Compasso
Afirmam que gostar demasiadamente pode ferir e, que o excesso de sentimento vira aroeira. Na atenuação você é obrigado a expelir de si parte dos pretextos amorosos, sob o raciocínio de que está transbordando. Trágica ótica, uma vez que passamos quota de nossas vidas exercitando nosso ângulo mais nobre a fim de proclamá-lo à outra metade da laranja. Convertendo-nos em curadores dos melhores ensaios. Invertemos diques de angústias em aplacações táticas de alegrias. Aprendemos a pontuar olhares e suprimos nossa solidão para criar uma duplicidade e, ter assim nosso dobro a oferecer. Para os enamorados, vêem-se carreiras de bordadores de caftan satin com linhas siderúrgicas, com o intento de abrigar quem se ama contra as frases ruidosas disparadas pela sociedade. Arriscamos nosso corpo pelos haveres do outro, inclusive no interior de missas.
E por tarefa do acaso, padecemos por sobrepujar a velocidade. Sofremos por dar mais do que recebemos, por desfilar mais do que nos fazem enxergar. Esta situação árdua põe em risco quem amamos, porque faz o outro saltar em uma auto-supressão incitada pela sobreposição de posturas. Como então salvar uma relação onde você ama muito a ponto de fazer o outro sentir-se diminuído ou inapto? Se eu soubesse como labutar com esse problema, não estaria escrevendo esse texto. Mas presumo que observar e dialogar me conduzirá a melhor trilha, porque sozinho ninguém se move em uma relação. Além disso, não creio que frear os melhores desígnios seja salutar, porque seria substituição de algo genuíno por uma errônea felicidade. O caminho, ao escalar a montanha, é confiar. Buscar o gatilho, de modo que possamos dar vazão aos nossos desejos sem atingir com tanto vigor a outra pessoa. Acima de tudo, está a dedicação e o tempo pela nivelação. Relógios são locomotivas de esperança camufladas.
(Rafael B. Sanches)
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