Senhor Sérgio, vou lhe falar, pois sei que o senhor vai entender.
Já falei pra doutora assistente social, mas parece que ela não entendeu direito.
Teve uma vez, já faz dois anos, que os meus filhos me deixaram aqui em dezembro depois do natal e foram pra praia. Disseram que não iriam levar-me, pois a casa estava em reforma. Não gostei muito porque eu gosto da praia.
Até me lembro de quando eles eram pequeninos, eu e o meu falecido marido abarrotávamos e carro de tralhas e passávamos o verão inteiro com eles.
Tenho dois filhos, um guri e uma guria.
Era uma festa lá na praia.
Era pescaria e banho de mar quase todos os dias. Eles davam um cansaço em nós. Mas era gostoso.
Nós penamos pra construir aquela casa e ela ficou muito bonita. E é bem grande.
A “parentada” toda se esbaldava lá no verão.
Parece que agora tudo mudou.
Eu sei Seu Sérgio, que estou velhinha, mas vou dizer uma coisa pro senhor, eu ainda adoro praia. E até nem sei por que eles não me levaram mais.
Depois que o meu marido morreu, vendi o apartamento pra ajudar meus filhos e fui morar com o guri, que já estava casado. Não quis incomodar, mas ele insistiu. Fiquei no quartinho que era da empregada, mas é confortável. Lá eu não atrapalhava ninguém. Um dia ouvi uma discussão muito séria entre o meu filho e a nora. Só ouvi uma parte da conversa, ela falava muito alto e dizia que tinha que dar uma solução definitiva, e eu não entendia o que seria.
No verão passado eles me deixaram aqui e disseram que me buscariam em fevereiro.
Muito a contra gosto aceitei.
Pois então senhor Sérgio, já as águas de março passaram, o verãozinho de maio já foi, a geada de junho e o frio de julho também. Estamos em agosto, e, nem ele e nem a minha filha vieram aqui me buscar.
Eu fiquei confusa.
Nunca pensei que o verão lá na praia fosse tão longo.
Estou desistindo de esperar, eu acho que vou ficar por aqui mesmo...
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