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A carta que você nunca lerá
Pandora Agabo

Resumo:
Imagina que loucura se essa carta alcançar seus olhos...

A que ponto chegamos?

Não sei se lhe falha a memória, mas eu já tentei me afastar de você. Não somente me afastar, como tentei te deixar no passado. Lembra? Eu te disse. Disse com todas as palavras que eu estava gostando de você, que sabia que não era correspondida e para evitar maior sofrimento, afastei-me. Suas lembranças podem te trair, mas as minhas não. Lembro-me de você ter desdenhado da "satisfação" que eu te dava, ela havia sido desnecessária na sua opinião. A raiva que eu senti disso foi crucial pro relativo sucesso que tive em meu plano. Passamos o que? Um mês sem nos falarmos? Foi mais ou menos isso mesmo. Até que, de repente, você veio até mim. Fiquei confusa, mas aceitei aquilo de coração aberto, porque é o que faço: aceito de coração aberto.

Retomamos nosso contato. Pouco depois disso chegara seu aniversário e eu lhe presenteei, lembra-se? Foi a forma mais sincera que encontrei para demonstrar meu afeto. Dei-lhe o que eu sabia que você iria gostar, queria que você soubesse através desse gesto o quanto eu presto atenção nas coisas que você diz e como eu não me esqueço daquilo que me importa. Nesse dia eu senti algo diferente. Os meus sentimentos tinham mudado drasticamente. Não era mais paixão, era carinho extremo.

Eu sei que você se sentiu tocado, porque agora você falava comigo. Geralmente acontecia o contrário ("Deve ser porque procuro mais do que você"). Você queria voltar a me encontrar. No começo, bem no comecinho, eu não estava querendo tanto assim, mas a vontade foi aumentando, até porque o seu beijo havia sido o melhor que eu tinha experimentado. Aceitei e até mesmo tomei iniciativa para que nos encontrássemos, porém nesse dia foi diferente. Eu sempre sentia uma explosão de emoções quando te beijava, mas dessa vez não. Achei que a paixão havia se dissipado. Lembra que inovamos? Havíamos feito algo novo e não foi tão bom como imaginei que seria, mas sabe o que eu sou capaz de fazer? Por mais que um episódio não seja assim tão bom, na medida em que o tempo vai passando, eu vou trabalhando aquela memória de diferentes formas na minha cabeça e a torno melhor do que realmente foi.

Desta maneira, fui me convencendo de que queria te encontrar novamente. E mais: eu queria passar a noite contigo; a minha primeira noite. E como estávamos mais próximos, disse-lhe isso com todas as letras. Aliás, essa é uma prática bem comum entre nós dois... Entre nós dois, mas claro, de mim pra você, não é mesmo? Eu sempre lhe digo o que me passa. Tento ser um aquário, enquanto você é uma garrafa térmica muito bem isolada.

Lembra que estávamos tentando "arranjar" isso alguns meses atrás? Uns oito ou mais meses, se brincar. Eu tinha medo, muito medo. Medo de acabar não conseguindo mais me desapegar - e não errei, no fim das contas. Acho que esse era um temor compartilhado. Só que dessa vez eu não tive esse medo e acho que você também não, porque você seguia falando comigo. Aliás, foram as vezes que mais nos falamos em todos os tempos. Eu me sentia verdadeiramente próxima de você, eu quase consegui me livrar da sensação que estava te incomodando enquanto conversávamos. Eu tive a certeza que eu te queria como amigo pro resto da minha vida. Sim, eu sou assim. Eu desejo essas coisas radicais. "Pra sempre", "pro resto da minha vida"... Eu queria dizer isso e demonstrar, mas não, não dava. Você sempre fala que eu sou dramática, até chegou aos meus ouvidos que você me acha "xonas demais", só que o engraçado disso é que o lado sensível que não pode ouvir uma palavra errada, porque se esquiva, é o seu. É como diz na música, você é "como a água do mar que escorre pelos dedos". Talvez isso explique minha constante sensação de arrependimento quando conversamos, porque, de repente, me dou conta que poderia ter me omitido... Ainda mais do que já me omito; piso mais em ovos do que você, pode ter certeza.

Eu nem consegui me animar tanto assim, por mais que estivesse tudo combinadinho. Eu estava com a sensação de que não daria certo, como tantas outras vezes que tentamos combinar e no fim nada acontecia. Mas dessa vez foi.

O que eu tenho a dizer sobre essa noite é que foi uma experiência boa que aconteceu de um jeito ruim. Você e eu sabemos o que foi ruim... Um momento em particular, no entanto, só eu sei quão ruim foi. Quando você ainda dormia e eu acordei, meu corpo inteiro foi tomado pela maior angústia que já senti. Eu queria ir pra casa e te confesso que eu até senti certa aversão a você. Gostaria de explicitar que não foi nada que você fez, cheguei a pesquisar sobre o tema e chamam de disforia pós-coital, dizem que pode ser um fator biológico. Pesadíssimo! Só não chorei porque tenho um forte controle sobre isso. Teve um momento que eu tava me levantando e disse "tenho que ir", daí você me abraçou e disse "vai agora não", me puxando pra voltar a deitar com você. Seu gesto na hora pode ter sido apenas reflexo da sua preguiça de levantar e não tenha significado nada pra você, só que por mais que você não saiba, isso foi essencial pra que eu me sentisse melhor. E quem me dera fosse só isso que você não sabe sobre mim...

Você também não sabe o quanto aquele dia foi importante pra mim. Acreditei, por um momento, que a tarde que passei na sua casa foi tudo o que precisávamos para selarmos a nossa amizade. Nunca tínhamos conversado por tanto tempo; eu nunca tinha conhecido tanto sobre você. E eu me diverti muito mais do que imagina. O "você" que eu idealizava foi superado totalmente pelo "você real". Eu adorei te conhecer, mesmo que eu não tenha tido coragem de te fazer me conhecer da mesma maneira. Eu adorei ver e comprovar uma e outra vez que você não é como eu imaginava; você não é por quem me apaixonei. Você é real. E eu queria muito ser amiga dessa realidade. E acreditei que seríamos capazes disso. Sei nem dizer se "capacidade" é o empecilho mesmo.

Não sei se você faz tudo isso consciente. Você gosta mesmo de ser essa água do mar? Você sabe que é água do mar? Você faz de propósito?

Se você não quer ser nem mesmo meu amigo, por que não deixar claro? Ou deixar de me responder é a sua forma de ser claro? Por um dia, esqueça-se que é água do mar e seja um aquário, deixe-me ver o que você tem aí dentro. Eu sei que aquários não são preenchidos com água salgada, mas esqueça-se disso hoje. Só hoje, por favor, me diga, me explica, esclarece pra mim.

Sei que não sou a pessoa mais "ok" pra você. Talvez eu não seja nada do que você procure, nem mesmo pra uma amiga. Vai ser uma verdadeira pena se não lhe sirvo nem mesmo pra amizade, porque foi um trabalho árduo me contentar em ter apenas isso. Pode não ser fácil de dizer e estou certa de que não será fácil de ouvir, mas nada pode ser pior do que não entender qual que é o problema comigo. Ou com você.


Este texto é administrado por: Sabrina Queiroz
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