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Carlinho e Alvinho ou Paulo Garganta
Lasana Lukata



Conheci dois amigos que trabalhavam na emergência dum posto de saúde que agiam de forma curiosa. Trabalhavam na portaria preenchendo ficha de pacientes, o BAU (Boletim de Atendimento de Urgência).

Vez por outra apareciam umas pacientes muito bonitas e eles não perdiam tempo nas conquistas, porém, conquistas essas que se davam de forma cruzada e o plano era esse: Quando chegasse uma paciente do agrado do Carlinho, este disfarçava e saía e o Alvinho se encarregava de encher a bola do amigo. Que Carlinho estava cansado, tinha vindo de outro plantão, muitas cirurgias durante a noite... E a paciente ficava deslumbrada com o suposto cirurgião Carlinho, que há pouco olhava para ela com ternura. Doida para conhecê-lo melhor. Na vez do Alvinho, o Carlinho fazia o mesmo, enchia a bola do amigo. E dava certo, rendendo-lhes muitas conquistas.

A cumplicidade era tanta que certo dia apareceu na administração uma paciente denunciando que foi agarrada e beijada pelo Carlinho, mas Alvinho saiu em sua defesa, Carlinho tem boca e não fala! É uma moça na portaria. Ele não é um homem comum. Vai morrer virgem se não o agarrarem. Fosse o que fosse Carlinho apoiava Alvinho e Alvinho saía em defesa de Carlinho. Sempre.

Por esses dias, denunciavam o Presidente do Senado e quando o Presidente da República saiu em defesa do senador, eu disse aos meus botões: Carlinho e Alvinho.

No mensalão Carlinho apoiou Alvinho e agora na crise do Senado Alvinho sai em defesa de Carlinho, sempre enchendo a bola um do outro: Ele não é uma pessoa comum.

Também não era pessoa comum o Seu Paulo. Não sou laringologista, mas com certeza fiquei sabendo mais sobre garganta depois que Seu Paulo foi à casa do meu tio Aristeu.

Meu tio sabendo que Seu Paulo viria num domingo para almoçar fez alvoroço, preparam salada de bacalhau com grão de bico; caruru no capricho do azeite de dendê, uma festa esperava por ele e a família. Naquele domingo caíram dentro. Panela vazia. Limpinha. O problema é que Seu Paulo entre uma garfada e outra não deixava de intimar meu tio. Chamava-o pelo apelido. Teteu, você vai um domingo lá em casa. Ah, isso é que não pode passar em branco. Preciso lhe retribuir esse suculento almoço, rapaz! Meu tio puxou os olhos azuis de banda para minha tinha também de olhos azuis como quem diz: vamos?! Minha tia arriscou e num olhar respondeu: vamos, Teteu. A certa altura da vida os casais já se comunicam apenas num olhar. Pois muito bem, iremos domingo que vem, está certo? Certo, certo, Teteu! Mas, ó, leva a família toda para almoçar com a gente.

E lá foi meu tio e a família atravessarem a Ponte Rio-Niterói, família grande, uns 7 ao todo. Chegaram antes das dez da manhã por pressão do próprio Seu Paulo.

Lá pelo meio dia os olhinhos das minhas primas começaram a brilhar. Seu Paulo com mercearia enorme, tinha de um tudo, carne seca, bacalhau, salaminho, mini-açougue... E enquanto não saía o almoço, Seu Paulo que jogava baralho com meu tio, entre uma cartada e outra, gritava: E aí mulé! Tá pronto o almoção do Teteu? Velá mulé! Olha que é o Teteu, nosso amigo! Velá!

Treze horas e Seu Paulo não cansava de gritar, e aí mulé? Esse almoço sai ou não sai? Teteu tá aqui! De treze pulou para quatorze e vieram as quinze horas e minhas primas tontinhas de fome, cambaleavam. Cadê o almoço mulé! Num já falei que é o Teteu? Finalmente todos puderam correr à mesa. A mulher do Seu Paulo já estava trazendo o banquete.
Sentados, trouxe a mulher do Seu Paulo um prato com 6 ovos cozidos e umas sardinhas. Como era de costume, meu tio puxou o olhar de banda, minha tia Tetéia também. Chamava-se Aristéia. Eu que era o filho emprestado na casa, bem ouvi aqueles olhos azuis conversando: nunca mais aceitaremos convite de ninguém, Teteu. Tudo bem Tetéia! E foi assim que lá em casa Seu Paulo ganhou o sobrenome de Garganta, Paulo Garganta.

Isto se deu em nível doméstico, mas em nível nacional vem aparecendo na mídia um Paulo Garganta que recebeu um senhor prato com milhões de votos dos brasileiros e vem retribuindo com um PAC garganta ou 6 ovos e umas sardinhas.

Na casa do meu tio Teteu, não se reza nem se ora quando se almoça. A única oração que se faz lá, nessa hora sagrada, é contar a história de Paulo Garganta. E como rimos.


Biografia:
Lasana Lukata é poeta, escritor por usucapião, São João do Meriti, RJ.
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