Sentado na cadeira defronte sua residência, lá estava ele. Homem magro, de estatura mediana, denotando, talvez, uns cinqüenta anos de idade. Sempre com um cigarro nos lábios, demonstrava altivez e firmeza no falar. Quando vim morar na rua onde resido atualmente, quase não havia casa, mas ele já se encontrava lá, sempre debaixo de uma frondosa árvore que lhe garantia uma sombra agradável! Sou daqueles que sempre busco amizades com as pessoas; e assim sendo, sempre dirigi palavras de cordialidade para com os outros, e não seria diferente com ele. Certo dia, logo cedo pela manhã, ao passar em frente sua residência, no caminho para o trabalho, aventei um diálogo.
- Bom dia! Como vai? Tudo bem?
- Tudo!
- A moradia aqui é tranqüila, não é?
- Sim, é bastante tranquila.
Desse breve diálogo surgiu uma amizade, e sempre que passava em frente sua residência, fosse pela manhã ou à tardinha, quando regressava do trabalho, cumprimentava-o, acenando com a mão. Tempos depois fiquei sabendo que ele sofria de insuficiência respiratória, talvez pelo fato dele ser fumante. Às vezes eu o via tossindo bastante e com dificuldade para respirar.
O tempo passou! Se é que o tempo passa! Oito anos se foram de repente. Na verdade, eu, particularmente, acredito que nós é que caminhamos no tempo. Mas aí é outra estória! O certo é que o estado de saúde de meu amigo foi se agravando cada vez mais. A ida a hospitais se tornou frequente e ultimamente, quase todas as semanas tinha de voltar ao pronto-socorro. Em uma dessas consultas o profissional da área médica sugeriu-lhe alguns exames complementares, já que a medicação que ele estava administrando não estava surtindo o efeito desejado. Marcados os exames, lá foi ele.
O eletrocardiograma era desejável. O raios- x torácico indispensável! Afinal, o mesmo deveria ser avaliado em minúcias.
Estava voltando de mais um dia de trabalho quando o avisto de longe. Havia alguns dias que eu não notara sua presença em frente sua residência. Dessa vez, sentado não mais na cadeira de sempre, mas no tronco da árvore que costumeiramente ficava, o observei abatido. Ah! A árvore havia sido cortada porque havia sido infestada por um inseto. Um parasito. Agora, o que lhe restava para o descanso, era apenas o tronco, ainda fixado no chão. Sinais de debilidade e cansaço físico foram prontamente por mim observados, quando me aproximei. Então perguntei:
- Tudo bem com você?
Com o semblante debilitado e quase sem poder falar, disse:
- Que nada, rapaz! Tenho estado nos últimos dias internado.
Insisti a perguntar:
- E o resultado dos exames?
- Nem te falo! Os exames cardiológicos nada detectaram de anormal.
Fiquei surpreso!
- Então, porque se encontra neste estado? Tornei a perguntar.
- Sabe, quando o médico observou a chapa de raios x, foi enfático no diagnóstico! Coração crescido. Sim, essa é a causa do meu sofrimento.
Confesso que nesse momento fiquei com um nó na garganta. Porém, sem demonstrar sentimento de dó, o que nesse momento, só lhe causaria maiores aflições disse-lhe:
- Contudo, o tratamento agora pode ser efetuado sabendo a causa e em breve você estará restabelecido. Com relação à medicação, ele prescreveu alguma?
Falando, com sofreguidão disse:
- Claro, uma medicação ‘pesada’, tanto para controlar o aumento do volume do coração, quanto para aliviar a falta de ar.
- Que bom! Vou indo e desejo-lhe pronta recuperação.
Desci a rua, pois moro um pouco mais para baixo e o deixei em suas íntimas cogitações.
Alguns dias se passaram logo depois dessa nossa conversa.
Eis que em um sábado, logo cedo, uma agitação tomara conta da rua. Como de costume não trabalho aos sábados, aproveito para dormir até um pouco mais tarde. Quando, enfim, ponho os pés na rua, os transeuntes informam a triste notícia: O Sr. Carlos faleceu hoje pela manhã, por volta das seis horas. Fiquei triste! Não esperava por uma notícia dessas, tão de repente. Fui até sua casa e constatei que alguns vizinhos e familiares já se faziam presentes. A esposa, os filhos, - uma jovem adolescente e um garoto pré-adolescente -, inconformados com o fato, não deixavam de verter lágrimas. Estava observando o amigo, ainda no leito, quando chega o carro de serviços funerários, para cuidar da parte que lhes é relativa. Deixando minhas condolências à família, retirei-me do recinto.
O velório acontecera à tarde, entrando pela noite. O sepultamento, no dia seguinte.
Fiquei a pensar, como sempre faço em qualquer situação e, especificamente nesse caso, observei a mim mesmo:
“Não sabemos o dia nem tampouco a hora em que partiremos para o lado de ‘lá’ ”. Digo de ‘lá’, para alguns que ainda não têm certeza da continuidade da vida em outros planos existenciais. Como para mim é fato, tenho certeza que poderemos nos encontrar novamente, algum dia, no lado de lá. Quem sabe! Sendo, assim, digamos aos nossos parentes, amigos e familiares: Até breve!
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