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RIMAS EM...ULHO
MUITAS, MUITAS ALÉM DESSAS
Rubemar Costa Alves

Doentinho, idoso, aposentado, a MULHER o mandava tomar sol todas as manhãs na parte da frente do prédio onde havia um pequeno jardim com... antúrios (bom, o repetido “-ulho” vem depois).
          Um MOÇO desconhecido falou “bom dia”, ELE riu e respondeu ser “muito velho para ainda ter ‘tia’ viva”. O interlocutor deve ter franzido a testa. (Esclareceu-se depois que um anterior colocaria determinado pacote suspeito num ambiente familiar insuspeito para este pegar, mas aconteceu que o atual não viu nada e começaram aí as rimas.) “Vovô, cadê o meu bagulho?”
          “Ah, meu filho, o caminhão da limpeza urbana já levou todo o entulho da nossa obra... Você chegou atrasado...”
          O rapaz um tanto impaciente: “Meu bagulho, vovô?”
          “Não estamos mais em julho: é agosto, mês do desgosto... Ah, está reclamando de barulho? Não é aqui, não, porque meus netos estão na escola... Muito barulhentos, sim!”
          “Que destino deu ao meu bagulho?”
          “Sou nordestino, sim, e com muito orgulho.”
          O homem irritou-se de vez: “O senhor está curtindo a minha cara?”
          “Bom, a Iára, mulher do Túlio, meu filho, aprendeu a fazer sarapatel, que aqui nesta cidade chamam sarrabulho, é muito gostoso... “
          A mulher do surdo, apartamento térreo, escutou a ‘ladainha’ exótica, interlocutor de voz estranha e nos limites do “sarabulho” (esta palavra o marido usava muito - regionalismo: sentido de tumulto, confusão, encrenca), veio espiar. “O que o senhor está falando com o meu MARIDO?”
          O cara pseudovalentão (com arma?!) já ia puxar o revólver... Boazuda, 25 anos mais nova, o enfezadinho logo se assanhou, porque percebeu que não eram pai e filha. A desculpa foi que um amigo ficou de deixar ali naquele jardim um pacote (já não falou ‘bagulho’), mas pelo visto não deixou “na madrugada”, falou sem querer, saiu intintivamente...
          Foi embora, andando e olhando para trás, num chão sem calçamento, coberto de pedrinhas miúdas. Riu sozinho e pensou: “Pedregulho...”
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NOTAS DO AUTOR:
BAGULHO - Gíria: de má qualidade, coisa material ou situação ruim, erva ilícita.
SARAPATEL - Prato nordestino: sarrabulho adaptado, às vezes usando carne de carneiro (talvez Influência judaica, do tempo de Maurício de Nassau), sempre com a inclusão de tripa, toucinho, manteiga de garrafa ou azeite de dendê e muita pimenta.
SARRABULHO - Prato originário do Alentejo, espalhado depois por todas as colônias portuguesas d’além-mar, com outros temperos regionais (açafrão, canela, gengibre, hortelã): no geral, guisado com os miúdos do porco ou cabrito, misturados com sangue coalhado e cortado em pedaços, salpicão, chouriço e tempero de cominho.

                    F I M




Biografia:
PARVUS IN MUNDUS EST. (O MUNDO É PEQUENO DENTRO DE UM LIVRO) Ser dedicado, paciente, ousado, crítico, desafiador e sobretudo enlighned são adjetivos de um homem cosmopolita que gostaria de viver mais duzentos, ou quem sabe trezentos anos para continuar aprendendo e ensinando. Muitos de nós acreditam que uma vida de setenta, oitenta anos é muito longa, contudo refuto esse pensamento, pois estas pessoas não sabem do que estão falando. Sempre é tempo de aprender, esquadrinhar opiniões, defender, contestar ou apoiar teses, seguir uma corrente filosófica (no meu caso, a corrente kantiana), não necessariamente crer num ser superior, mas admirar e respeitar quem acredita nele. Entender a diversidade de costumes e culturas denominados de forma polissêmica nas diferentes partes do mundo, falar um ou dois idiomas, se perguntar o porquê e tentar encontrar respostas para as guerras, a segregação racial, as diferenças étnicas, o fanatismo religioso, o avanço tecnológico, o entendimento político. Enfim, apenas estes temas já levaria uma vida para se ter uma compreensão média. A leitura é o oráculo para estas informações, é ela que torna o mundo cada vez menor capaz de se acomodar nas páginas de um livro. É por isso que se diz que não há fronteiras para quem lê. Atualmente as pessoas confundem Balzac com anti-inflamatório, Borges com azeite, Camilo Castelo Branco com rodovia estadual, Lima Barreto com laranja de determinado município paulista, Aristóteles com marca de carro e por aí vai. Embora, eu tenha dissertado sobre o conhecimento culto, os meus trabalhos publicados aqui demonstram o dia a dia das pessoas comuns narrados através de divertidas e curiosas estórias. Meu público alvo são as mulheres. É para elas que escrevo, pois são elas possuidoras de sensibilidade capaz de entender o conteúdo do meu trabalho.
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