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Curiosidade
Alfonse Humberto Balsa Coelho

Resumo:
Menino da roça, ingênuo, observou que certa pessoa invariavelmente entrava no mato em um mesmo local e hora todos os dias. Um dia resolveu observar e assuntar. Deu com os burros n'água. Leiam. Alfonse

Curiosidade!

Pelas estradas do Paraíso Perdido

Ali, parado, imóvel de tudo, nem respirando direito, observava. Foram uns tantos minutos; talvez uns 04 ou 05; parecia que foram horas .Vi quando ele se esgueirou por dentre a vegetação densa e se embrenhou no cerrado. Estava só. Observei ainda que ele se preocupava em não fazer alarde. Esgueirava-se por entre os galhos, levantava bem as pernas e as descia lenta e certeiramente, pisando onde não faria ruído, tanto quanto enfiava os braços por dentre as galhadas, quase que nadando por entre as folhas. Engraçado, pensava eu, todas as semanas destes últimos meses esse indivíduo vinha ali. Entrava quase que pelo mesmo lugar; nas redondezas. Sempre às quintas-feiras e invariavelmente entre as 05:30 e 06:30 horas da tarde. Fica lá por uns 15 a 20 minutos; sempre. A curiosidade é um sentimento muito estranho mesmo. O medo também. Sentia meu coração super acelerado mesmo quando imaginando entrar ali para ver o que existia de tão interessante para aquele cara ir tanto lá. Tinha que saber o que existia. Tinha que saber. O que será? Se ele sempre entra só e sai só, entra vestido e sai com o paletó na braço, o que estaria fazendo lá no meio do mato? E tem mais, lá bem para dentro, pois por inúmeras vezes ouvi o farfalhar das folhas mato afora.

Aquela estrada era de pouco movimento; não muito pouco, pois, com o passar dos anos vieram as pessoas de bairros que foram se anexando aos então já existentes , e com isso, se achegando mais às nossas bandas. Ela descia calma por uns 100 metros, virava-se à esquerda e descia-se novamente mais uns 100 metros, aí mais ligeira, virava-se à direita e andava-se no plano,quase um vagar tranqüilo, com pequena curva para a esquerda, por uns 200 metros.Nesse percurso todo, alguns poucos entroncamentos que nada nos diziam e mais uns 100 metros à frente, uns 200 descendo em curva direita-esquerda com 02 entroncamentos um da “ Chacrinha “ beirando a cerca e outro do “ Morro Vermelho “ e aí , finalmente um entroncamento mais aberto . À direita ia lá para o Sítio do “Seu Doutor “ e na reta, descendo até outro entroncamento, mais ou menos 50 metros, novo entroncamento, sendo à esquerda desciam-se para o pessoal dos Fortes e à direita para a tal Chácara do Tanque. Mas era ali , próximo à estrada que ia para o Sítio do Seu Doutor que a coisa ocorria. Dali se tem coisas engraçadas. Outras tristes e outras misteriosas; êta lugarzinho cheio de coisas , cheias de lembranças; não, sou eu quem tem as lembranças. É isso. Ali foi palco de muitos acontecimentos; uns muito tristes mesmo. Deixa pra lá!

Mas então; foi ali. Descendo para a “ cidade “ como dizíamos quando saíamos de casa rumo ao centro da cidade ou para outro local na “ rua “ , à direita era o tal recanto onde o camarada invariavelmente fazia suas entradas no cerradinho.
Um belo dia imaginei: - esse indivíduo anda bem uns 10 ou 15 metros mato adentro; será que andaria mais e eu não estaria escutando os barulhos , que já eram poucos pelos cuidados que ele tinha? É, pode ser que sim e pode ser que não. Apurei os ouvidos. Ao longe, bem longe ouviam-se vozes; que estranho, pensei! Está tudo tão longe das casas dos Fortes, seriam lenheiras? Quem sabe seriam dos donos de cavalos que por ali pastavam ? Ouvia também alguns ruídos e gemidos estranhos. Coragem eu não tinha para ir lá; isto eu não tinha mesmo! O que seriam esses gemidos? De hipóteses em hipóteses fui ajuntando idéias, amontoando pressupostos...conjecturando... - ÔI MENINO! – Um vozeirão acordou-me dos pensamentos e por pouco não caí ao chão. – Era o tinhoso; era o maldito do homem que vasculhava aqueles matos; era o cão dos infernos que voltara lá de dentro do cerrado e me flagara ali, absorto em meus pensamentos, imaginando e imaginando sobre o que seria que o levava ali.   – E AÍ MENINO ? –PERDEU A LÍNGUA? , ASSUSTOU-SE ? – “ CÊ TÁ BRANCO , INFELIZ ! “ – Não consegui responder; as palavras não me saiam da boca. – DIZ ALGUMA COISA AÍ SEU PRAGUINHA ! – O QUE ESTÁ FAZENDO AÍ OLHANDO PRA MINHA CARA ? – Moço, balbuciei trêmulo, eu sempre vejo o senhor entrar aí e então estava me perguntando o que é que o sr. faz aí toda vez que entra no cerrado... – SÓ ISSO? – JÁ “TE ARRESPONDO” ! – EU ENTRO   PARA FAZER LÁ DENTRO DO MATO O QUE VOCÊ ACABOU DE FAZER AÍ NAS CALÇAS !

Ele saiu rindo e eu, bem lambuzado, fiquei com aquela cara de titica...

Alfonse
Até 12.08


Biografia:
Administrador de Empresas, aposentado, 66 anos, pós-graduado em Met.Ensino Superior, formado pela Adesg ( Associação dos Diplom. da Escola Superior de Guerra ), 18 anos na Mobil e Ipiranga, 20 anos na M.Benz do Brasil, atualmente só rabiscando.
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Publicações de número 1 até 4 de um total de 4.


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