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SEQUESTRADINHO...
Rubemar Costa Alves

Tempo antigo, meados da década de 50. Quase certo 1954... Não era o crédito fácil de hoje, “...comprar no cartão” – exigiam fiador até para um simples liquidificadorzinho.   População ‘começando’ a se modernizar. As pessoas de mais posses exibiam e desafiavam parentes-amigos-vizinhos com geladeira elétrica, aspirador de pó e toca-discos... Telefone? Raridade. Ou pedir instalação e esperar dez anos ou... não sonhar ser empresário brasileiro poderoso ou cidadão ‘norte-americano’.
          Loja de eletrodomésticos na rua principal da Tijuca, Rio de Janeiro. O gerente reuniu rapidinho os vendedores e comentou que as vendas estavam muito baixas – conversar mais com os clientes, na tentativa de seduzir e hipnotizar. “Mulher, então... Ofereçam com delicadeza, quase carinho, o que houver de melhor e mais caro.”
          ELE não apareceu para trabalhar três dias seguidos. Versão intimista de que era filho do proprietário da cadeia de lojas (mesmo sobrenome estrangeiro / real filiação ou coincidência?), desde garoto com desejo de independência, daí que era tão vendedor quanto os outros. Morava sozinho, ocupava um quarto de quintal, liberdade plena do ir e vir, senhorios não perceberam a ausência dele. Nesse terceiro dia, entrou na loja um aparente mendigo – andar bamboleante chapliniano (sem o característico chapéu), roupa rasgadíssima, imundo, mal cheiroso, pés descalços. No que iam enxotar, o reconheceram – caiu desmaiado no chão da loja, quase vazia de clientes. Chuveiro quentíssimo nos fundos, sabão de coco e roupa limpa dele mesmo, cada funcionário tendo um pequeno armário no quarto de repouso. Café quente sem açúcar, uma golada de uísque e um sanduíche de presunto.
          Foi o que ELE disse. Carro na porta da loja, motorista grandalhão, terno gravata e óculos escuros, mulher loura ao lado, outras três mulheres louras no banco de trás o chamaram na calçada e......... sequestraram. Taparam os olhos dele com pano cheirando a alho e cebola, amarraram com uma só corda comprida os pés unidos e as mãos para a frente do corpo, sentado longo tempo. Carro ora lento ora correndo, parecia rodar a esmo, as quatro mulheres alternando onde seria......... (o quê?). No ponto de chegada, identificou Vista Chinesa, um quiosque oriental perto da estrada. Saltaram todos, motorista fortão o levou no colo, desejou-lhe ao ouvido “Boa sorte!” e foi embora com o carro.
          Não tinha nada de pouco instruído, estava era muito nervoso, não pensou em bacantes gregas ou odaliscas do Oriente Médio. O que aconteceu? ELAS o despiram e – não sei a linguagem da época – teve que transar com as quatro, sem parar. “Magicamente” (pensamento dele), uma delas saía e trazia embrulhos de comida, único momento de intervalo para ELE. Coitado! quem disse coitado?! farra muitíssimo boa! Farra boa até o primeiro fracasso, desgaste físico surgindo e aí ELE já não dava conta do recado. As mulheres trocaram olhares e passou a haver menor orgia sexual.
          E como tudo na vida é 1-2-3, ao entardecer do terceiro dia o carro voltou e ELE, o galã pintoso (duplo significado mesmo!), foi devolvido na porta da loja, atirado à calçada como trapo velho... ou saquinho vazio (duplo sentido outra vez) de pi...poca!
          Dispensado de trabalhar no dia seguinte. Descansar!!!
           Espalhou-se o boato, verdadeiro ou não, de um bonitão seqüestrado e toda mulher loura passou a ser suspeita. Jornais noticiaram, tevê era nova no país, mesmo assim noticiou. A rua, bem larga, vivia cheia de gente curiosa – bondes, já lentos, ficaram mais vagarosos ainda – ônibus idem, devagar, devagarinho. Sei de uma garota – a narradora, minha parenta distante no tempo e no espaço - que saía da escola, em grupo de três meninas... espiavam o felizardo, iam para casa.
          Farta clientela feminina agora.   A loja vendeu horrores – horrores, não, vendeu muito! Só queriam ELE.
          Com o passar do tempo, o assunto foi caindo em desuso, ELE pediu demissão, nunca mais visto em nenhuma das lojas do pai (?) e na atualidade só as pessoas de boa memória lembram da estória.


                      F I M




Biografia:
PARVUS IN MUNDUS EST. (O MUNDO É PEQUENO DENTRO DE UM LIVRO) Ser dedicado, paciente, ousado, crítico, desafiador e sobretudo enlighned são adjetivos de um homem cosmopolita que gostaria de viver mais duzentos, ou quem sabe trezentos anos para continuar aprendendo e ensinando. Muitos de nós acreditam que uma vida de setenta, oitenta anos é muito longa, contudo refuto esse pensamento, pois estas pessoas não sabem do que estão falando. Sempre é tempo de aprender, esquadrinhar opiniões, defender, contestar ou apoiar teses, seguir uma corrente filosófica (no meu caso, a corrente kantiana), não necessariamente crer num ser superior, mas admirar e respeitar quem acredita nele. Entender a diversidade de costumes e culturas denominados de forma polissêmica nas diferentes partes do mundo, falar um ou dois idiomas, se perguntar o porquê e tentar encontrar respostas para as guerras, a segregação racial, as diferenças étnicas, o fanatismo religioso, o avanço tecnológico, o entendimento político. Enfim, apenas estes temas já levaria uma vida para se ter uma compreensão média. A leitura é o oráculo para estas informações, é ela que torna o mundo cada vez menor capaz de se acomodar nas páginas de um livro. É por isso que se diz que não há fronteiras para quem lê. Atualmente as pessoas confundem Balzac com anti-inflamatório, Borges com azeite, Camilo Castelo Branco com rodovia estadual, Lima Barreto com laranja de determinado município paulista, Aristóteles com marca de carro e por aí vai. Embora, eu tenha dissertado sobre o conhecimento culto, os meus trabalhos publicados aqui demonstram o dia a dia das pessoas comuns narrados através de divertidas e curiosas estórias. Meu público alvo são as mulheres. É para elas que escrevo, pois são elas possuidoras de sensibilidade capaz de entender o conteúdo do meu trabalho.
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