Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
Magical Mystery Tour *
Rafael da Silva Claro



Ônibus lotado em São Paulo é ruim, mas ninguém precisa esfregar isso na cara.

Um sujeito, com visual hippie, embarcou no veículo e começou a arranhar um violão. A trilha sonora merecia uma fogueira e um garrafão de cinco litros de vinho. O aspecto meio bicho-grilo, meio rastafari era evidente: cabelos dreadlocks, roupa indiana, violão surrado, e um repertório um tanto quanto bucólico.

O cara teve a pachorra de postar-se apoiado na catraca do coletivo e entoar canções que remetiam a um ambiente idílico. A provocação aconteceu porque o sujeito interrompeu o terrível trajeto trabalho/casa (ou vice-versa) para exibir como é muito melhor seu estilo de vida: livre e saudável. A vida dos usuários do transporte público urbano é diferente: ficar o dia inteiro enfurnado numa tarefa análoga à escravidão voluntária e voltar para casa numa lata de sardinha entupido de monóxido de carbono.

As inconvenientes musiquinhas do hippie fora de época falavam de casinhas nas montanhas, cachoeiras, trinados de pássaros, ar puro e verde, muito verde. Tudo o que ele cantava estava muito distante da nossa realidade pavimentada com concreto e cinza. Eu encarei aquilo como provocação. Mas só eu estava reprovando o andarilho e seu maldito violão. Olhei para trás e todos estavam com expressão meio boba, alguns inclusive se curvaram para assistir melhor ao show. Desisti de qualquer reação e aderi à apresentação.

Depois de algumas enfadonhas e utópicas letras, o, suposto, anticapitalista passou implorando algumas moedas. Foi aí que me toquei: todos os seus versos nos transportavam a um modo de vida almejado por ele. No entanto, o cara estava o dia inteiro pulando de ônibus em ônibus — no estilo “eu poderia estar roubando, poderia estar matando...” e caçando alguns trocados.

Logo vi, era tudo uma farsa. O falso hippie — que se vestia mal, menos por ideologia e mais por falta de recursos financeiros — queria estar dentro de suas músicas. O jogo havia virado, minha situação era bem melhor que a dele. Eu até, uma vez por ano, ia para algum lugar como São Tomé das Letras. E pensar que eu acabaria o dia me sentindo um “porco capitalista”.

Saí do “busão” um pouco mais animado, feliz por não depender da minha falta de talento no violão para ganhar a vida.


Biografia:
Ensino secundário completo. Trabalhei em várias empresas, fora da literatura. Tenho um blog, onde publico meus textos: “Gazeta Explosiva” Blogger
Número de vezes que este texto foi lido: 55573


Outros títulos do mesmo autor

Ensaios 🔴 Que rei sou eu? Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Igual, mas diferente Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Como manipular e influenciar eleitores Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Boulos + Marçal = Boçal Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 McTrump Rafael da Silva Claro
Ensaios Assassinando por um propósito pacificador🔴 Rafael da Silva Claro
Crônicas 🔵 A viagem Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴Pátria Educadora Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Aqueles caras... Rafael da Silva Claro
Ensaios 🔴 Que ministro é esse!? Rafael da Silva Claro

Páginas: Próxima Última

Publicações de número 1 até 10 de um total de 519.


escrita@komedi.com.br © 2024
 
  Textos mais lidos
Minha Amiga Ana - J. Miguel 61120 Visitas
O DESAFIO DA INCLUSÃO - Simone Viçoza 60672 Visitas
A Importância da Educação Digital no Ensino Fundamental - FERNANDO JUNIOR PEREIRA 60556 Visitas
Os Hackers, os Crackers e Nós - Max Bianchi Godoy 60411 Visitas
🔵 Noite sem fim - Rafael da Silva Claro 59273 Visitas
Jazz (ou Música e Tomates) - Sérgio Vale 59166 Visitas
Sete sugestões úteis para advogados: - Professor Jorge Trindade 59039 Visitas
🔵 Só se vive uma vez - Rafael da Silva Claro 59038 Visitas
🔴Madonna de areia - Rafael da Silva Claro 58795 Visitas
O CONTROLE É SEU - Vinicius Pereira Brito 58790 Visitas

Páginas: Próxima Última