A carteira de trabalho foi uma conquista dos trabalhadores na década de 40, assim como outros direitos fundamentais. A sociedade mudou muito de lá para cá, mas não podemos ignorar que o trabalhador, de modo geral é a parte mais fraca na relação de emprego. Embora a modernização que caracteriza nosso século, muito do ranço escravagista permanece na relação de emprego em regiões mais distantes e isoladas deste país, no qual o trabalho escravo ainda é uma realidade, assim como o trabalho infantil. A carteira de trabalho era o documento essencial para a comprovação do vínculo empregatício. Quem tivesse a carteira assinada pelo empregador, em decorrência tinha as garantias de salário, férias, décimo terceiro salário, indenização, posteriormente ao FGTS, PIS/PASEP, aposentadoria, auxílio doença e outros benefícios previdenciários. Com as modificações na legislação previdenciária (Lei 8212 e Lei 8213) que reformulou vários aspectos importantes no que tange aos benefícios, a carteira de trabalho não mais passou a garantir por si só o direito à aposentadoria, pois esta passou a ser por comprovação de recolhimento. A aposentadoria que era por tempo de serviço passou a ser por tempo de contribuição. Passou o empregado a ter direito à aposentadoria só se o empregador recolheu devidamente a contribuição previdenciária. Ora, passou então a ser cobrado do trabalhador um ato sobre o qual ele não tem competência legal para efetuar, visto que a competência do recolhimento é do empregador. Também não tem poderes para efetuar tal cobrança do empregador durante a vigência do contrato de trabalho, Após a vigência, apenas na justiça do trabalho. Só que muitas vezes o empregado só vai saber que tal procedimento não foi realizado por ocasião da solicitação do benefício. É de forma indireta uma forma de desvalorizar a carteira de trabalho. Aliado a isto, o mercado hoje é cruel com os jovens. Em função do excedente de mão de obra em muitas regiões, a experiência é requerida como fator primordial. O jovem para adquiri-la se submete a trabalhar sem a carteira de trabalho assinada, assim como o trabalhador que já está em uma faixa de idade mais avançada e para quem o mercado se fecha. Ambos passam à economia informal, devido ao excesso de encargos. Daí passam estes também a atribuir menos valor ao documento, quando na realidade o mal não é a carteira, mas o excesso de encargos sociais. Há ainda quem possa pensar que se não houve recolhimento isto passa a ser um peso para a previdência, quando na realidade o que pesa é a má gestão do dinheiro da previdência alocado para outras áreas ou desviado através de fraudes vergonhosas. O jovem para adquirir experiência submete-se aos "maravilhosos" estágios tão propagados em certas ocasiões pela mídia nas propagandas institucionais. Proliferaram os fornecedores de mão de obra estudantil, que na realidade não passa de mão de obra barata para o empregador, trabalhando em atividades nada compatíveis com o ensino desenvolvido, sem que o estágio seja condição para obtenção do diploma-previsão legal-e sem o devido acompanhamento e supervisão da escola, sem o resguardo do tempo para estudo. Muitos passam de um curso para outro, após o término, para terem garantia de trabalho, tirando com isto vaga nas escolas para outros alunos e não respeitando o tempo de estágio previsto em lei, nem tendo o cômputo deste tempo para aposentadoria visto que não há recolhimento de contribuição previdenciária. Isto sem falar nos estágios voluntário nos quais nada recebem. Poderíamos falar ainda no crescente culto ao voluntariado, como outras tantas coisas boa para os Estados Unidos, país rico e desenvolvido. Não para o Brasil tão carente de empregos. Não sou contra o voluntariado para quem realmente disponha de tempo e condição para fazê-lo e também porque possibilita o desenvolvimento de outros valores de extrema importância na formação da pessoa. Sou contra os casos em que o jovem trabalha meses sem nada receber, como "voluntário", para estar por perto e ter chance de ser visto e conseguir um emprego posteriormente. Já vi também bancário experiente, após ser demitido, matricular-se em escola técnica para conseguir "trabalhar” como estagiário em outra instituição e assim poder levar algum dinheiro para casa. O futuro da carteira não depende de um único fator, mas de vários, como maior geração de empregos, mais valorização e qualificação profissional, incentivo e políticas que realmente venham a proteger o jovem (e isto não é aumentando a idade para o jovem aprendiz, tal qual a adolescência que está sendo prolongada até quase 30 anos) diminuição da informalidade, políticas de incentivo aos mais idosos para se qualificarem, modelo econômico mais humano e menos paternalista (que ensine a pescar e não coloque o peixe na boca) maior e real incentivo e política de estado para a educação, pública e de qualidade para que a população possa efetivamente se desenvolver, evoluir, ter possibilidades de ascensão social e, sobretudo de discernimento. Será que isto interessa?
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