Ela, enfurecida, olhava para si mesma no espelho. Imóvel, em seu quarto, diante de si, perguntava-se como uma imagem lhe poderia ser tão vulgar quanto a que contemplava naquele momento.
A mulher presa no espelho lhe parecia fútil, desonesta e indigna de tudo que a vida a havia concedido. Então, ela, a mulher de fora do vidro, pela primeira vez teve coragem de falar com a imagem diante de si:
- Você não se parece em nada comigo...
- Eu sou exatamente você - respondeu a imagem.
Assim, ela calou-se, e ficou a espera de uma outra resposta da mulher a sua frente, mas nada aconteceu. Ela se movia e a mulher à sua frente se movia também, em uma perfeita imitação de seus gestos.
Por ainda continuarem em silêncio, resolveu defender-se:
- Eu não sou assim, nunca fui assim
- Você é exatamente quem eu sou
- Eu não sou você! - gritou furiosamente.
- Olhe para mim ! - ordenou - É como olhar para você, eu fui feita à sua imagem!
- Eu não sou você!
- Então quem é você ?
Fez-se um longo silêncio, até que a voz do espelho tornou a dizer:
- Olhe para você, ou para mim... Olhe para nós e veja quem nos tornamos. Não passamos mais de uma figura invejavel e um coração vazio
- Não me compare a você!
- Não é preciso, eu sou você
- Não, não é. Eu não sou infeliz!
- É claro que é infeliz! A que preço você alcançou a vida por você tão desejada, que logo descobriu que não passa de solidão?
- A nenhum preço
- Não tente me enganar, não queira enganar a si mesma. Nós sabemos bem quanto custou a sua alma
- Não! - gritou ela.
- Sim
- Você não sabe, não sabe nada sobre mim! - continuou a gritar
- Então quem é você ?
- Eu não preciso provar nada pra você!
- Na verdade, você precisa sim, pra mim, pra você e pra todos os outros
- Não preciso!
- Então por que está tentando provar algo para mim exatamente agora?
Ela, bruscamente retirou o espelho da parede e o jogou no chão, a fim de sufocar a voz que lhe atormentava. Depois que o estrondo da quebra do vidro se calou, para ela, naquele quarto, havia apenas o silêncio, a noite e mais nada.
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