LIRA E A PRIMEIRA MANHÂ DE CASADA
Sílvio levantou-se cedo. Era a primeira manhã na condição de casado, dirigiu-se ao banheiro para fazer sua higiene, retornou ao quarto acordando Lira com um leve beijo com cheiro de creme dental e foi dizendo:
_ Estou com uma fome daquelas! Levanta, faz o café. OK?
_Tão animado a essa hora da manhã? Pensei que em lua de mel o café caísse do céu.
_Mas não cai, vou à padaria e volto já.
Lira levantou-se ainda cheia de sono, viu a sogra dormindo no quarto que pertencia a Sílvio, à porta entreaberta certificou-se que a senhora dormia tranqüila, foi para a cozinha, queria que aquele café da manhã fosse o melhor o qual já preparara. Colocou a água para ferver na chaleira e pegou a coadeira, lavou o coador de flanela e tirou a frigideira de ferro da estufa, percebeu que não podia fritar ovos com tanta crosta no fundo, então lançou mão de uma faca raspou o mais que pode colocou para secar no fogo para não enferrujar. Passou o café e o cheiro encheu o ar. De onde estava avistou entre as gigantescas casuarinas que ladeavam a entrada do sítio, o Sílvio caminhando ao ar fresco e puro da manhã, a marcar o ritmo dos passos, balançando o litro de leite preso nos dedos, abraçado às bisnagas de pão.
Sua entrada na cozinha trazia evidências de que o cheiro de café o deixou satisfeito com um largo sorriso:
_Estou com tanta fome, parece que não como há um século!
Logo a banha chiava na frigideira. Lira fritou os ovos, com cuidados para que saíssem no ponto, com claras brancas e gemas inteiras...
Na segunda-feira foi buscar o menino, sua irmã a ajudou na pequena mudança, fraldas, mamadeiras, o carrinho, roupas e o rechonchudo guri, aos seis meses de idade, que apesar de tão pouco tempo separados fez grande falta a Lira.
Com o avançar dos dias, Lira percebeu que nem tudo era fácil no seu interior como parecera de início. Embora continuasse considerando-se vitimada, não se sentia receosa o bastante para se desesperar. Tendo chorado árduas lágrimas, ter passado grande angustia e decepção, havia armazenado armas para se defender, desejando que em momento algum tivesse que laçar qualquer torpedo. Teria firmeza, havia de requerer coragem para vencer o período que tivesse aguardando os problemas serem resolvidos. Dedicar-se-ia somente às tarefas delicadas, se sentiria respeitada, importante. Afinal entre tantas bem vestidas, não havia nenhuma capaz de ostentar tanta alegria e beleza mesmo vestida de chita. A sensatez dava sabor à sua vida, não conservaria mágoas, e muito menos a desconfiança. Relevaria na ausência tudo que acrescentasse ao dia a dia. Então descobriria muitas outras coisas para substituir a felicidade que esperou e sonhou tanto. O príncipe podia gabar-se por ter uma linda família, às custa de Lira que deslumbrada, decidida... Fazia valer sua própria identidade como dona de sua casa...
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