O homem procura a harmonia e, muitas vezes, encontra o ódio no infinito, na desilusão e no olhar perdido no chão. Nas palavras de Pedro Du Bois, “... O ódio é o remanescente / do medo exacerbado / diante dos sorrisos / opostos à luz / do momento...”
Classifico o ódio como sentimento de empobrecimento que atinge e consome as pessoas, que domina a força através da qual o tempo não muda. Carlos Pessoa Rosa, alerta que “... o ódio existe, é pela euforia descabida de uma sociedade desigual... talvez o ódio, ...faz seu ancoradouro pela impossibilidade da imortalidade. Aí a alma começa a mostrar os dentes. Sofrimento insano...”
O ódio é troca de horas perdidas, representada na esforçada liberdade da imaginação – fictícia liberdade de escolha que fornece argumentos para a criação. Tal sentimento oferece arte autêntica como recompensa pela indução a ele. Mas, o que significa ser autêntico nesse panorama? Penso ser autor capaz de elaborar o viés do ódio no poema e na prosa, provocando reflexão no leitor para permitir a crítica e a reconstrução, como o livro de Bulcão Neto, A eloquência do Ódio, “...no vazio, o Ódio criou seu próprio objeto valendo-se apenas da eloquência”.
O escritor assume o tema através da tensão generalizada: na medida em que esse sentimento for juntado com o conhecimento o autor tem a cena em que se revela que quem não for amigo é inimigo.
No descrever o sentimento do ódio há a tristeza que invade o espaço da página branca, como em Fernando Pessoa, “... o ódio é mais intermitente que o afeto; sendo uma emoção desagradável, tende por instinto de quem os tem, a ser menos frequente. mas tanto o ódio como o amor nos oprimem; ambos nos buscam e procuram, nos não deixam sós”.
O labirinto odioso toma seu rumo na rédea solta pela imaginação, reconstrói a trajetória na mente do escritor; cabe a ele amargurar e até inverter e denunciar os valores; lastimar e desabafar. Sua obra é a prova: é homem com ódio da vida, é seco nas expressões, mas, mesmo assim, é arte e é belo. Em Armindo Trevisan encontramos,“...em teu corpo, nosso corpo / flagelado, metralhado, dividido; / a pele dos esfolados, / o ódio dos oprimidos...” O escritor é especialista em promover desencontros entre os personagens e defender a tese de que neste mundo permanece a incompreensão entre as pessoas.
Por vezes, ao lermos poesia ou prosa, não nos damos conta de que estamos no território do ódio que a beleza do texto disfarça a ruindade lá contida e cultiva a curiosidade do leitor. Lemos e gostamos do resultado, enquanto obra de arte, como em Marly B. Palma, “Quando estou enfurecida, sou tempestade, / sou trovoada, sou relâmpago com raios, / com direito a ventania, um furacão...”
A arte de escrever sobre o ódio carrega a glória pelo nada, no modo indireto do sentimento cruel e da desesperança, onde o autor estabelece seus juízos e forma textos provocativos, como em Murilo Mendes, “...O ódio, o mal, a desesperança. / Mas não quero continuar minha tarefa. / Dá tua herança aos urubus...”
Penso que o tema é popular, mas, intelectual, onde cada autor em seu estilo envolvente e, temperado por pitadas do ódio, retrata o sentimento que, sabemos, é parecido com a nossa realidade: mundo de competições e da incomunicabilidade entre as pessoas, restando à literatura, desdobrada em suas vertentes e abrangências, unir autor e leitor num mesmo objetivo que, por questão de ordem, atua como gerador de ideias e do saber, assim como retrata Rodrigo Cézar Limeira, “... E às vezes eu me sinto como uma ilha, / cercada de desamor por todos os lados, / As pessoas padecem sem amor na vida, / E veem seus sonhos adormecerem abandonados”.
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