Confesso que ficaria espantado e desapontado se uma pandemia global fizesse o autor de “Homo Deus — Uma Breve História do Amanhã”, rever seus princípios que escreve no livro. Felizmente Yuval Noah Harari não faz isso. Na sua visão, o Coronavírus não mudará a crença de que é possível vencer a morte.
Num extenso artigo publicado no domingo pelo jornal A Folha de São Paulo, o israelense que é o autor de três Best-sellers mundiais, todos aparecendo também na lista dos mais vendidos no Brasil da revista Veja escreve sobre essa sua crença. Resumi-lo numa página de PDF, em sete ou oito parágrafos, agora cinco ou seis, é uma tarefa quase impossível, mas é isso que me é permitido semanalmente.
Podemos dividir o artigo de Harari em duas partes. A visão da vida e da morte no antes e no depois da Idade Moderna. No antes, para a maioria das religiões e ideologias a morte não significava algo inevitável, mas a vida eterna. Os principais momentos da existência humana ocorriam após o último suspiro. A viagem para o céu ou o inferno.
Pensemos num mundo sem mortes. O céu, o inferno, as religiões e os livros sagrados deixariam de fazer qualquer sentido. Todos esses livros tentam fazer os humanos acreditarem que morremos porque Deus, o Cosmos ou a Mãe Natureza assim decretaram. O melhor a se fazer é aceitar esse destino. Afinal, é de graça.
Então a Idade Moderna chegou trazendo a ciência que deu um chute no traseiro da metafísica. Para a ciência a morte não é um decreto divino. É o resultado de um problema técnico. Uma das crenças da ciência é a de que para cada problema técnico haverá sempre uma solução técnica.
Não é Deus quem faz o coração parar de bombear sangue porque o músculo cardíaco não recebeu oxigênio suficiente. Não faz as células cancerosas se multiplicarem devido alguma mutação genética aleatória. A ciência vê nisso problemas técnicos e está sempre buscando soluções técnicas para resolvê-los. No antes, a morte era especialidade dos que usavam batinas pretas nas igrejas. No depois, os especialistas estão nos laboratórios e usam aventais brancos.
Os que usam aventais brancos estão cientes de ainda não haver soluções para todos os problemas técnicos. Entretanto, a aumento brutal na expectativa de vida dos humanos ocorrida nos últimos dois séculos mostra que eles estão no caminho certo na busca pela imortalidade. Muitas das ideologias com as quais convivemos atualmente já perderam o interesse pelos acontecimentos do além-túmulo. Não há mais qualquer interesse em saber o que acontece quando um comunista ou um capitalista morre.
Harari acredita que a pandemia atual será um marco não necessariamente ruim. A ciência usará a tragédia redobrando esforços para proteger e prolongar a vida.
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