Nênia, a irmã de Norma, estava sentada no sofá da sala de sua casa, quando o telefone tocou;
- Alô! Pois não?
- Tia! Sou eu, Hélio;
- O que foi Hélio?
- Você pode vir ficar comigo?
- O que está havendo? Cadê a sua mãe?
- Saiu com Sophia e a mulher que estava conversando com ela aqui em casa!
- Que mulher Hélio? Do que você está falando, cadê o Marcelo?
- Tia..., você vem logo? Eu..., eu..., estou com medo! Tem alguma coisa lá no quarto...!
- Hélio! Não saia daí, fique na sala que eu já estou chegando... – Nênia foi até o quarto, pegou a bolsa em cima da cama, conferiu se a chave do carro estava dentro, e saiu...
Hélio desligou o telefone e foi se enrolar debaixo de um cobertor, indo esconder-se atrás do sofá, com medo! O motivo de seu medo, foi que depois que Norma saiu, ele sentou para assistir a televisão e em pouco tempo, começou a ouvir barulhos em seu quarto e de Sophia. Subiu as escadas pensando ser o gato do vizinho, passeando pelo quarto, como tinha costume de fazer, todas as vezes que encontrava a janela aberta.
Hélio empurrou a porta do quarto e entrou; procurou por todos os cantos e nem sinal do bichano. Passou pela frente do espelho e não percebeu quando a imagem de uma menina com o rosto desfigurado e em carne viva, com os cabelos despenteados, refletiu no espelho, acompanhado com os olhos, os seus passos. Voltou e olhou pela janela, pensou: “o danado deve ter saído na hora em que entrei”.
Fechou a janela e caminhou até o centro do quarto e se olhou no espelho. Virou-se para ir embora, ficando com as costas para o espelho, quando a imagem da menina mais uma vez surgiu, e esticou seus dois braços esqueléticos através do espelho, na tentativa de agarrar Hélio. Ele sentiu um arrepio no corpo, e por instinto, voltou-se rapidamente para olhar o espelho e...; enxergou somente, sua própria imagem nele.
Já estava prestes a sair do quarto, quando a cama balançou sozinha; Hélio ficou parado olhando para ela, desconfiado, com o olhar arregalado! De repente, a cama pulou! O coração de Hélio só faltou sair pela boca! Mesmo com medo, resolveu ir até a cama, sua curiosidade era maior que a noção de perigo e ele ainda pensar, se tratar do gato; lentamente se abaixou e deitou no chão para olhar por debaixo dela; um odor forte de carne podre misturado com o cheiro de enxofre, impregnaram suas narinas, fazendo com que ele levasse uma das mãos à boca e fechasse seus olhos instantaneamente.
Hélio foi abrindo seus olhos devagar..., de repente, na frente deles, surgiram dois olhos amarelos fogueados, que quase encostavam nos seus! Hélio arrastou-se para trás e desceu as escadas, em disparada, quando se deu o episódio do telefonema para sua tia Nênia.
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... Dentro do carro, Éster e Norma falavam como iriam forçar a velha, a invocar outro ritual, para salvar Sophia. Éster explicou para Norma, que era imprevisível saber o resultado dessa nova invocação, pelo motivo se sua mãe, ser controlada pelos espíritos na maioria das vezes.
Norma aproveitou para procurar por algum pedaço de papel para poder passar na perna que escorria o sangue, quando abriu o porta luvas e uma foto de uma menina caiu, sobre seus joelhos. Pegou a foto e colocou na claridade:
- Essa garotinha, era a sua filha? – Perguntou para Éster;
- Minha pequena Sônia! – Respondeu Éster;
- Mas..., ela é..., a cara se Sophia!!! – Exclamou Norma;
- Realmente, elas se parecem! Eu quase não acreditei quando olhei para sua filha, cheguei a imaginar que era... – Éster respirou fundo!
Norma pôs a foto de volta no porta luvas, entendendo o que Éster queria dizer. Ficou conjeturando consigo mesma, a razão para tantas coincidências entre sua filha, e a filha de Éster. Pegou a caixa de lenços de papel para limpar o ferimento, Éster olhou a perna de Norma e falou;
- Isso está feio mesmo!
- Nada que não possa suportar!
No banco de trás do carro, Sophia continuava na mesma posição que foi colocada por Norma. As duas perceberam que a boneca parou de se debater no porta-malas, parecendo aceitar estar presa. Éster, ao ver que se aproximava da rua onde morava sua mãe, diminuiu a velocidade do carro, entrando na avenida principal. Norma lembrou do dia anterior que passou com Sophia, por aquela mesma avenida, das lojas que entrou, do moleques que quase a assaltaram, e finalmente, da velha! Sentiu raiva! Éster parou o carro na frente da pequena casa, olhou para fora do carro, e finalmente falou com Norma:
- Lá dentro, você vai ouvir, ver e sentir coisas que nunca se passaram por sua cabeça!
- Creio que nada mais vai me surpreender, depois desta noite! – Respondeu Norma, se fazendo de corajosa;
- Pelo contrário; você ainda vai se surpreender com muita coisa, ainda! - Disse Éster olhando Norma nos olhos;
- O que mais poderia ser surpreendente que uma boneca que se alimenta de restos de carnes de mortos em decomposição?
- No mundo que eu cresci, vendo os rituais que minha mãe invocavam, pode acreditar; ainda existem coisas que nenhum ser humano, pode imaginar que exista no mundo das trevas...!
Norma se calou! Sabia que não podia discutir sobre o assunto, com quem passou praticamente, toda a sua vida vivendo naquele ambiente:
- Quando entrarmos, deixe que eu mesma fale com minha mãe;
- E se ela não quiser realizar o ritual?
- Impossível! Esse ritual é do interesse dela!
- Como assim? – Perguntou Norma;
- Você vai ter que confiar em mim e acreditar nas coisas que eu mandar você fazer lá dentro! – Disse Éster, ignorando a pergunta de Norma.
Saíram do carro e Norma tratou de pegar Sophia no colo, enquanto Éster abria o porta-malas e puxava a boneca pra fora. Verificou a corda que a amarrava, a segurou firme nos braços, e se dirigiu para a entrada da casa, seguida por Norma...
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... Hélio permanecia encolhido atrás do sofá, quando a campanhia da porta tocou. Permaneceu quieto, a campanhia insistiu por mais três vezes, até ele ouvir a voz de sua tia chamá-lo pelo nome:
- Hélio! Hélioooo!
- Tia Nênia? – Falou baixinho, pra ele mesmo. Hélio saiu de trás do sofá, ainda enrolado no cobertor e foi abrir a porta;
- O que está havendo, e porque você está enrolado neste cobertor? – Nênia perguntava à medida que ia adentrando na casa;
- Cadê todo mundo Hélio? – Perguntou mais uma vez, jogando a bolsa em cima da mesa;
- Não sei! Papai está no hospital, mamãe saiu com a mulher e Sophia e ...
- Hospital? O que houve com seu pai? – Interrompeu ela;
- Caiu de cima do lugar onde ele tava trabalhando; - Respondeu achando que o pai ainda estava vivo e internado, pois até aquele momento, ninguém da família sabia que Marcelo já estava morto;
- Meu Deus! E sua mãe saiu sem falar pra onde ia com Sophia?
- Sophia ficou esquisita depois que ganhou uma boneca que fala!
- Boneca que fala?
- NAZU! Mas Sophia disse que era pra chamá-la de Éster! – Disse ele, referindo-se ao nome da boneca;
- NAZU! Eu já vi alguma coisa sobre esta palavra... – Nênia buscava pela lembrança na mente, quando Hélio interrompeu seus pensamentos;
- Tia, tem alguma coisa lá no quarto, debaixo da cama;
- Oh! Meu filho! Estava tão preocupada com seus pais, que esqueci porque você me ligou; o que foi mesmo que você falou?
- Tem alguma coisa debaixo de minha cama! – Repetiu ele, deixando o medo transparecer em sua voz.
Nênia olhou para as escadas, segurou Hélio pela mão e subiu em direção ao quarto. Encontrou a porta fechada, abriu lentamente; Hélio deu alguns passos e se colocou atrás de Nênia. Ela passou a mão pela parede em busca do interruptor da luz até encontrá-lo, acendeu a luz do quarto e passou o olhar por ele todo.
O quarto permanecia no mais absoluto silêncio. Entrou com passos lentos, sendo seguida por Hélio, que se mantinha a uma certa distância. Voltou o olhar para Hélio que estava parado na porta do quarto e lhe apontou a cama; Nênia olhou para a cama, respirou fundo, e ajoelhou-se para observar debaixo dela. Não viu nada de estranho que lhe chamasse a atenção.
Já estava levantando do chão, quando ouviu um barulho, como se algo estivesse arranhando o colchão por baixo da cama. Voltou a olhar novamente e sentiu o odor de carne podre e enxofre que emanava do piso sob a cama. Ficou em pé e começou a empurrar a cama para o lado, até encostá-la na parede, queria descobrir de onde vinha aquele cheiro e quando olhou para o piso que a cama cobria, encontrou uns desenhos e marcações, que a fizeram tremer dos pés à cabeça...
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