Perdida no meio da mata havia uma olaria, parecia que era de propósito que muitos operários fincassem ali seu pé em troca de míseros reais, ou até por comida. Os casebres cheios de gretas, frestas nas portas e telhados. No inverno sofrimento se juntava as dores do corpo das famílias, que quase ao relento, tentava descansar da dura jornada. Ainda era madrugada, quando as mulheres amassavam a argila, preparava o forno à lenha e os homens entravam na água e tirava a pouca matéria prima que ainda restava. As crianças iam para a escola, enquanto os adolescentes e os jovens sonhavam com um futuro melhor, sem saber se quer o abc, ficavam na lida com os pais, sem esperança de vencer e construir para si uma vida melhor. Eram os escravos da vida amarga e cruel.
Era sábado, dia de descansar que nada! todos continuavam a rotina, quando o patrão chegava e entregava ao seu funcionário de confiança, o mísero pagamento de cada um. O valor de cada milheiro era de R$ 100,00(cem reais). Suspeito eu que a comida e as roupas eram descontadas naquele pagamento, quando não eram doadas. Domingo era para alguns alegria, pelo menos para as crianças, porque os mais velhos continuavam na labuta. Pois, cada minuto desperdiçado era centavos a menos, na renda dos operários. Para ajudar a passar o tempo e driblar a tristeza, se alcoolizavam, mas, ouvia os conselhos dos confrades e consorcias atentamente.
Todo o mês fazíamos reuniões com os nossos assistidos e muitas crianças vinham acompanhando seus pais, que dividiam as famílias para não desfalcar no trabalho da olaria. Falávamos sobre São Vicente de Paulo, Antônio Frederico Ozanam e lia uma leitura da Bíblia. Muitas famílias que alegaram que não tinha uma bíblia em casa foram agraciadas.
Na véspera de natal a alegria de todos eram mais contagiante, pois, reuníamos para rezar o terço e refletimos a palavra de Deus. Em seguida eram distribuídas cestas, presentes e aquele delicioso cachorro quente com refrigerante.
Após vários questionamentos a cerca do direito a moradia, uma vida digna, saúde e educação, foi realizada uma pressão para a conquista destes direitos. Algumas famílias foram vítimas de perseguição por parte do patrão, houve intervenção de membros da conferência, elas receberam uma indenização, algumas já compraram seus imóveis, construíram e moram decentemente.
Sabemos que as sequelas do trabalho pesado, do pulmão afetado e da friagem sem limite, ainda marca este povo, mas, ficamos mais “felizes” sabendo que cada um conquistou seu espaço. O trabalho na olaria continua com menos intensidade e que nem todos dependem deste trabalho para sobreviver, até porque o mercado de trabalho atualmente está mais aquecido.
Na minha visão “ser vicentino” está além da simples visita, acompanhar cada caso é necessário até para promoção da família em questão. As vezes a gente chega numa determinada residencia, pergunta como está, reza um Pai Nosso e uma Ave Maria e vai embora. É necessário ouvir nossos assistidos, evitar falar muito e ouvir mais. As decisões podem ser tomadas com mais serenidade. Estas reuniões para rezar o terço, falar sobre a vida de São Vicente, de Frederico Ozanam e refletir sobre a palavra de Deus, junto com os confrades, consorcias e assistidos, pelo menos bimestralmente ou semestralmente, pode ser viável para que todos conheça o trabalho sério desempenhado pela Sociedade de São Vicente de Paulo.
J Chaves
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