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AO LÉO, COM AMOR
Débora da Silva Consiglio

Uma colega me ofereceu e disse que alguém estava vendendo brigadeiro na recepção.Recusei, estava satisfeita com o chocolate nosso de cada dia na Americanas.
Eu subia a escada quando o vi.O cabelo parecido, o tipo físico também. Travei olhando o menino segurando a cesta de chocolates e por dois minutos me iludi: pensei que ele era o Léo.
Não poderia ser.
Leonardo foi meu aluno em meu primeiro ano como professora efetiva no sistema público. Ele estava no segundo ano do ensino médio, e entre as primeiras provas que corrigi de sua turma, foi a dele que acalmou a minha insegurança de professora novata. No canto da folha ele escreveu: " I loved my new teacher". Fui correndo mostrar para a minha mãe porque sabia que não era uma simpatia forçada.
Era apenas o Léo: um menino que podia gritar ao perceber que você tinha uma tatuagem, e lembrar com carinho da aula de Inglês em que arrasou fazendo uma mímica tosca de um cara que vivia em Paris ( da qual eu me lembro em detalhes). No ano seguinte eu não fui professora dos terceiros anos e e sempre que me via pelo corredor da escola ele brincava que eu não gostava mais deles, imagina.Se pudesse voltar atrás, teria encarado o desafio só para passar mais um ano sendo a professora daquele menino de riso escandaloso e doçura sincera.
Eu nunca poderia imaginar.
O ar me faltou, não quis acreditar. Foi uma dessas notícias que você torce para ser um boato de mau gosto.Me disseram seu nome, seu sobrenome, desesperada entrei no Face atrás de algo que desmentisse o que me arrebentava o peito. Não podíamos aceitar que um dos nossos alunos inesquecíveis havia nos deixado, levado pela tristeza que, egoístas, nós nunca enxergamos. Jamais conseguimos ver em tanta luz a escuridão que o torturava.
Léo foi embora porque o cinza de um mundo preconceituoso apagou a cor da sua humanidade e a transparência de seus sentimentos. Não o culpamos por sua decisão, mas devemos tratar a nossa dor sendo seres humanos melhores, para que outras pessoas não se sintam solitárias e desesperadas como ele se sentia.
O que me assustou quando vi o menino do brigadeiro foi o sentimento infantil de querer mudar a história do Léo: eu queria ter ouvido um "professoraaa", ter ganhando um abraço. Eu desejei que seu corpo não fosse apenas parecido com do meu lindo ex aluno: eu quis, naqueles curtos momentos que ele fosse o Leonardo.
Ter decorado a sua risada, o seu jeito, faz com que as memórias e a lembrança daquela manhã machuquem um pouco menos. Sei que ele não gostaria que substituíssemos o carinho pela sua presença por mágoa e tristeza.
E que aprendêssemos com a alegria que ele sempre deu aos nossos dias a combater com amor a violência da sociedade que não o abrigou como ele merecia.
Pelo nosso Léo e por todos os e as Léos, sempre!
                      DéboraSConsiglio


Biografia:
Professora para viver,escrito para não enlouquecer.
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Outros títulos do mesmo autor

Crônicas BRUNA, MINHA CASA. Débora da Silva Consiglio
Crônicas AO LÉO, COM AMOR Débora da Silva Consiglio


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