Fui contestado sobre minha condição emotiva:
- Você ama?
Racionalmente, a resposta estava pronta e fúlgida, assegurada pela ponta da língua. Mas algo entravou que eu falasse imediatamente. Houve um bloqueio no ar que cruza a garganta e concede o som da palavra. Foi mordaz o pensamento: imaginei com minha consciência a vastidão do meu amor e de sua façanha. Era na realidade um mapeamento da arquitetura que constrói o que sinto.
Um beliscão da engenharia emotiva, tentando justificar que existe dentro de mim algo suntuoso. Isso é tributável ao tempo (porque não se ergue casas da noite para o dia). Tributável também a intensidade (porque ninharia de vigor e baixa velocidade não fazem vastas estradas). Assim, conforme o relacionamento se promove, as pessoas tendem a criar dentro de si uma pintura abstrata do parceiro. Essa espécie de “amabilidade” ganha uma linha mais evidente à medida que é nutrida por reverência e confiança.
O que sentimos é efeito da influência de outros valores. Valores que edifica valores. É algo gradual, ascendente. Uma semeação. E quando um dos dois não contribui com suas vigas, é quase impossível suportar a carência de um teto dentro do peito. Todos desejam um lar dentro de si para colorir em função do que tem. É um requerimento entre o coração e a coluna dorsal. Claro que nada é indestrutível eternamente. Há alicerces que podem tornar-se ardis preenchidos de muito pesar. Há paredes que desabam. Amores liquidados podem levar a um soterramento. Falta de ar acena enchente. Mas o intuito aqui é deixar claro que somos proprietários do que deixamos crescer. Somos autores e personagens protagonistas simultaneamente.
Medite sobre suas destrezas. Seja ebanista. Seja jardineiro. Seja mestre-de-obras. Estime a capacidade que a sua moralidade tem de dar domicílio para alguém que você tanto ama. Seja a sombra e o ardor que o outro almeja. Orgulhe-se de concretizar aí dentro um monumento insólito, fruto das suas melhores virtudes. A pergunta:
- Você ama?
Um olhar interno, sucedido de apreciação e louvor, com os olhos fluindo do chão para o céu:
- Sim, amo. Um Coliseu.
Atiro-me na batalha por sua sombra. Dentro de mim sempre haverá uma gigantesca conquista para você...
(Rafael B. Sanches)
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