Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
José e Pilar, conversas inéditas - impressões pessoais
Flora Fernweh

Ainda não assisti ao filme José e Pilar, dirigido por Miguel Gonçalves Mendes, mas tive a surpresa de conhecer um pouco sobre um dos autores mais célebres da língua portuguesa, José Saramago, por meio do livro que reúne conversas inéditas e cujo prefácio é de Valter Hugo Mãe. Com trechos selecionados de entrevistas, o livro José e Pilar é um presente intimista em forma de pequenos trechos de entrevistas, que apresentam o amor e a poesia entre o escritor José Saramago e a jornalista Pilar del Río em sua face mais real e eloquente.

Até que admiro José Saramago, e isso admito com base em alguns poucos textos e livros que li do autor, mas confesso que sou mais Fernando Pessoa, talvez a prosa de Saramago me intimida pela perfeita transposição da realidade, de forma que não consigo encontrar tanto mistério implícito em sua escrita. Após ler este pequeno livro, em timbre biográfico e que conta até mesmo com uma seleção de fotos, fiquei tentada a conhecer mais do trabalho do escritor português.

Por trás de um grande escritor, com frequência existe uma grande mulher, e na história da literatura, muitas vezes essa mulher era idealizada e tornada inalcançável pelo romantismo, que, inclusive, é alvo de críticas por Pilar del Río. É nítida a forma como ambos se complementam sem tantos clichês e preocupações que não cabem em um amor maduro. Para mim, as partes mais especiais do livro, dividido em capítulos alternados para não cansar o leitor, são justamente aquelas em que podemos conhecer mais de Saramago sob o olhar de Pilar, que doou-se plenamente a um amor que lhe foi predestinado, embora logo se perceba que ela é um tanto cética quanto a isso, e cujas renúncias lhe fizeram uma mulher muito feliz.

Sinto que Pilar e eu seríamos boas amigas, gosto da austeridade dela e da resistência às contingências, como ela bem narrou. Identifiquei-me demais com uma passagem logo nas primeiras páginas, em que Pilar afirma que o frio não lhe doi tanto e que também é capaz de não sentir tanto calor nos dias escaldantes, admiro essa dureza que de certa forma, lhe permite a versatilidade de uma mulher incomum.

De uma feminilidade firme e desapegada das pequenas coisas em prol de uma causa maior: este é o retrato que me vem à mente quando penso na voz por trás das respostas nas brilhantes entrevistas transformadas em livro. Compactuo com muitos pensamentos dela sobre a vida, sobre a escrita, sobre o amor e sobre a morte. Também fiquei comovida ao ler sobre a sua história, de modo que se eu pudesse caracterizá-la ou resumi-la às expressões que formam a tríade dos P’s de Pilar, seriam: prestatividade, potência e perspicácia.

Recomendo a leitura para todos aqueles que admiram a literatura portuguesa como um todo, ainda que Saramago já seja um mestre da literatura universal. Seus discursos conjugados com o de Pilar oferecem um panorama cultural fascinante sobre o mundo ibérico, mesmo sendo possível extrair da opinião de ambos que a nacionalidade não lhes é um elemento definidor de quem são.

A leitura é leve, e nos proporciona uma onisciência, e de forma simultânea, a impressão de que estamos dialogando com o autor e com sua amada. De certa forma, estamos, porque Saramago consegue tornar simples e palpável os grandes temas que assombram as relações humanas sem lhes retirar sua profundidade fundamental, enquanto se volta ao entrevistador com uma xícara de café e fala no mesmo tom como se conversasse com um amigo de infância, é assim que Saramago nos faz sentir.


Biografia:
Sobre minha pessoa, pouco sei, mas posso dizer que sou aquela que na vida anda só, que faz da escrita sua amante, que desvenda as veredas mais profundas do deserto que nela existe, que transborda suas paixões do modo mais feroz, que nunca está em lugar algum, mas que jamais deixará de ser um mistério a ser desvendado pelas ventanias. 
Número de vezes que este texto foi lido: 61413


Outros títulos do mesmo autor

Crônicas Ao calor do incenso Flora Fernweh
Crônicas O problema do professor institucionalizado Flora Fernweh
Crônicas Sobre ser mulher Flora Fernweh
Sonetos Soneto dos dois anos de amor Flora Fernweh
Haicais Ampunheta Flora Fernweh
Crônicas Agora o ano começou Flora Fernweh
Crônicas Considerações sobre o Oscar 2025 Flora Fernweh
Crônicas Meu bloco na rua Flora Fernweh
Haicais Sextante Flora Fernweh
Crônicas Barrada no sex shop Flora Fernweh

Páginas: Próxima Última

Publicações de número 1 até 10 de um total de 447.


escrita@komedi.com.br © 2025
 
  Textos mais lidos
Ao calor do incenso - Flora Fernweh 61816 Visitas
Perseverança ou teimosia - Patrícia 61650 Visitas
PERIGOS DA NOITE 4 IND 14 ANOS - paulo ricardo azmbuja fogaça 61529 Visitas
O pseudodemocrático prêmio literário Portugal Telecom - R.Roldan-Roldan 61499 Visitas
A menina e o desenho - 61498 Visitas
Insônia - Luiz Edmundo Alves 61495 Visitas
Canção - valmir viana 61494 Visitas
Viver! - Machado de Assis 61494 Visitas
SILHUETA - MARCO AURÉLIO BICALHO DE ABREU CHAGAS 61492 Visitas
CORDEL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - Manoel Messias Belizario Neto 61488 Visitas

Páginas: Próxima Última