É um dia normal do final do mês de junho. Deito-me na cama, e fico ali curtindo o desânimo que me levou até aquela trégua do cansaço cotidiano. Inclino levemente minha cabeça para trás e vejo, através da janela, um lindo céu colorido com um azul que só existe mesmo na paleta de cores do Criador. Há também finas nuvens que salpicam o azul celeste como se fossem algodõezinhos desfiados, incandescentes e hipnoticamente brancos. E eles passam lentamente, preguiçosamente, com toda a avareza que um momento pós-refeição exige. Um doce vento sopra pela janela e invade todo o ambiente, tocando o meu corpo e esvoaçando os meus cabelos. Meu pensamento pega carona com a brisa e voa também pela janela, levando-me a reviver remotos e inocentes tempos. Eu tinha três ou quatro anos de idade e vivia aquela mesma situação pela primeira vez, desde que entendia-me por gente. Um lento início de tarde, tão lento quanto as nuvens que caminhavam pelo céu. E eu ali deitada na cama, admirando-as da mesma maneira que agora faço. Não sei porque recordo-me tão nitidamente daquele momento aparentemente sem importância, tendo em vista que meu livrinho mental de memórias ainda nem havia suficientemente se desenvolvido para tal feito. Mas hoje, ao deitar na cama e rever, através da janela, o mesmo céu que já era o teto do meu mundo enquanto criança, percebi que, apesar de parecidos, os algodõezinhos já não eram mais aqueles de outrora. Eles eram como eu. Embora o céu - o mundo - ainda fosse o mesmo, muitas nuvens haviam passado, e hoje eram outras que salpicavam o azul celeste. Sou como uma destas nuvens. Já voei por muitos céus, já enchi-me de aprendizagens, e quando menos esperei, desfiz-me para novamente renascer, com outras formas e em outros lugares do mesmo mundo que hoje me contém: o céu.
|