Naquela idade, com apenas dez anos, Floriano já estava apaixonado. Chamava-se Marina, a menina por quem ele morria de amores. A menina, uma linda loirinha de olhos verdes, vivia cercada de luxos, mimos e paparicos. Muito orgulhosa, ela nem sequer olhava pra ele. Enquanto que ele, mísero vivente, só tinha olhos pra ela.
Apesar de pobre, tinha mesa farta. Mas de tão triste, Floriano nem queria comer. Morrer, talvez quisesse. Passava a maior parte do tempo quieto, calado. A mãe dele sempre fazendo de tudo para agradá-lo: não tinha jeito, o garoto era só tristeza. Preocupada ela sondava o estado de espírito do filho, sem saber o motivo de tanto desgosto.
- Meu Deus, o que será que esse menino tem? - perguntava ela para o marido.
Coitada. Não podia imaginar que uma criança, que mal havia deixado de mijar na cama, estivesse já tão apaixonado.
Quando as férias chegaram, aconteceu o inesperado - um circo chegou na cidade. Cheio de curiosidade Floriano saiu de sua tristeza e foi olhar tudo de perto. E chegando mais perto, foi que ele viu um palhaço, de cara pintada e chapéu na cabeça, cercado por um bando de crianças.
Então o palhaço pediu para que os meninos se aproximassem mais um pouco, e depois de alguns minutos de ensaio estava tudo combinado. Agora era só sair pelas ruas da cidade e quando o palhaço gritasse uma rima, todos iam responder com outra.
E lá se foram eles. Os meninos, numa algazarra de dar gosto. Na frente deles, equilibrando-se em duas grandes pernas de pau, o palhaço - que logo deu um grito alto e forte anunciando a estreia do circo na cidade:
- Hoje tem espetáculo?
E a meninada respondeu numa alegria só:
- Tem, sim sinhô!
- Às oito horas da noite?
- Tem, sim sinhô!
- E arrocha, negada!
- Úuuuuuuuu.
- Mais um bocadinho!
- Úuuuuuuuuuuuuu.
- Subi pelo tronco e desci pela rama.
- Menina bonita me deite na cama.
- Tapioca de coco, beiju de massa.
- Peguei nos pitoco da velha Inaça.
Pronto, o circo fizera Floriano esquecer seus desgostos e desilusões. O mundo agora transformara-se num lugar cheio de cores e encantos. Esquecido da menina Marina, ele tinha voltado a ser criança, tudo por causa de um palhaço.
Dois meses mais tarde, para a decepção dele, o circo foi embora. Deu-se que mais dois anos de sua vida transcorreram sem grandes alegrias. Até que um dia, a bela Luíza apareceu diante dele. Que belos olhos verdes, que candura tinha aquela menina! Mal botou os olhos naquela doce criatura, já se apaixonou por ela. A menina também gostou dele.
Depois, além de apaixonados os dois se tornaram amigos. Mas, por orgulho ou por medo de estragar aquela amizade tão bonita, nenhum deles declarava o que sentia pelo outro. E foi assim que aquela amizade se transformou num namoro disfarçado. Agora, eles dançavam juntos, e riam de tudo e de todas as coisas, até mesmo deles próprios. Depois, sem nenhum motivo os dois se abraçavam.
Às vezes, fingindo cansaço ela encostava a cabeça no ombro dele, ao passo que ele, fazendo-se de bobo, enroscava o braço na cintura dela. E ficavam ali, os dois, um ao lado do outro. Quietos e abraçados. Naqueles momentos o coraçãozinho de Floriano ia nas nuvens e voltava.
Os dias passando e Floriano guardando segredo dos seus sentimentos, sem coragem de se declarar àquela linda menina. Depois de algum tempo começou a tomar raiva de si, envergonhado de sua grande covardia. Completamente despeitado, trancava-se no quarto olhando-se no espelho do guarda-roupa.
- Bobo! Como você é bobo, garoto!
Muitos anos se passaram. E de menino Floriano tornou-se homem feito. E viu que estava condenado a ser eternamente bobo, sempre apaixonado por Luíza. Só que ela, também, continua apaixonada por ele.
Faz um ano que os dois se casaram e foram morar numa cidadezinha de Minas Gerais. E lá, quando a tarde cai, eles sentam na varanda da casa e ficam ali juntinhos, um perto do outro. E de tão felizes mais parecem duas crianças. E por qualquer motivo os dois ainda se abraçam - e depois se beijam. E rindo prometem que vão se amar por toda a vida.
Jota Santiago
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