Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
O Expresso do Horror
Rafael da Silva Claro


Cinco corintianos e três palmeirenses. Essa combinação pode ser segura, sendo todos amigos e se ninguém estiver uniformizado. Ir até o Estádio do Morumbi ver Corinthians X Palmeiras, nos “medievais” anos 90, exigia um cuidado maior, porque essa década foi o período do auge das brigas de torcida. O Derby Paulista merecia alerta máximo.

Divididos, alvinegros e os infelizes alviverdes, subimos para a arquibancada. Na ida, estranhamente tudo transcorreu bem. Mal sabíamos que, como na penitenciária, se a noite está muito tranquila, significa que no dia seguinte a cadeia vai estourar; ou na guerra, mesma situação: noite tranquila significa iminente batalha. O risco de morte, pregando uma peça, guardava fortes emoções para a volta, justamente no momento de maior desatenção.

A bancada corintiana saiu contente com os três a zero. Juntando com os tristes palmeirenses, a volta seria sossegada, quem sabe até pararíamos em alguma lanchonete. Só que a maldita Caixa de Pandora foi aberta, fazendo do retorno algo quase trágico.

Os ônibus do Corinthians estavam saindo lotados. Foi quando apareceu um dos reservados aos palmeirenses, relativamente vazio, pronto para sair, parecia que estava apenas nos aguardando. Olhamos um para o outro, estávamos desuniformizados. Por que não? A resposta tácita era de anuência, fomos embarcar. Acabávamos de avançar em um hipnotizante pedaço de queijo numa ratoeira armada ou num suculento corte de bife com chumbinho.

A viagem já começou ruim, pois o coletivo pegou o caminho alvinegro. Para piorar, sofremos um intenso ataque da torcida do Corinthians, que identificou nosso veículo coalhado de palmeirenses. Nós, achando que éramos espertos, estávamos sob ataque do mais intenso fogo amigo. E assim foi o caminho: pedras e xingamentos.

O desespero era grande; apanharíamos dos palmeirenses se revelássemos nossa identidade secreta ou, calados, seríamos linchados pelos corintianos, que continuavam destruindo o ônibus. A viagem da morte teria que ser abolida ou pereceríamos junto ao inimigo.

Num horrível barulho, que deve ser igual ao de um avião prestes a colidir em uma montanha, todos clamavam para o motorista parar. Mas o “busão” parecia desgovernado, a cada pedrada o piloto acelerava mais. Numa brecha, quando o motorista se sentiu compelido a parar no farol, saltamos. Estava chovendo e terminando a tarde. Nesse cenário, deve ter sido meio ridículo nós atravessando correndo a ponte sobre o Rio Pinheiros, como quem estava na Guerra do Vietnã.

Longe do expresso maldito, tínhamos que evitar o Centro, destino dos ônibus e epicentro da efervescência da violência das torcidas. A alegria da goleada foi substituída pela tensão gerada pelo instinto de sobrevivência. Ao menos oito corintianos e palmeirenses, nesse dia, estavam unidos, mesmo que pelo medo.


Biografia:
Ensino secundário completo. Trabalhei em várias empresas, fora da literatura. Tenho um blog, onde publico meus textos: “Gazeta Explosiva” Blogger
Número de vezes que este texto foi lido: 55547


Outros títulos do mesmo autor

Poesias 🔴 Nada como um dia após o outro Rafael da Silva Claro
Ensaios São só automóveis, satélites, foguetes e robôs 🔴 Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Oportunista, por que não? Rafael da Silva Claro
Crônicas 🔵 Uma estórinha de tristeza e lágrimas Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Decadência com elegância Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔹 Warning (aviso) Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 O socialista da Vila Madalena Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Os últimos serão os primeiros Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 A volta dos que não foram Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Carta na manga Rafael da Silva Claro

Páginas: Primeira Anterior Próxima Última

Publicações de número 11 até 20 de um total de 519.


escrita@komedi.com.br © 2024
 
  Textos mais lidos
Experiência com o Positivo Stilo One - Vander Roberto 58552 Visitas
Estupro é crime e não opção! - Vander Roberto 58455 Visitas
Anistia para a imprensa - Domingos Bezerra Lima Filho 58404 Visitas
A LUA É UMA FESTA - Saulo Piva Romero 58352 Visitas
Ganhei Na Loteria! - J. Miguel 58348 Visitas
O estudo da História é vital para não ser escravizado - Vander Roberto 58229 Visitas
LABIRINTOS DA SOLIDÃO - Darwin Ferraretto 58221 Visitas
Sucesso e Fracasso - Paulo R Rezende 58220 Visitas
O pensar é dialógico e dialético - ELVAIR GROSSI 58140 Visitas
Paralisação nacional nas universidades federais - Flora Fernweh 58086 Visitas

Páginas: Primeira Anterior Próxima Última