Pode parecer rabiscos de criança, mas é apenas o gráfico que ilustra o humor de Raquel.
Ela acordou neutra, tomou banho bem humorada, quis ficar triste durante o café da manhã, pegou seu metrô sentindo-se concentrada, chegou ao trabalho extremamente cansada e decidiu que estava se sentindo estranha. Ela não costumava ser assim e só pra piorar a situação, não era sua culpa essa falta de estabilidade. Raquel estava lá, vivendo normalmente, quando, de repente, surgia alguém prontíssimo para tirá-la da rota...
Ta certo, talvez ela tenha alguma parcela de culpa, sobretudo por ter-se deixado levar.
— Deixa que a Raquel do futuro lide com isso.
Acontece que a Raquel do presente estava puta com a Raquel do passado. Em meio a tantas tentativas de superação, o que lhe restava era convencer a Raquel do presente que uma futura Raquel analisará tudo o que lhe passa como algo realmente positivo para a construção de seu caráter.
— Porra de caráter...
Não tinha jeito. A Raquel do presente estava irredutível.
Era compreensível, na realidade. Ela estava passando frio. Embora seus pelos se eriçassem e volta e meia ela estivesse tremendo, não é bem desse tipo de frio que estou falando. É daquele que você prepara todo um terreno para receber calor e tudo o que se ganha é o sopro vindo do nada, com aquele suspiro barulhento de um vento solitário e medonho. Medonho principalmente, pois Raquel soubera que as estações do ano não estavam naquela ordem costumeira pra ela.
Seu Verão é de um tempo tão remoto, que ela nem se lembra mais de como é estar no aconchego estival. A Primavera ainda está viva em sua memória e somente Raquel sabe a falta que sente. O Outono tem sido longo, está quase no fim e ela se deu conta que o Inverno está próximo. É a única explicação para tamanho frio. A neve está prestes a cair. É verdade, ela olhou para o céu e notou pelo aspecto das nuvens que um cruel nevoeiro chegará em breve, apenas para congelá-la e estabilizar de vez o seu gráfico.
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