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EU VI A FOME DE PERTO!
João Carlos de Oliveira

Era Dezembro, fazia um frio danado pelo lado de fora da minha cabana de enchimento, chovia copiosamente, ao claro de uma lamparina que permanecia acesa, estava deitado num banco de madeira na pequena saleta da casa. Ouvia com o coração apertado, o choro do meu filho mais novo que vinha do quarto, que reclamava da mãe, por estar com fome. Naquela noite, sem nada poder fazer, meus filhos dormiram com fome, e ao ouvir a lamúria do caçula, me senti o quanto era impotente. Angustiado, não dormi direito, silenciosamente, chorei debruçado com o meu rosto colado ao banco de madeira, para que não fosse ouvido pelos meus filhos. A chuva que teimava em cair lá fora, não podia ouvir as minhas mágoas, mesmo porque, não haviam culpados, a natureza mãe, cumpria com a sua missão. O tempo estava bom, já se faziam trinta dias de chuvas ininterruptas. Quanto difícil me estavam sendo aqueles dias, não que não fosse um homem trabalhador, nem que não conseguisse manter o sustento do meu lar, ocorria entretanto, tratar-se de uma situação inusitada. Sendo um mero trabalhador braçal, somente percebia remuneração pelos meus dias efetivamente trabalhados. Como o período chuvoso permanecia intenso, não conseguia vender a minha mão de obra braçal, o patrão havia paralisado os serviços da fazenda, pela argumentação, de que em decorrência das chuvas torrenciais que caiam, os serviços de capinas das lavouras e limpeza das pastagens, não rendiam o suficiente. Ao passar dos dias, sem conseguir trabalho e sem dinheiro, já endividado no pequeno armazém da região, nosso pequeno estoque de mantimentos foi se esgotando cada vez mais, e ao final dos quase trinta dias, estávamos com o nosso parco estoque de gêneros alimentícios, praticamente zerado, restando-nos, apenas algumas cozinhadas de fava ( vicia faba ) amarga, que provocava empazinamento nas crianças. Nascido de uma família negra de trabalhadores braçais, até então, não havia conseguido recursos para compra de um pedaço de terras, assim sendo, como não sabia fazer outras coisas, restava-me, a opção do trabalho como agregado nas fazendas da região onde nasci. Ao queixar-me para o fazendeiro-patrão, da difícil situação momentânea em que me encontrava, ele não se sensibilizou, virando-se para mim, disse-me, que nada podia fazer, já que a situação dele também não era boa, que eu deveria procurar por outros fazendeiros da região, que sabe, pudessem me auxiliar. Ouvindo a tudo, permaneci calado, me despedi e retornei para minha casa de imediato, sabia intuitivamente, que o fazendeiro, desejava mesmo, era que fossemos embora das suas terras. Naquele mesmo dia, me dirigi a uma outra fazenda vizinha, onde fui acolhido. Em poucos dias, as chuvas torrenciais ficaram mais esparsas, retornei ao trabalho, minhas coisas voltaram a normalidade. Filho de um casal de trabalhadores braçais rurais com onze filhos, vi a fome de perto muitas vezes, embora fôssemos muito pobres, carrego comigo, como uma boa herança dos meus pais, a dignidade e a disposição para luta. Meu pai nos disse muitas vezes, que ser pobre não era nenhum defeito, pelo contrário, até poderia ser uma qualidade, más que diante de qualquer situação, deveríamos sempre, nos orgulharmos de sermos pobres, sim, más honrados.

João carlos de Oliveira

E-mail: zoo.animais@hotmail.com


















Biografia:
Nem mesmo cairá uma unica folha de uma árvore, se caso não exista uma razão para tal!

Este texto é administrado por: João carlos de oliveira
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