Eu entrava na adolescência, época em que as certezas começam a ruir. Provavelmente era a busca de novas certezas que tinha me levado ao quarto de empregada. Lá a conversa era sexo. Desconfio que as intenções não eram das mais nobres. Da parte dela eu não sei, mas ela era jovem e bonita e, pelo que me lembre, tinha namorado e estava com casamento marcado. Eu, em contrapartida, era feioso, desajeitado e acima de tudo, muito sem experiência.
Que eu saiba, jamais houve nada entre nós dois e a conversa não devia ser muito apimentada porque me lembro, a certa altura, ter perguntado: “Mas a rainha da Inglaterra, será que ela faz sexo também?” Na época, Elisabeth devia estar beirando os quarenta e como já tinha filhos, imagino que não foi por inseminação artificial. Juliana, a empregada, riu muito. Não sei se ela sabia quem era Elisabeth, nem onde ficava a Inglaterra, mas com certeza entendeu a pergunta e com certeza respondeu afirmativamente.
Segundo a música "Let’s do it" do Cole Porter, que a maioria provavelmente só conhece de ver escrito nas camisetas, sexo é algo que até mesmo o passarinho azul, as abelhinhas, pulgas educadas (e mesmo as não tão educadas), na Espanha, Lituânia, inclusive na Holanda, na fria Finlândia, isto para não falar da Argentina, todos fazem, então porque não a rainha da Inglaterra? Como é possível que aos dez anos de idade eu não soubesse disso? Como é que eu imaginava a procriação, eu que vivia no meio de animais, cercado por cães, gatos, galos, galinhas, patos e marrecos, freqüentava pastos e estábulos? Além disso, havia a escola. Não é possível que este tema não entrasse nas conversas com os colegas. Lembro-me inclusive de um rapaz, um pouco mais velho do que eu, mau aluno por sinal, me ter chamado para um canto, para me mostrar figurinha de mulher nua.
Pode ser que isto só reforçasse o preconceito, só confirmasse que sexo era coisa suja, feia, feita entre animais e pela marginália. Minha mãe também evitava o tema e, se é verdade que ela jamais chegou a falar de cegonhas, ela inventou uma história da semente que germina que era tão aérea como a cegonha. Mas mesmo assim, é difícil acreditar que só ignorância, preconceito e deseducação fossem a causa da pergunta. Será que era só para fazer Juliana rir? Será que era para despertar nela o instinto maternal? Ou seria esperteza, artimanha para que, chegada a hora, Juliana me explicasse exatamente o que Elisabeth fazia com a coroa?
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