Giovanni um dia foi Ana.
E assoviavam quando ela passava com seus passos de garça,
no espaço da calçada traçava o balé cotidiano,
seu coração de suburbana moça traçava os planos
que desembocariam nos pelos no rosto, face de um humano
que sonhava ser quem era, um ser de outra física esfera...
Giovanni deixou de ser Ana.
E assoviavam como chacota quando ele/ela passava
com a chave de uma outra porta,
os palavrões recorrentes saíam por entre os dentes,
animais em fúria poderiam atacar, de repente,
o meio homem e meio moça sentia
que poderiam quebrar a sua louça,
espatifar um sonho no chão de bruto cimento
como se espatifa um xícara de porcelana barroca,
como se machuca, com palavras, um coração,
por dentro...
Giovanni guardou sua Ana num jardim da memória,
já alto e espadaúdo caminhava por entre todos, sereno,
sabia que seus passos escreviam outros passos da história,
já sem receio ia e vinha sem sentir nenhuma gota de veneno...
Casou com Petra, que era como uma pétala macia,
adotaram os filhos deserdados pela ignorância,
não sabia que sobre ele um anjo desenhava a poesia,
ato de lúcido amor, primevo, mas de última instância...
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