Passos ecoam
Pela igreja que me parecia vazia,
Sombras escorrem pelas paredes
Do altar-mor:
A imagem cega me vigia.
O vento inventa uma oração
Em uma língua, a mim desconhecida.
Fantasmas brotam do chão
Rasgando ao meio a madeira polida.
Tilinta o apagado candelabro de cristal
Suspenso ao centro da abobada marfim,
Um anjo escapa de algum vitral
Voando raso sobre mim.
Insuficiente, a luz amarela de círios
Esforça-se em amarrar a cada pilar, uma assombração,
Seres a arfar, buscar o ar,
Nas entranhas da escuridão.
Quebrasse a letargia de santos de gesso
Despencando de seus pedestais,
A esquiva de arandelas a esmo
E abemolas espaciais.
Ouço o badalar de sinos que não vejo
Ao compasso de um relógio imaginário,
Onde o soar não e só um ensejo
Mas trilha sonora no sacro cenário.
A primeira das oito pilastras começa a ruir
E uma segunda a se contorcer,
O teto se racha ameaçando cair
E a principal porta, a bater.
Miro uma das pequenas janelas azuis
E de repente ouço o vidro estilhaçar,
Um segundo, menos que dois,
É o tempo que a eternidade me custa a passar.
Na ardósia, pelo orvalho molhada,
Meu corpo se espatifa do lado de fora,
Sangra a pele por cacos cortada,
Cortes, que a consciência ignora.
Equilibrando-me sobre os joelhos estourados
Cambaleio por um corredor de pinheiros,
Os passos passam atropelados;
Imagens turvam nos olhos vermelhos.
A uma distancia que eu pensei ser segura
O corpo alcança o que a alma deseja,
Viro-me e só uma névoa escura há
Onde nunca houve nenhuma igreja.
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