É carnaval. Espero pular as quatro noites. Passei o dia todo preparando o meu Kit. Minha cuidadora ajudou. Têm analgésicos, emplastos, Iodex, ataduras, talas. Ao invés de cerveja, estou levando Biotônico Fontoura. Troquei as pilhas do meu aparelho de ouvido, pensando bem, nem vou levar. Pode cair na hora em que eu estiver pulando. A cola Corega não pode faltar, nunca se sabe, na hora que eu estiver gritando “O Sol estava quente no deserto do Saara, ai que calor ô ô ô” , pode acontecer um acidente. Botei umas fitinhas coloridas na minha bengala. A minha cuidadora vai fantasiada de enfermeira, apropriado, não é mesmo? Ih! Não posso esquecer de uma fralda extra. Botei glitter nos meus suspensórios. Tomara que a Genoveva esteja lá, faz sessenta anos que a gente pula junto. Adoro quando começa a música “Bandeira Branca Amor, Não posso mais! Pela saudade que me invade ...”. Só não sei se eles vão tocar: “O teu Cabelo não nega Mulata...” Tá tudo mudado! E aquela: “Olha a cabeleira do Zezé, será que ele é, será que ele é?” Eu e a Genoveva gostamos da música da Colombina. Vou levar um monte de camisinhas no bolso. Tinha bastante lá em casa e nunca usei, vou encher de ar e soltar no salão. A Genoveva gosta muito da “Mamãe eu quero, Mamãe eu quero...”.
A Genoveva é que era mulher de verdade. Peraí, mulher de verdade era a Amélia!
Confundo tudo.
A Genoveva era especial.
A minha cuidadora diz que este ano ela não vem...
(Amigos são Amigos até o fim.).
Na verdade, sempre tivemos carnaval e, desde que me conheço por gente, é um curto período de longa descontração. Tenho um amigo do Rio que foi meu colega nos tempos de Escola Militar, olha só que privilégio: ele mora em Copacabana, diz sempre que somos um povo alegre. Longe dessas pesquisas internacionais que diz nós sermos deprimidos(mentira deslavada), o meu amigo tem razão. Apesar de tudo, ainda mantemos o nosso bom humor. Sabemos que na calada da noite e aproveitando a nossa euforia, os políticos estão tramando pacotes de maldade contra nós. Eles são assim mesmo, é das suas índoles. Eles não têm arrumação, temos que tirá-los de lá a força, sempre repeti isto. Logo chegarão as águas de março trazendo no seu fluxo, uma quantidade enorme de medidas que nos prejudicarão, como sempre. Tomaremos bastante cerveja e esqueceremos por um tempo essas coisas. Fará bem pra nós. O que sobrar das nossas energias, iremos à luta novamente contra eles.
Ufa! Consegui sobreviver à primeira noite de carnaval. A fisioterapeuta já estava esperando-me. Até o meu geriatra ligou pra mim. Nem falei nada pra ele, ele é muito ranzinza! Mas a minha enfermeira! Olha rapaz, eu queria ter uns anos a menos...
É parecida com a Genoveva quando tinha trinta anos.
E a Genoveva? Minha colombina, que pena...
Sérgio Clos
|