SER E/OU NÃO SER, EIS A QUESTÃO
Há momentos, e este em que escrevo é um deles, que desconfio estar sofrendo de um sério deficit cognitivo. Vivo queimando a mufa e mesmo assim, até agora, não tenho conseguido compreender e tampouco interpretar, ainda que de forma perfunctória, a atitude de muitos dos nossos políticos. Cunha, certamente, é um deles. Mas por estes dias é no senhor Luiz Inácio Lula da Silva, pela sua importância intrínseca, pelo seu passado de humilde trabalhador metalúrgico e sindicalista vociferante, de paladino da justiça social e da incorruptibilidade no meio político, que tenho concentrado toda a força do meu intelecto hipoteticamente apoucado na tentativa hercúlea de deslindar o que vai, aí sim, na sua grande e ilustre cachola de ex-presidente da república. Por que o senhor refuta com tanta veemência e teimosia as investigações da Polícia Federal e as acusações do Ministério Público? Por que o senhor se esquiva, como o diabo se esquiva da cruz, de depor acerca das denúncias que lhe imputam por ocultação de patrimônio e por outros que tais de semelhante sordidez, que adviriam, segundo as denúncias, de vantagens ilícitas recebidas pelo senhor e por membros da sua família durante o seu mandato presidencial?
Enquanto o senhor se recusa a colocar em pratos limpos todo esse imbróglio nauseante, os partidos de oposição, como urubus famintos, seguem conjeturando maquiavelicamente e salivando ao vislumbre da carniça que os fortalecerá sobremaneira para o próximo pleito presidencial. Fortalecimento esse que, é bom que se diga, pode não ser garantia de vitória oposicionista em virtude da arrogância e da manifesta hipocrisia, do baixo discernimento político e da limitada consciência e sensibilidade social dos seus caciques, que nada mais são que sujos falando dos mal lavados. Como resultado pedagógico desta histórica e ultrajante crise moral em que vivemos, minha intuição, embora possa parecer capenga porque vem de mim, um plebeu, é de que, hoje, a consciência política que certamente falta à maioria dos homens públicos pode estar sobrando em grande parte do eleitorado brasileiro. As urnas comprovarão.
Meus muito provavelmente débeis e sobrecarregados neurônios, em curto-circuito constante, doem ao cheiro da calcinação. Não conseguem iluminar nem sequer uma tênue razão do porquê que uma pessoa que diz acreditar não existir no Brasil ninguém mais honesta que ela se nega a formular imediata e intransigentemente a sua defesa e/ou a apresentar provas de sua inocência quando acusada de corrupção, muito embora o ônus da prova seja obrigação da parte que acusa.
Não obstante, talvez por culpa do meu possível baixo QI, acredito mais na sua honestidade do que o senhor próprio. E é matutando com muita dificuldade que eu aqui dou ao senhor alguns conselhos. Embora venham de um provável acéfalo, mesmo assim são conselhos, e de graça. Portanto, não custa nada ao senhor tentar avaliá-los mesmo que en passant. Quem sabe? Aqui vão:
Não recorra mais ao Supremo Tribunal Federal para pedir suspensão de quaisquer investigações sobre o senhor. Isso, na minha embotada opinião, pode parecer confissão involuntária de culpa. Sobretudo, cumpra com solicitude todas as intimações da Justiça. Não procrastine mais a sua defesa. Não fique constrangido de, depois da cadeira presidencial, o senhor se sentar no banco dos réus. Muito pelo contrário, tire proveito desse fato adverso em sua carreira política e mostre para todo mundo a sua inocência, o quão honesto de verdade o senhor é. O quanto estão errados os seus adversários maledicentes, tapando-lhes a boca. Se o senhor não deve o senhor também não deve temer. Capisce?
Tão logo saia deste quiproquó dos infernos, do qual acredito o senhor sairá mais fortalecido do que entrou, com a alma honesta lavada e mais limpa ainda, mova ação indenizatória por danos morais contra todos os seus acusadores caluniosos: são muitos e a maioria deles da classe abastada. Com as indenizações que, segundo a minha rasa inteligência, deverão compor uma substanciosa fortuna por força do seu quilate de ex-chefe da nação, e à guisa de desforra, compre não só um, mas dois apartamentos triplex ou tríplex, não importa; não só um sítio, mas dois com campo de aviação, de futebol e tudo mais.
Por último, provada a sua inocência, candidate-se de novo para as próximas eleições presidenciais. Se o senhor não tiver entre 80% a 90% dos votos válidos ainda no primeiro turno dou a minha cara de retardado a tapas.
Enfim, meu caro senhor Lula, o que posso de modo muito precário depreender desse seu comportamento muitíssimo paradoxal, e deveras incompreensível, pelo menos para mim, um apalermado cidadão votante, é que eu devo estar precisando de tratamento psiquiátrico urgente. Digo isto porque, apesar de tudo, enquanto eu persisto em apostar na sua honestidade, o senhor segue dando pistas de que pode estar enganando a si mesmo ao querer, na marra, que todos, indistintamente, creiam na sua inocência. Isso sem o cabedal de provas inequívocas que o senhor, de forma inexplicável, nega-se a apresentar, muito embora, mesmo numa democracia meia-boca, que espero não seja o nosso caso, o ônus da prova caiba a quem denuncia.
Amanhã mesmo vou procurar ajuda terapêutica antes que, de presumível retardado mental, eu fique completa e manifestadamente desmiolado e comece a achar que sou um derrotado soldado raso do então moribundo império napoleônico de quatro em Waterloo, sem atinar a razão de ali estar e o porquê da infame posição.
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