Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
Sexo, cegonhas e a rainha da Inglaterra
Cláudio Thomás Bornstein

Eu entrava na adolescência, época em que as certezas começam a ruir. Provavelmente era a busca de novas certezas que tinha me levado ao quarto de empregada. Lá a conversa era sexo. Desconfio que as intenções não eram das mais nobres. Da parte dela eu não sei, mas ela era jovem e bonita e, pelo que me lembre, tinha namorado e estava com casamento marcado. Eu, em contrapartida, era feioso, desajeitado e acima de tudo, muito sem experiência.

Que eu saiba, jamais houve nada entre nós dois e a conversa não devia ser muito apimentada porque me lembro, a certa altura, ter perguntado: “Mas a rainha da Inglaterra, será que ela faz sexo também?” Na época, Elisabeth devia estar beirando os quarenta e como já tinha filhos, imagino que não foi por inseminação artificial. Juliana, a empregada, riu muito. Não sei se ela sabia quem era Elisabeth, nem onde ficava a Inglaterra, mas com certeza entendeu a pergunta e com certeza respondeu afirmativamente.

Segundo a música "Let’s do it" do Cole Porter, que a maioria provavelmente só conhece de ver escrito nas camisetas, sexo é algo que até mesmo o passarinho azul, as abelhinhas, pulgas educadas (e mesmo as não tão educadas), na Espanha, Lituânia, inclusive na Holanda, na fria Finlândia, isto para não falar da Argentina, todos fazem, então porque não a rainha da Inglaterra? Como é possível que aos dez anos de idade eu não soubesse disso? Como é que eu imaginava a procriação, eu que vivia no meio de animais, cercado por cães, gatos, galos, galinhas, patos e marrecos, freqüentava pastos e estábulos? Além disso, havia a escola. Não é possível que este tema não entrasse nas conversas com os colegas. Lembro-me inclusive de um rapaz, um pouco mais velho do que eu, mau aluno por sinal, me ter chamado para um canto, para me mostrar figurinha de mulher nua.

Pode ser que isto só reforçasse o preconceito, só confirmasse que sexo era coisa suja, feia, feita entre animais e pela marginália. Minha mãe também evitava o tema e, se é verdade que ela jamais chegou a falar de cegonhas, ela inventou uma história da semente que germina que era tão aérea como a cegonha. Mas mesmo assim, é difícil acreditar que só ignorância, preconceito e deseducação fossem a causa da pergunta. Será que era só para fazer Juliana rir? Será que era para despertar nela o instinto maternal? Ou seria esperteza, artimanha para que, chegada a hora, Juliana me explicasse exatamente o que Elisabeth fazia com a coroa?


Biografia:
Para mais informações visite o blog CAUSOS em www.ctbornst.blogspot.com.br. Querendo fazer comentários, mande e-mail para ctbornst@cos.ufrj.br
Número de vezes que este texto foi lido: 61623


Outros títulos do mesmo autor

Crônicas Faixa de ginástica Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas Ame o seu próximo Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas Tirem-me daqui! Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas Mondo Cane Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas Motorista de Uber Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas Disparates na sapataria Cláudio Thomás Bornstein
Frases Sonho e realidade Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas João e meus dois amores Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas Escondidinho de camarão Cláudio Thomás Bornstein
Crônicas Brincadeira tem hora Cláudio Thomás Bornstein

Páginas: Próxima Última

Publicações de número 1 até 10 de um total de 88.


escrita@komedi.com.br © 2025
 
  Textos mais lidos
PERIGOS DA NOITE 9 - paulo ricardo azmbuja fogaça 62693 Visitas
Jornada pela falha - José Raphael Daher 62541 Visitas
Mistério - Flávio Villa-Lobos 62373 Visitas
O Cônego ou Metafísica do Estilo - Machado de Assis 62241 Visitas
Viver! - Machado de Assis 62228 Visitas
Os Dias - Luiz Edmundo Alves 62213 Visitas
- Ivone Boechat 62188 Visitas
Eu? - José Heber de Souza Aguiar 62179 Visitas
PEQUENA LEOA - fernando barbosa 62177 Visitas
Insônia - Luiz Edmundo Alves 62167 Visitas

Páginas: Próxima Última