Do outro lado da rua
Hoje, pela manhã, desenhei um coração na janela do teu quarto, pois, a neblina do alvorecer me favoreceu. Eu não quis acordá-la, estavas tão linda, tão aquecida, tão entregue. Ali, sobre o telhado, quedei-me paralisado por tamanha beleza, os ponteiros pararam, a inspiração acelerou, e eu, desejei profundamente os teus lábios.
Zangado, o cão do vizinho, avistou-me e começou a latir. Por pouco não despenquei do telhado, escorreguei com o susto, mas não cai. O terrível cão despertou-me de um estado de sublimação; as folhas dançavam ao som de uma suave brisa, e os pássaros em sintonia batiam as suas asas, mas Zangado, meu inimigo número um naquele momento, insistia em me entregar. De repente ouvi a porta da casa ao lado abrindo, era o Seu Wilson, pareceu-me chateado com o latido do cão. Este olhava para o dono, voltava o olhar para o telhado, como querendo dizer: “Ele está ali!”. Wilson ordenou-lhe que se calasse imediatamente, por um instante, achei que havia sido descoberto. O traíra parou de latir, o dono, o chamou para dentro da casa. Escapei por pouco, exclamei!
Os minutos foram passando, os demais vizinhos começavam a despertar, as luzes da tua casa foram ligadas, certamente, tratava-se do teu pai. Pus a mochila nas costas, e como a serpente, eu deslizei sobre as telhas até a cerca pela qual havia subido. Eu desci devagar para não chamar a atenção dele. À medida que me afastava do teu sono, dos teus cachos encaracolados, da tua respiração, de teus lábios, da tua janela, o meu coração angustiava-se porque o momento de partir havia chegado. Atravessei o jardim, pulei o muro, corri para o outro lado da rua e, antes de pegar o ônibus, beijei a palma da minha mão e lancei os mais sinceros sentimentos ao vento, para que ele os levasse até você.
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