Moro em Goiania já alguns anos. Por isso sigo minha rotina como uma goiana: pego ônibus, vou estudar, faço meu lazer e etc. Hoje tomei o transporte coletivo, que é público, mas beeem particular. Cobra-se uma tarifa por viagem de R$3,70. Não bastando isso, toda vez que estudantes ou idosos vão tomar um coletivo, tem de apresentar sua carteirinha de identificação com o nome, CPF, matrícula, nome da mãe, do pais, do filho e do espírito santo...
Além disso, muitos idosos são impedidos de pegar o ônibus por não possuírem a carteirinha e são obrigados a esperar a boa vontade de algum outro motorista que os deixem seguir viagem.
Seguindo viagem, tomei o 002, ônibus que faz a linha do meu bairro até o centro. Passo pela catraca e procuro um lugar no fundo (ainda há lugares, pois não está perto do horário das pessoas saírem do trabalho) sento-me e observo algumas pessoas. A grande maioria no celular e com fones de ouvido, outras lendo, algumas conversando sobre assuntos aleatórios e eu observando.
Meu banco não tem encosto de cabeça, o que torna meu cochilo mais difícil. Do banco da janela posso ter mais espaço e ainda vejo o lado de fora, mesmo que seja a mesma paisagem todos os dias. A rota é sempre a mesma, por isso vejo os grafites de sempre, os hotéis, os hospitais, uma funerária...
No entanto, o ônibus para em um ponto em frente à um DP e sobe pela porta de trás um policial militar. Tudo bem para todos, na verdade quase ninguém repara. Algo normal.
Ele está de pé e um mulher levanta-se para ele sentar. Nossa viagem continua.
Até que o ônibus para em outro ponto mais adiante.
Havia um rapaz com uma camiseta alaranjada-desbotada-encardida, uma bermuda verde musgo, que estava mais para amarronzada e sem sapatos. Seu rosto era magro, fino e só não era amarelo-pálido pois era negro.
Esse rapaz que aparentemente tinha uns vinte e poucos anos, subiu um degrau. Olharam. Outro. Analisaram. Outro. Se espantaram.
O motorista não andou. Parou, exigiu que descesse e as pessoas também.
Elas estavam indignadas.
O policial se levantou. Empurrou-o, gritou e ordenou que descesse imediatamente.
“Desceu”
E eu?
Não pude fazer nada, paralisei.
Só pude olhar para trás e ver aquele frágil corpo se reerguendo da queda.
A queda era a realidade.
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