Apesar de não levar jeito com versos, a apresentadora do "Jornal Nacional", Patrícia, não esconde o orgulho que tem do sobrenome – Poeta.
Se, em vez de Patrícia Poeta, ela se chamasse Patrícia Poetisa, teria atraído tanto a atenção de todos quando assumiu a bancada do telejornal mais famoso do país no lugar de Fátima Bernardes?
De posse de "poeta", a jornalista teria sido beneficiada pelo atrativo linguístico, ainda que seja uma mulher bela e talentosa?
As palavras, que envolvem questões gráficas, semânticas e/ou afetivas, precisam ser levadas a sério. E quando se se trata de “poeta” ou “poetisa”, aí a coisa esquenta ou se complica... de vez.
Essa digressão não tem outra finalidade senão servir de desculpa para tocarmos na questão – relevante para uns, irrelevante para outros – sobre o uso cada vez mais unissex da palavra poeta...
A qual, diga-se de passagem, existe no português desde o século 14 – derivada do latim poeta, que veio por sua vez do grego poietes –, tendo nascido como substantivo masculino e mantido essa condição por séculos e séculos. Tanto que, para designar uma mulher que escreve versos, a tradição manda que usemos o termo poetisa.
No dia a dia, aqui ou em Portugal, contudo, tem se firmado a tendência – já vitoriosa – em tornar poeta um substantivo de dois gêneros, ou seja, para denominar tanto o homem como a mulher que se dedicam à arte de poetar.
Especialmente ela, que encara poetisa como um termo pejorativo ou, no mínimo, como uma palavrinha cheia de conotações condescendentes. Claro que esse fenômeno foi motivado pelo feminismo que permeou sobretudo a segunda metade do século 20.
Do lado de cá, Cecília Meireles foi a primeira a perceber poeta como um gênero neutro e o eu lírico como uma força, digamos, assexuada, conforme atesta o poema "Motivo": "Não sou alegre nem sou triste: sou poeta". Do lado de lá, uma geração depois, Sophia de Mello Breyner Andresen reivindicou para poeta o gênero feminino, firmando uma espécie de isonomia entre o macho e a fêmea de letras...
Certo é que, hoje em dia, ficou muito difícil encontrar uma poeta de verdade que se apresente como poetisa. Minto. Cynara Novaes, uma poeta de verdade, se apresenta como "poetisa, costureira de palavras, tecelã de frases arranjadas em versos".
Minto de novo. No poema "Sou e isso é tudo", ela deixou claro que é mais que isso. Vejamos: "Sou poetisa e, por mais que o mundo me renegue, continuarei assim / Por mais que o descaso a mim se apresente em forma / da ausência ou em forma de gente, continuarei poetisa / porque ser poetisa, ou poeta, como queiram, / é atemporal e está em mim como para o passarinho está seu canto / e, por consequência, seu natural encanto / Ninguém, ninguém jamais, poderá tirar isso de mim..."
Então, tá.
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