Sempre busquei o amor em vida
O amor por quem os sinos dobrassem e a boca calasse
Amor onde os olhos dissessem a palavra exata
E o peito parecesse explodir de vida,
enquanto eu repetiria insensata: infinitamente, infinitamente.
Foi de repente, numa curva da estrada, que o amor me apareceu.
Naquele tempo, não havia nada.
Nem imagem, nem toque, nem gesto.
A única coisa que eu sabia eram as palavras de um conhecimento já tão breve
e inexplicavelmente eterno.
Era mais do que conhecer o novo.
Era quase reconhecer o que me parecia sempre ter sido meu.
Não que não tivesse fugido.
Fugi o mais que pude da emoção que me pareciam correntes,
arrastando-me para longe de minha vida.
Mas foi ali,quando da primeira palavra ouvida,
Que a verdade caiu em meu colo: eu já não era mais eu.
Era mulher, não me pertencia e amava, tanto que não sabia medir.
As conseqüências dessa verdade eram muitas e não se fizeram esperar.
Eu sofri a cada segundo de ausência, mas a presença, posto que não fosse física,
enchia-me a alma de uma vida tão imensa que não me sentia capaz de vivê-la.
Antes morrer, no contato dessa certeza,
de que nada nem ninguém seria capaz de mudar o universo que se abria para mim.
Eu amava e já sabia que seria para sempre.
Não a ventura do vivido, mas a certeza de sentir.
E foram muitas madrugadas de um silêncio mútuo
Onde a música preenchia a alma e a comunicação se fazia presente em tantas vezes
que me dizia, quase com medo: "sim".
Mas as palavras que aproximam ,
são as mesmas cujo sentido atravessa a verdade do sentir e promovem o "não".
E foi quando me encontrei sozinha, num silêncio da falta,
e que compreendi que a verdade que descobri em meu afeto,
não me impediria de me afastar dele.
Não houve nada que eu não tivesse feito.
Mil palavras escrevi, de flores enchi a casa alheia,
Músicas e sonhos que descrevi em detalhes, na esperança de recuperar a magia do sim.
Foi em vão.
Os anos passaram e resolvi preencher de materialidade o encontro etéreo.
Penetrei num universo outro e conheci ruas de uma cidade distante.
Era como voltar para casa, depois de uma longa ausência.
Meu corpo encontrou outro corpo que há muito eu esperava
E as horas foram poucas para tanto dizer.
Mas a alma que eu buscara já não residia mais lá.
E nem o desespero mais absoluto me impediu de viver o “não" em todas as suas dores.
Eram esquinas em que eu esperava
E ainda que pedisse e suplicasse nada nem ninguém se fez presente .
Eu estava só.
Restavam-me dois caminhos:
Interromper o curso da minha vida e virar hipótese, na certeza de não suportar a dor
Ou caminhar para frente sempre,
na esperança de que haveria um dia em que a dor não existiria mais.
Caminhei.
A vida me trouxe reencontros de amigos e de amores.
Eu procurei dizer sim o mais que pude,
Afinal, era preciso prosseguir.
Às vezes, sem que impedisse,
ainda me transportava intimamente
Para o breve momento de silêncio
Em que compreendi que meu coração não era mais meu.
Abri-o, é verdade, a todos que se quiseram aproximar
Preenchi de vivências, firmei compromissos, era o caminho que podia percorrer.
Mas a certeza do pertencimento,
Essa me acompanha ainda hoje,
em palavras que já não pronuncio
e em músicas que já não ouso escutar.
Destino difícil, esse de não se pertencer,
de ainda sentir dor quando a poética do mundo entra janela adentro
E o pôr de sol preenche o silêncio das mesmas palavras de anos atrás.
A verdade ignora o "não”, ela existe e é tudo.
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