Se desdobre para se tornar nobre,
não de casaca ou carruagem,
mas até que isso se torne
em longa viagem
vida adentro até chegar à luz,
lugar que mesmo o mais empedernido
saberá ser o céu, bem depois da cruz...
Do alto do teu mais doce e sábio sentimento
verás os que passam carregando seus fardos,
viajantes, minúsculos transeuntes, soldados,
os que guardam as mãos nos bolsos, dentro,
pequenos em busca da escola que lhes trará saber,
os que se vão pelos vãos dos becos desse viver,
os que são lanternas aos que navegam no escuro,
nós, que buscamos o ouro reluzente do amor puro...
Ao chegar à porta do Paraíso terás por companhia,
lado a lado, os que perderam o juízo, nautas loucos,
Van Gogh e sua alma decepada, o pincel como espada,
o zeloso jardineiro que sempre vias debruçado no jardim
a regar as flores que entravam por teus olhos cansados,
um homem à espera da queda da maçã sobre a cabeça,
mais que isso, os que foram impedidos de ousar,
um Galileu Galilei a enfrentar o mais indócil mar
humano em vestimentas religiosas,
aquele que foi perdoado por ter inventado a pólvora,
o que mais perguntas fez ao silencioso cosmo,
como se não soubesse que a cada resposta
outra pergunta viria junto em interminável novelo,
esperando, um dia, que Deus pudesse recebê-lo...
Se reparares de modo mais arguto,
verás tua sombra a pairar ao lado da porta fechada,
o que fostes a si e aos outros o que nunca pode ser,
verás o porque da existência de almas penadas,
aquelas que vieram para o inverso da vida viver,
os que jamais olharão para trás com medo das visões
que compuseram ao largo da régua do tempo,
e, quando o anjo celeste a porta abrir,
verás, enfim, que estivera no Paraíso,
por toda vida, a todo momento,
por viveres sem de nada fugir...
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