A organização dos espaços na Educação Infantil tem papel fundamental no processo de desenvolvimento das crianças. Quando planejados com intencionalidade e centrados na criança como protagonista, os espaços tornam-se ambientes que acolhem, instigam e favorecem o brincar, a aprendizagem e a construção da autonomia. Essa visão dialoga diretamente com os princípios da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que reconhece o brincar, o conviver, o explorar, o expressar e o participar como direitos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças.
Longe de serem estáticos ou imutáveis, os espaços acolhedores são dinâmicos e se transformam conforme as necessidades, os interesses e as curiosidades das crianças. Essa flexibilidade permite que os ambientes se adaptem constantemente, desafiando os pequenos a explorar, experimentar, criar e se reinventar. O planejamento desses espaços deve considerar a diversidade e a singularidade de cada criança, garantindo acesso a materiais variados e acessíveis, que incentivem o jogo simbólico, as escolhas e as interações.
Nessa perspectiva, destaca-se a contribuição de Loris Malaguzzi, idealizador da abordagem Reggio Emilia, que considera o ambiente como o “terceiro educador”, ao lado da criança e do adulto. Para ele, os espaços devem ser cuidadosamente pensados para favorecer a autonomia, a interação e a investigação, funcionando como elementos ativos no processo educativo.
Ao organizar espaços que acolhem, promove-se naturalmente um ambiente de escolhas. A criança, nesse contexto, exerce sua autonomia ao optar pelos ambientes de preferência e formar pequenos grupos de acordo com as afinidades, seja em relação às brincadeiras, seja às interações que se estabelecem nesses territórios. Essa prática fortalece a ideia de protagonismo infantil, também defendida pela BNCC, que orienta a construção de contextos que respeitem e valorizem a capacidade da criança de decidir, pensar e agir sobre o seu próprio processo de aprendizagem.
Cada espaço estruturado tem como objetivo proporcionar diferentes experiências de brincar, de interação e de construção de vínculos. Os chamados "territórios de aprendizagem" configuram-se como locais de investigação ativa, onde o conhecimento é construído por meio da exploração sensorial, cognitiva e social. A criança, desde muito cedo, demonstra uma impressionante capacidade de perceber, interpretar e interagir com o mundo ao seu redor, utilizando todos os seus sentidos nesse processo.
De acordo com Maria Carmen Barbosa, pesquisadora da área de Didática da Educação Infantil, os ambientes devem proporcionar desafios que façam sentido para as crianças, respeitando seus interesses e promovendo aprendizagens significativas. Quando a criança atua com as mãos e a mente sobre os materiais disponíveis, ela desenvolve habilidades, adquire experiências e cria suas próprias regras de convivência e experimentação.
Nesse cenário, é essencial oferecer mais do que o já conhecido, desafiando-as a ir além do superficial. O contato com a natureza, com materiais não estruturados e com ambientes provocadores possibilita às crianças criar, inventar, testar hipóteses, resolver problemas e, assim, construir aprendizagens significativas. Essas experiências dialogam com os campos de experiência da BNCC, especialmente "O eu, o outro e o nós", "Corpo, gestos e movimentos" e "Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações", que propõem uma vivência integrada e contextualizada do conhecimento.
Nesse ambiente enriquecido, o papel do professor é de mediador e pesquisador. Cabe a ele manter uma escuta sensível e um olhar atento, promovendo interações intencionais e respeitosas, que potencializem os interesses das crianças e favoreçam o desenvolvimento integral. O professor deixa de ser apenas um transmissor de conteúdos e passa a ser um co-construtor de saberes, como propõe Paulo Fochi, ao destacar o papel do adulto na escuta ativa e na mediação de aprendizagens potentes.
Organizar espaços acolhedores não é apenas uma escolha estética ou funcional, mas sim uma decisão pedagógica potente, que reconhece a criança como sujeito ativo, criativo e competente no processo de aprendizagem. Fortalecer esses espaços é, portanto, fortalecer uma educação infantil de qualidade, que respeita a infância em sua essência e oferece às crianças as condições necessárias para que sejam protagonistas do seu próprio percurso formativo.
Viviane Zen
Lianete Maria Cappellin Vanin
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