Aventurando-se, como de costume, pelos mais diferentes e inóspitos lugares, Lemmin, desta vez, encontrava-se numa aldeia isolada que ficava num vale seco, antigo caminho em que, há muito, fluía o maior dos rios da região, um rio de águas claríssimas. Os aldeões, quando depararam com o visitante, julgaram que ele fosse um tipo de deus, não por suas roupas extraordinariamente coloridas nem por sua grande estatura, mas porque andava sempre com a cabeça erguida e porque possuía uma voz retumbante como nenhuma outra. “Talvez seja”, diziam-se, “o grande deus da fertilidade por quem tanto esperamos”.
Embora não houvesse associação lógica entre alto som e fecundidade da terra, havia, para os pequeninos e pardos habitantes do vale, nexo entre a aparição de um ser desigual e uma boa novidade para aqueles que somente tinham vivido na sequidão.
Por outro lado, Lemmin encarava a circunstância apenas como mais uma de suas aventuras turísticas, que depois seriam reveladas aos amigos através das fotografias em que ele apareceria, para a surpresa e para a admiração de todos, ao lado de criaturinhas ingênuas totalmente afastadas do mundo real.
Algumas gotas, por sorte, começaram a cair do céu. E o sorriso se estampou em cada rosto da aldeia, inclusive no de Lemmin, que, vendo a chuva ficar mais forte, pensava que teria uma ótima história para contar quando voltasse a sua casa: um povo jamais visto, a dificuldade em uma terra seca e, o melhor, um milagre atribuído a si comporiam uma excelente narrativa.
A chuva se agravava e a lama se formava sob os pés. Os aldeões, temendo ou já satisfeitos com o fantástico disso tudo, agradeceram ao deus e depois adentraram suas casas de palha. Deus, porém, viu aquele seu prodígio se transformar, rapidamente, em um dilúvio. O vale em que antes corria um enorme e límpido rio era inundado, agora, por águas lamacentas. Deus, para não se afogar, manteve-se sobre os tetos frágeis dos seus adoradores, mas, como era pesado demais para ser suportado, desabou e quebrou o braço direito. Sem poder nadar e sem alguém que o salvasse, afundou e nunca mais emergiu.
Aldeões, casas e deuses, tudo o que havia por onde o rio passou foi devastado. Após o dilúvio, não houve arco-íris e nunca mais choveu.
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