesus, na linguagem mais clara e definitiva, que Ele virá julgar a terra com justiça. Ele é a testemunha fiel, e não pode mentir. Diante dEle serão reunidas todas as nações, e Ele separará uns dos outros, como o pastor separa os cabritos das ovelhas. Há muitas outras passagens em que isto é mencionado, como II Tes 1.7-10 e Apo 20.11,12, por exemplo. Faltaria a nós o tempo necessário para nos referirmos a todas as Escrituras, mas é assegurado pelo Espírito Santo, cuja Palavra é a verdade, que haverá uma julgamento depois da morte.
Juntamente com este testemunho direto, deve ser recordado que há um argumento que também se faz necessário, e que deriva do fato de que Deus é justo e o Legislador sobre todos os homens. Em todos os governos humanos Ele deve ser tomado como padrão. Todos os homens receberam dons e talentos da parte de Deus. E assim todos são vistos como mordomos diante dEle, e terão que prestar-lhe contas de sua mordomia, isto é, do uso que fizeram dos dons e talentos dele recebidos para servi-lo e ao próximo. Mesmo os ímpios são responsáveis perante Ele por tal uso.
Se não há mundo futuro, então o homem egoísta que não tem o temor de Deus, está sobre todos, é o mais sábio dos homens e o mais louvado entre seus companheiros. Mas isto não pode ser assim. Nosso senso comum se revolta contra tal pensamento. Deve haver uma outra condição em que estas anomalias serão retificadas. “Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais infelizes de todos os homens”, (I Cor 15.19) disse o apóstolo. Há uma reparação para aqueles que sofreram injustamente: deve ser uma punição para o mau e opressor.
A própria consciência humana atesta que deve haver um juízo, não apenas para o castigo dos maus, mas para que através dele, os que sofreram injustamente por sua causa, direta ou indiretamente, possam ser vingados.
Agora, referindo-nos ao julgamento propriamente dito, devemos dizer, antes de tudo, que se aponta a todos a necessidade de vigilância para a vinda do Senhor (Lc 12.35-40), porque todos devemos comparecer diante do Tribunal de Cristo (2 Cor 5.10). Isto quer dizer, todos os que são da raça humana, quer crentes ou descrentes. Mas os crentes, por estarem em Cristo, conforme está escrito, terão confiança no dia do Juízo. Nunca devemos esquecer que os cabritos serão separados das ovelhas para que estas não sejam julgadas juntamente com os mesmos para efeito de condenação eterna. Mas, ninguém por mais pobre ou rico que seja estará isento de comparecer diante do Juiz de toda a terra. Repare que a palavra “todos” é usada por Paulo em II Cor 5.10. E temos ainda o verbo “comparecer”. Nenhuma ausência será possível.
Alguns afirmam que pelo fato de ser Cristo o Juiz neste Tribunal que será levantado no futuro, deve ser animador para os crentes porque têm um amigo na pessoa do Juiz. Mas o assunto não deve ser colocado desta forma, porque não é apropriada, porque todo juiz que fosse parcial a seus amigos quando se assentasse no Tribunal para o julgamento, mereceria ser colocado para fora de sua posição de juiz. Como Juiz não devemos esperar nenhum favorecimento da parte de Cristo. Ao contrário podemos esperar com certeza uma completa e perfeita imparcialidade no julgamento. Amigo ou não amigo, todos nós seremos submetidos a um julgamento perfeito, cada um de nós, e Cristo não considerará a aparência, posição ou respeitabilidade de quem quer que seja. Em muitas partes do mundo a aplicação da justiça é apenas um título, mas não será assim com o Juiz Celestial. Certamente não o teremos como um Juiz para a nossa condenação, mas como um pai que julga a seus filhos para recompensá-los ou castigá-los. Receberemos ou deixaremos de receber galardões em função do bem ou do mal que tivermos feito através do corpo depois que nos tornamos crentes no Senhor. Será a nossa fidelidade ou infidelidade ao Senhor que estarão sendo passadas por Ele em revista quando se assentar como Juiz no Tribunal.
Agora, qual será a norma do julgamento? O texto de 2 Cor 5.10 diz “para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo.”. Então, o que estará em evidência, serão nossas ações. Isto implica que cada ação nossa feita enquanto vivemos na terra, isto é, enquanto estivemos em nosso corpo físico, será conhecida. Tudo será recordado. Tudo será trazido à luz. Por maior que tenha sido o seu cuidado para esconder tais coisas, elas serão trazidas para fora para sua própria surpresa, quando isto ocorrer no seu julgamento. Quanto ao que será tornado de conhecimento público ou que não o será estará na esfera de soberania e deliberação própria do Senhor, mas é certo que nada estará encoberto aos Seus olhos de chama de fogo quando estivermos diante dEle. Os nossos pecados são esquecidos por Deus, porque foram perdoados em Cristo quanto à condenação por eles. Por isso se diz que são esquecidos, lançados no mar do esquecimento. Mas isto não significa que não haverá lembrança das nossas faltas praticadas após nossa conversão, para efeito de julgamento das nossas obras, boas ou más. É importante lembrar que Deus não é promotor de escândalos, e nem mesmo poderia sê-lo. É por isso que Ele mesmo determina que no caso de alguém pecar contra seu irmão na igreja, o ofendido deve procurar a parte culpada para a solução do problema, para que isto não chegue ao domínio público. E em caso de resistência deliberada ao arrependimento, que se leve duas ou três testemunhas para a solução do caso. E somente em caso de permanência no endurecimento, que se leve o fato ao conhecimento e deliberação da igreja. O que o Senhor tem em vista com tudo isto, não é a de tentar proteger a reputação do ofensor? Se Ele tem este cuidado no exercício da disciplina aqui neste mundo de pecado, como deixaria de tê-lo quando estivermos perfeitos em sua presença quando se assentar como Juiz? Entretanto, não cabe a nós tentar explicar ou justificar os atos soberanos do Senhor. Falar daquilo que não conhecemos perfeitamente. O que nos cabe é vigiar para que façamos caminhos retos para os nossos pés sabendo que estaremos diante dEle para sermos julgados, ainda que sendo seus filhos e amigos amados, e não mais correndo o risco de sermos condenados juntamente com os ímpios. A esse respeito, já recebemos da parte do Senhor, as correções necessárias, ainda enquanto estamos neste mundo, exatamente porque não seremos condenados juntamente com o mundo (I Cor 11.32)..
Se a graça não nos fizer diferir dos outros homens, não é a graça que Deus dá a seus eleitos. Nós não somos perfeitos, mas todos os santos de Deus mantêm seus olhos no grande padrão da perfeição, e, com forte desejo, empenham-se em caminhar à altura da elevada chamada de Deus a viverem de modo digno do evangelho, abundando em obras que provem seu amor a Deus; e se não temos estes sinais seguindo a fé, ou se não estão colocados em evidência em nós, no último grande dia nós não seremos capazes de provar a nossa fé. Isto comprovará que você odiou a Deus, porque o homem que despreza os conselhos de Deus, que não dá atenção às suas exortações e reprovações, que desdenha da sua graça, é porque certamente despreza o próprio Deus. Aquele que não é salvo pela misericórdia de Deus, prova que ele odeia o Deus de misericórdia. O crente deve provar seu amor por Deus odiando o pecado e aplicando-se por viver de modo que Lhe seja inteiramente agradável (2 Cor 5.9).
Mas, se a sua fé estiver em Jesus, se sua vida for influenciada por Jesus, Ele será o seu exemplo e haverá evidência – você pode até não ver a evidência (Mt 25.37-40), mas ela existirá em seu favor.
Por isso, devemos nos empenhar na obra de Cristo procurando fazer o bem a todos e especialmente aos domésticos da fé, porque no dia do juízo eles serão nossas testemunhas de que os visitamos, os socorremos em oração, enfim que buscamos o bem dos mesmos, segundo Deus. Ainda que não vejamos a evidência da graça de Cristo em nós, eles a testemunharão por nós, no Tribunal de Cristo. Você não precisará chamar as testemunhas porque o próprio Juiz as convocará, Ele conhece todas as coisas e todos. Além disso, tudo está registrado nos livros em que Deus tem o relato minucioso de cada uma das vidas de todos os que tiverem vivido na terra. Você entende agora porque o apóstolo insiste em dizer repetidamente que não nos cansemos de fazer o bem a todos? Em dizer que o nosso trabalho para o Senhor não é vão? E o próprio convoca-nos diretamente na Palavra em nos empenharmos em fazer boas obras diante de todos os homens? (Gál 6.9, 10; II Tes 2.13; Tito 3.14).
Quando Ele disse ao jovem rico, que lhe perguntou o que deveria fazer para herdar a vida eterna, que deveria guardar os mandamentos, não estava ensinando que alguém é salvo pelas obras, pois todos somos salvos pela graça, mediante a fé, mas, um salvo há de ser visto consequentemente, guardando os mandamentos de Deus. Somos salvos do pecado para vivermos na prática da justiça, em outras palavras, somos salvos do mal, para sermos do bem e praticarmos o bem. Um crente sem obras é uma aberração. É um desvio flagrante do propósito de Deus. Os que têm caminhado desordenadamente devem ser melhor instruídos, para que não fiquem envergonhados no dia do juízo, pois que tudo que se requererá será somente evidência, e o que será julgado, serão nossos atos, nossas obras, que tivermos feito por meio do corpo. Seja o bem, seja o mal.
Ninguém será salvo pelo mérito das suas obras, dos seus feitos, mas eles serão a evidência da sua graça, ou seus feitos serão a evidência da sua descrença, e assim, pelas suas obras estarão diante do Senhor, ou pelo seu mundanismo eles serão condenados.
O objetivo do julgamento está declarado também no texto de 2 Cor 5.10: receber segundo o bem ou mal que tiverem praticado por meio do corpo. O Senhor retribuirá a cada um segundo as suas obras. Ele recompensará a cada um, abundantemente por tudo o que tiverem feito. Ainda que o justo não mereça qualquer recompensa, da parte de Deus, porque a graça que usaram para realizar boas obras foi-lhes dada por Deus, Ele os recompensará pelas suas boas obras como evidência de um coração renovado.
Mas, o ímpio será horrivelmente castigado por suas obras. E a punição não será somente na proporção da transgressão, mas será pelo crescimento das más ações feitas com más consequências para serem sofridas, porque cada homem comerá o fruto de seus próprios caminhos.
A simples fé em Jesus é a base para o caráter que evidenciará no último dia se você é de fato um escolhido de Deus. Cristo é a rocha do fundamento em que a igreja está sendo edificada. Essa construção deve evidenciar o caráter que está determinado para nós desde antes da fundação do mundo. Que o Senhor possa operar em nós tal caráter.
O apóstolo Paulo foi um dos servos mais fiéis de Deus. E eu creio que havia três motivos importantes por detrás da fidelidade de Paulo: esperança, amor, e temor. Paulo teve uma esperança abençoada da vida eterna que motivava à fidelidade. Teve também um amor grande por Cristo. Em II Cor 5.14 ele diz, "o amor de Cristo nos constrange" – isto é, constrangeu-o a permanecer fiel a Deus. Mas a fidelidade de Paulo foi motivada também por algo mais: o temor reverencial da hora em que estaria diante do Juiz do mundo - no Dia do Juízo.
Hoje, a grande maioria dos crentes possui somente as duas primeiras motivações. Virtualmente cada crente reivindica ter a esperança da vida eterna. E muitos dizem com toda sinceridade, "eu sei que amo Jesus com todo meu coração.". Mas o que falta à igreja de Jesus Cristo nestes últimos dias é a terceira motivação - o senso do temor de que um dia nós estaremos diante de um Deus santo e daremos conta de cada pensamento e ação. Nós raramente, se nunca, pensamos nesse dia do julgamento.
Contudo a verdade da vinda de um dia de julgamento é coisa muito séria que produz crentes devotados. E esta verdade está na Bíblia para que lhes seja ensinada, como é da vontade de Deus. Aqueles que não têm isto na mente são geralmente frios, descuidados e indulgentes. Mas o fato que permanece é que cada pessoa que viveu estará sujeita um dia ao juízo de Deus - para ser julgada por Jesus Cristo (II Cor 5.10; Rm 14.12).
Neste momento mesmo, as legiões de anjos já estão prontas para atender ao comando de Jesus para recolher todos os escândalos e os que praticam a iniquidade para serem lançados na fornalha acesa onde haverá choro e ranger de dentes (Mt 13.41,42). E os crentes também serão julgados pelo Senhor, ainda que não juntamente com os ímpios, e não para condenação eterna, mas darão contas de si mesmos, de tudo que fizeram por meio do corpo. Os ímpios serão julgados depois dos crentes, para condenação eterna, e então se cumprirá a Palavra que se encontra em Mt 5.43: “Então os justos resplandecerão como o sol, no reino de seu Pai.”.
Todos os reis da terra, os grandes, os comandantes, os ricos, os poderosos e todo escravo e todo livre de todas as épocas serão trazidos para estarem na presença de Jesus, e tentarão se esconder da face daquele que se assenta no trono, e da ira do Cordeiro (Apo 6.15-17).
Os que creem em reencarnação ficarão assombrados porque saberão que não há um retorno de seus espíritos a este mundo, habitando um outro corpo, antes, serão chamados pelo Juiz à última corte – uma corte onde não há apelações.
Deus tem mantido livros para cada alma vivente desde Adão. Deus gravou cada paixão, cada pensamento, cada palavra, cada ação. E o histórico de vida de cada crente está escrito num livro de memórias, que é o livro da vida. E no dia do julgamento, Cristo irá recordar tudo o que está escrito neste livro: “Então os que temiam ao Senhor falavam uns aos outros; o Senhor atentava e ouvia; havia um memorial escrito diante dele para os que temem ao Senhor, e para os que se lembram do seu nome. Eles serão para mim particular tesouro naquele dia que prepararei, diz o Senhor dos Exércitos; poupá-los-ei, como um homem poupa a seu filho que o serve.” (Mal 3.16,17).
Se você ama Jesus de todo o seu coração e se você foi lavado pelo sangue, o seu nome está escrito no seu livro de memória. Mas há o livro, e há livros. A Bíblia diz que cada vida tem seu próprio livro, um registro de uma vida inteira na terra: “Vi um grande trono branco e aquele que nele se assenta, de cuja presença fugiram a terra e o céu, e não se achou lugar para eles. Vi também os mortos, os grandes e os pequenos, postos em pé diante do trono. Então se abriram livros. Ainda outro livro, o livro da vida, foi aberto. E os mortos foram julgados, segundo as suas obras, conforme o que se achava escrito nos livros. Deu o mar os mortos que nele estavam. A morte e o além entregaram os mortos que neles havia. E foram julgados, um por um, segundo as suas obras.” (Apo 20.11-13).
A Escritura afirma que cada pessoa terá um corpo de ressurreição nesse tempo. O ímpio terá um corpo destinado à perdição (Rom 9.22). Mas os crentes terão um corpo de glória como o do Seu Senhor.
Há que se considerar que antes que o Juiz condene eternamente os ímpios, ele chamará os santos para estarem ao seu lado, como se lê em Apo 3.21; I Cor 6.2,3 e em várias outras passagens das Escrituras. Quando Jesus vier em sua majestade com todos os anjos, Ele se assentará no seu trono de glória, e então, com todas as nações reunidas em Sua presença, separará os cabritos das ovelhas (Mt 25.31-33).
A Bíblia é bastante clara quanto àqueles que têm permanecido em Cristo quanto a que terão ousadia e confiança nesse dia: “Filhinhos, agora, pois, permanecei nele, para que, quando ele se manifestar, tenhamos confiança e dele não nos afastemos envergonhados na sua vinda.” (I Jo 2.28). “Nisto é em nós aperfeiçoado o amor, para que no dia do juízo mantenhamos confiança; pois, segundo ele é, também nós somos neste mundo.” (I Jo 4.17). Mas é oportuno esclarecer que esta santa ousadia e confiança a que o apóstolo se refere, está baseada no fato de viverem os crentes de modo digno, como verdadeiros filhos de Deus. Ele não estava se referindo a uma teoria, a um mero ensino teológico, mas a uma realidade referente à vida dos filhos de Deus. Os apóstolos quando se referiam à santidade devida a Deus pelo fato de ser Ele santo (I Pe 1.13-16), estavam se referindo a todo o procedimento dos crentes, ao seu comportamento total, em todas as áreas de suas vidas. O assunto era tratado com a devida solenidade e seriedade, porque olhavam para o futuro, para o Tribunal de Deus onde os próprios crentes serão julgados, ainda que não para condenação eterna. Olhavam para o dia do Juízo Final, em que os próprios crentes estariam junto ao Senhor em seu trono, como testemunhas no julgamento para condenação que estabelecerá sobre os ímpios e anjos caídos. Portanto, de que modo santo de vida, de que compromisso real com Cristo, de que tipo de permanência nEle estão os apóstolos falando na Palavra? Não é menos do que aquele que gera temor, tremor e reverência diante do Juiz de mortos e de vivos. Como o crente poderá estar não envergonhado na presença de Deus no dia do juízo, se não vela pelo seu modo de caminhar neste mundo? Por isso é necessário permanecer nEle e ser aperfeiçoado no amor para que possa estar com confiança e ousadia na presença de Deus no dia do Juízo. Que ele saiba fazer o uso adequado da graça de Jesus que o libertou do pecado e da morte, enquanto caminha neste mundo de trevas. E que não abuse do direito que foi conquistado para ele por Cristo, vivendo desordenadamente, sob o argumento de que já foi salvo. Haverá um juízo futuro de todo o seu comportamento. É bom que não se esqueça disso, quando a carne o incita a abusar da graça do Senhor.
É por isso que não são poucas as referências bíblicas que apontam para a necessidade de os crentes se empenharem em santidade para que sejam achados sem mácula e irrepreensíveis quando Jesus se manifestar em Sua vinda para julgar todos os homens, de modo que não se envergonhem em Sua presença (Lc 21.36; I Cor 1.8; Cl 1.22,23; I Ts 5.23; I Tim 6.14; II Pe 3.11-14; I Jo 2.28).     
Por isso o crente deve examinar-se a si mesmo, todos os dias da sua vida, para saber como tem andado na presença de Deus.
Este mundo não é a nossa pátria, e estaríamos criando raízes nele? Jesus nos salvou exatamente para nos desarraigar deste mundo perverso, isto é, para arrancar nossas raízes do mesmo, de maneira que elas possam estar sendo firmadas no Seu amor, pois é nisto em que devemos estar arraigados.
Falando do dia da vinda do Senhor e do fogo que fará com que os céus passem com estrepitoso estrondo, de modo que a terra e as obras que nela existem sejam atingidas (II Pe 3.10), Pedro se refere ao modo que os crentes devem viver, em razão do estabelecimento de tal juízo da parte de Deus: “Visto que todas essas cousas hão de ser assim desfeitas, deveis ser tais como os que vivem em santo procedimento e piedade, esperando e apressando a vinda do dia de Deus, por causa do qual os céus incendiados serão desfeitos e os elementos abrasados se derreterão.” (II Pe 3.11,12). “Por essa razão, pois, amados, esperando estas cousas, empenhai-vos por ser achados por ele em paz, sem mácula e irrepreensíveis,” (II Pe 3.14). A Bíblia não dá a mínima margem para que qualquer crente possa justificar um modo de vida negligente e não santo. Ao contrário, alerta-nos, adverte-nos, exorta-nos firmemente quanto ao modo de vida que devemos ter em face do juízo que se aproxima.
Ninguém se iluda que poderá agradar a Deus isolando-se da comunhão dos santos na igreja. O lugar em que cada crente deve servir e ser santo ao Senhor, de modo agradável, é ocupando o lugar que lhe está reservado por Ele mesmo, no corpo de Cristo, em Sua amada Igreja. O crente não deve abandonar a comunhão dos santos para não prejudicar a si mesmo, e também os interesses do reino de Deus, que são realizados usando-se a igreja como meio. Afastar-se dela é incorrer em grave erro. Mesmo com todas as suas falhas e defeitos, é ali o lugar que cada crente deve ser encontrado para o aperfeiçoamento de sua santidade e de todos os demais santos (Hb 10.24,25).   
Não servirá como desculpa o fato de justificar a sua falta de santidade, pela falta da mesma em sua igreja, porque então, seria o seu dever dar o exemplo e orar por ela.
Se um único pecado sujeita à condenação eterna no inferno a todos quantos não têm a Cristo, de que modo então devem viver os que foram livrados de tão grande condenação, por terem sido feitos filhos de Deus, por meio da graça que está em Cristo Jesus?
Este modo nos é ensinado pelas conclusões que podemos tirar da parábola do servo vigilante, da dos talentos, e das variadas exortações à perseverança, que encontramos na Palavra de Deus.
É com fraqueza, temor e grande tremor que o salvo deve andar diante de Deus, porque, pela Sua justiça, tem revelado o que fará a todos quantos vivem na prática do pecado.
Ainda que livrado da condenação eterna pelo sangue e sacerdócio de Cristo, não está o crente, todavia, livre do julgamento de sua vida e obras por Deus, no Tribunal de Cristo (Rm 14.10-12; II Cor 5.9-11), ainda que não para efeito de condenação, mas seguramente sofrerá alguma forma de dano e castigo, não somente em relação à perda de galardões, mas quanto ao conhecimento de sua condição e atos de infidelidade praticados durante sua jornada terrena, depois de ter-se tornado servo de Cristo.
Seguramente foi salvo pela graça, mas para viver dignamente, como convém a todos os que foram feitos filhos de Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo.
Há um juízo esperando por cada crente, porque também está escrito que o juízo começa pela casa de Deus, e que o Senhor julgará o seu povo. Isto deve ser claramente ensinado, para que haja um sábio temor a reger toda a nossa conduta em nossa caminhada terrena, de modo que sejamos diligentes em viver de modo santo e irrepreensível, dando bom testemunho em todas as coisas e áreas de nossas vidas.
Se lemos na parábola do servo vigilante (Lc 12.35-48) o que será feito com o mordomo infiel, que terá sua sorte lançada com os infiéis onde há choro e ranger de dentes, bem faríamos em considerar que tipo de fidelidade se espera de nós na qualidade de servos verdadeiros de Deus, e não infiéis, como o citado na parábola.
Se a infidelidade na mordomia conduz aos horrores do inferno, como seremos desleixados no cuidado daqueles que Deus tem confiado a nós? Porque certamente prestaremos contas da nossa mordomia, como está escrito em tantas passagens bíblicas, e que possamos fazê-lo com alegria e não gemendo, como lemos em Hb 13.17.
Jesus disse que é na nossa perseverança que ganharemos as nossas almas. Ora, isto quer indicar que há necessidade de evidência de vida santificada, de perseverança na fé, de fidelidade, na vida de todos os que são filhos de Deus. A Palavra é clara em afirmar que sem santificação ninguém verá a Deus. Ora, o que isto quer significar é exatamente o que está dito. Se alguém é salvo, deve demonstrá-lo pelas suas obras e empenho de viver de modo inteiramente agradável a Deus. É certo que a salvação é pela graça e mediante a fé, e não por obras, mas Deus determinou por Seu decreto de que o que for salvo deve viver abundando em obras de justiça, em santificação. Que ninguém se glorie portanto na segurança eterna da sua salvação sem que se esforce para viver como um mordomo fiel, que faz não a própria vontade, mas a vontade do seu Senhor. Os que praticam a justiça segundo a vontade de Deus, e perseveram na fé, podem estar certos da segurança da sua salvação e de que têm confirmado cada vez mais a sua eleição e consequente garantia de entrada na posse da herança eterna que lhes está reservada nos céus. Porque um terrível juízo de fogo aguarda a todo aquele que não perseverou até o fim, que não exerceu a sua mordomia com temor e tremor, em fidelidade diante de Deus, que não investiu seus talentos no reino de Deus.
Não dizemos com isso que um autêntico eleito virá a perder a sua salvação, mas que todo verdadeiro crente persevera, e com isto dá provas evidentes da sua salvação, pelo exercício fiel da sua mordomia. Ninguém deve descuidar-se portanto de ser diligente no seu caminhar, sem o devido temor do Tribunal de Cristo, onde todos prestarão contas de sua mordomia ao Senhor. Recordemos que castigos estão reservados aos descuidados e até mesmo aos ignorantes, conforme revela a parábola do servo vigilante, e ainda na mesma parábola, o próprio inferno aos infiéis, que esperamos, não se refira a parábola, e não encontremos entre os mesmos, a verdadeiros servos de Cristo, comprados para Deus pelo Seu próprio sangue. Isto dizemos porque quando a parábola do servo vigilante foi proferida (Lc 12.35-48), Jesus estava explicando aos discípulos sobre a sua segunda vinda para estabelecer o julgamento divino sobre todos os homens, separando os cabritos das ovelhas. Nesta ocasião, os apóstolos não estavam ainda bem inteirados da missão de Jesus, o que se infere pela pergunta que lhe foi feita por Pedro (Lc 12.41) sobre a aplicação da parábola, se a mesma se referia apenas aos crentes ou a todos. E a resposta de Jesus foi dada na sequência em Lc 12.42-53, subentendendo-se que contemplava toda a humanidade, mas respondia à expectativa de Pedro e dos demais, contemplando especialmente a comunidade de Israel, que era tida, toda a nação, como povo eleito de Deus. Israel era o servo do Senhor. Mas Jesus, deixou claro que sua missão seria a de lançar o fogo do juízo sobre a terra, que seria estabelecido depois da Sua morte, que dividiria o mundo todo em dois segmentos, inclusive Israel: aqueles que seriam livrados da condenação vindoura por crerem nEle, e os que permaneceriam debaixo de tal condenação, de sorte, que estariam também divididos entre si, em suas próprias famílias (Lc 12.49-53). Ora, disso se depreende então que ao falar de mordomos fiéis e infiéis instruindo os discípulos sobre a condição dos homens quanto à prestação de contas de sua mordomia no dia do juízo, não se dirigia exclusivamente aos crentes, mas a todos os homens, porquanto todos têm recebido, crentes e não crentes, talentos e dons de Deus para servirem ao próximo, sendo todos, neste sentido, administradores dos bens que têm dEle recebido, e haverão de prestar contas a Deus no dia do juízo, sobre o uso que fizeram destes dons e talentos. Se foram usados para a glória exclusiva do Senhor, debaixo do Seu temor, ou se foram usurpadores da herdade do Senhor, para atenderem a seus próprios interesses e caprichos egoístas. A parábola é clara no sentido de afirmar que é somente aos mordomos fiéis e prudentes que o senhor confiará os seus conservos para que recebam o sustento a seu tempo, e que somente estes são bem-aventurados diante de Deus, se forem achados desta forma na volta do seu senhor (Lc 12.42,43). Sabemos que somente os crentes podem atender a tal condição. Mas se o mordomo maltratar os criados e as criadas, e comer o que é destinado a eles, bebendo e embriagando-se, será lançado no inferno quando da volta do senhor, quando for prestar contas com ele (Lc 12.45,46). Um crente que faça tal coisa está louco, porque estará fazendo o que é próprio aos que são das trevas e que estão sujeitos à ira e à condenação de Deus, por não terem sido justificados no sangue de Jesus. É bem provável que no caso de crentes se lhes aplique o que está contido em Lc 12.47 e 48, que distingue entre aqueles que conheciam a vontade de Deus, quanto ao que se esperava deles em termos de procedimento, pela Palavra, na condição de crentes, e que não a fizeram, sendo por isso punidos com muitos açoites (retribuição, dano, perda de galardão, sem condenação) e aqueles que não chegaram a conhecer a vontade do Senhor, pela Palavra, e que fizeram cousas dignas de reprovação, que serão também castigados, mas com poucos açoites. Entenda-se que tudo isto Jesus ensinou como fatos que ocorrerão no Tribunal de Deus, no futuro, em razão de Sua segunda vinda para julgar todos os homens.          
Vivemos em dias muito perigosos em que os crentes, diferentemente dos crentes do passado, não têm mais a determinação de fazer marcante a sua distinção em relação ao que é do mundo, para revelarem a sua condição de pertencerem a Cristo, empenhando-se em cumprir tudo o que está ordenado em Sua Palavra. Hoje em dia, vê-se exatamente o contrário, um esforço dos crentes para mostrarem que não são pessoas diferentes das que são do mundo.
A norma bíblica de não se por em jugo desigual com os incrédulos, porque não há comunhão entre luz e trevas, já não soa tão alto nos ouvidos espirituais da maioria dos crentes destes últimos dias. A igreja está no mundo mas não é do mundo. E o que ama o mundo é chamado de infiel na Bíblia, e se faz com isso inimigo de Deus, que não é mundano, mas santo.
Por todo lado e momento há cheiro de infidelidade no ar. Tudo convida a isto. É necessário mais do que triplicar a vigilância, porque os dias são maus. A rigorosa justiça do Deus que nos salvou clama por completa conformação à Sua santidade, num viver fiel à Sua vontade. Isto jamais mudará em qualquer época, porque Jesus não muda, e a Sua Palavra permanece a mesma para sempre. É sobretudo neste sentido que importa, antes, agradar a Deus do que aos homens. Não devemos seguir o espírito da época, mas o Espírito de Deus.
O Mestre já nos tem alertado na Sua Palavra o horror eterno que está reservado para os infiéis. Como poderemos então viver de modo infiel a Ele? Se há cheiro de risco no ar, qual é a vantagem de fechar nossos olhos e ouvidos espirituais às suas exortações à necessidade de vigilância e perseverança? Como justificaremos diante dEle no julgamento diante de Seu trono a opção por um viver irresponsável e negligente neste mundo? Como esperaremos ouvir o “Muito bem servo bom e fiel”, se não pusemos por alvo ser-lhe inteiramente fiéis, especialmente por praticar a Sua Palavra revelada, conforme a temos na Bíblia? Bem faremos em nos apegar com mais firmeza às verdades ouvidas, para que delas jamais nos desviemos (Hb 2.1), porque, afinal, não há uma outra opção de vida para um crente autêntico. O que é crente deve viver como crente, segundo a Palavra. Não há uma outra opção de vida para ele.
Todos os servos de Deus que se empenharam em fazer a Sua vontade, e que se gastaram em Seu serviço, gerando muitos frutos para a Sua glória, estavam completamente inteirados destas coisas. Eles sabiam que estarão um dia no Tribunal de Cristo para prestarem contas de suas próprias vidas. Eles temiam o Senhor, e sabiam exatamente o que exige a santidade e justiça do Deus que estavam servindo. O próprio apóstolo Paulo declara isto em suas epístolas. Um dos segredos do seu empenho na obra de Deus era o fato de que tinha o conhecimento do que ocorrerá no Tribunal de Cristo, e andava em temor e tremor em sua caminhada terrena, sabendo que haveria de prestar contas de todos os seus atos, no futuro. Todo crente deve ser devidamente esclarecido quanto a isto, e deve dirigir os seus passos com o mesmo temor e tremor que havia no apóstolo Paulo.
Entretanto, pelo princípio que muito se exige a quem muito é dado, Deus há certamente, de ser muito mais rigoroso com aqueles que são chamados por Ele para serem seus ministros, e é aqui, que se aplicam as palavras de Tiago 3.1: “Meus irmãos, não vos torneis, muitos de vós, mestres, sabendo que havemos de receber maior juízo.”. Todos os que aspirarem ao ministério devem estar devidamente esclarecidos que estão escolhendo juntamente serem submetidos no futuro, no Tribunal de Cristo, a um juízo mais rigoroso da parte de Deus.          
O fato de que haverá seguramente um Tribunal onde Cristo passará as nossas obras em revista, é o fato de Deus ordenar que haja exercício de disciplina não apenas em nossos lares, como também na igreja.




LEVANDO O PECADO A SÉRIO

(exposição em Esdras 9)
“1 Ora, logo que essas coisas foram terminadas, vieram ter comigo os príncipes, dizendo: O povo de Israel, e os sacerdotes, e os levitas, não se têm separado dos povos destas terras, das abominações dos cananeus, dos heteus, dos perizeus, dos jebuseus, dos amonitas, dos moabitas, dos egípcios e dos amorreus;
2 pois tomaram das suas filhas para si e para seus filhos; de maneira que a raça santa se tem misturado com os povos de outras terras; e até os oficiais e magistrados foram os primeiros nesta transgressão.
3 Ouvindo eu isto, rasguei a minha túnica e o meu manto, e arranquei os cabelos da minha cabeça e da minha barba, e me sentei atônito.
4 Então se ajuntaram a mim todos os que tremiam das palavras do Deus de Israel por causa da transgressão dos do cativeiro; porém eu permaneci sentado atônito até a oblação da tarde.
5 A hora da oblação da tarde levantei-me da minha humilhação, e com a túnica e o manto rasgados, pus-me de joelhos, estendi as mãos ao Senhor meu Deus,
6 e disse: Ó meu Deus! Estou confuso e envergonhado, para levantar o meu rosto a ti, meu Deus; porque as nossas iniquidades se multiplicaram sobre a nossa cabeça, e a nossa culpa tem crescido até o céu.
7 Desde os dias de nossos pais até o dia de hoje temos estado em grande culpa, e por causa das nossas iniquidades fomos entregues, nós, os nossos reis e os nossos sacerdotes, na mão dos reis das terras, à espada, ao cativeiro, à rapina e à confusão do rosto, como hoje se vê.
8 Agora, por um pequeno momento se manifestou a graça da parte do Senhor, nosso Deus, para nos deixar um restante que escape, e para nos dar estabilidade no seu santo lugar, a fim de que o nosso Deus nos alumie os olhos, e nos dê um pouco de refrigério em nossa escravidão;
9 pois somos escravos; contudo o nosso Deus não nos abandonou em nossa escravidão, mas estendeu sobre nós a sua benevolência perante os reis da Pérsia, para nos dar a vida, a fim de levantarmos a casa do nosso Deus e repararmos as suas assolações, e para nos dar um abrigo em Judá e em Jerusalém.
10 Agora, ó nosso Deus, que diremos depois disto? Pois temos deixado os teus mandamentos,
11 os quais ordenaste por intermédio de teus servos, os profetas, dizendo: A terra em que estais entrando para a possuir, é uma terra imunda pelas imundícias dos povos das terras, pelas abominações com que, na sua corrupção, a encheram duma extremidade à outra.
12 Por isso não deis vossas filhas a seus filhos, e não tomeis suas filhas para vossos filhos, nem procureis jamais a sua paz ou a sua prosperidade; para que sejais fortes e comais o bem da terra, e a deixeis por herança a vossos filhos para sempre.
13 E depois de tudo o que nos tem sucedido por causa das nossas más obras, e da nossa grande culpa, ainda assim tu, ó nosso Deus, nos tens castigado menos do que merecem as nossas iniquidades, e ainda nos deixaste este remanescente;
14 tornaremos, pois, agora a violar os teus mandamentos, e a aparentar-nos com os povos que cometem estas abominações? Não estarias tu indignado contra nós até de todo nos consumires, de modo que não ficasse restante, nem quem escapasse?
15 Ó Senhor Deus de Israel, justo és, pois ficamos qual um restante que escapou, como hoje se vê. Eis que estamos diante de ti em nossa culpa; e, por causa disto, ninguém há que possa subsistir na tua presença.” (Ed 9.1-15).
O povo do Senhor deve ser muito cuidadoso quanto ao modo como anda na Sua santa presença, porque, conforme no dizer de Tiago “qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos.” (Tg 2.10). E o apóstolo não está falando aqui de salvação, mas de santificação, de consagração.
Israel não estava adorando Baal no templo do Senhor como havia feito os seus antepassados. Eles não estavam edificando altares para provocar o Senhor à ira. Mas estavam casando com mulheres das demais nações, transgredindo a Lei de Deus relativa ao matrimônio das pessoas do seu povo, que não devem se colocar em julgo desigual com os incrédulos.
Não basta sermos zelosos a várias exigências que são feitas a nós pelo Senhor, em Seus mandamentos, mas a todas elas.   
Jesus nos disse que o crente que violasse o menor mandamento da Lei e assim o ensinasse aos homens seria considerado mínimo no reino dos céus. Ele mostra que esta pessoa pode estar no reino, ser salva, mas desagradar inteiramente a Deus, por transgredir um só e pequeno mandamento da Lei, ainda que tenha apreço por todos os demais.
“Qualquer, pois, que violar um destes mandamentos, por menor que seja, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor no reino dos céus; (Mt 5.19a).
Quando nós entendemos espiritualmente qual é o verdadeiro apreço que Deus tem pela Sua Palavra, e pela Sua completa seriedade em exigir que guardemos todos os Seus mandamentos, é que podemos também entender por que Esdras reagiu da maneira que reagiu quando soube através dos príncipes de Judá que até mesmo sacerdotes haviam se entregue à prática de casamentos mistos (v. 1,2), pois Esdras rasgou a sua túnica e o seu manto, e arrancou os cabelos da sua cabeça e barba e ficou sentado atônito no templo (v. 3).   
E a causa disto é declarada no verso 4, porque se juntaram à sua tristeza pelo pecado do povo de Judá todos aqueles “que tremiam das palavras do Deus de Israel”. As ameaças da Antiga Aliança eram muito sérias para a transgressão dos mandamentos da Lei, especialmente daquele que aqueles judeus estavam transgredindo. Esdras e aqueles que se juntaram a ele, bem conheciam a Lei, e não somente a conheciam, como tinham um verdadeiro temor do Senhor, quanto ao modo como Ele vela sobre a Sua Palavra para a cumprir, seja para abençoar no caso de obediência, seja para castigar e corrigir, no caso de desobediência. Daí se dizer que este tipo de temor de Deus é o princípio da sabedoria, porque através dEle evitaremos a todo custo fazer aquilo que Lhe seja desagradável.
Esdras tendo-se levantado com suas vestes rasgadas por ocasião da apresentação do cordeiro que era oferecido como holocausto à tarde, ali junto ao altar do templo, colocou-se de joelhos e orou ao Senhor com as mãos estendidas (v. 5), com as palavras registradas nos versos 6 a 15, confessando o pecado do povo como fosse o seu próprio pecado, porque estava identificado com eles tanto na condição de ser da mesma família do Senhor, quanto de ministro designado para cuidar das almas deles.
Um bom ministro do evangelho, instruído na vontade do Senhor, não se justificará diante do pecado do povo que foi colocado pelo Espírito debaixo da sua autoridade, e nem os condenará, antes chorará por causa do pecado deles, confessará o pecado deles como se ele próprio tivesse pecado. E vale lembrar que Esdras fizera isto sem ter tido tempo de conduzir aquele povo. Eles não se encontravam antes debaixo da sua liderança, mas ele lamentou profundamente por eles quando soube do estado de coisas que estavam ocorrendo entre eles.
Esdras afirmou a justiça de Deus em ter deixado que Israel ficasse reduzido a um número de pessoas tão pequeno, por causa dos pecados deles, e por esta mesma causa eles seriam dignos até mesmo de serem exterminados como Sodoma e Gomorra, mas ele reconhecia que era pela exclusiva graça do Senhor que Ele estava mantendo um remanescente em Israel (v. 8), e ele reconhece no final da sua oração que eles estavam indesculpáveis diante do Senhor (v. 15), porque em face de tão grande misericórdia eles não lhes foram fiéis, mas ao contrário, continuavam transgredindo os Seus mandamentos.
Quão diferente é isto do que andam apregoando os pregadores da Terceira Onda, e os falsos mestres e pastores da Teologia da Prosperidade. Eles sequer admitem que se fale em pecado, porque isto é negativo, e o crente deve pensar somente no que é positivo. Quanto mais sobre a necessidade de arrependimento e confissão humilde do pecado, reconhecendo a miséria da nossa natureza terrena que temos o dever de mortificar, para que a nova natureza possa crescer na santidade que procede de Deus, pelo Espírito!
Assim, todo ministro fiel afirmará a justiça do Senhor em corrigir o Seu povo enquanto pede humildemente a Ele que seja misericordioso para com ele e para com o seu povo, porque sem Ele, nada podemos fazer, e de nós mesmos, por causa da fraqueza da nossa carne, somos dados a nos desviar da Sua presença.
Mas, estes mesmos ministros fiéis jamais justificarão o pecado, jamais serão condescendentes para com o pecado, e tal como Esdras não desconsiderarão o pecado do seu povo usando como desculpa que afinal a carne é fraca, e que somos dados a nos desviar de Deus. Ao contrário, ele trará esta realidade sempre diante de si e sempre alertará o seu povo quanto à necessidade pois de vigiar e de orar incessantemente, de modo a não se cair em tentações e ser vencido pelo mal. Que a santificação da vida seja real e constante. Que o compromisso com Deus seja sério. Que o tremor da Sua Palavra seja sempre presente e permanente. Se pecarem eles confiarão no Advogado que têm junto ao Pai, mas terão verdadeiro horror ao pecado e lembrarão que também lhes é imposto o dever de não viverem pecando. A oração deles será: “Não posso escondê-lo....pequei...confesso o meu pecado ao Senhor, mas sei que não devo pecar mais. Sei que o pecado poderá voltar a bater à minha porta, mas estou bem certo de que não devo voltar a lhe dar acolhida.”. Uma verdadeira santificação demanda esta convicção e determinação em purificar o coração e de se viver de tal maneira que não se tenha que estar pedindo perdão a toda hora a Deus por transgressões voluntárias dos Seus mandamentos. Afinal os que estão se santificando constatarão que pelo poder do Espírito Santo, e pelo seu crescimento na graça e no conhecimento de Jesus a natureza terrena, ou carne, ficará cada vez mais fraca, e a nova natureza, recebida na regeneração, ficará cada vez mais forte, de modo que um crente espiritual não viverá pecando e nem debaixo do domínio do pecado, como costuma ocorrer com aqueles que não estão santificando as suas vidas.       
Eles saberão que a santificação deles não consiste em perfeição moral absoluta enquanto estiverem neste mundo, isto é, sem qualquer pecado, mas exatamente nesta obediência à Palavra do Senhor pelo Espírito, sabendo eles que um coração puro é aquele que sente repugnância pelos pecados que possa eventualmente cometer. Quando se perde este sentido espiritual de repugnância pelo pecado, é necessário pedir ao Senhor um coração puro, tal como fizera Davi no passado.   





Afinal por que não entraram na arca com Noé?

Os que pereceram no dilúvio não podiam ter se salvado pelo simples ato de entrarem na arca?
Noé mesmo não lhes havia pregado para que se salvassem daquela destruição?
No entanto, o que ocorreu com Noé acontece em relação a Cristo, que é a arca que pode nos salvar com segurança.
Não é uma simples questão de fugir para a arca para ser salvo.
Esta arca é santa. O que está nela é santo, e santos devem ser todos os que entrarem nela.
Os homens dos dias de Noé olhavam para ele e não se agradavam do seu modo de vida santo.
Eles não queriam ser como Noé. Ele não seria uma companhia agradável para eles, porque afinal queriam viver na prática deliberada do pecado. Eles queriam uma vida de violência e impureza. E isto não estava em Noé. E o discurso de Noé também não lhes era agradável porque protestava contra os pecados deles e lhes exigia mudança de vida, arrependimento, para viverem de modo justo para Deus.   
Eles não queriam isto. Desprezaram tanto a Noé quanto a mensagem que ele pregava, e em consequência pereceram.
Não é nada diferente disto o que ocorre ainda e principalmente hoje em relação a Cristo.
O juízo de Deus está às portas, pronto para ser despejado sobre o mundo, mas as pessoas desprezam a Cristo e a mensagem de arrependimento do evangelho. Por isso Jesus disse que quando estivesse próxima a Sua volta para julgar o mundo as coisas estariam ocorrendo como nos dias de Noé.
"19 E o julgamento é este: A luz veio ao mundo, e os homens amaram antes as trevas que a luz, porque as suas obras eram más.
20 Porque todo aquele que faz o mal aborrece a luz, e não vem para a luz, para que as suas obras não sejam reprovadas." (Jo 3.19,20).




Sobre o Pecado nos Crentes

“Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura”.
(2 Coríntios 5.17)
1. HÁ, porventura, pecado naquele que está em Cristo? Permanece o pecado no que crê em Cristo?
Subsiste qualquer pecado nos que foram nascidos de Deus, ou estão inteiramente libertados do pecado?
Que ninguém julgue seja isto assunto de mera curiosidade, ou que seja de pequena importância responder-se de uma ou de outra forma. Ao contrário, esta questão é da maior importância para todo cristão honesto, e sua solução interessa mui de perto à felicidade presente e à felicidade eterna.
2. Não se sabe de controvérsia que sobre isto se houvesse levantado na Igreja primitiva. Na verdade, não havia lugar para disputa acerca desse assunto, visto constituir matéria dobre que todos estavam concordes.
Na medida de minha constante observação, todas as comunidades de cristãos antigos, que algo nos deixaram escrito, declaram a uma voz que, mesmo os crentes em Cristo, mesmo os que são “fortes no Senhor e na força do seu poder”, tem necessidade de “lutar contra a carne e o sangue”, contra uma natureza depravada, assim como contra “principados e potestades”.
3. E nisto a Igreja (como, na verdade, acontece em muitos pontos), segue exatamente a primitiva, declarando em seu Artigo Nono: “O pecado original é a corrupção da natureza de todo homem, pela qual está por sua própria natureza inclinado para o mal, de modo que a carne cobiça contra o Espírito.
Esta infecção da natureza permanece mesmo naqueles que são regenerados, visto que a cobiça da carne não está sujeita à lei de Deus. E embora não haja condenação para os que creem, essa cobiça participa da natureza do pecado”.
4. O mesmo testemunho dão todas as outras Igrejas, —não só a grega e a romana, mas todas as comunidades reformadas da Europa, e não importa que denominação. Algumas, na verdade, parece terem levado a questão demasiadamente longe, apresentando a corrupção do coração, mesmo no crente, de intensidade tal, que ele se mostra incapaz de a dominar, sendo, ao invés, escravo dela; e, nesse sentido, não estabelecem sensível diferença entre o crente e o incrédulo.
5. Para fugir a esse extremo, muitos homens bem intencionados, principalmente os que seguiram a orientação do finado Conde Zinzendorf, correram para o lado oposto, afirmando que “todos os verdadeiros crentes são não somente salvos do domínio do pecado, mas do pecado interno e externo, de modo que o pecado não mais permanece neles”. Dos seguidores de Zinzendorf, nestes vinte anos, muitos de nossos compatriotas herdaram a mesma opinião, afirmando que a corrupção da natureza não mais existe no que crê em Cristo.
6. É verdade que, quando os alemães eram arguidos sobre este capítulo, logo reconheciam (pelo menos muitos dentre eles), que “o pecado ainda permanece na carne, mas não no coração” do crente; e, algum tempo depois, quando se mostrou o absurdo de tal afirmativa, eles de pronto mudaram de tom, confessando que o pecado ainda permanece no que é nascido de Deus, embora não o domine.
7. Mas os ingleses, que receberam dos morávios essa doutrina (alguns diretamente, outros de segunda ou terceira mão), não se mostraram prontos em romper com ela; e, mesmo quando muitos deles foram convencidos de que semelhante posição teológica seria insustentável, não se deixaram persuadir, mas, ao contrário, mantêm-na até hoje.
II
1. Por amor dos que realmente temem a Deus e desejam conhecer a “verdade que há em Jesus”, não se pode levar a mal a consideração calma e imparcial do assunto. Fazendo isto, uso indiferentemente as palavras regenerado, justificado ou crente, uma vez que, embora não tenham rigorosamente o mesmo significado (a primeira implicando em mudança interna, atual; a segunda em mudança relativa; e a terceira no meio pelo qual ambas as mudanças operam), todavia elas vêm a ser uma e a mesma coisa, visto que aquele que crê é ao mesmo tempo justificado e nascido de Deus.
2. Por pecado, aqui emprego a palavra no sentido de pecado interior; toda tendência pecaminosa, paixão ou afeição, tais como orgulho, obstinação, amor ao mundo, de qualquer espécie ou grau; cobiça, ira, impertinência; qualquer disposição contrária à mente que havia em Cristo.
3. A questão não se refere ao pecado exterior, – se o filho de Deus o comete ou não. Todos concordamos e ardorosamente sustentamos que “o que comete pecado é do diabo”. Concordamos em que “qualquer que é nascido de Deus não comete pecado”. Também não perguntamos se o pecado interior permanecerá sempre nos filhos de Deus; se o pecado continuará na alma enquanto permanecer no corpo; nem ainda inquirimos se uma pessoa justificada pode recair, seja no pecado interior, seja no pecado externo; mas simplesmente queremos fixar esta questão: o homem justificado ou regenerado fica livre de todo pecado logo que se dá a justificação? Não há, pois, nenhum pecado em seu coração – nem haverá depois, a não ser que ele decaia da graça?
4. Afirmamos que o estado do homem justificado é indizivelmente grande e glorioso. Ele é renascido, não “do sangue, nem da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus”. É filho de Deus, membro de Cristo e herdeiro do Reino dos céus. “A paz de Deus, que excede a toda compreensão, guarda seu coração e mente em Cristo Jesus”. Seu corpo é “templo do Espírito Santo” e “habitação de Deus, pelo Espírito”. Ele é “criado de novo em Cristo Jesus”: é lavado, santificado. Seu coração é purificado pela fé; é lavado “de toda a corrupção que há no mundo”; “o amor de Deus é derramado em seu coração pelo Espírito Santo que lhe é dado”. E enquanto “anda em amor” (o que deve sempre fazer), presta culto a Deus em espírito e verdade. Guarda os mandamentos de Deus e faz as coisas que são agradáveis à sua vista, esforçando-se por “ter uma consciência livre de ofensa para com Deus e para com os homens”: e ele tem poder tanto sobre o pecado interior como sobre o pecado externo, desde o momento em que é justificado.
III
1. “Mas não foi libertado de todo pecado, deixando este de existir em seu coração?” Não posso dizer isto; não posso crê-lo, porque S. Paulo diz o contrário. Falava ele aos cristãos e, descrevendo o estado dos crentes em geral, diz: “A carne cobiça contra o espírito e o espírito contra a carne: estes são contrários um ao outro” (Gl 5.17). Nada pode ser mais claro. O apóstolo aí diretamente afirma que a carne, a natureza má opõe-se ao espírito, mesmo no caso dos crentes; que mesmo regenerados, há dois princípios “contrários um ao outro”.
2. Ainda mais: quando escreve aos crentes de Corinto, aos que eram santificados em Cristo Jesus (1Co 1.2), diz: “E, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, mas como a carnais, como a criancinhas em Cristo. Vós sois ainda carnais: porque, desde que há em vós inveja e contenda, não sois carnais?” (3.1-3).
Agora, nesta passagem, o apóstolo fala aqueles que eram incontestavelmente crentes, aos quais ele, no mesmo instante, qualifica como seus irmãos em Cristo, sendo, todavia, em certa medida, carnais. Afirma que havia inveja (uma inclinação má), ocasionando lutas entre eles; e, apesar disto, não pronuncia sentença final, quanto a terem perdido a fé, nem manifestamente o apóstolo declara que eles não tivessem, porque então já não seriam “criancinhas em Cristo”. E, criancinhas em Cristo, como uma e a mesma coisa, plenamente mostrando que todo crente é (em certo grau), carnal, enquanto permanece na condição de – criancinha em Cristo.
3. Na verdade, este grande ponto – a existência nos crentes de dois princípios contrários, a natureza e a graça, a carne e o Espírito, – mostra-se através de todas as epístolas de S. Paulo e mesmo através de todas as Santas Escrituras. Quase todas as direções e instruções nelas contidas fundam-se nesse pressuposto, apontando tendências más ou práticas errôneas na vida daqueles que, não obstante isto, são reconhecidos como crentes pelos escritores inspirados. E são constantemente exortados a lutarem contra aqueles males, vencendo-os pelo poder da fé que neles há.
4. E quem pode duvidar de que houvesse fé no Anjo da Igreja de Éfeso, quando nosso Senhor lhe disse: “Conheço as tuas obras, e teu trabalho, e tua paciência, e que por amor de meu nome tens trabalhado e não tens desanimado”? (Ap 2.2-4). Mas não havia, apesar disto, pecado em seu coração? Certamente; senão Cristo não teria acrescentado: “Entretanto, tenho alguma coisa contra ti, porque deixaste teu primeiro amor”. Este era um pecado real que Deus viu em seu coração, pecado de que, consequentemente, é exortado a arrepender-se; e, depois de tudo isso, não temos autoridade para dizer que ele, o Anjo da Igreja, não tivesse fé.
5. Também o Anjo da Igreja de Pérgamo é exortado a arrepender-se, o que implica em pecado, embora nosso Senhor expressamente diga: “Tu não negaste a minha fé” (versículos 13 e 16). E ao Anjo da Igreja de Sárdis ele diz: “Sê vigilante, e confirma o resto que estava para morrer”. O bem restante estava para morrer, mas ainda não estava morto (Cap. 3.2). Assim, nele havia ainda uma centelha de fé, o que torna compreensível o mandamento dado no sentido de resistir (versículo 3).
6. Ainda mais: quando o apóstolo exorta os crentes a “purificar-se, ipso facto, de toda impureza?” De modo nenhum. Por exemplo: um homem me repreende asperamente: sinto ressentimento, que é uma nódoa do espírito; ainda que eu não pronuncie uma palavra denunciadora. Neste ponto, “eu me abstenho de toda aparência do mal”, mas isto não me purifica daquela mancha de espírito, como verifico, para minha confusão.
7. E como a proposição segundo a qual “Não há pecado no crente, nem mente carnal, sem pendor para a apostasia” é contrária à Palavra de Deus, do mesmo modo se opõe à experiência de seus filhos. Estes continuamente sentem um coração tendendo para a rebeldia, uma inclinação para o mal, um forte pendor para se apartar de Deus e apegar-se às coisas da terra. Sentem diariamente o pecado que permanece em seu coração: - orgulho, obstinação, incredulidade, e do pecado que se apega a tudo quanto dizem e fazem, mesmo a suas melhores ações e a seus deveres mais santos. Todavia, ao mesmo tempo “conhecem que são de Deus”: nem podem, por um momento sequer, duvidar disso. Sentem que o Espírito claramente testifica com seu espírito, que eles são filhos de Deus”; regozijam-se em Deus mediante Cristo Jesus, por quem receberam afinal a propiciação”. Deste modo, estão igualmente certos de que o pecado está neles e de que “Cristo é neles esperança da glória”.
8. “Mas, pode Cristo estar no mesmo coração em que está o pecado?” Indubitavelmente, pode; de outro modo nunca poderia ser salvo dos pecados. Onde há doença, ai há necessidade de médico,
“Prosseguindo nele sua obra,
Lutando até que possa dominar o pecado”.
Cristo, não pode, em verdade, reinar onde reina o pecado, nem habitar onde algum pecado habita. Mas Ele está no coração de todo crente e nesse coração habita, havendo aí combate ao pecado, posto não exista ainda purificação condizente com a limpidez do santuário.
9. Já se observou que a doutrina oposta – que não há pecado nos crentes – é bastante nova na Igreja de Cristo: dela não se ouviu falar durante dezessete séculos, nem antes que fosse descoberta pelo Conde Zinzendorf. Não me lembro de ter encontrado o menor vestígio dessa doutrina, nem nos escritores antigos, nem nos modernos, a não ser, talvez, em algum extravagante declamador antinomiano. Ainda assim a questão, segundo os tais, se resolve numa alternativa entre sim e o não, já que reconhecem que há pecado na carne dos crentes, embora não haja em seu coração. Mas toda doutrina nova deve ser errônea, porque a velha religião é a única verdadeira; e nenhuma doutrina pode ser certa, se ela não for a mesma “que era desde o princípio”.
10. Mais um argumento contra essa doutrina nova e antiescriturística pode-se retirar das consequências letais que dela decorrem. Se dizendo alguém: “Hoje estive irado”, eu me apressar em responder: – “Logo, não tens fé?”, o outro dirá: “Sei que tua conclusão é boa, mas meu querer é de todo oposto à ira”. Se eu insistir: “Então és um incrédulo, debaixo da ira e da maldição de Deus?” – qual será a natural consequência disto? Esta: se ele acreditar no que digo, sua alma não somente ficará conturbada e triste, mas talvez definitivamente destruída, tanto mais se ele “abandonar” aquela “confiança que possuía grande peso de recompensa”; e, tendo abandonado seu escudo, como poderá “apagar os dardos inflamados do maligno”? Como poderá vencer o mundo, visto que “esta é a vitória que vence o mundo, a nossa fé”? Fica ele desarmado em meio de seus inimigos, exposto a todos os seus assaltos.
Que maravilha haverá, pois, se for definitivamente subjugado, e o levarem cativo à vontade, se cair de maldade em maldade, nunca mais contemplando o bem?
Não posso, pois, de modo nenhum, receber essa asserção, segundo a qual não há pecado no crente, desde o momento em que ele é justificado: primeiro, porque é contrária a todo o teor das Escrituras; segundo, porque é contrária à experiência dos filhos de Deus; terceiro, porque é absolutamente nova, dela não se tendo ouvido falar no mundo até ontem; e, finalmente, porque dela decorrem as consequências mais desastrosas, não só afligindo àqueles a quem Deus não afligiu, mas talvez sepultando-os mesmo na perdição eterna.
IV
1. Concedemos, entretanto, leal atenção aos principais argumentos dos que pretendem sustentar semelhante doutrina. É, em primeiro lugar, pelas Escrituras que eles intentam provar a não existência de pecado no crente, assim raciocinando: “As Escrituras dizem que todo crente é nascido de Deus, é puro, é santo, é santificado, é limpo de coração, tem um novo coração, é templo do Espírito Santo. Agora, como o “que é nascido da carne é carne”, é inteiramente mau, assim “aquele que é nascido do Espírito é espírito”, é totalmente bom. Mais: o homem não pode ser ao mesmo tempo puro, santificado, santo e impuro, impenitente e ímpio. Não pode ser puro e impuro, e ter simultaneamente um coração novo e um coração velho. Nem pode sua alma ser ímpia, sendo templo do Espírito Santo”.
Apresentei esta objeção nos termos mais fortes, para que se possa evidenciar todo seu peso. Passemos agora a examiná-la parte por parte. 1) “O que é nascido do Espírito é espírito, é totalmente bom”.
Reconheço o texto, mas não o comentário. Porque o texto afirma – que todo que é “nascido do Espírito” é um homem espiritual, - e não vai além. É espiritual, mas pode ser ou não ser totalmente espiritual. Os cristãos de Corinto eram homens espirituais: se assim não fora, não seriam cristãos de modo nenhum; todavia, não eram totalmente espirituais; eram ainda, em parte, carnais. – “Mas haviam decaído da graça?”. São Paulo diz que não. Eles ainda eram criancinhas em Cristo. 2) “Mas o homem não pode ser puro, santificado, santo, e ao mesmo tampo impuro, impenitente e ímpio?”. Em verdade, pode. Assim eram os coríntios: “Fostes lavados” – diz o apóstolo – “fostes santificados”, isto é, purificados de “adultério, idolatria, bebedice” e todos os outros pecados externos (1Co 6.9-11); e ainda, ao mesmo tempo e em outro sentido da palavra, eram profanos; não estavam lavados, nem interiormente purificados de inveja, suspeita de mal, parcialidade. “Mas, certamente, não tinham ao mesmo tempo um coração novo e um coração velho?”. Seguramente eles os tinham, porque exatamente naquele tempo seus corações estavam sendo verdadeiramente, ainda que não inteiramente, renovados. Sua mente carnal fora pregada na cruz, mas não fora totalmente destruída. “Mas podiam eles ser ímpios, sendo templos do Espírito Santo?” Sim.
Que eles fossem templos do Espírito Santo, é certo (1Co 5.19); e é igualmente certo que eles eram, de algum modo, carnais, isto é, ímpios.
2. “Entretanto, há mais uma passagem da Escritura que porá a questão fora de dúvida: “Se alguém é crente em Cristo, ele é uma nova criatura. As coisas velhas passaram; e eis que todas as coisas se fizeram novas” (2 Co 5.17). Ora, certamente que o homem não pode ser ao mesmo tempo nova criatura e velha criatura. Pode, sim; pode ser parcialmente renovado, que é precisamente o caso dos de Corinto. Eles foram, indubitavelmente, “renovados no espírito de sua mente”, ou não poderiam chegar a ser “criancinhas em Cristo”; todavia, não possuíam toda a mente que houve em Cristo, uma vez que invejavam uns aos outros. Mas é declarado expressamente que “as velhas coisas passaram, e eis que tudo se fez novo”. Não temos necessidade de interpretar as palavras do apóstolo de modo a fazê-lo contraditório consigo mesmo. E, se o fizermos consistente consigo mesmo, com seu próprio ensino, a significação precisa de suas palavras será esta: seu velho conceito acerca da justificação, santidade, felicidade, e, numa palavra, no tocante às coisas de Deus em geral, passou; assim também passaram seus antigos desejos, desígnios, afeições, tendências e conversação. Todas essas coisas se tornaram realmente novas, grandemente mudadas em relação ao que eram antes; contudo, sendo novas, não são totalmente novas. Ainda ele sente, para sua tristeza e confusão, que algo permanece do velho homem, permanecem traços demasiadamente manifestos de seus primitivos pendores e afeições, embora estes não possam obter vantagem sobre sua alma, enquanto permanecer vigilante na oração.
3. Todos estes argumentos: “Se ele é puro, é puro; se é santo, é santo”, e vinte outras expressões de igual sentido que facilmente se podem catalogar, não valem realmente mais do que qualquer jogo de palavras.
E a falácia de deduzir do particular o geral, de inferir uma conclusão geral de premissas de ordem particular. Proposta toda a sentença, ela decorrerá assim: “Se ele é santo, é totalmente santo”. Isto, porém, não se verifica: toda criancinha em Cristo é santa; todavia, não é totalmente santa. É salvo do pecado, mas não inteiramente; o pecado permanece, embora são reine. Se pensas que ele não permaneça, (pelo menos nas “criancinhas”, quer se trate de jovens ou de adultos), decreto que não consideraste a altura, a profundidade, a largura e a espessura da lei de Deus, (mesmo da lei de amor, posta em relevo por S. Paulo no capítulo 13 da Epístola aos Coríntios), e que cada falta de conformidade com esta lei ou desvio dela, – é pecado. Agora, no coração ou na vida do crente não há desacordo com essa lei? Que não o haja no cristão adulto, é outro caso; mas, quão ignorante da natureza humana há de se alguém, para que possa imaginar que isto se verifique em relação a cada criancinha em Cristo!
4. “Mas os crentes andam segundo o Espírito (Rm 8.1), e o Espírito de Deus habita neles; consequentemente, estão livres de culpa, do domínio do pecado, ou, numa palavra, – do pecado”.
Estas coisas se apresentam reunidas, como se fossem de igual espécie; não são, contudo, a mesma coisa.
A culpa é uma coisa, o poder outra e o pecado em essência, outra. Que os crentes estejam livres da culpa e do poder do pecado, concordamos; que estejam livres da essência do pecado, negamo-lo. Nem isso decorre de modo nenhum daqueles textos. O homem pode ter o Espírito de Deus habitado em si, pode “andar segundo o Espírito”, embora ainda sinta “a carne cobiçando contra o Espírito”.
5. “Mas “a Igreja é o corpo de Cristo” (Cl 1.24); isto implica em serem todos os seus membros lavados de toda a impureza; de outro modo seguir-se-ia que Cristo e Belial se associam”. Segundo o mesmo argumento, de fato de “ainda sentirem, os que são o corpo místico de Cristo, a carne cobiçando contra o Espírito”, concluir-se-ia que Cristo tem qualquer aliança com o diabo e com o pecado, para cuja extirpação até a vitória Ele, justamente, fortalece os crentes.
6. “Mas os cristãos não se chegam “à Jerusalém celestial”, onde “nada de impuro pode penetrar”? (Hb 12.:22). Sim, e em companhia de anjos inumeráveis e de espíritos de justos que se tornaram perfeitos, isto é, “A terra e o céu concordes, Tudo formando uma grande família”.
E eles são do mesmo modo santos e sem mancha, enquanto “andam segundo o Espírito”, embora sentindo que, ao lado do bem, outro princípio há neles, sendo os dois “contrários um ao outro”.
7. “Mas os cristãos são reconciliados com Deus. Ora, isto não se pode verificar, se a mente carnal permanecer; porque esta é inimizade contra Deus: consequentemente, nenhuma reconciliação pode efetuar-se, a não ser pela destruição integral da mente carnal”. Somos reconciliados com Deus pelo sangue da cruz: nesse momento, a corrupção da natureza, que é inimizade para com Deus, é posta debaixo dos pés; a carne não mais tem domínio dobre nós. Ela, entretanto, ainda existe e ainda é, por sua natureza, inimizade para com Deus, por isso que cobiça contra o Espírito.
8. “Mas os que são de Cristo crucificaram a carne, com suas afeições e cobiças” (Gl 5.24). Assim fizeram, mas a carne permanece neles e sempre luta por se desprender dos braços da cruz. “Não, “eles sepultaram o homem velho com seus feitos” (Cl 3.9). Assim, é; é, neste sentido, “as coisas velhas passarem; eis que todas as coisas se fizeram novas”. Para esse mesmo efeito uma centena de textos poderíamos citar; e todos admitem a mesma resposta. “Mas, para dizer tudo numa palavra, “Cristo deu-se a si mesmo para a Igreja, para que fosse santa e sem defeito” (Ef 5.25 e 27). Assim será ela no fim: mas nunca chegou a sê-lo, desde seu começo até este dia.
9. “Deixem, porém, que fale a experiência: todos os que são justificados alcançam ao mesmo tempo absoluto livramento de todo o pecado”. Duvido que seja assim; mas, se for, conservarão tal libertação de modo inquebrável? De outra forma nenhum proveito há. “Se não a conservam, é por sua própria culpa”.
Esta conclusão fica de lado, à espera de provas.
10. “Pela própria natureza das coisas, pode, entretanto, o homem ter orgulho em si mesmo e não ser orgulhoso; ter ira e não se irar”?
O homem pode ter orgulho, pode pensar de si mesmo, em certo sentido, muito mais altamente do que deveria pensar (e vangloriar-se, deste modo, acerca das vantagens que sua ilusão lhe empresta), e ainda não ser orgulhoso em seu caráter geral. Pode abrigar em si a ira, e mesmo uma forte propensão para a cólera desabalada, sem dar, contudo, lugar a ela. “Mas podem a ira e o orgulho estar no coração em que somente a mansidão e a humildade deveriam manifestar-se?” Não; mas algum orgulho e alguma ira podem estar no coração em que haja muita humildade e mansidão.
“De nada vale dizer: “essas inclinações ali se encontram, mas não dominam”, porque o pecado, de qualquer espécie ou grau, não pode existir onde não lhe seja dado reinar, visto que a culpa e o poder são propriedades essenciais do pecado. Logo, onde um deles estiver, todos devem estar”.
Maravilhoso, com efeito! “O pecado, de qualquer espécie ou grau, não pode existir onde ele não reine?”
Isto é absolutamente contrário a toda experiência, a toda a Escritura e a todo o senso comum. O ressentimento deixado por uma afronta recebida é pecado; é falta de conformidade com a lei do amor. Esse ressentimento tem existido em mim um milhar de vezes. Todavia, ele nem reinou, nem reina. “A culpa e o poder são, porém, propriedades essenciais do pecado; logo, onde um deles estiver, devem estar todos”. Não: no exemplo que coloquei diante de nós, se o ressentimento que sinto não for avante, nem por um momento, de modo algum haverá culpa, nem condenação da parte de Deus, por esse motivo. Neste caso, esse pecado não tem poder. “Embora ele cobice contra o Espírito”, não pode prevalecer. Neste, como em dez mil exemplos, há pecado, sem haver culpa ou poder.
11. “Mas a suposição de pecado no crente é fecunda em muitas coisas aterrorizantes e desanimadoras.
Implica em disputa com um poder que domina nossas forças, sustenta a posse de nosso coração e aí prossegue no combate desafiando o Redentor”. Não é assim: a suposição de que o pecado está em nós não implica que ele domine nossas forças, como o homem crucificado não domina os que o crucificam. Ainda menos implica em que “o pecado mantenha usurpação de nossos corações”. O usurpador está destronado. Se permanece, com efeito, onde uma vez dominou, permanece em cadeias.
Deste modo, até certo ponto, ele “prossegue na guerra”, embora cada vez se torne mais fraco, enquanto que vai o crente crescendo em forças, vencendo sempre para continuar a vencer.
12. “Ainda não estou satisfeito: aquele que tem o pecado em si, é escravo do pecado. Assim, tu supões ser o homem justificado, enquanto é escravo do pecado. Agora, se concordas em que os homens possam ser justificados enquanto tem em si orgulho, ira ou incredulidade, ou se concordas que essas coisas existam (ao menos por algum tempo), em todos os que são justificados, que admiração pode causar o fato de termos tantos crentes orgulhosos, irascíveis e incrédulos?”
Não suponho que homem algum, uma vez justificado, continue sendo escravo do pecado; entretanto, acredito que o pecado permaneça (ao menos por algum tempo), em todos os que são justificados.
“Se o pecado permanece no crente, este é um pecador: se permanece o orgulho, por exemplo, então ele é orgulhoso; se voluntariamente, então ele é voluntarioso, obstinado; se descrença, então ele é incrédulo; consequentemente, não pode ser crente de modo nenhum. Em que, pois, difere ele dos incrédulos, dos não regenerados?” Ainda que temos simples jogo de palavras. Isto significa nada menos do que raciocinar: se nele há pecado, orgulho, obstinação, há, em consequência, pecado, orgulho, obstinação. E isto ninguém pode negar. Naquele sentido ele é orgulhoso ou obstinado, mas não o é no mesmo sentido que o são os incrédulos, isto é, governados pelo orgulho ou pela obstinação. Nisto ele difere dos não regenerados: estes obedecem ao pecado; aquele, não. A carne está em ambos: os incrédulos “andam segundo a carne”, o crente “anda segundo o Espírito”.
“Como pode, entretanto, estar no crente a incredulidade?” Esta palavra possui dois sentidos: que dizer falta de fé ou, ainda, fé diminuta, ou seja ausência de fé ou fraqueza de fé. Na primeira acepção, a incredulidade não cabe no crente; na Segunda, encontra-se em todas as “criancinhas”. Sua fé se mistura comumente à dúvida a ao temor, isto é, no último sentido, à incredulidade. “Por que temeis – diz nosso Senhor – homens de pequena fé?” Mais: “Homens de pequena fé, por que duvidais?” Note-se que havia ali incredulidade em crentes: fé diminuta e incredulidade vultosa.
13. “Mas esta doutrina, segundo a qual o pecado permanece no crente, podendo alguém estar na graça de Deus, tendo ao mesmo tempo o pecado em seu coração, certamente que se inclina para o incitamento dos homens ao pecado”. Compreendida retamente a suposição, tais consequências dela jamais poderão advir.
O homem pode estar na graça, embora sinta o pecado; poderá aquela condição somente se se submeter ao pecado. Ter o pecado em si não afasta o favor de Deus; afasta-o, porém, o dar lugar ao pecado. Embora em ti “cobice a carne contra o Espírito”, podes ainda ser filho de Deus; se, porém, andares “segundo a carne”, serás filho do diabo. Daí resulta que a doutrina em debate não incita à obediência ao pecado, mas leva o homem a resistir-lhe com todas as suas forças.
V
1. A conclusão de tudo quanto se disse é a seguinte: Há em toda pessoa, mesmo depois de ter sido justificada, dois princípios contrários – a natureza e a graça, que S. Paulo designa pelos nomes de carne e espírito. Daí resulta que, embora as criancinhas em Cristo sejam santificadas, elas o são somente em parte. Em certa medida, segundo a intensidade de sua fé, são espirituais; em outra medida, são carnais.
Concordemente, os crentes são exortados à contínua vigilância contra a carne, assim como contra o mundo e o diabo. E com isto concorda a experiência constante dos filhos de Deus. Conquanto sintam em si mesmos esse testemunho, também sentem uma vontade não totalmente resignada à vontade de Deus.
Sabem que estão em Deus; e ainda sentem possuir um coração pronto a separar-se dele; sentem, em muitos casos, um pendor forte para o mal e certa repugnância para todo o bem. A doutrina oposta é inteiramente nova: dela não se ouviu falar na Igreja de Cristo, desde o tempo de sua vinda ao mundo até os tempos do Conde Zinzendorf – e de tal doutrina decorrem as mais ruinosas consequências. Ela suprime toda vigilância sobre essa natureza pecaminosa, sobre a Dalila que nos disseram ter-se ido, embora ela ainda repouse contra nosso peito. Tal doutrina arrebata o escudo aos crentes fracos, priva-os de sua fé e destarte deixa-os expostos a todos os assaltos do mundo, do diabo e da carne.

2. Retenhamos, pois, a sã doutrina “uma vez entregue aos santos” e por estes ensinada, mediante a palavra escrita, a todas as gerações que as sucedem, - doutrina segundo a qual, apesar de sermos renovados, lavados, purificados, santificados, no momento em que verdadeiramente cremos em Cristo, ainda não somos renovados, lavados, purificados inteiramente; mas a carne, a natureza má, ainda permanece (embora subjugada), e luta contra o Espírito. Tanto quanto possível, usemos de toda diligência no “combater o bom combate da fé”. Cada vez mais ativamente, “vigiemos e oremos” contra o inimigo interior. Tomemos com o maior cuidado “toda a armadura de Deus”, de modo que, embora “lutemos” ao mesmo tempo, “contra a carne e o sangue, e contra principados, poderes e espíritos depravados nos lugares elevados”, possamos “estar firmes no dia mau”, e, tendo feito tudo, permaneçamos firmes na fé.


Biografia:
Servo de Deus, que tendo sido curado, pela graça de Jesus, de um infarto do miocárdio e de um câncer intestinal, tem se dedicado também a divulgar todo o material que produziu ao longo dos 43 anos do seu ministério, que sempre realizou para a exclusiva glória de Deus, sem qualquer interesse comercial ou financeiro. Há alguns anos atrás, falou-me o Senhor numa visão que eu fosse ter com os puritanos e com Martyn LLoyd Jones. Exatamente com estas palavras. Por incrível que possa parecer, até então, nunca havia ouvido falar sobre os puritanos e LLoyd Jones. Mais tarde, fui impelido pelo Senhor a divulgar todo o material que havia produzido como fruto do referido estudo. Você pode ler e baixar estas mensagens nos meus seguintes blogs e site: http://livrosbiblia.blogspot.com.br/ Comentário dos livros do Velho Testamento https://www.legadopuritano.com/ https://spurgeonepuritanos.net/ https://jenyffercarrandier.wixsite.com
Número de vezes que este texto foi lido: 52816


Outros títulos do mesmo autor

Artigos Deus Requer Santificação aos Cristãos 3 Silvio Dutra
Artigos Deus Requer Santificação aos Cristãos 2 Silvio Dutra
Artigos Deus Requer Santificação aos Cristãos 1 Silvio Dutra
Artigos Porque a Vida Eterna é Dependente da Fé Silvio Dutra
Poesias O Selo do Crente Silvio Dutra
Artigos O EVANGELHO QUE NOS LEVA A OBTER A SALVAÇÃO Silvio Dutra
Artigos O Real Sentido da Vida Silvio Dutra
Artigos Satisfação Silvio Dutra
Poesias Salvação sem Jesus? Silvio Dutra
Artigos Quem São os Puritanos? Silvio Dutra

Páginas: Próxima Última

Publicações de número 1 até 10 de um total de 2088.


escrita@komedi.com.br © 2024
 
  Textos mais lidos
JASMIM - evandro baptista de araujo 68999 Visitas
ANOITECIMENTOS - Edmir Carvalho 57911 Visitas
Contraportada de la novela Obscuro sueño de Jesús - udonge 56750 Visitas
Camden: O Avivamento Que Mudou O Movimento Evangélico - Eliel dos santos silva 55824 Visitas
URBE - Darwin Ferraretto 55079 Visitas
Entrevista com Larissa Gomes – autora de Cidadolls - Caliel Alves dos Santos 55027 Visitas
Caçando demónios por aí - Caliel Alves dos Santos 54895 Visitas
Sobrenatural: A Vida de William Branham - Owen Jorgensen 54878 Visitas
ENCONTRO DE ALMAS GENTIS - Eliana da Silva 54786 Visitas
Coisas - Rogério Freitas 54756 Visitas

Páginas: Próxima Última