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Apátridas
Roberto Queiroz

As luzes se apagam.

É quando começam os primeiros sintomas,
sinais de movimento,
sussurros,
confissões ocultas
entremeadas de falsos versos
escondidos em becos sujos
e biroscas velhas.

É quando os vermes se materializam
e mostram as suas verdadeiras identidades
escondidas por trás de toneladas e mais toneladas
de maquiagem pesada e artificial.

É por trás dessa combinação de mentiras
que eles
(a quem não sabemos os nomes)
tramam seus projetos sórdidos
baseados em mentiras incoerentes
que nada mais são do que tentativas torpes e malfadadas
de autoexaltação precoce e infame.

Eles não são pais
nem filhos
nem netos
nem bisnetos
de ninguém.

São seres sem alma
que habitam entre as reentrâncias da cidade-oculta,
cidade-outrora-do-silêncio
que teima em falar de vez em quando,
furtivamente,
só para provocar aos homens de paz
e de bom coração.

Estão em todos os lugares
apreciando o nada e destruindo as paisagens
que sobrevivem às noites gélidas e pérfidas
num apocalipse polifrenético e sistemático
que deixa atrás de si
vítimas horrorizadas e despedaçadas
em sua moral torpe e indecisa.

O dialeto que proferem
é uma mistura de balbucio e urro
e volta e meia espraguejam de ódio,
revolta dos tempos em que eram belos,
disponíveis,
ousados.

Que criaturas são essas
que não consigo definir com precisão?

Agora não passam de fantasmas criados em laboratório
com a clara intenção de parecerem autodidáticos
quando mais parecem avatares
de alguma ideia tola e nonsense
fabricada por um artesão preguiçoso
(ou seria melhor dizer desleixado?)
que teima em deixar sua tarefa sempre pela metade
só pelo prazer de dar trabalho aos outros.

São fortes
mas usam de seu poder para denegrir
por isso parecem fracos, obsoletos, desnecessários.
São feios
mas há beleza em suas faces ruídas
de anos e anos de sofrimento acumulado
e derrotas injustas.

Mas não adianta falar sobre o passado.
Ele não trará nenhuma resposta positiva
ou legado necessário para se entender
o porquê da existência desses seres malévolos
que gostam de ser implicantes
e fazem de tudo para desconcertar
o dia-a-dia caótico
e contam com a segurança fornecida pela escuridão
que, marota, está ali justamente para obstruir a realidade
tornando-a ainda mais atroz do que ela já é.

Tocam as doze badaladas
e quem tem juízo foge,
corre,
pra bem longe,
tranca-se em si,
reza suas preces alucinadas,
último recurso daqueles que ainda tem esperança
em alguma coisa séria.
Os que arriscam permanecer na rua
por sua conta e risco
mais do que bem armados
estão conscientes de que participarão
de um jogo sórdido
onde somente os menos afortunados em termos de ética
sobreviverão ao combate.

Se você não se encaixa nessa categoria,
fuja agora
ou arrependa-se amargamente.
Não brinque com eles
porque eles não são briquedo, não.

Eu mesmo,
esse narrador que vos fala,
que de corajoso mesmo
só tem a oratória,
já estou indo nessa
que de bobo só tenho a cara
e não estou nem um pouco afim
de manchar o que resta de minha reputação
com falsas valentias.

Aliás,
falando nisso,
olha só as horas.
Tô fazendo o quê
aqui fora ainda?

As ruas
nunca foram tão perigosas
quanto agora...


Biografia:
Crítico cultural, morador da Leopoldina, amante do cinema, da literatura, do teatro e da música e sempre cheio de novas ideias.
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