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Uma vida Cyberlife
Caliel Alves dos Santos

Resumo:
Veja a resenha que eu fiz da primeira antologia em que participei desse ano.


     Poucas coisas nos angustiam como o futuro. Essa coisa que apenas projetamos e não vivemos cria sonhos e gera pesadelos. Quando a Sem Tinta Editorial resolveu publicar uma coletânea de contos de ficção científica, a antologia Cyberlife, diversos autores nacionais se empenharam na tarefa de escrever sobre a vida no futuro. A base para isso era a inclusão de vidas artificiais e alienígenas, o que tornava o cenário complexo para nós humanos.
     O organizador Erick Alves acertou em cheio nas escolhas. Em catorze contos, vemos como os terráqueos teriam que lidar com novas formas de vida, sejam elas com ossos de metal e pele orgânica, ou vindo de planetas distantes. O livro mescla vários subgêneros da ficção científica como o cyberpunk e a space opera, além de grandes doses de futurismo. Técnica e imaginação foram essenciais na construção desses mundos.
     O conto que abre a coletânea é o Injeção leta de culpa, escrito pelo Erick Alves. Nessa história ele aborda a relação entre duas personagens: Lady Fox, uma rebelde de um grupo revolucionário chamado de a Corte, e Norene, uma agente policial. Aqui o autor aborda a marginalização da juventude sem esperança e niilista, em contraponto ao corporativismo das instituições e a rigorismo das leis penais. O final foi emocionante e inesperado.
     O texto seguinte, Onde mora a lua do Thiago Franco, foi o que menos gostei. O conto tem uma ótima narrativa em primeira pessoa, e se divide entre as memórias da protagonista como viajante espacial e o seu presente como gladiadora. Embora o título do conto se refira a lua, o satélite teve muito pouca importância. A obra é carregada de nuances poéticas, mas o problema mesmo é o final, com direito até a Deus ex machina. Acabou com o clima de “felizes para sempre”, para o que foi apresentado na trama, soou romântico demais.
     O terceiro conto para mim é o melhor. O Rodrigo Ortiz Vinholo nos trouxe o conto A semente do céu. De todos os contos apresentados, ele apresentou o melhor conceito e também o desenvolveu com muito sucesso. A história narrada em primeira pessoa revela os questionamentos de um extraterrestre que vive em bairros planejados, o que eu entendi como se fossem guetos nos moldes de segregação racial. As sementes a que o título se refere são capsulas espaciais que chegam a terra, e graças a sua alta tecnologia, regeneram a vida em seu interior. O conto aborda de modo muito prolífico o fanatismo religioso e o preconceito racial, bem como as consequências sociais negativas sobre o fato.
     O meu conto vem logo em seguida, e se chama O Bairro Esquecido. Nele eu abordo a história de um bairro onde convergem refugiados, androides, cibercriminosos e extraterrestres. Eu gostei muito do resultado desse conto, e o organizador acreditou na sua estrutura narrativa. Espero que o leitor goste. Para mim foi um desafio escrever um conto sem mocinhos nem vilões.
     Anabel, a poeta é escrito pelo Felipe Del Bosco. Nesse conto o autor aborda de modo poético vários questionamentos sobre o tecnicismo, voltado para a escrita. Ao longo do texto, a protagonista demonstra ter umas fugas da realidade. O cotidiano se torna uma montanha russa de alucinações constantes. O que mais surpreende nesse conto é que a protagonista não é bem o que pensamos no início.
     Jon O’Brien nos traz o conto Crianças aprendem a odiar. Embora a protagonista e a narrativa foquem em crianças, o conto é bem assustador. Uma metáfora para a ausência de humanismo o período de educação infantil, o que torna as crianças cada vez mais violentas e portadoras de preconceitos enraizados de modo profundo. As crianças são o espelho da sociedade, só que sem freios morais.
     Um pequeno ponto pálido é o conto trazido pela escritora Ana Carolina Machado. É a história mais curta do livro, mas rico em detalhes e sentimentos. O primeiro é a solidão, não caber em um mundo, estar a margem de uma sociedade e saber que nunca mais pode voltar para a sua terra natal provoca uma certa angústia. Estar invisível numa sociedade cada vez mais artificial traz mesmo uma náusea na gente.
     O homem de vime é um conto que une o cyberpunk e o thriller psicológico. Yian é um agente policial que tem como missão levar um prisioneiro a Kadath, onde oniromante, seres que controlam a capacidade se sonhar, irão cuidar de extrair as informações de sua mente. Ao longo da obra, temos uma sensação sufocante de déjà vu. Foi um dos contos que mais gostei, o final foi um choque para mim. A imagem do homem de vime a que o autor recorreu é perturbadora.
     O conto seguinte é do autor Paulo Matheus Ferrari. Em seu O som do metal, um homem ganha um violino de um estranho na rua, assim, sem mais nem menos! Ao longo do conto, através desse gesto, o personagem vai se questionando sobre a artificialidade da vida humana. O conceito de mind upload foi legal, mas acho que a história em si careceu de um contexto melhor. O diálogo do protagonista com a alíen foi desconexo em relação a proposta do conto. Achei que o autor ia desenvolver conflitos maiores, mas se limitou a desconfiança e reticências do protagonista.
     Em O jardim, a autora Sabrina Mota Marcondes nos mostra uma protagonista que tenta revitalizar a natureza através de pequenas ações como resgatar plantas. Um conflito em grande escala colocou humanos, robôs e extraterrestres em lados opostos. Confesso que na primeira leitura, você não saberá identificar a qual grupo ela pertence. Parabenizo a escritora, foi genial.
     O autor Mardey Stealth nos traz um conto semelhante ao do Thiago Franco, só que desenvolvido com mais competência, acredito eu. Aqui também temos um protagonista gladiador. Sua única esperança de sair dessa vida de batalhas é derrotar o campeão. Panthogar narra os últimos passos desse guerreiro em busca de liberdade. O autor se permitiu certo exagero no conflito do protagonista título com o campeão da arena, mas narrado de modo mais crível e com um final coerente.
     A autora Fernanda Miranda nos traz um conto com referência direta ao feminismo, mas ao invés de mulheres, temos robotas, e ao invés de uma ideologia, um vírus. F-7 e S.I é o mais cyberpunk dos contos dessa coletânea. A narração é muito boa, porém, os conceitos parecem meio genéricos, tipo “mundo-cópia” e os clichês dos velhos chips neurais. Nesse futuro, as robotas são androides femininas que são usadas para diversão sexual por seus donos, a autora não fala diretamente, e nem precisava. Entretanto, um vírus chamado Sentimentos-Intensos mudam suas configurações básicas, criando uma nova personalidade chamada F-7. E tem uns problemas estruturais básicos: o vírus S.I torna as robotas hipersensíveis, emocionalmente instáveis e desinteressadas, como elas vão se tornar livres nessas condições? E por último, se as robotas foram criadas pelos membros do Conselho Intermundial para auxiliar os humanos, porque são produzidas e vendias em série? Isso é fetichismo da mercadoria. Eu achei o conto bem panfletário! As metáforas utilizadas pela autora não caíram bem. O argumento da história é falho e contraditório.
     Sentimento obscuro é escrito pela Francy Lima. Nesse conto, um velho robô resgata uma criança de dentro de uma capsula de hibernação. Ao longo da história os dois descobrem que tem um passado em comum. Esse é o tipo de conto que peca pelo pouco espaço. Conhecendo esse risco, o autor sabe que sua narrativa pode apresentar soluções vacilantes na trama. Mesmo assim ela cumpriu sua função, mostrou um futuro possível e a relação entre robôs, humanos e extraterrestres. Mas faltou algo mais para prender minha atenção.
     Por último, temos o conto Brand new life da autora Mayra Pamplona. A história foca em Aglaya, a única sobrevivente de sua família após uma infecção bacteriana que provocou milhões de vítimas. Vivendo numa colônia terrificada em Marte, a protagonista vive como ume mendiga, comendo sobras de lixo e o pouco que adquire com seu artesanato. Gostei do clima descompromissado da história. A vida de Aglaya é bem traumática, só achei algumas situações exageradas como quando o robô deu sua chave mestra a alienígena, o que poderia colocar não só a vida dela em risco, bem como a de toda a Bahram. Tirando isso, gostei muito do desenvolvimento da história, mostra um outro lado dos seres humanos, que deveriam ser mis recorrentes.
     Foi a primeira edição, do primeiro do livro da Sem Tinta Editorial, então não serei rigoroso nas críticas. Os pequenos erros que apareceram não impactaram de modo negativo na leitura, e poderão ser corrigidos facilmente numa segunda edição do livro. Um ou dois parágrafos que não estavam com espaço inicial, ou uma palavra sem acento gráfico. Nada que desabone o livro.
     A brochura tem mais de 190 páginas, dividida em catorze contos, que nos dão um gostinho de quero mais. Conta com orelhas, a capa é em Supremo 300g. A introdução fica por conta de Erick Alves. A capa do livro é sensacional. No fim do livro, temos um anúncio de nova antologia, essa será de terror e se chama Chave das trevas. O livro custa R$ 25,00. Leitura recomendada a todos os leitores de ficção científica.

Para adquirir acesse:
https://www.semtinta.com/product-page/cyberlife-antologia


Biografia:
Caliel Alves nasceu em Araçás/BA. Desde jovem se aventurou no mundo dos quadrinhos e mangás. Adora animes e coleciona quadrinhos nacionais de autores independentes. Começou escrevendo poemas e crônicas no Ensino Médio. Já escreveu contos, noveletas, resenhas e artigos publicados em plataformas na internet e em algumas revistas literárias. Desde 2019 vem participando de várias antologias como Leyendas mexicanas (Dark Books) e Insólito (Cavalo Café). Publicou o livro de poemas Poesias crocantes em e-book na Amazon.
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